Para entender a não obrigatoriedade de Bolsonaro mostrar seu exame de saúde

Porque se invoca o Código Penal e os Direitos Humanos? Porque Jair Bolsonaro é suspeito de ter cometido crimes. A Imputação que está sofrendo é de ter transmitido doença contagiosa dolosamente. Ao mesmo tempo que tem a prerrogativa de não se autoincriminar, sua recusa, se somada a outras evidências, pode levar à sua condenação.

Há uma confusão sobre os direitos de Jair Bolsonaro em não mostrar seu teste de coronavirus.

Vamos, primeiro, à suspensão da liminar e da sentença obrigando Bolsonaro a mostrar seu teste de coronavirus, concedida pelo Presidente do Superior Tribunal de Justiça João Otávio de Noronha:

Segundoos argumentos da defesa:

“Sustenta que o cumprimento da decisão impugnada gera grave lesão à ordem pública, pois se está a exigir que a administração pública federal invada a esfera privada de pessoa física mediante a divulgação de dados personalíssimos referentes a sua saúde.

Afirma que o Presidente da República, ao realizar exame médico com a finalidade de detectar se padece ou não de determinada enfermidade, não o faz na condição de agente público, e sim de pessoa física, razão pela qual deve ser assegurado seu direito à intimidade e à privacidade.”

É uma impropriedade óbvia. Seria o mesmo que um médico, que atende a uma UTI, recusar-se a mostrar seu exame de saúde, para confirmar se está infectado ou não.

Na ação proposta, para que Bolsonaro revele o resultados dos exames, explica-se:

Ainda que a Lei de Acesso à Informação limite o acesso a dados pessoais quando não houver consentimento expresso do indivíduo (art. 31, § 1o, II), essa autorização é dispensada se a informação for necessária à prevenção e ao diagnóstico médico, à realização de estatísticas e pesquisas científicas, ao cumprimento de ordem judicial, à defesa de direitos humanos e, de forma mais genérica, à proteção do interesse público e geral preponderante (art. 31, § 3o).

O primeiro mandatário do país se submete a princípios superiores ao desse direito da privacidade: o princípio da moralidade e da transparência. O país tem o direito de saber todas as informações que possam ter impacto sobre atos do Presidente da República.

No entanto, a sentença de Noronha trata os direitos de Bolsonaro como equivalentes a qualuer cidadão comum:

Relativizar tais direitos titularizados por detentores de cargos públicos no comando da administração pública em nome de suposta “tranquilidade da população” é presumir que as funções de administração são exercidas por figuras outras que não sujeitos de direitos igualmente inseridos no conceito de população a que se alude, fragilizando severamente o interesse público primário que se busca alcançar por meio do exercício das funções de Estado, a despeito do grau hierárquico das atividades desempenhadas pelo agente público.

É fantástico! Equivaleria a acabar com o psicotécnico para exame de piloto de avião, ou considerar discriminatório pedir exame de saúde para um médico responsável por uma UTI, suspeito de ter alguma doença infecciosa.

Direito a não auto-incriminação

Na verdade, o direito que protege Bolsonaro – e que não foi explicitado por seus advogados, por razões óbvias – é o principio penal da não auto-incriminação: ninguém é obrigado a produzir provas contra si.

Há quem invoque o Incisivo 53 do artigo 5 da Constituição Federal:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), em seu artigo 8º, item 2, alínea g, prevê que toda pessoa acusada de um delito tem, durante o processo, a garantia de “não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada”. (https://tinyurl.com/yb2sux4l)

O Código de Processo Penal prevê o direito do acusado de ser advertido do “direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas”, sendo que “o silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa” (art. 186).

Porque se invoca o Código Penal e os Direitos Humanos? Porque Jair Bolsonaro é suspeito de ter cometido crimes. A Imputação que está sofrendo é de ter transmitido doença contagiosa dolosamente.

Ao mesmo tempo que tem a prerrogativa de não se autoincriminar, sua recusa, se somada a outras evidências, pode levar à sua condenação.

