Jean Wyllys: “Jaques Wagner fez um governo carlista”

Há tempos a imagem do vencedor do Big Brother Brasil 2005, o baiano Jean Wyllys (PSOL-RJ), se dissolveu dando espaço para um dos deputados federais mais atuantes da atual legislatura. Em entrevista ao A TARDE, ele analisa as manifestações pelas ruas do País e atira contra muitos, incluindo o governador Jaques Wagner e o deputado estadual Sgto. Isidório (PSB).

Regina Bochicchio – Você julga representar os manifestantes?

Jean Wyllys – Eu represento parte dessas pessoas que estão nas ruas. Representação não é uma coisa fácil, direta, dada. Representação é uma coisa difícil. E dinâmica, permanentemente sendo revista. Eu represento as pessoas que foram as ruas com uma pauta direta de reivindicação. As pessoas que defendem, por exemplo, um objetivo concreto, como o que aconteceu inicialmente em São Paulo e Rio, a questão das tarifas de transporte urbano e os gastos com a Copa do Mundo. Mas a manifestação foi se estendendo, as repressões policias foram crescendo e incorporando outra pauta, a questão da moralidade pública, ou seja, um uso adequado, republicano dos recursos públicos. Isso também tem a ver comigo. Mas aí quando foram crescendo ainda mais, se tornando espetáculo na televisão, elas começaram a atrair segmentos assustadores, dos fascistas.

Regina Bochicchio – Mas evidencia uma insatisfação geral, não é?

Jean Wyllys – Isso é fato. Mas evidencia mais do que isso,  evidencia um povo que sempre se colocou à parte de  uma participação política mais ativa, de acompanhar  os mandatos, de ter participação política. E uma vez  convocada, não sabe como é participação política, não  saber fazer. E aí o que aconteceu? Os equívocos. Um,  primeiro os fascistas foram para as ruas. Por  exemplo, eu publiquei um manifestante que  segurava um cartaz dizendo ‘Não à corrupção,  intervenção militar já! Impechment de Dilma já!.  Isso é uma defesa do golpe! Como ele tinha outras  pessoas fazendo isso. A inabilidade, a falta de  hábito da grande maioria de lidar com a participação  política se expressou muito no antipartidarismo. Numa  manifestação política, sem centro e sem líderes,  impedir a participação dos partidos é totalitarismo.  Na medida em que são antidemocráticos as manifestações também atraíram esses setores antidemocráticos, de colorido fascista, de uma  direita que não admite de hipótese alguma um governo  dos trabalhadores – com todos os problemas que tem.

Regina Bochicchio – As falas de algumas pessoas denunciam um certo descompasso sobre como agir de forma direta na sociedade, para além das ruas…

Jean Wyllys – Nós somos uma democracia jovem ainda. Os governos Lula fizeram alguma coisa que é inegável é que houve  que é fato inegável, um mérito, houve de fato  redução da pobreza durante o governo de Lula. E  emergiu uma nova classe média que é a classe C. Ela teve acesso às redes  sociais… mas ela já vem sendo alijada há muito  tempo do direito à Educação de qualidade. Ausência de educação para a cidadania,  impediu que as pessoas participassem da política, no  sentido assim, da fiscalização sobre o poder, impediu  que elas fizessem a democracia participativa. A  democracia é representativa e participativa. Agora,  como estamos num a democracia jovem, chegou a hora  dessas pessoas fazerem a democracia participativa. Essas manifestações foram o primeiro  momento dessa democracia participativa. Eu acredito  que com a experiência negativa as pessoas vão  aprender, na próxima, elas terão objetivos mais  claros, coisas mais concretas. Mas essa colcha de retalhos não funciona. A única que foi apresentada  concretamente foi a do MPL e essa foi atendida. Com essas experiências dos fascistas, dos vândalos, elas vão ver  que democracia participativa não é só ocupar as ruas  sem um objetivo concreto – uma democracia são suas  instituições democráticas. Acho que foi bonito, foi  um primeiro movimento. E eu vou ser nesse momento  positivista: sem ordem não há progresso. O caótico é bacana para o espetáculo, para a  pauta da TV. Eu defendo, por exemplo, que o partido esteja lá, é  um direito dele. Quando você perguntava  para um desses meninos nas ruas, diziam: “A gente é  contra tudo isso que tá aí”. Mas eu perguntava: mas  contra tudo isso que taí o que? Não sabiam dizer. A  gente é contra partidos. Sim, mas você quer colocar  o que no lugar dos partidos? O que eu  percebo é que essa juventude foi pra rua sem alfabetização politicamente, foi  só com a vontade e isso é bom.  Eles pediam por exemplo explicação  pelos gastos da Copa. É tarde, deveria ter sido  discutido antes, E quem estava discutindo eram os  partidos de esquerda. Houve discussões, capitaneadas  por partidos. Não me venham  agora dizer que os partidos tem de estar fora porque  quem estava discutindo isso enquanto o gigante  dormia eram os partidos.

