Filha de médico relata experiência no interior

Comentário ao post “MP do programa Mais Médicos trouxe muita coisa à tona

Vou dar meu depoimento.

Sou filha de médico. Meu pai saiu de SP e foi clinicar no interior. Já passei pelo interior do Paraná, interior de SP e interior de SC.

Em algumas dessas cidades não havia cinema, bons restaurantes, e não havia nem escola particular. Estudei em escola pública alguns anos; em outras ocasiões eu estudei em outra cidade, ia e voltava de ônibus todos os dias.

Do ponto de vista dos médicos, há sim problemas em clinicar na saúde pública no interior. Na minha visão o principal deles é a falta de compromisso dos prefeitos da ocasião com a saúde. Muda-se o prefeito, muda-se toda a política municipal de saúde (e às vezes os médicos; por isso mudamos tanto de lugar…).

Falta estrutura de laboratórios e exames sofisticados. Mas, segundo meu pai, esse não é o principal problema (e nem se pode esperar que haverá em algum tempo a possibilidade de ter centros de referência em todos os municípios do Brasil); mas passa a ser um grande problema se a formação dos novos médicos os habitua a só clinicar mediante exames complexos. Ou seja, não são capazes de realizar a medicina com uma estrutura básica (que tem que haver, claro). Disso meu pai se queixa bastante – os colegas mais novos não conseguem clinicar sem os exames.

Agora, o meu ponto principal – já que não sou médica, apenas ouço o que meu pai diz – é o seguinte: morar para Conceição do Deusmelivre não é o fim do mundo. Vejo posts aqui que dizem “imaginem, sair de um grande centro, morar onde não tem cinema, restaurante…” como se isso fosse o maior absurdo. Absurdo para mim é fazer um comentário desse tipo. A primeira vez que fomos para o interior, havíamos saído de SP. Nem eu nem minha família morremos por causa disso! Ao contrário. Sempre avaliei que essa experiência pela qual passamos foi muito rica. Não somos as típicas “filhas de médico”; aliás, sempre achávamos graça desse rótulo. Convivemos com pessoas das mais diversas classes sociais, sem o menor problema. Aprendemos as diferentes realidades do interior do Brasil. Conhecemos muita gente diferente. Sempre tivemos acesso a cultura, pois isso sempre foi uma preocupação dos meus pais e mesmo se na cidade não houvesse cinema, em nossa casa nunca faltaram muitos livros…

Acho que a questão sobre a ida para o interior (feitas as ressalvas acima) também é saber quem está a fim de aprender com novas experiências e quem quer ficar na sua zona de conforto.

Luis Nassif

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