Vivemos hoje a privatização dos direitos sociais, diz Chauí em aula na UFPR

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Filósofa é conhecida por seus estudos voltados a formação da sociedade brasileira e foi uma das fundadoras do PT. / Giorgia Prates

Socióloga é conhecida por seus estudos voltados a formação da sociedade brasileira e foi uma das fundadoras do PT. - Créditos: Giorgia Prates

do Brasil de Fato

“Vivemos hoje a privatização dos direitos sociais”, diz Chauí em aula na UFPR

O evento faz parte do Curso sobre o Golpe de 2016 organizado por diferentes setores da Universidade

Ana Carolina Caldas

Brasil de Fato | Curitiba (PR)

Num auditório lotado por diferentes gerações, a filósofa Marilena Chauí, uma das intelectuais mais respeitadas da América Latina, falou  sobre a formação da sociedade brasileira e as causas dos golpes de estado no Brasil. Para ela,  “cada vez que se tem um risco de uma mínima democratização, de divisão do poder da classe popular com a classe dominante, ela, a elite, imediatamente prepara o golpe.” A aula aconteceu na última segunda-feira (21),  no Anfiteatro do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná, em Curitiba.

Chauí afirmou que o país vem sendo ocupado por uma operação neoliberal com a destruição de direitos sociais. “Há um avanço da ideologia e prática neoliberais, que é o aumento do espaço para o privado e a diminuição da esfera pública. Sendo assim, existe uma ideia colocada na cabeça dos brasileiros, que direitos são concessões, são dádivas e, na verdade, são conquistas.”  E continua: “com o aumento da participação do privado, os direitos sociais estão sendo vendidos. Vivemos a privatização dos direitos sociais”.

A filósofa é conhecida por seus estudos voltados à formação da sociedade brasileira e foi uma das fundadoras do PT. Ela se apresentou no evento como  uma eterna defensora da democracia que ultrapasse o conceito de governo e que represente a sociedade. “Temos que falar em sociedade democrática. Esse conceito ultrapassa o regime político. Afinal, democracia pressupõe legitimidade de conflitos e soberania política pertence aos cidadãos. A democracia é atividade criadora dos cidadãos e aparece em sua essência quando existe igualdade, liberdade e participação.”

Resistência

Professora de Filosofia Política e de História da Filosofia Moderna na USP,  descreveu que historicamente a sociedade brasileira é constituída pelo pensamento do colonizado. “O pensamento de que uns mandam e outros obedecem é o que forma o povo brasileiro. Que é apresentado como um povo cordato, pacífico, trabalhador. Mal sabem os brasileiros o quanto de violência existe por trás disso. A opressão, a condição servil e o esquecimento de que o natural é ser livre.”  Para ela, “a principal função da Universidade é justamente mostrar, dar luz a este pensamento mostrando que a resistência é pela luta por ser livre.”

Eu acho que nossa geração, a geração que viveu o Golpe de 64, não merecia viver isso de novo

Chauí viveu os tempos de ditadura militar e foi uma das combativas intelectuais que, dentro da Universidade, refletiam sobre aquele golpe e denunciavam, escrevendo livros e dando aulas públicas. Ao final da sua fala, respondendo a perguntas da plateia, desabafou dizendo não achar que viveria tempos iguais ou até piores. “ Minha geração não merecia viver isso tudo de novo”, desabafou.  

Por fim, defendeu a resistência nas várias lutas que se colocam pela reconquista dos direitos sociais que estão sendo totalmente destruídos. “Direitos são o coração da democracia e, para mim, é nisso que devemos focar.”  Infelizmente, hoje ainda, “temos que explicar para a sociedade brasileira que um ser humano comer três vezes ao dia é direito mínimo.”

Edição: Laís Melo

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

1 Comentário

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  1. Vivemos a Imbecilização da Nação, Professora…
    Nassif, ver Marilena Chauí desabafar – “ Minha geração não merecia viver isso tudo de novo” – resume o sentimento de impotência que assalta todos os que ainda jovens fomos perseguidos, presos e torturados por sermos visceralmente contra um regime que roubava dos pobres para dar aos ricos os recursos essenciais ao combate à miséria e à promoção da igualdade social. Mais de meio século depois do golpe de 64, somos sexagenários, septuagenários e octogenários estarrecidos ao constatar que a UNE foi superada pelo MBL e que a atual juventude acredita, como enfatiza Chauí, que “direitos são concessões, são dádivas e, na verdade, são conquistas.” E que, “com o aumento da participação do privado, os direitos sociais estão sendo vendidos. Vivemos a privatização dos direitos”. E cadê a Universidade que deveria estar lutando pela liberdade ou pela democracia – essa (…) atividade criadora dos cidadãos que aparece em sua essência quando existe igualdade, liberdade e participação”? Resposta: juventude e universidade estão submissas aos ditames dessa conectividade via redes sociais e demais dispositivos da webb que aposentaram as bibliotecas, os jornais e o conhecimento como molas auxiliares propulsoras da vida em sociedade. Essa última, vida em sociedade, jaz reduzida ao conformismo diante do retrocesso de um país que despencou 20 anos em dois; que assiste impassível ao bloqueio das principais rodovias e consequente desabastecimento das feiras livres, Ceagesps, postos de combustíveis, transporte coletivo terrestre e aéreo; que contempla o ex-governador mineiro Azeredo, tucano comprovadamente corrupto, ser detido com toda honra no salão que abrigava o comando do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais enquanto o ex-presidente Lula é prisioneiro, sem nenhuma prova de que tenha praticado qualquer ilícito, numa solitária policial curitibana. Ameaçado de não poder concorrer à eleição presidencial de outubro próximo justamente por ser desde já o candidato que a Nação elegeria, Lula está sendo condenado por ter dedicado a vida à conquista de direitos para os metalúrgicos do ABC e para todos brasileiros, quando conseguiu melhorar a vida de 60 milhões de pessoas pobres ou remediadas, sem se descuidar dos outros 147 milhões de brasileiros e brasileiras. Pena que os 207 milhões de beneficiados enxerguem tais conquistas como dádivas e concessões imerecidas, ao permanecerem inertes quando o MPF, Judiciário e demais cúmplices do golpe de 2016 rasgam a Constituição Cidadã de 88 e jogam no lixo a honra e dignidade da primeira mulher a conquistar a Presidência da República que, como Marilena Chauí e demais membros da resistência civil que derrubou a ditadura militar, é tratada como bandida por juízes parciais, vendidos e entreguistas que formam a ditadura togada que nos subjuga a todos.

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