POR QUE HADDAD SE RECUSOU E A ESQUERDA SE RECUSA A FALAR SOBRE SEGURANÇA PÚBLICA?

Leonardo Boff se espanta e escreve: “o povo votou nos seus algozes”. Por que será? Perguntemos. Seria aquele famoso discurso da servidão voluntária de La Boétie? Tem a ver mas não só. Não precisamos ir tão longe. O povo votou nos seus algozes porque esses algozes prometeram livrá-lo de um algoz ainda mais terrível para ele: o criminoso comum do bairro, aquele que o inferniza, humilha, bate, mata, torna o seu dia a dia carregado de um desespero inimaginável para nós classe média bacaninha que, quando muito, sofremos um assaltozinho aqui e acolá nas avenidas chiques.

O problema da segurança para as massas populares é tão grave quanto o problema de sua viabilidade econômica (emprego, renda, estudo, moradia, etc.).

Um amigo meu tem uns imóveis prá alugar numa cidade satélite popular de Brasília. Teve o seguinte problema: inquilinos que não possuiam carro devolveram o imóvel no primeiro mês porque tinham de ir pro emprego de ônibus às 5:30 ou 6:00 hs da manhã e foram repetidamente assaltados na parada. Foram obrigados a se mudar prá imóveis mais centrais –e mais caros-, próximos de uma estação de metrô.  É viável uma vida assim para as pessoas?

Eu consigo uma moradia do Minha Casa, Minha Vida, que a Esquerda, quando no governo, me proporcionou, eu fico muito feliz, agradecido ao Presidente Lula, à Dilma, então eu me mudo, monto meu pequeno negócio, meu filho entra no Prouni e no Fies, eu estava muito feliz, entretanto, as milícias estão batendo na porta do meu negócio exigindo propina, meu filho foi assaltado três vezes na porta de casa ao voltar da faculdade à noite e a filha da minha vizinha foi assassinada nas mesmas circunstâncias.

Aí vem as eleições. A Esquerda é COMPLETAMENTE MUDA em relação à segurança pública. A Direita vem dizendo que torturador é o herói, que vai curar gay na marra, privatizar estatais –eu até acho estranho tudo isso- mas ela também diz que vai acabar com a bandidagem, matar uns 30.000, punir os De Menor criminosos, reduzir a maioridade penal, por criminoso na cadeia. Aí eu apoio, pois ela promete acabar com todos os que estão acabando com a minha vida, com a minha felicidade.

No imaginário do povão funcionaria mais ou menos assim:

Esquerda (PT): Moradia, emprego, escola… Coisas importantes, necessárias. Eu apoio.

Direita: Acabar com os bandidos, prender os criminosos… Coisas essenciais. Eu apoio.

Dessa forma, aparentemente, venceria a eleição quem soubesse estimular mais o imaginário e o humor das massas pobres para as necessidades de um desses itens naquele momento da eleição (fake news à parte).

Agora umas perguntas: Por que essa dicotomia? A esquerda, tão craque em desenvolvimento social, não é capaz também de apresentar um programa de segurança pública que prometa mitigar o sofrimento das pessoas em relação à violência, à criminalidade comum, aos assassinatos banalizados? Conseguiria, dessa maneira, invadir o campo onde a direita se acha a única rainha e ter muito mais força nas eleições. Por que deixar apenas Sérgio Moro falar uma verdade óbvia como: “é necessário aumentar a pena para crimes graves como homicídio”? Por que deixar a direita dominar essa narrativa, como se a esquerda também não fosse favorável a punições severas para homicidas e assassinos cruéis?

A esquerda seria capaz de dar uma resposta a essas perguntas, se não fosse impedida por duas travas: uma trava cognitiva e outra ideológica.

Cognitiva: Não percebe que a violência comum acontece dentro das massas pobres. São os pobres agredindo os pobres. Uma minoria de pobres violentos, criminosos, agredindo a grande maioria de pobres que tenta sobreviver no desespero. Portanto, os bandidos são tão tiranos, para a vida da população trabalhadora pobre, quanto os capitalistas que as exploram e que foram descritos por Marx.

Ideológica: Como a Esquerda não consegue perceber isso e acha que toda a violência, todo o sofrimento do povo pobre é devido à exploração capitalista (claro que a causa básica é, ninguém discute isso), qualquer plano de se punir com mais rigor os tiranetes de bairro é visto como se fosse uma punição a quem já é uma vítima “do capitalismo” e assim essa ideia é suprimida com vigor e jogada lá pros quintos do subconsciente, pois é coisa “de direita”.

Aí… fica de mãos atadas e vai perder todas as eleições para a Direita que empunha a bandeira do punitivismo, porque punitivismo é música para os ouvidos das massas trabalhadoras pobres das periferias, oprimidas não só pela exploração capitalista mas também pela ação dos tiranetes de bairro, e aflitas com a violência e impunidade desses tiranetes.  

