O que os jornais não explicam sobre a dívida pública, por José Salvador Faro

Do História, Cultura, Comunicação

Dívida pública: o que o noticiário não diz nem os jornais explicam

José Salvador Faro

Neste caso específico do volume de recursos financeiros que oneram o Estado através da dívida pública, me parece que dois contextos precisam ser obrigatoriamente constituídos para que a dimensão social da notícia seja alcançada. Um primeiro contexto é o da causalidade racional do fato.

Num país de fraca acumulação capitalista e que tem à frente de suas práticas empresariais uma burguesia anêmica e provinciana – mais preocupada em burlar direitos e em lucrar no nível da ganância – corresponde ao Estado o papel de indutor e de promotor dos investimentos. Sem que cumpra essa função – que lhe dá a definição dedesenvolvimentista – o Brasil estaria ainda vivendo o estágio da economia agrário-exportadora da era colonial. Aliás, no agro-negócio há muita semelhança entre um período e outro.

 
Essa é uma dimensão estrutural da dívida pública e gigantescamente estrutural pois que o valor de R$ 2,8 trilhões indicados na matéria, levando em conta as grandezas do quadro econômico e social de um país como o nosso, é até pequena. E um aumento anual dessa dívida em 21,7% pode perfeitamente ser relativizado frente a outras demandas. Onde isso tudo aparece no noticiário?

 
O segundo contexto é um círculo que envolve o condicionamento político da dívida pública pelo qual seus próprios beneficiários são culpados: o diabólico sistema de desonerações fiscais e de subsídios de todo o tipo que o governo põe à disposição dos empresários imaginando que com isso vai tirá-los da letargia e do parasitismo em que estão acostumados a viver desde sempre. As matérias indicadas abaixo dão bem a dimensão do problema, mas é suficiente emoldurá-lo: cumprimos todos os anos a liturgia de transferir da sociedade para as mãos privadas da nossa burguesia uma soma estratosférica de recursos e o nome disso é dívida pública.
 
Os impostos que a precária inteligência da Fiesp quer pagar a menos são o tiro no pé dos próprios empresários. E isso nem o Sr. Paulo Skaf tem coragem de dizer (talvez nem mesmo saiba do que estamos falando) nem os jornais dizem, preocupados como estão em construir textos pobres de entendimento e ricos em espetacularização. 
 
Sugiro a leitura: Perdas com o serviço da dívida (Nova Democracia) * Dívida pode superar limite de 70% do PIB em 2016 (Valor) * Arrecadação soma $ 1,2 trilhão em 2015, pior resultado em 5 anos(Valor) * Desequilíbrio fiscal brasileiro e as consequências do financiamento da dívida (IHU) * Governo pode perder R$ 116 bi com desoneração (Estadão) * Dilma deu R$ 458 bilhões em desonerações (Folha) * Impostos: quem paga o pato não é a Fiesp (Outras Palavras) * Governo acaba com ‘Bolsa Empresário’ e fica com dívida de R$ 214 bilhões (Folha).
 
José Salvador Faro é Professor da UMESP e da PUC-SP
Redação

14 Comentários

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  1. para compensar e justificar a

    para compensar e justificar a sua incompetencia vejo

    alguns empresários desancarem o governo popular,

    como se a substituição deste governo fosse beneficiá-lo…

    mal sabe ele, por sua ignoranbcia patética verificável em qualquer

    pesquisa histórica, que quanto mais houver concentração de renda

    com o regime neoliberal  pior fica para ele….

    e o paulo skaf é um dos representates desse falacioso bloco de

    empresários mal preparados e aproveitadores que querem dar o golpe para

    auferir beneficios que, como empresarios, jamais conseguiriam,…

     

    1. Muito bom artigo e comentário.

      Como li em alguma ocasião sobre esse tipo de empresários: Se seu negócio é ficar esmolando ao governo para baixar um ou dois pontos percentuais (como é costume falarem sobre PIS, COFINS e outros) é melhor fechar as portas. Se meu negócio depender disso é uma atestado de…

  2. prezado, porque será que:

    prezado, porque será que: “corresponde ao Estado o papel de indutor e de promotor dos investimentos” ?

