O deputado e o motorista, por Marcio Valley

do blog do Marcio Valley

Lamentável a violência ocorrida no episódio no qual o deputado Takayama (PSC-PR), de 67 anos, acabou levando um soco do motorista do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) nas vias de acesso ao Congresso Nacional.

Não é possível defender ou justificar qualquer violência, muito menos quando verificada a desproporcionalidade física entre os envolvidos. O deputado, afinal, é um idoso.

Porém, as imagens captadas pelo sistema de segurança da Polícia Legislativa do Congresso são inquestionáveis. Os vídeos, que foram divulgados, claramente comprovam que: (a) não houve manobra de risco acentuado por parte do motorista quando dirigindo; (b) o deputado inicia a agressão ao desferir um tapa ou um soco no motorista, que somente então revida.

Além disso, aparentemente as lesões derivaram mais da forma com que se deu a queda do deputado, do que propriamente do soco que recebeu.

Em princípio, não cabe tecer considerações sobre fatos que não testemunhamos diretamente. As verdades são múltiplas e possuem tantas versões quantas são as pessoas que as contam.

Contudo, talvez porque o motorista sirva a um parlamentar do PT, ele está sendo massacrado pela opinião pública como um agressor de idosos. Assim, cabe levantar um contraponto.

Não conheço o deputado agredido, muito menos seu caráter, mas sabemos sobre a natureza geral das micro e macro relações de poder em nossa sociedade, brilhantemente destrinchadas por Sérgio Buarque de Holanda, em seu obrigatório Raízes do Brasil, e caracterizadas como hierárquicas e autoritárias, herança da cordialidade dos ibéricos. Cordial, de coração, ou seja, não pela simpatia e solicitude, mas pela abandono da razão em favor da paixão e da emoção. Afinal, coração é, antes de tudo, um órgão sanguíneo.

Dada essa herança ibérica, gostamos de mandar e também do seu correlato lógico, que é obedecer. Como afirmou recentemente aquela madame que representa o sindicato das patroas das empregadas domésticas sobre essas últimas: as pessoas precisam se colocar nos seus lugares. Em outras palavras, à casa grande o que é da casa grande e à senzala o que é da senzala, só para fazer remissão a outra grande obra sócio-antropológica.

Se entendermos o gesto do parlamentar idoso dentro desse contexto de interrelação de poder – quem manda, quem obedece -, é forte a presunção de que, talvez, ciente de sua condição de mais poderoso, afinal, deputado e, muito provavelmente rico, certamente mais rico do que o motorista, tenha assumido que podia agredir uma pessoa desfavorecida, inferior nessa visão hierárquica e autoritária que predomina em nossa sociedade, e sair impune, porque, afinal, ele é branco, rico e poderoso.

Quantos possuem a tolerância necessária para receber um tapa na cara e não revidar? Fosse um idoso carcomido, nitidamente enfraquecido pela idade, talvez, mas não é o caso.

Só que o poder tem muitos modos. Um deles se manifesta pela supremacia da força física, que quem nesse caso detinha naquele momento era o motorista.

Não há santos nessa história, mas se há alguém com uma dose um pouco menor de culpa, aparentemente é o motorista.

no blog: http://marciovalley.blogspot.com.br/2015/10/o-deputado-e-o-motorista.html

Redação

34 Comentários

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    1. Nassif precisa ter mais cuidado

      Essa trollada da Direita, que defende qualquer aberração desde que seja da Direita e condena um espirro em público se for da Esquerda, está infestando o blog.

      Quando esse pessoal começa a se sentir muito à vontade, não demora começam a pregar a volta do nazismo e coisas assim como se fosse a coisa mais normal do mundo…

        1. A cama

          Tá se escondendo embaixo da cama de quem, Senhor? D’algum dedo gordo demais querendo se aproveitar da liberalidade da sua aliança?

        2. Engano seu

          Os nazistas saíram de baixo da cama há muito tempo. Estão sem a menor vergonha de se expor com suas ideias nazistas. Alguns até tentam se travestir de liberais, mas não conseguem…

          1. Exatamente!
            E é ótimo que
            Exatamente!

            E é ótimo que mostrem a cara porque tem gente(a maioria das pessoas) que acham que não existem.

