China passa por correção de rumo inevitável, dizem especialistas

Jornal GGN – Estabilidade é a palavra de ordem na China, desde o anúncio das reformas econômicas e sociais no país, na semana passada. Desde então, analistas têm traçado diferentes cenários para essa “nova era flexível” no país, com o fortalecimento do mercado doméstico, menos sensibilidade às flutuações externas, menor custo de produção e o início da integração entre setor privado e economias estrangeiras ao fortíssimo serviço público.
 
Mas o que será que o futuro reserva para o país? O primeiro-ministro chinês, Li Keqiang, já anunciou que a meta de crescimento de 7,5% para o PIB (Produto Interno Bruto) em 2013 com controle da inflação está “bem dentro do alcance”. Mas e o chamado “longo prazo” chinês, o que efetivamente acrescentará à população e aos outros países?
 
O ímpeto de crescimento está naturalmente desacelerado, mas é perfeitamente aceitável após um “crescendo” de aproximadamente 30 anos, afirma José Roberto de Araújo Cunha Jr, especialista em economia internacional do Proceb (Programa de Comércio Exterior Brasileiro) da FIA (Fundação Instituto de Administração) e presidente do Sindicato dos Economistas do Estado de São Paulo.
 
 
Longo prazo
 
Para ele, esse processo longo e eficaz é uma herança quase cultural dos asiáticos. “Normalmente, nos preocupamos com o imediatismo dos resultados. Temos que lembrar que a China não toma decisões de curto prazo, exceto em emergências, como terremotos. A cultura oriental, que também se reflete na economia, é de longo prazo. Diferentemente de nós, que olhamos para uma distância de quatro anos, eles olham 15, 20 anos. Seguem o modelo coreano, que por sua vez, seguiu o modelo japonês no pós-guerra”, diz ele relembrando a trajetória de potências conhecidas hoje como tigre e dragão asiáticos. “Eles acreditam que o curto prazo já está dado, é o hoje. Em 2014, não crescerá a 20%, mas também não terá uma ruptura. Para o tamanho da economia chinesa, em termos de PIB, população e território, as decisões não produzem efeitos imediatos”.
O caminho é mesmo o da consolidação – o que é excelente também para o Brasil. A aposta é de Celina Ramalho, professora de economia da Escola de Administração FGV (Fundação Getúlio Vargas). Para ela, o objetivo é que as reformas se mantenham e intensifiquem a competitividade do país, o que deve também abrir os caminhos e possibilidades de negócios com a China. “Com reformas estruturais significativas, a longo prazo, o futuro se encaminha para a aceleração dos negócios, havendo portanto influência nas relações de comércio e finanças, entre Brasil e China. Eles não são autossuficientes em commodities, e é aí que nós entramos na pauta”, afirma. Números recentes apontam para esta possibilidade: as importações de soja, um dos produtos mais exportados pelo Brasil para o país, cresceram 3,9% em outubro, na comparação com 2012. Os dados são da própria Administração Geral Alfandegária chinesa.
 
Para os analistas, tais reformas eram inevitáveis já que, para crescer, o país precisa tomar decisões de correção de rumo de sua política econômica. Desta vez, após plenária de quatro dias, os líderes do Partido Comunista da China divulgaram um plano econômico em que se comprometem a deixar os mercados desempenharem um papel fundamental na alocação de recursos, o que significa que a oferta e a demanda determinarão os preços de recursos como o petróleo bruto, gás natural, eletricidade e água.
 
“Inevitável que a China viesse a adotar, e têm feito periodicamente, algumas decisões de correção de rumo de política econômica, como maior liberalidade no setor financeiro. À época da crise, alguns países como os Brics se saíram muito bem em relação aos demais por uma efetiva supervisão do setor financeiro pelos bancos centrais e governo. Permitem participação do setor privado e também estrangeiro, o que é a parte mais importante”, explica Araújo.
Impactos

Já os impactos de tais medidas só serão sentidos nos próximos 30 anos, calcula. “Estão preocupados com este desequilíbrio, essa disparidade econômica no país, e, por isso, também interiorizaram o desenvolvimento para as zonas central, norte e oeste, onde vão promover modernização, geração de empregos, infraestrutura, etc. Isso terá um impacto brutal, já que mais de 50% da população está concentrada nessa área – é quase uma nova China surgindo”, conta Araújo, com o conhecimento de quem já morou no país.

 
Esse impacto social também será sentido na questão dos filhos por família, sob controle do governo, embora nem tanto economicamente, garante Celina, da FGV. “A China está num patamar suficiente pra integrar mais gente à sua sociedade. Familias registrarem o segundo filho com o mesmo nome do primeiro pra ter os benefícios sociais causava um desacordo entre o tamanho real da população e dos registros. Está na hora de regulamentar essa situação”, diz. Mesmo assumindo que as mulheres chinesas estão hoje dispostas a ter dois filhos, duas entre cada dez mães teriam que ter três rebentos cada uma, apenas para manter o nível populacional até a metade deste século, de acordo com uma análise de dados da ONU (Organização das Nações Unidas).
 
Além do fortalecimento do mercado doméstico, sem viés exportador, os analistas esperam um aprimoramento do setor industrial, com um custo de produção menor, operando com escala ainda maior. O premiê, que é responsável pela administração diária de questões de política econômica, também disse que o governo está determinado a deixar que os mercados desempenhem um papel “decisivo” na alocação de recursos, usando uma linguagem que reflete as decisões tomadas em uma reunião do Partido Comunista na última semana.
 
Redação

1 Comentário

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  1. Sobre a China

    A China possui muitas características que a diferenciam completamente do Brasil nessa área:

    – Não existe a possibilidade de perder as próximas eleições e mudarem toda a política, então fica fácil planejar para 20 ou 30 anos.

    – O tamanho da população os obriga a planejar o longo prazo e evitar guinadas abruptas, pois com mais de um bilhão de habitantes, cometer um pequeno erro de avaliação pode matar milhões de fome. Então é natural que planejem com cuidado, e antecipadamente.

    – Como orientais, eles não possuem o nosso individualismo, então para eles abrirem mão de ganhos pessoais em prol da sociedade é uma coisa natural, e trabalhar muito hoje para garantir o futuro dos filhos e netos é uma honra, e não um peso.

    – Outra vantagem estratégica é não ter oposição. O governo define como vai ser feito e se não obedecer…Não estou fazendo juizo de valor disso, somente enumerando as características.

    O Brasil agora precisa incrementar suas relações, e firmar acordos de longo prazo que sejam vantajosos para ambos, como o feito agora no leilão de Libra.

    Vai ser interessante (e perigoso) ver a esfera de poder no mundo mudar do hemisfério norte para o sul.

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