Para André Singer, Brasil ainda deve politizar casos brutais como linchamentos

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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rasil?

Por André Singer, na Folha

O que está acontecendo no Brasil? Cabeças cortadas em presídios, mulheres arrastadas até a morte, linchamentos malucos que viram parte do cotidiano. É certo que o país sempre foi muito violento por baixo da capa cordial, terna e alegre – verdadeira, mas parcial–, usada para construir uma ideologia adequada aos trópicos. Só que agora a brutalidade parece exacerbada.

O que torna estranho o aumento do brutalismo, como o denominou o jornalista Janio de Freitas em coluna recente, é que houve, na última década, uma evidente, ainda que moderada, melhoria das condições sociais. As famílias mais pobres passaram a receber um auxílio que, embora pequeno, aliviou a miséria e abriu janelas de esperança para os seus filhos. Os jovens tiveram acesso a empregos com carteira assinada, ainda que de baixa remuneração e em condições precárias.

Os salários subiram, a começar do mínimo, que teve uma valorização da ordem de 70%. Mesmo depois de três anos de baixo crescimento do PIB, as categorias organizadas continuam a conseguir aumentos reais. Nos primeiro trimestre de 2014, de 140 convenções coletivas realizadas, 97% registraram concessão de ganhos acima da inflação (ver dados em bit.ly/agsind). São ganhos pequenos, com apenas 33% desses dissídios representando elevação real maior do que 2%, mas ganhos, enfim.

Pode-se argumentar que tais avanços significam pouco em face do tamanho da pobreza e da desigualdade brasileiras, o que não deixa, também, de ser verdade. Porém deve-se considerar que tendo conseguido mantê-los ao longo de toda uma década, os efeitos são cumulativos. A esta altura já existe toda uma geração formada em ambiente menos excludente.

Por que, então, os traços de barbárie social, nos quais é possível enxergar a perversidade específica que a escravidão legou, não vão sendo atenuados? É como se em um contexto de lento desafogo, as relações fossem tomadas por uma onda barbarizante, quando se esperava um progresso civilizatório, mesmo que incremental.

Com sinceridade, não sei responder à pergunta. Percebo que, no fundo, ela sequer está bem formulada, pois o que estou chamando aqui de brutalismo deve encobrir fenômenos muito diferentes entre si.

Estou convicto de apenas uma coisa: é preciso politizar o problema. Os candidatos e os partidos precisam por a questão da violência em suas agendas. O Estado deve desenhar novas políticas públicas a respeito. As instituições e organizações da sociedade que estiverem do lado da civilização precisam refletir a atuar sobre o assunto.

O pior que pode acontecer é deixarmos a brutalidade se naturalizar, enquanto cada um se esconde em casa, tentando fingir que o mundo lá fora não existe.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

15 Comentários

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  1. A submissão pela força da

    A submissão pela força da época da invasão portuguesa, o espancamento e a justiça pelas próprias dos tempos da escravidão, a tortura e perseguição de grupos paramilitares oficiais da ditadura, as nossas polícias e suas militarizações, denota que o Brasil sempre viveu entre “bons e maus”, daí para justiça pelas próprias mãos é um pulo.

    Fruto da  divisão entre “casa grande e senzala” onde os da casa grande sempre foram detentores de poder e os da senzala sendo empurrados, com a imagem divulgada de imorais, preguiçosos e muitas vezes bandidos, para a marginalidade real ou imaginária.

    “Sabe com quem está falando” parece ainda ter resultados na nossa sociedade.

  2. sheherazade&joaquim barbosa… incitadores do ódio e violência!

    Sem dúvida.

    Qual a parcela de responsabilidade tem joaquim barbosa, sheherazade e outros bucéfalos que infestam o PiG com sua pregação do ódio nestes episódios de pura barbárie?

    Um presidente do stf que bate em mulher, ameaça idosos, rosna contra quem diverge e abusa do poder para causar sofrimento em adversários é que tipo de exemplo para o Brasil?

    Já esta sheherazade e o sem número de “jornalistas” que defendem bandido bom é bandido morto no PiG? Qual a mensagem que estes pitbulls tem para nossa nação?

    A barbárie é incentivada e atiçada por estes repugnantes e vulgares personagens.

    1. Embora o comportamento dessas

      Embora o comportamento dessas pessoas que você citou seja deveras repugnante, vejo ele muito mais como o sintoma de uma sociedade violenta do que a causa da violência.

      Infelizmente a gloriosa tradição da justiça pelas próprias mãos e dos linchamentos é muito anterior a esses personagens.

      1. joaquim barbosa e sheherazade são incitadores da violência.

        Sim, a violência pelas próprias mãos, não é novidade. Mas não tenho dúvida que joaquim barbosa e sheherazade incitam a violência. 

        1. Incitar não seria o maior

          Incitar não seria o maior problema, embora já fosse grande. A questão, a meu ver, no caso de JB, é ser enaltecido, exatamente, pelo fato de incitar a violência. Seu comportamento, ao invés de ser criticado é aclamado como salvador, justamente por ser um bárbaro. aí complica… Não, eles não são produtos da de uma sociedade violenta são marketeiros da violência. ( ou de mais violência ).

  3. Eu vejo certa semelhança com

    Eu vejo certa semelhança com o que ocorria nos EUA do pós guerra. Com o aumento da renda nos EUA do pós-guerra, houve um processo semelhante de judicialização da política por meio do McCarthismo, estilo político de caça às bruxas idêntico ao procedimento da direita brasileira.

  4. Ah, a “elite” brasileira. Sem

    Ah, a “elite” brasileira. Sem fazer muita força sou capaz de citar crimes do casal Nardoni, da patricinha Richtofen, de uma médica em BH que esquartejou empresário num Ap da zona Sul e por aí vai. Os bárbaros do bolsa família são piores que os dos shoppings? Até isso?

     

     

  5. Releiam Sérgio Buarque!!!!!!

    Nassif e amigos, como historiador acho que será a enésima vez que digo que as pessoas definitivamente não leram ou não entenderam direito o conceito de homem cordial utilizado por Sérgio Buarque de Hollanda em Raizes do Brasil.

    O conceito diz respeito ao tipo ideal brasileiro, que antesde qualquer coisa, é movido pelos impulsos mais pulsionais possíveis. Cordialidade para Sérgio é alguém que apenas usa suas sensações e impulsos afetivos mais intensos para se expressar. Utilizando uma metáfora seria o seguinte: é o sujeito que te dá um abraço para lá de afetuoso e intenso sem sequer lhe conhecer ou ter lhe visto alguma vez na vida, mas que também é capaz de esfaquear o cidadão pq apenas olhou para sua namorada! Em nenhum momento Buarque de Holanda diz que ser cordial é ser bom, alegre ou cordato. É acima de tudo alguém que é avesso à impessoalidade da Lei e que procura de todas as formas individualizar as realções público privadas. 

  6. A questão colocada “Por que o

    A questão colocada “Por que o aumento da barbárie se houve uma significativa melhora nas condições sociais?” é, de fato, uma questão complexa que deve ser explorada por todos, principalmente pelos candidatos a cargos políticos. Em Primeiro lugar,  não  é  razoável aceitar essa vinculação direta entre barbárie/violência e condições sociais pois os casos “do casal Nardoni, da patricinha Richtofen, de uma médica em BH que esquartejou empresário num Ap da zona Sul”, como lembra o comentário de Silvio Torres, acima,  desautorizariam de imediato a associação. O Próprio caso do linchamento da dona de casa no Guarujá, embora tenha sido executado por membros de uma classe social menos favorecida,  teve como “autor intelectual” os responsáveis por um blog que não se enquadram no perfil social dos executores. Em segundo lugar,  se isolarmos das estatisticas os crimes cometidos pelo crime organaizado, na guerra pelo controle do tráfico, os números da violência cairão significativamente e aí, talvez, esteja uma clara evidência de que já passou da hora de se perguntar: Será que a estratégia de criminalizar as drogas é a forma mais racional de enfrentar o problema? O exemplo do cigarro, cujo uso vem caindo significativamente com campanhas de informação, não oferece um caminho menos traumático para a sociedade? Em terceiro lugar, e sem esgotar outras possíveis explicações, não seria hora de se avaliar criticamente e se perguntar qual é o papel da mídia no aumento dessa barbárie, visto que, numa busca alucinada por mais audiência, ela vem se tornando perigosamente sensacionalista a ponto de aumentar, exponencialmente, a sensação de insegurança, desencadeando, assim, mais violência? Ainda sobre o papel da mídia, qual é a influência que ela exerce sobre os “ânimos” e valores morais da sociedade ao assumir linhas editoriais que visam amplificar e distorcer denuncias de corrupção e de falta de bons serviços públicos, sempre focando nas exceções e na “parte vazia do copo”, com o objetivo de desgastar o governo e favorecer outros partidos politicos?  Esse ativismo partidário não termina por corromper o processo democrático  e leva a uma descrença no estado de direito que  estimula a barbárie, a violência e o  “vale tudo” dos individuos mais fanáticos?      