Regina Bochicchio – Como isso respinga no Congresso e em 2014?

Jean Wyllys – Isso já respingou lá no Congresso. Após a grande  manifestação de segunda-feira, tivemos uma reunião grande do colégio de líderes. Ivan Valente que é líder  do PSOL não estava então eu como vice-líder fui. Antes de a agente abrir a reunião nós estávamos conversando entre nós e eu vi que a grande  maioria dos deputados não entende o que está  acontecendo mesmo. Por que? Porque a maioria dos  deputados é alheia… alheia aos novos tempos. É  alheia ao fato de que essa juventude está em rede, que  ela está articulada em rede. Os deputados não  perceberam essa mutação, não estão nas redes sociais,  não dialoga no twitter com essa gente, não sabe o que  está atravessando o corpo social, portanto, foram  pegos de surpresa. Eu fui o primeiro a falar e eu  disse: a gente precisa dar uma resposta. E a resposta  que as pessoas querem é que a pauta legislativa  reflita os seus interesses. São interesses difusos e  há pautas que não tem consenso. Mas é possível  identificar o que é de consenso. E o que é de  consenso tem de estar nessa pauta. Por exemplo:  educação é um consenso. A nossa pauta poderia esboçar  esse consenso votando os 10% dos royalties do pré-sal.  Isso é função do Legislativo. Nós poderíamos  atender à essa reivindicação colocando em prática o  PNE – Plano de Educação e Metas, que passou pela  Câmara dos Deputados e parou no Senado – Renan Calheiros não põe na  pauta. Havia consenso em relação à segurança também.  Então, a gente podia votar a  PEC 300. E no bojo dessa votação discutiríamos que  polícia nós queremos. Uma  polícia que não faça como a polícia da Bahia na  quinta-feira. A polícia da Bahia foi uma das mais truculentas em todas as manifestações, a que mais  reprimiu durante os manifestantes.

Regina Bochicchio – Como você avalia a resposta  que governador Jaques Wagner deu ?

Jean Wyllys – Jaques Wagner quando se elegeu, em campanha,  apresentou o contracheque de um policial e dizia que  na Bahia os policiais eram desvalorizados e ganhavam  muito mal e que a má remuneração levava a problemas  como a corrupção policial, da constituição de milícias  e grupos de extermínio e parte da população negra na  periferia. (pausa). Nos dois mandatos a polícia baiana  quase que duplicou a quantidade de assassinatos (nova  pausa). Isso significa que Jaques Wagner não cumpriu  a promessa dele, não foi por acaso que houve uma  greve das polícias durante o governo dele. Logo, um  governador que traiu sua promessa de campanha e cuja  polícia continua matando a população negra, não  seria sensível a manifestantes de rua e, numa nota  oficial não falaria da violência da polícia. Outra coisa: a Copa das Confederações acontece sem que o  metrô esteja funcionando. Porque cargas d’água não se fez uma CPI na  Assembleia Legislativa ou na Câmara para apurar o  escândalo do metrô? Porque vai respingar lama – e eu  digo sem medo de ser feliz – vai respingar lama sobre  todos os grupos políticos que se enfrentam aqui.

Regina Bochicchio – Você sabe que aqui na Bahia o  governador está em sintonia com o prefeito?