Uma das evidências é a quantidade de companheiros de viagem aos Estados Unidos já contaminados. Outra são as aglomerações públicas em que se meteu. A mera identificação de uma pessoa contaminada, após o contato com Bolsonaro, será suficiente como prova do crime.

Luis Nassif

8 Comentários

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  1. Conheço uma pessoa que não respeita o isolamento social. Vive circulando como se a epidemia não existisse. Ela não trabalha. Suas saídas são para visitar amigos, para participa de churrascos, etc. Ontem ela apresentou dores no corpo, tosse seca e respiração ofegante. Perdeu o paladar e o olfato. Nada obstante, hoje ela pegou transporte coletivo e foi visitar uma amiga.

    O povo foge da ignorância apesar de viver tão perto dela e sonha com melhores tempos idos, contempla essa vida numa cela

  2. So existe razão para Bolsonaro lutar tão ferozmente para não apresentar o resultado de seu exame: O resultado foi positivo para coronavirus.
    Aliás, nesse caso se é prá defender o direito a intimidade da pessoa fisica Bolsonaro contra uma obrigatoriedade de divulgar o exame ele deveria estar sendo representado por um advogado privado nao pela AGU que existe para defender o poder executivo.

    1. Andre: você matou a charada. O resto é balela. O MessiasDoBras tá bichado. E concordo com a não obrigatoriedade dele fazer prova conta si mesmo. Porém, segundo disse um do Çupremu, “a vida de um ÔmePúblico há de ser um livro aberto”. Então, quem fez o tal exame que declare, EXPRESSAMENTE, se a PragaPresidente foi alcançado pela PragaChinesa. Pode até ser que a local seja mais forte e derrote a importada por 7 x 1.

      Mas devo confessar que na atual circunstância, com os VerdeSauva (e agora, os AzulSauvas) assumindo a direção, sinto que essa tal Constituição e leis decorrentes parecem escritas em papel higiênico de qualidade tão ruim que não serviria nem pra limpar merda sem arranhar profundamente a bunda das pessoas.

  3. A saúde pública se sobrepõe a qualquer outro regramento, seja civil ou penal. No caso, ninguém quer saber se o bolsonazi esteve ou não contaminado, mas, se ele, enquanto infectado produziu atos capazes de contaminar pessoas ao seu redor. Como tantos já foram condenados por passarem aids a outras pessoas, pois, sabia ser agente contaminado e contaminador.
    Então, a decisão do dito norões é de impropriedade legal e, até mesmo, de conluio pró contaminação de terceiros. Tão criminosa quanto o bolsofascista.
    No caso, a acusação devia reivindicar a entrega dos exames ao hospital onde os mesmos foram feito.
    Se usou codinome, fácil de encontrar: procurar por ustra, brilhante ou curió.
    E, mandem prender de imediato o associado norões, por agir contra a saúde pública.
    No caso do norões, interessante notar como ele está fugindo do seu sempre tutor: gilmaredomendes.
    Não fosse o GM, o norões hoje estaria nas praias espiritosantenses tomando covid-19.

  4. Ele é uma figura pública ocupando o mais alto posto publico do país, só por isso tem a obrigação de tornar públicos todos os exames médicos que possa comprometer o exercício da sua função como dos demais funcionários públicos em seu entorno, no mínimo, que dirá o público em geral com quem ele se relaciona.

    Agora pensem em um exame em que se avalia a sua acuidade mental para o exercício da função para a qual foi eleito e cujo resultado aponta que ele não reúne minimamente tais condições?

    Ele não divulga o resultado e proíbe a equipe médica de fazer o mesmo. Como fica o país?