  7. Até quando o marginal poderá tudo?

    Até quando os que se acham, e mesmo os pretensos, acreditam que o marginal brasileiro continuará podendo tudo nesta terra inpunimente?

    Enganam-se os mancomunados e padrinhos do facínora nativo que ele prevalecerá na sua opção destruidora de roubar o patrimônio, estrupar, invalidar, matar, desgraçar enfim uma vida, uma família, uma comunidade inteira por prazer ou meio de vida, uma, duas, infindas vezes ancorado na certeza de que nada lhe ocorrerá da parte da justiça, o que é fato, porque a sociedade não tem sangue de barata e lhe reagirá à altura do que merece a sua afronta.

     

    1. Defesa de linchamentos aqui neste Blog é o fim da picada

      Até que ponto irá essa invasao de trolls? Isso acaba com o espaço. 

  8. Se as vítimas fossem da classe dominante dariam um jeito

    Ao lado da estrutura capitalista, que são os meios de produção, fábricas, bancos, etc, temos a superestrutura, que todo um aparato(mídia, judiciário,  personagens como Joaquim Barbosa, religião, arte, cultura, educação, novelas, programas como o Datena, telejornais opinativos…) que determina a forma como o povão deve pensar e agir no dia a dia.  Por outro lado a pollícia é omissa e não investiga sob a alegação de falta de tipificação no código penal.;;ah mas se tais linchamentos fossem praticados contra figuras da classe dominante, já teriam achado uma “brecha” na leia, que tal formação de quadrilha combinado com outros crimes tipo lesão corporal, homicidio…

    http://g1.globo.com/brasil/noticia/2014/04/maioria-dos-espancamentos-de-suspeito-nao-vira-inquerito-policial.html?menu=5eb31164aba62b7

     

    1. O “mensalão” está ai para funcionar como válvula de escape

      [video:http://www.youtube.com/watch?v=kgeKE-fCQdg%5D

      O “mensalão” está ai para funcionar como válvula de escape e evitar que a verdadeira causa seja debatida: O papel e a responsabilidade dos verdadeiramente poderosos nunca são debatidos, a corrupção dos empresários idem, kd DD, Cachoeira, Azeredo, André Lara Rezende, alguém sabe quem é esse moço, o povão não sabe, para o povão sabe que ZD é um “ladrão” e que Joaquim Barbosa é, como retratou Veja, o “menino pobre que salvou o Brasil”. O resultado dessa ideologia está ai: O Direito Penal do Bode Expiatório sendo posto em prática por quadrilhas que se reunem facil e rapidamente através do facebook após  alguma mídia da linha Guarujá Urgente(há um em cada cidade) apontarem algum bode expiatório a ser linchado, no momento o Brasil lincha Zé Dirceu e todo mundo está achando bom demais da conta, os verdadeiros problemas não são apontados, como por exemplo a sonegação fiscal dos grandes grupos econômicos, o Itaú deve mais de 18 bilhões de reais, a Globo mais de 1 bilhão de reais, são mais de 1 trilhão de reais inscritos na dívida ativa. Mas temos Zé Dirceu para ocupar as manchetes todos os dias e aliviar as agruras do povo brasileiro, temos Joaquim Barbosa ensinando como fazer justiça com as próprias mãos, temos os Datentas(sic Datenas) e até Malafaias, estes para massacrar gays, ah, e ninguém sabe os motivos dos linchamentos, então tá