Jean Wyllys – Não me espanta que o governador Jaques Wagner esteja  em sintonia com o prefeito ACM Neto (DEM). Não me  espanta de forma alguma. Jaques Wagner fez um governo  carlista. Embora tenha sido eleito com a promessa de  que enterraria o carlismo. Mas embora tenha prometido isso, fez um governo  carlista, mais do que os próprios carlistas. Não só  incorporando pessoas no seu governo mas se  comportando, muitas vezes, de maneira autoritária e  arrogante, tal qual o antigo cabeça branca. E olha que Jaques Wagner sequer aproveitou o que havia de  bom no carlismo – sim, porque havia uma coisa de bom  no carlismo. O carlismo, com toda a política  paternalista que ele invocava tinha uma coisa bacana  que se incorporava nas letras ACM – Arte, Cultura e  Memória. O carlismo investia no orgulho de si,  orgulho de ser baiano. esse orgulho de si, por mais  que pareça uma coisa idiota num primeiro momento, ele  tem uma coisa boa, gostar de seu lugar, cuidar do seu  lugar. E esse gostar e cuidar implica uma abertura  para o outro: mostrar para o outro a minha Bahia. E  isso não é uma bobagem, tem implicações políticas e  econômicas. Abrir a minha Bahia e mostrar como a  minha Bahia é cuidada traz divisas, recursos para a  Bahia. Mas também não gostaria  que Jaques Wagner não agisse de maneira republicana  com ACM Neto, devolvendo à ACM Neto aquilo que o avô  dele fez com Lídice da Matta (PSB).

Regina Bochicchio – Por que se blinda a base do governo que deu a Comissão ao PSC de Marco Feliciano?

Jean Wyllys – As pessoas escolherão Feliciano porque ele é um  símbolo, ele encarna o fundamentalismo. Ele é vaidoso, narcisista,  gosta de estar em frente aos holofotes. Mas as pessoas que fazem a crítica mais  embasada não perdem de vista que Marco Felciano é da  base do governo e que ele chegou à presidência  graças a maioria da comissão de direitos humanos que  é fundamentalista, pessoas do naipe do  deputado Sargento Isidório…

Regina Bochicchio – Que está aguardando aprovação do projeto  para criar os dele aqui, como o “consola  corno”, ajuda aos homens traídos…

Jean Wyllys – Eu só não acho tão surreal que a Assembleia  Legislativa da Bahia tenha alguém do naipe do pastor  Isidório porque na Assembleia do Rio de Janeiro tem  gente muito pior. E porque na própria Câmara dos  Deputados existe Bolsonaro e Marco Feliciano. Porque  se não existissem esses dois em Brasília eu diria que  a presença de Isidório na Assembleia é uma aberração  inadmissível.

Regina Bochicchio – E ele nem é de partido  evangélico, é do PSB…

Jean Wyllys – Pois é. A deputada Luiza  Erundina, que também é do PSB  chegou par mim outro dia e disse: meu filho, eu fico  envergonhada, depois de tudo o que passei e  enfrentei, eu fico envergonhada de no meu partido  haver uma pessoa daquela.

Regina Bochicchio – Eleições 2014. Você é candidato à reeleição?

Jean Wyllys – Sim, sou, pelo Rio de Janeiro. Eu pensei inicialmente  em não me candidataria porque há um custo emocional  muito grande. O mandato federal me  expõe demais. As  pessoas que moram no Caminho das Árvores e na  invasão do Pela-Porco,  têm  direitos humanos.  E quando você advoga o direito  dessa população pobre, negra, as pessoas acham que  ela não tem direitos humanos. E então elas olham os  direitos humanos como se fosse coisa de bandido. É uma estupidez pensar assim.  Tocar nesses temas não é fácil. Tem um  desgaste que vai do insulto à ameaça de morte. Foi tanto desgaste que já passei, tanto que eu pensei: não vou segurar essa onda mais  uma vez. Mas ao mesmo tempo eu  tenho responsabilidade com a representação que eu  tenho hoje no Brasil. Eu não fui eleito em 2012 o  melhor deputado do Brasil pelo Congresso em Foco por  acaso.

Fonte: http://atarde.uol.com.br/politica/materias/1512952-jean-wyllys-jaques-wagner-nao-cumpriu-a-promessa-dele

Redação

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