Rebelião das massas?, por Rodrigo Medeiros

No livro “A rebelião das massas” (1930), Ortega y Gasset afirma logo no primeiro capítulo: “A característica do momento é que a alma vulgar, sabendo que é vulgar, tem a coragem de afirmar o direito da vulgaridade e o impõe em toda parte”. O livro é datado para a Europa do período entre guerras, porém revela as preocupações de um importante intelectual quanto ao processo de inclusão das massas.

Logo depois do início do Plano Real, cerca de 1/3 dos trabalhadores tinha emprego formal e ao final de 2014, 2/3 estavam nessa situação. Esse expressivo processo de formalização representou um importante avanço civilizatório entre nós, maior segurança para muitos e mudança da relação com o Estado: muitos passaram a pagar mais tributos e ter direitos sociais. A “mordida” do imposto retido na fonte nos novos contracheques, segundo o instituto Data Popular (07/2013), explicaria parte das presenças nas manifestações de junho de 2013. A inflação também integrou as muitas explicações para aquele fenômeno complexo.

Expectativas atuais de mercado detectadas pelo Banco Central apontam para inflação acima de 8% neste ano e contração econômica da ordem de 1%. O eventual problema para a nossa democracia é que as pessoas se mostram dispostas a ir às ruas protestar “contra tudo e todos”. Nesse contexto, é razoável supor que as instituições serão capazes de absorver, filtrar e dar respostas satisfatórias às demandas sociais? Sempre é positivo conservar alguma dose de otimismo no Brasil. No entanto, há nuvens no horizonte.

De acordo com uma matéria da Folha de S.Paulo (8/4/2015), “a poupança, principal fonte de recursos para o financiamento imobiliário no país, perdeu em março depósitos pelo terceiro mês seguido. Neste ano, a poupança teve R$ 23,2 bilhões em saques, já descontados os depósitos”. A matéria diz ainda que “a perda de recursos da caderneta reflete também a retirada de dinheiro para o pagamento de dívidas, a dificuldade do brasileiro de poupar diante da alta do custo de vida e a busca por aplicações com maior retorno”. O cenário externo é também adverso em suas perspectivas, alerta o FMI (clique aqui). Não podemos esquecer da crise política instalada no Congresso.

Um artigo de junho de 2013 do escritor Luís Fernando Veríssimo é bem atual: “No Brasil tanta coisa está errada há tanto tempo que qualquer figura, atual ou histórica, serve como símbolo da nossa desarrumação intolerável, na falta de um De Gaulle. Renan Calheiros ou Pedro Álvares Cabral” (clique aqui). Veríssimo se perguntava o que viria a seguir e citou então uma frase de Marx: “se uma nação inteira pudesse sentir vergonha, seria como um leão preparando seu bote”. Para ele, restava saber para qual lado seria o bote do leão.

Rodrigo Medeiros é professor do Ifes (Instituto Federal do Espírito Santo)

Rodrigo Medeiros

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