    Por que?

    Porque o estado é centralizador, e responsavel pela maior fatia do bolo.

    Quando o estado não é centralizador, deveria ser regulador. Mas nem isso consegue ser, porque se corrompe.

     

     

  3. A auditoria “cidadã” da dívida pública, a velhinha e o SAMU

    A auditoria “cidadã” da dívida pública, a velhinha e o SAMU

    Toda semana (era toda terça-feira) o Banco Central realiza o leilão de títulos públicos da dívida brasileira emitidos pelo Tesouro Nacional, a maioria pós-fixados, atrelados à Selic. Papéis novos são ofertados para pagamento dos que estão vencendo nos próximos dias. É a rolagem semanal da dívida pública brasileira, quem não pode pagar, rola. Os maiores compradores são os bancos, que ou entesouram os títulos (mantém em tesouraria rendendo 14,25% a.a.), ou lastreiam Fundos de Investimentos – todos os bancos possuem Fundos de Investimento. Um Fundo que contenha majoritariamente papéis públicos pós-fixados é um fundo destinado a investidores de perfil conservador, preferem a segurança em detrimento da rentabilidade. Afinal, os papéis são emitidos pelo governo brasileiro, quer garantia maior do que essa? O único – único – risco de não receber é o país quebrar, falir, e isso jamais vai acontecer.

    Aí entra a velhinha aposentada e viúva na história. Ela pegou as economias do falecido, vendeu um imóvel, juntou tudo e fez uma bela e sólida aplicação financeira num banco igualmente tradicional e sólido, o do Brasil, onde tem conta desde 1945. A finalidade é garantir uma velhice digna e decente pelo tempo que lhe restar. Mas ela é uma velhinha descolada, sabe das coisas, não quer saber de Poupança, poupança é para pequenos valores, e como o valor já é significativo, aconselhada pelo gentil e prestativo funcionário do BB aplicou tudo num Fundo de Investimento de perfil conservador, como ela. Todo dia a velhinha põe a cabeça no travesseiro e dorme o sono dos justos, seu dinheiro, sua única segurança, está a salvo.

    Mas onde é que entra o SAMU na história? Calma, entra aqui. Daí vem a tão sonhada auditoria “cidadã” da dívida pública. Durante 18 a 24 meses, tempo em que durou o circo, o mercado financeiro brasileiro virou do avesso, o caos se instalou. Um dia a velhinha é chamada ao Banco para tratar de assunto de seu interesse. A velhinha chega e como tem preferência, logo é atendida, quando então é comunicada que a sua aplicação financeira não existe mais, virou pó, os títulos que lastreavam o Fundo do qual era cotista foram tidos como espúrios, passíveis de não pagamento segundo o comitê de auditoria “cidadã” da dívida pública brasileira. Agora sim, entra o SAMU, antes de dar a notícia o funcionário do BB acionou a ambulância do SAMU com um cardiologista dentro. Porque a velhinha aposentada e viúva vai enfartar. Assim como ela, milhares de aplicadores Brasil afora. 

        1. Claro, está cheio de velhinho

          Claro, está cheio de velhinho vendendo casa e aplicando em títulos públicos, parece o típico perfil dos nossos endinherados aposentados… Bom, talvez os velhos que sejam donos de instituições financeiras tenham algum problema cardiaco, mas já causaram muitos infartos por aí não? Eu mesmo já escutei caso de pessoa que faleceu por infarto quando um bom banco foi lhe foi tomar a casa…

    1. Essa auditoria cidadã não vai acontecer
      Por mais que eu queira, essa vergonha de dívida pública não vai acabar.
      Nem os blogs progressistas dão o devido destaque.
      Todos eles deveriam ter um contador na página principal, informado quanto está sendo pago por isso

    2. Então, o assunto é tabu?

      Eventuais distorções, para não dizer extorsões em certos casos, não podem sequer ser discutidos sob a constante e temível ameaça do Deus mercado? Quer dizer que o próprio sistema financeiro é quem dita os riscos da auditoria da dívida? E se nada for achado? A dívida for integralmente correta ou, pior, o governo dever ainda mais do que deve atualmente? 