Nosso querido Haddad, tão competente, tão gabaritado para dirigir esse nosso querido país, sendo entrevistado, na campanha, por um jornalista sobre a redução da maioridade penal disse: “Somos contra”. O Jornalista perguntou: “Por quê?”  Ele respondeu: “Porque não consideramos que seja solução para o problema”. Nada mais. Titubeou discretamente ao falar essa última frase. Talvez porque, sendo um homem inteligente, tenha inconscientemente percebido que não é uma resposta convincente a ser dada aos eleitores sobre a violência e os anseios deles por justiça. Ele deve ter sentido, lá no íntimo, que a Esquerda deve apresentar propostas um pouco mais elaboradas para um problema que aflige tanto as massas pobres, como é a violência. Ou faz isso, ou não está preparada para resolver os problemas do povo, para convencer a massa de eleitores e então não deve reclamar nem lamentar a derrota.

 Será se, ao encarar a questão da segurança pública, a Esquerda se igualaria à Direita? Vamos comparar possíveis roteiros de ação de cada uma:

Solução da Direita:  Redução da maioridade penal para todos os crimes; aumentos gerais de penas; pena de morte; trabalhos forçados; penas cruéis, ao estilo da pena que Fujimori aplicou em Abimael Gusmán, líder do Sendero Luminoso (para quem não lembra, ele foi preso em uma cela pequeníssima, onde não podia se mover, de teto baixo, onde não podia se levantar por completo, escura, não podia ler um livro, não podia fazer nada, ou seja, uma tortura contínua para qualquer ser vivo, animal ou humano); liberação e apologia da violência policial; humilhações; sangue; massacres.

Solução de Esquerda: Redução da maioridade penal para os crimes de homicídio e lesão corporal; Aumento de penas para esses crimes com obrigação de cumprimento da pena total em regime fechado; Aumento de penas além dos 30 anos para homicidas reincidentes; presídios-escolas; presídios-fábricas modelos; eliminação dos crimes de desacato, resistência e desobediência em relação a policiais (arts. 329 a 331 do Código Penal), a profissão já embute a necessidade de lidar com pessoas fora de si, bêbadas, loucas, enfurecidas, etc.; punição severa à violência policial; respeito.

Ver outras propostas no texto https://jornalggn.com.br/fora-pauta/pobre-esquerda-sempre-dando-murro-em-ponta-de-faca

Com possíveis soluções tão diferentes, por que a Esquerda tem tanto medo de ser confundida com a Direita ao palpitar sobre segurança pública?

Só pode ser devido às travas cognitivas e ideológicas mencionadas acima.

Ah, mas reduzir maioridade penal, seja de que forma for, é “proposta de direita”. Ah, é? Então continue assim, pequena avestruz, enfie a cabecinha na areia, vire a bundinha para cima e deixe a Direita enrabar você como fez nessas eleições de 2018, enrabar o nosso querido Presidente Lula como está fazendo, para nosso completo desespero e impotência, e outras muitas coisas terríveis que ainda fará, uma vez que você, pequena avestruz, se recusa a ir aonde o povo está e tentar entende-lo. Se recusa a dar uma resposta realista “de esquerda” aos problemas que o afligem e assim ganhar a eleição e poder influir mais no processo político, que é a única possibilidade de “revolução” com que podemos contar na atualidade.  

 

Redação

2 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Um ótimo texto, realista, principalmente quando a esquerda ataca a desigualdade e a exploração social como causas de violência, e que deve ter uma atitude propositiva sobre o tema. Mas a esquerda tem que aproveitar a visão sistêmica e atacar a violência, a cultura de violência, o comportamento violento. O cara que pega o carrão bêbado e mata o pai de família no ponto de ônibus é tão ou mais violento que qualquer outro tiranete de bairro. Os EUA são um país violento se comparado com outros da OCDE, aplicam pena de morte e até crianças podem ser julgadas como adultos. E aí está sua enorme população carcerária. Um traficante pequeno não pode pegar 5 anos de tranca, esperar 1 ano por julgamento em CDPs que não proporcionam estudo e trabalho mas já tem a presença dos “partidos” De que adianta prisão perpétua se a resolução de homicídios é baixa? Isso é impunidade. E a discrepância entre o acesso à defesa entre ricos e pobres? Isso é algo que leva tempo, mas antes levantar essa bandeira que nenhuma.

    1. Devemos, mesmo começar a discutir saídas mais CRIATIVAS e mesmo MELINDROSAS, a partir de questionamentos de ARTIGOS como este. temos que sair da MESMICE e achar saídas mais URGENTES, e de CONFRONTO com a realidade..”sem medo de questionamentos das TEORIAS de ESQUERDISMO TRADICIONAL”!
      Precisamos afastar “O MEDO”, de que vamos perder a essência da nossa LUTA, se tivermos clareza dos PROBLEMAS SOCIAIS, e COMBATE-LOS, dentro da PROBLEMÁTICA SOCIAL que ele se apresenta.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador