Ion de Andrade
Médico epidemiologista e professor universitário
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A vitória da Extrema Direita se limitou ao legislativo, seu alvo: o Centro, por Ion de Andrade

Somente o PSDB e o PP perderam, cada um, onze cadeiras, bancando quase integralmente com as suas perdas o crescimento do PL.

Sebrae

A vitória da Extrema Direita se limitou ao legislativo, seu alvo: o Centro

por Ion de Andrade

Apesar da decepção com a não eleição de Lula no primeiro turno, fato que nunca foi estatisticamente garantido, os ganhos da Extrema Direita, que nos pesaram logo após a publicação dos resultados, quando observados a uma melhor análise mostram que estão limitados ao legislativo e que, mesmo assim, apenas e tão somente enquanto substituição de vagas anteriormente ocupadas por alguns partidos do Centro e nem de todos.

Não se tratou, portanto, de uma vitória sobre a Centro-Esquerda, ou sobre Lula, mas unicamente contra a direita tradicional, a que chamaremos de Centro nesse artigo, que se materializou como O alvo prioritário da Extrema Direita.

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Vejamos o cenário como um todo:

  1. Dentre os governadores eleitos em primeiro turno, 15 totais, 12 foram reeleitos. A reeleição é um fenômeno em boa parte inercial que torna a análise da correlação de forças bastante dificultada. Porém, dentre os três governadores eleitos em primeiro turno cuja vitória não se deu por reeleição, dois foram do PT (Rafael Fonteles pelo Piaui e Elmano de Freitas pelo Ceará) e um foi do Solidariedade (Clécio Luis, pelo Amapá). Portanto, claramente, o PL não ampliou a sua influência nos executivos estaduais.
  2. No Senado, dos vinte e sete mandatos em disputa, sete partidos perderam cadeiras: O PP, duas; o MDB, três; o PSDB, duas; o Podemos, duas; o PROS, uma; o PTB, duas e a Rede uma, uma cadeira (sem partido) também foi substituída ,o que totalizou 14 substituições.
  3. Tais substituições ocorreram em benefício (a) do PT, duas; (b) do União Brasil, três; (c) do Republicanos, duas; e (d) do PL, sete. Isso significa que, excetuada a perda sofrida pela Rede, que pode ser classificada como uma perda para a centro-esquerda, (que foi compensada por duas cadeiras a mais para o PT), todas as demais foram perdas para o Centro. É um fenômeno interessante, pois o que vemos são ventos da Extrema Direita varrendo violentamente a direita tradicional. Vale salientar que o setor da direita que perdeu as eleições, o Centro, é composto por políticos que aprenderam, ao longo dos séculos e como ninguém, a arte de manter o Poder em suas mãos. Eles estão sendo conjunturalmente substituídos por políticos menos experientes e mais agressivos. É emblemática nesse cenário a eleição de Moro contra Álvaro Dias ou no Rio Grande do Norte a não eleição de Garibaldi Filho que cede lugar para o PL. Só o futuro dirá se esse fenômeno político terá vida longa ou vida curta.
  4. Na Câmara Federal deu-se o mesmo. A Centro-Esquerda ganhou um total de dezesseis cadeiras com (a) a federação formada pelo PT, PC do B e PV, que passou de 68 para 80 deputados e deputadas eleitos, totalizando doze cadeiras e (b) a federação formada pelo PSOL e Rede, que passou de dez para catorze cadeiras, totalizando quatro cadeiras a mais. Houve, entretanto, uma perda importante para esse campo que perdeu dez cadeiras devido aos maus resultados obtidos pelo PSB, que caiu de 24 eleitos para catorze. Já o PDT, provavelmente em decorrência da estratégia kamikaze de Ciro Gomes, perdeu duas cadeiras. O balanço positivo para a Centro-Esquerda é de quatro cadeiras a mais consolidando um pequeno avanço e não uma derrota.
  5. O crescimento do PL (23 cadeiras a mais) foi, portanto, bancado exclusivamente pelos demais partidos do Centro que tiveram perdas volumosas de eleitos. Somente o PSDB e o PP perderam, cada um, onze cadeiras, bancando quase integralmente com as suas perdas o crescimento do PL. As demais siglas do Centro amargaram perdas de 21 cadeiras que foram ocupadas pelo União Brasil, MDB e Podemos, esses últimos com crescimentos modestos.
  6. O cenário que emerge é (a) o de uma derrota do Centro, (b) de um crescimento da Extrema Direita limitado ao legislativo, num contexto em que a Centro-Esquerda teve também  um crescimento discreto e (c) o de um crescimento da Centro-Esquerda nos Executivos estaduais onde já consolidou dois estados a mais (o Ceará e o Piauí) e está disputando vários outros. Diversos partidos de Centro também disputam esses Executivos contra o PL e podem sair vitoriosos.
  7. No plano da disputa no tabuleiro principal, que é o da Presidência da República, síntese mais fiel da eleição como um todo, as forças democráticas (Centro + Centro-Esquerda) emergem vitoriosas na luta contra a Extrema-Direita com mais de 48% dos votos válidos dados a Lula que tem, também, boa capacidade de diálogo com candidatos que não passaram para o segundo turno.
  8. O Poder Judiciário por sua vez, atuou com imensa competência técnica na condução de uma eleição desenrolada no continente que é o Brasil, o que calou por completo a grita dos que pretendiam desacreditar, por interesses escusos, as urnas eletrônicas.  O desempenho foi tão extraordinário que tudo parecia “normal” como se toda aquela obra e esforço, não tivesse tido que ser defendida com coragem dos interesses anti-pátria  que visaram, repetidamente e ao longo dos últimos anos, fazer terra arrasada de um processo eleitoral que é motivo de orgulho para o Brasil.
  9. O ordenamento inatacável das eleições emerge também, como mais uma derrota acachapante para a Extrema-Direita.

O Centro deve entender que, se com a Centro-Esquerda há um confronto, que pode e deve, o quanto mais melhor, ser balizado pelo regramento do Estado de direito. Com a Extrema-Direita há para ele uma doença letal que se for deixada com a corda solta não deixará sobrar dele pedra sobre pedra.

Consolidada a vitória de Lula a estratégia parlamentar do grande bloco democrático que se desenha deverá ser o isolamento da Extrema Direita (os antagônicos) e, simultaneamente, o aprofundamento do Estado de direito e o regramento das bases de diálogo entre os divergentes com base no consenso.

Ion de Andrade é médico epidemiologista e professor e pesquisador da Escolas de Saúde Pública do RN, é membro da coordenação nacional do Br Cidades e da executiva nacional da Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela democracia

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected].

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