      O temor do “mercado” é pela certeza da fragilidade dos seus créditos?

      Por outro lado, é curioso notar que, para discutir previdência e direitos trabalhistas, o mercado é totalmente favorável, porque é para reduzir direitos e trazer mais “eficiência” e “sustentabilidade” ao sistema. Nessas horas as bolsas disparam e sobem, como um milagre divino.

  4. Para ajudar um pouco o

    Para ajudar um pouco o entendimento sobre tema tão importante, mal entendido e distorcido por boa ou má fé, gráficos abaixo, e muito mais aqui neste link sobre as dívidas públicas do Brasil, e de outros países, e sua evolução nos últimos anos: https://brasilfatosedados.wordpress.com/2014/08/19/divida-liquida-total-interna-externa-governo-em-do-pib-brasil-evolucao-1991-2014-recebida-e-entregue-governos-1991-2014/

     

    Dívida Líquida Total - interna + externa - Governo - em % do PIB BRASIL - Evolução - 1991 - 2014 - REV A

     

     Dívidas Públicas Líquidas das 15 maiores economias do mundo - em % do PIB - 2013 - em ordem crescente - FMI - Rev. C  por 

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  5. O empresário brasileiro quer viver nos tempos dantes de Dom João

    O empresário brasileiro quer viver nos tempos pré-capitalistas anteriores à abertura dos portos em 1808, quando o comércio exterior era proibido e todo empreendimento só podia ser feito com autorização (alvará) e apoio da coroa, que concedia monopólios a seus protegidos.

    O governo lança subsídios achando que vai tirar o empresário brasileiro da letargia e do parasitismo, mas só consegue criar um séquito de empresários amigos-do-rei ávidos por mais subsídios. Mas não é por inocência que o governo cai nessa arapuca, e sim por interesse: os empresários beneficiados sabem muito bem recompensar os políticos que os beneficiam. A ideia do Estado indutor do desenvolvimento podia fazer algum sentido 60 anos atrás, quando nossa industrialização era incipiente, mas na época atual está totalmente superado. Haja visto os resultados que Dilma colheu ao ressuscitar o desenvolvimentismo.

    O capitalismo não se desenvolve sob afagos, mas apenas sob chicote: a lei da selva implacável do livre mercado e da livre concorrência, onde quem não tem competência não se estabelece. Mas nossos empresários só querem mamar nas tetas do Estado, e nossos políticos gostam muito disso, pois são bem recompensados.

  6. O PT perdeu para os rentistas…

    O Maior problema da economia no Brasil é a taxa Selic. O economista que a levar para baixo da poupança ganha o nobel de economia.

    O Brasil é terra virgem, precisa de gestores com coragem e honestidade…

    1. concordo totalmente…..

      concordo totalmente….. selic e o ministro Zé Cardoso, a destruição do PT……………….  ambos, escolha de Dilma……. 

  7. Investidores?

    O Brasil teve uma “greve” dos investidores. Na verdade o que atrairá os investidores não é a Selic alta, nem regras pró mercado, nem tercerizar a mão de obra.

    O que espantou os investidores foi o espetáculo da Lava Jato, onde empresas de décadas são quebradas por ordem judicial, e a presidanta, republicanamente não faz nada, apenas observa. Coloquem um presidente de pulso no lugar dela, fechem a Lava Jato, e salvem as empresas que os investidores voltam.

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