        1. Aliás, Athos, fiquei um pouco

          Aliás, Athos, fiquei um pouco surpreso quando Ninguém me elogiou. Aproveito para mandar saudações aos outros três.

  1. Nossas “otoridades” se

    Nossas “otoridades” se esquecem que o poder emana do povo, tanto que ser parlamentar não é profissaõ, como alguns querem crer, deveriam vetar eleições sucessivas para todos os cargos, uma reeleição, uma boa quarentena e outro reeleição, assim  quem sabe baixa a crista desses “donos do poder” que só fazem asneiras.

  2. o deputado e o motorista

    Antes de mais nada pesquisem o comportamento do nobre parlamentar, vejam se  ele não é useiro e vezeiro em agir desta maneira com os mais humildes e por úlitmo não se esqueção que os canalhas também envelhecem.

  3. E se fosse o seguinte, o

    E se fosse o seguinte, o motorista do Bolsonaro tivesse dado um tapa na Maria do Rosário na mesma situação como seria o texto, “Quantos possuem a tolerância necessária para receber um tapa na cara e não revidar? Fosse uma mulher carcomida, nitidamente enfraquecido pela idade, talvez, mas não é o caso”.

    Uma regra serve para todos.

     

     

    1. Aliança, sei que você gosta

      Aliança, sei que você gosta de provocações e, em geral, não me manifesto. Porém, pretender que justiça seja equivalente a igualdade absoluta significa desejar uma injustiça absoluta. Desde Aristóteles que os bons pensadores reconhecem que justiça é a igualdade entre os iguais e desigualdade entre os desiguais. Por outro lado, a intenção do texto foi muito menos produzir a defesa da violência do motorista do que chamar a atenção para o tipo de sociedade que aceita passivamente a violência contra os desfavorecidos, traduzindo-a como “as coisas são assim mesmo”. Como coloquei no texto, não existem santos nessa história, mas há uma possibilidade de leitura do episódio sob a perspectiva das relações desiguais de poder. Obrigado por ler o texto.

      1. Hi, cara, perdeste tempo!

        Não existe hoje, no Brasil, nenhum comentarista de Direita com inteligência pra entender o que você escreveu, que dirá esse aí…

    2. E se fosse

      Tu partes do princípio, escolhido a tua discrição, que Maria do Rosário teria a MESMA REAÇÃO do depufede.

      Na tua ânsia de atacar o PT estás igualando os desiguais. 

      Até aí nada de novo, já se tornou hábito desde as mencionadas CASA GRANDE & SENZALA.

      Cada um com suas elocubrações . . . 

      1. Neste caso, a comparação dele

        Neste caso, a comparação dele está correta, pois o deputado era bem mais fraco fisicamente que o motorista. Tem muita mulher por aí muito mais forte que esse deputado. A meu ver, em ambos os casos, logicaemnte, seria legitima defesa do motorista.

  4. O revide do motorista nada

    O revide do motorista nada mais foi do que a revolta do povo brasileiro contra as atrocidades cometidas por Eduardo Cunha et caterva. Espero que haja o bom senso necessário da Justiça e que o deputado seja punido nas urnas pela sua soberba.

  5. Como assim,  não se justifica

    Como assim,  não se justifica a “violência”?

    Alguém ti dá um tapa, você se defende, há inclusive exceção legal para isso, assegurando o direito a defesa.

    O fato de quem iniciou a agressão é fisicamente mais fraco não afasta o direito a defesa do agredido!

    Luciana Mota.

    1. De fato, Luciana, você tem

      De fato, Luciana, você tem razão. Esse trecho diz menos, na literalidade, do que se pretendeu dizer. Claro que me refiro à violência imotivada e injusta. Obrigado.

  6. Raizes do Brasil

    O mesmo sentimento que tive. Mas acho que mesmo com as imagens, o unico que saira perdendo nesse imbroglio é o motorista…

  7. Quer saber? Estou de saco

    Quer saber? Estou de saco cheio desses “idosos” que agem como se tivessem direitos acima de outros cidadãos brasileiros. Idade, se serve para alguma coisa, é para adquirir sabedoria. E ninguém tem direito de agredir ninguém. Entrou na briga, pois que aguente. Ou se comporte como cidadão civilizado da próxima vez.