  5. Um toco de pau, plástico ou ferro não pega Covid-19 (jamais ficará “doente”).
    Mas se eu pegar o toco e cumprimentar um monte de pessoas nas ruas, basta que uma esteja com a mão contaminada (não precisa nem estar doente) para que cada pessoa seguinte que eu cumprimentar seja contaminada.
    É preciso compreender (de uma vez por todas!) que não é necessário estar doente para transmitir a doença.
    QUALQUER PESSOA, 100% SAUDÁVEL E NÃO CONTAMINADA PODE SER UM TRANSMISSOR/VETOR DA DOENÇA!
    Bolsonaro não precisa ter estado doente para ter cometido crime. Basta estar recorrente e ostensivamente saindo em público sem máscara, falando à curta distância, cumprimentando pessoas, abraçando-as para selfies, tomando crianças no colo, TOCANDO EM COISAS NA RUAS em sucessão, para poder assim REPASSAR o vírus de um para outro.
    Os tais exames não são necessários para incriminá-lo como possível REPLICADOR de contaminação. Isto já é fato, público e ostensivo e está gravado em inúmeras ocasiões.
    Publicizar os exames é necessário para COMPROVAR QUE MENTIU COMO PRESIDENTE DA REPÚBLICA em diversas oportunidades, inclusive em CADEIA NACIONAL OFICIAL.
    Apenas um OUTRO CRIME (mais um de vários).

    1. O exemplo do “toco” é para demonstrar que um replicador de contaminação não precisa sequer de contato físico com o contaminado.
      Basta usar o “toco” para cumprimentar outros em sucessão, servindo de PONTE para a contaminação.
      Não precisa nem estar presente. Se eu contaminar o toco com alguém, depois “limpar” o toco contaminado e deixar o pano num balcão, uma pessoa que use o pano ou se apoie no balcão poderá se contaminar.
      Se achar que está segura e passar as mãos nas entradas do rosto, aí estará adquirindo a doença.
      Ficar em casa (doente ou saudável) NÂO é só para SE proteger da doença. É para proteger os DEMAIS, diminuindo a PROBABILIDADE de repasse “ponte” , seja por contato, contaminação aérea (sem máscaras) ou contaminação de COISAS que outros poderão tocar (fazer a “ponte” por “RASTRO”).
      Se a sociedade não entender isso e continuar reduzindo o distanciamento social, não adianta só usar máscaras (e pior, não usar): a contaminação continuará crescendo.

      Não entender cálculo exponencial na propagação de uma epidemia é aceitável.
      Mas entender PROBABILIDADE, qualquer pessoa que jogue “par ou impar” e jogue na loteria ou advinhar um entre dois números ou mil sabe a diferença.
      Então vamos pensar na seguinte imagem (quem sabe alguém aqui faça uma animação, Nassif arranja?)
      Tenhamos uma mesa de sinuca com as tradicionais caçapas e bolas.
      Aí acontece um terremoto chamado Covid-19.
      Na alternativa 1, recolhem-se as bolas, ficando algumas poucas na mesa. As demais ficarão guardadas. Chamaremos esta alternativa de “quarentena de bolas”.
      Na alternativa 2, todas as trocentas bolas ficarão na mesa. Chamaremos esta alternativa de “trabalho liberta”.
      Tomando-se a mesa como o espaço público, as bolas como pessoas, os choques entre as bolas como contaminações, as caçapas como mortes (caixões?) e o terremoto como a pandemia, pergunta-se (inclusive a minions!):
      Com a mesa tremendo e sacudindo, em qual das alternativas colidirão mais bolas?
      Em qual das alternativas cairão mais bolas nas caçapas?
      Será que os mínions vão responder “arbeit macht frei”?

      PS: Nassif, Lourdes e pessoal do GGN: há algumas semanas um pesquisador (Mauricio Féo) publicou um vídeo sobre replicação EXPONENCIAL bastante didático. Falta agora lembrar a todos sobre o outra variável que é a PROBABILIDADE. Se vcs arranjarem alguém para fazer um vídeo com a animação do exemplo acima (ou outro qualquer), seria uma ótima contribuição para disseminar uma visão melhor de porque as pessoas não devem sair tanto às ruas.

  6. Tudo bem que ele não possa ser obrigado a produzir prova contra si mesmo. Mas, na investigação do crime, não se pode exigir do laboratório (e não de Bolsonaro) que mostre o exame? Assim, não se haveria de falar em produção de prova contra si.

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