  9. Eu não sei em outras partes
    Eu não sei em outras partes do País mas pelo menos no Nordeste, no sábado de aleluia, havia o tradicional linchamento do Judas (um boneco de pano enchido com melão de São Caetano). Inclusive era comum nomear o Judas com o nome de desafetos.
    Pois bem, isto é uma evidência da violência intrínseca que permeiam as relações sociais no Brasil. Uma nação formada à base do extermínio de negros e índios, que teve no latifundio e na escravidão suas principais instituições sociais, por quase quatro séculos, do coronelismo nos grandes sertões, do banditismo frente a ausência do Estado. Leiam Guimarães Rosa, Jorge Amado, etc.
    Quando a direita evoca o “olho por olho” está tão somente buscando trazer à tona essa nossa sombra coletiva, apelando para os nossos piores instintos.
    Quem é Joaquim Barbosa, a não ser o típico prepotente brasileiro? Violento, sem misericórdia alguma, caprichoso, perseguidor. Quem nunca se deparou com um superior hierárquico com essas atitudes?
    Neste sentido, não tenho claro se a violência cresceu ou se em tempos de Internet apenas ficamos sabendo de tudo o que ocorre no território nacional, em termos de notícia ruim, é bem verdade. Inclusive pq o nosso lado negro se alimenta desse tipo de reportagem. Os datenas da vida hoje estão na televisão mas por muito tempo estiveram e estão nas rádios e jornais locais alimentando nossa sombra coletiva.
    Bem, diante disso (agravado pelo declínio das principais instituições modeladoras do comportamento social (família, religião, a escola. Hoje em dia quem educa nossos filhos é a televisão, sobretudo os mais pobres). Não vai ser qq melhora econômico – social que vai modificar esse quadro. Freud e Jung já nos alertaram sobre o peso do inconsciente na modelagem dos nossos comportamentos.

  10. Farei aqui uma análise de

    Farei aqui uma análise de como acho que explodiu a bárbarie e a violência na sociedade brasileira moderna. 

    Na me rerirei aqui ao processo histórico de colonização de exploração, de escravidão, de capitanias hereditárias e de coronelismos ou clientelismos, mesmo admitindo que nesses fatos moram a semente do problema.

    Contudo, a raiz da atual sensação de barbárie é moderna. O médico brasileiro, renomado mundialmente, Eusimar Coutinho, disse há 30 anos em entrevista que se o Brasil não se preocupasse com o controle de natalidade, teríamos consequências catastróficas no futuro.

    Todos os governos, desde os militares, defensores do “crescei-os e multiplicai-vos, até os democráticos, negligenciaram e/ou não foram incisivos na questão. Da década de 70 até hoje houve um boom na população.

    População gigantesca aliada ao nosso processo histórico excludente, concentrador e improdutivo,  gerou como consequência a incapacidade das estruturas estatais de atingir a todos. O sentido disso é ululante: pessoas pobres e sem condições de vida migrarão para os centros urbanos que produzem mais riquezas, geram mais dinheiro, logo, oferecem uma maior oferta de emprego. O produto dessa multiplicação de fatores é a superpopulação de centros urbanos que não têm a mínima condição de que o aparelho estatal e o interesse do capital chegue a todos, gerando uma gigantesca leva de miseráveis. 

    Miseráveis, sem educação e sem condições dignas de vida, acabam optando por viver da criminalidadade. O inconsciente coletivo dos crimes de exclusão gera em seus atores a ideia de que o fazem por uma justiça, de ter direitos aos quais nao tem acesso. Isso tudo somado a uma estrutura burocrática, corporativista, corrupta, ineficiente e que funciona como empresa, não como nação, fez com que ninguém quisesse resolver o problema.

    O ser humano é sádico por natureza, temos o instinto da violência como indispensável para nossa sobrevivência. Nosso país faz de tudo para que esse instinto seja liberado, pois confunde pena com vingança, Só a educação, a punição exemplar e a prevenção exemplar são capazer de frenar esse instinto. Boas condiçoes de renda, serviçoes e principalmente a igualdade entre as pessoas fazem  com que elas nao tenham que praticar crime – ressalvados passionais, brigas de bar etc, que sempre acontecerão-  ou, caso pensei em praticá-lo, O Brasil nao faz nada disso. Aqui preparamos o terreno para a barbárie e a criminalidade atuar.

    Só programas de distrubição de renda não resolverão essa parada. Somente uma política criminal aliada à educação pode ser efetiva para que não cometamos o mesmo erro sempre.Não se cura uma ferida profunda colocando um esparadrapo sem antes colocor o medicamento.

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