Saúde escolar para o desenvolvimento nacional

            Em 2007 foi instituído o Programa Saúde na Escola, concebido para integrar várias ações dos Ministérios da Educação e da Saúde em benefício de 50 milhões de alunos das escolas públicas brasileiras. Implementado no ano seguinte, teve por meta atender pelo menos a metade dessa população estudantil já no primeiro triênio. Avaliação auditiva e visual, consultas odontológicas, verificação do cumprimento do calendário vacinal, estímulo às atividades físicas e à alimentação saudável, inclusão dos estudantes com necessidades educacionais ou de saúde especiais, avaliação psicossocial e prevenção do tabagismo, alcoolismo e de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) são apenas algumas das suas inúmeras propostas.

            O Programa é norteado pelos princípios da cultura de paz, da promoção da saúde, do envolvimento da comunidade e do respeito à cidadania e aos direitos humanos; é muito bem planejado e imprescindível ao desenvolvimento do nosso país. Porém, na prática a teoria ainda é outra.

            A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) foi feita pelo IBGE em 2009 com 62.910 alunos do 9º ano do ensino fundamental (antiga 8ª série) de escolas públicas (79,2%) e privadas (20,8%) das capitais e do Distrito Federal. A maioria dos estudantes entrevistados tinha entre 13 e 15 anos de idade. Nesse levantamento constatou-se que:

  • mais da metade dos alunos consumia guloseimas quase todos os dias;
  • um terço das meninas fazia dieta para emagrecer;
  • 25% já haviam sido vítimas de chacota (bullying) na escola;
  • 12,9% tinham se envolvido em briga que resultou em agressão física nos 30 dias anteriores à entrevista;
  • 87% tinham sido orientados quanto à prevenção da AIDS e outras DSTs e 30,5% eram sexualmente ativos. Destes, 24,1% afirmaram ter tido relação sem preservativo na semana anterior à entrevista;
  • 22,1% já haviam se embriagado alguma vez e
  • 79,5% deles passavam mais de duas horas diárias assistindo à TV.

A PeNSE registrou que apenas 42,8% dos adolescentes de escolas públicas praticavam atividade física regularmente. Isso vem de encontro a dados de estudo anterior com 7.507 escolares de sete a 10 anos de idade de todas as regiões brasileiras*, mostrando que 96% não atingiram nível satisfatório de aptidão física (flexibilidade, força muscular e capacidade cardiorrespiratória).

Esses números evidenciam como ainda são frequentes diversas condições desfavoráveis ao crescimento e desenvolvimento dos nossos escolares, tanto dos estabelecimentos de ensino públicos quanto particulares: alimentação inadequada, situações de violência, risco de contágio por DSTs, abuso do álcool e hábito sedentário.

As estatísticas não contemplam alguns problemas que comumente afetam a saúde de muitas crianças e adolescentes. Um deles é a dificuldade respiratória durante o sono, geralmente por aumento do tamanho das amígdalas ou da adenoide, resultando em sono agitado, apneia, dificuldade de concentração nas atividades diárias e o consequente prejuízo no aprendizado. A espera por cirurgia para retirada das amígdalas ou da adenoide através do Sistema Único de Saúde (SUS) em muitos municípios chega a dois anos, impondo transtorno e angústia prolongados à criança e aos seus pais. Além disso, a ampliação da oferta da triagem auditiva aos recém-nascidos (“teste da orelhinha”), não se acompanhou da avaliação auditiva rotineira nas crianças matriculadas no ensino fundamental. Muitos alunos têm dificuldade de aprendizado não por indisciplina ou falta de inteligência, mas porque não ouvem. Frequentemente, basta o médico remover o excesso de cerume dos ouvidos da criança para solucionar o problema auditivo. Mas quantos municípios dispõem de especialista que atenda de forma regular os estudantes da rede pública?

É lógico que a implantação de uma iniciativa tão abrangente quanto o Programa Saúde na Escola envolve as complexas e delicadas questões do financiamento da saúde e educação, das diretrizes pedagógicas, da capacitação dos profissionais de saúde e educadores, da conscientização e participação efetiva dos alunos e pais e do empenho dos gestores do SUS em cada município. Não se esperam resultados imediatos mas, assim como há o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), é desejável acelerar também a melhora da saúde dos nossos estudantes, para que as escolas brasileiras do século XXI sejam, de fato, motores do desenvolvimento nacional. Quem precisa aprender tem pressa.

 

 

* Pelegrini A, Silva, DAS, Petroski EL, Glaner MF. Aptidão Física Relacionada à Saúde de Escolares Brasileiros: Dados do Projeto Esporte Brasil. Rev Bras Med Esporte 2011; 17: 92-6.

 

Para quem quiser ler mais:

 

Secretaria da Educação do RS. Material para capacitação de educadores em temas de saúde. Disponível em:

http://www.educacao.rs.gov.br/pse/html/saude_escolar.jsp?ACAO=acao4

 

Políticas públicas de combate ao bullying

http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/as-politicas-publicas-para-o-bullying

 

A escola e a obesidade infantil

http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-obesidade-infantil-e-o-papel-da-escola

 

Programa Nacional de Saúde Escolar de Portugal.

http://www.min-saude.pt/portal/conteudos/informacoes+uteis/saude+escolar/saudeescolar.htm

Luis Nassif

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