O investimento na pesquisa e produção de vacinas

Da Folha

Vacinas: autossuficiência e inovação

Isais Raw

O ministério prioriza institutos que só envasam importados. Autossuficiência não é montar uma “indústria” comprando a granel ou importando tecnologia

A gripe aviária surgida no Vietnã relevou a vulnerabilidade dos países não produtores de vacinas. A solução foi matar todas as aves que alimentavam os vietnamitas. No Brasil, um dos principiais produtores de frangos e ovos, além da falta de carne, isso destruiria uma importante fonte de empregos e divisas.

Foi o Instituto Butantan que teve a iniciativa de produzir 20 mil doses para eventual uso. Além disso, investimos numa fábrica destinada a produzir 20 milhões da vacinas de influenza para maiores de 60 anos, casos em que a gripe abre a porta para pneumonia.

Autossuficiência não é montar uma “indústria” comprando a granel ou importando tecnologia, algo que torna o pais dependente.

O Butantan, com investimento do BNDES, garantirá já em 2013 e em 2014 uma vacina tetravalente de dengue, com custo de cerca de R$ 1. Fará também uma vacina pentavalente de rotavírus, que protege contra todas as cepas existentes no país. Desenvolvemos uma nova vacina contra coqueluche, mais segura e eficaz, com o mesmo custo da clássica.

Não ficaremos refém de um cartel que vendeu aos países não produtores a vacina da gripe AH1 por dez vezes mais do que as outras cepas!

Desenvolvemos um adjuvante, subproduto da vacina de coqueluche, que permite usar quatro a sete vezes menos vacina de influenza. Depois de formular mais de 200 milhões de doses tríplice da vacina de influenza, eficaz e segura, usado em todo o país, produzimos em 2012 cerca de 15 milhões, que a Anvisa por razões técnicas não liberou!

O adjuvante demonstrou ser eficaz para a vacina canina para leishmaniose. Está em ensaios a vacina de hepatite B, para quem aguarda transplante de fígado e rim. Desenvolver, para o Butantan, representa economizar recursos federais, não obter lucros!

Entre 1984 e 2009, fornecemos 800 milhões de doses de vacinas, que o ministério pagou do jeito que queria e quanto pode. Produzimos 90% das vacinas (difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e raiva) e uma dúzia de soros. Solucionando exigências que crescem continuadamente, deixaremos de importar a influenza a granel em 2012.

Vamos produzir o surfactante pulmonar, salvando mais de 50 mil bebês por ano. Em 2014, teremos a mais moderna planta de processamento de plasma humano em existência. Nossas inovações estão descritas em uma centena de artigos nas mais importantes revistas internacionais.

O ministério tem priorizado institutos que são envasadores de produtos importados, usando o pretexto que receberão transferência de tecnologia, algo que não resultará em produção, inovação e empregos na próxima década.

Ao ano, gastam centenas de milhões com produtos a granel que rotulam como fabricado no Brasil, destruindo a politica de autossuficiência, desenvolvimento e inovação tecnológica na área de saúde.

A menos que o governo federal reveja a sua politica, chegaremos em 2015 sem uma indústria que seja capaz de produzir de verdade -e muito menos desenvolver. Obviamente, somos uma ameaça para os cartéis e continuaremos a ser vistos como inimigos -não só dos cartéis, aliás, mas também dos outros produtores públicos que não inovam.

ISAIAS RAW, 85, foi diretor do Instituto Butantan e presidente da Fundação Butantan

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. [email protected]

Luis Nassif

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