  8. Bem, um excludente de

    Bem, um excludente de ilicitude básico é a legítima defesa, está no Código Penal:

     

    “Art. 23 – Não há crime quando o agente pratica o fato:

    (…)II – em legítima defesa

    (…) Art. 25 – Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.”

     

    Não vi o vídeo, mas se o deputado tentou dar um soco ou tapa no motorista, e este, imediatamente, revidou, a ação é moralmente justificada e claramente legal. Não vale tomar o soco e depois ir atrás revidar por óbvio, a reação tem que ser sempre em defesa.

     

    Entretanto, em se tratando de Brasil, e em se tratando de motorista pobre de petista, o coitado do motorista tá em maus lençóis, coitado. Até porque deputado petista é tudo cagão,e não farão nada para defender o ser funcionário.
     

     

    1. De fato

      De fato, conforme pode ser visto no Youtube, o deputado estapeia o motorista primeiro e depois leva uma bifa tão firme que, simplesmente, decola do piso! Pensei ter voltado na infância e estar revendo o National Kid na tv preto e branco.

      Detalhe: a diferença de cota entre o motorista e o deputado era bastante expressiva, do tipo uns ~2.1m, ~100kg, para ~1.55m, ~65kg.  Não sei como o agressor não varou a vidraça tão forte foi a pancada.

      Talvez aprenda a lição que cara de homem não é pandeiro.

      Avaliou mal o oponente. Deve ter pensado que  daria o sopapo e que tudo ficaria na mesma, que o cara iria procurar o seu lugar.

      Bateu, levou. Duvido que faça isso de novo!

       

  9. Esse deputado é um idiota

    Prova:

    http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2015/09/24/comissao-da-camara-aprova-parecer-sobre-estatuto-da-familia.htm

     

    Mesmo sem fazer parte da comissão especial, o deputado Hidekazu Takayama (PSC-PR) participou das discussões nesta quinta e fez declarações polêmicas durante a reunião.

     

    Defensor do Estatuto da Família, o pastor afirmou que homossexuais deveriam ser presos porque, segundo ele, são eles que se matam durante “briguinhas íntimas”.

     

    “Eu desafio qualquer jornalista investigativo a verificar os quase 4.000 casos de mortes de homossexuais. Quantos foram praticados por católicos e evangélicos? Nenhum, nenhum”, disse.

     

    E continuou: “Se continuar com esse tipo de argumento que dois homens e duas mulheres formam uma família, daqui a uns dias vai ter um homem com uma vaca e vai virar avacalhação”.

  10. Nenhuma surpresa

    Marcio, nenhuma surpresa, nenhum espanto. Estes são tempos de intolência e pontos de fusão cada vez mais baixos. Não há mais espaço para diálogo – você mencionou este fato para a Francy – e nem há vontade de abrir um espaço de convivência que respeite diferenças e escolhas divergentes. Os tais “democratas”, defensores das liberdades, da livre iniciativa, revelam-se na verdade  defensores da estratificação social em detrimento de qualquer integração. Estes episódios – e outros a que assistimos diariamente, inclusive em comentários no Blog que revelam-se intolerantes, virulentos até o limite do desrespeito – só comprovam que o “espírito democrático” acaba no limite da ocupação por qualquer cidadão de espaços “naturalmente talhados” para quem se acha mais do que os outros – ou porque estudou em melhores escolas (de graça, diga-se de passagem), detem algum poder, pode alterar a vida de alguém, dispõe de meios inacessíveis à maioria. Este pessoal ainda não se deu conta de que não adianta querer “ganhar no grito” ou na ameaça do “sabe com quem está falando”. Não mais. A última década modificou ao menos isso.  Mas este processo é lento e não muda a nossa convivência de uma hora para a outra. Não é salutar o silêncio que se verifica nestes episódios;  nos custará ainda mais caro no futuro. É preciso firmar posição ainda que numa primeira, segunda ou terceira não surta efeito.  Nenhuma violência se justifica, de onde quer que parta. Mas afirmar, com firmeza, nossa posição é imperativo para que estes episódios produzam no futuro resultantes diferentes. Excelente post. As usual.

    1. Realmente, Anna Dutra, o

      Realmente, Anna Dutra, o processo de transformação cultural é lento. Como você diz, ocasionalmente assistimos a publicidade de uma denúncia de carteirada, como no caso daquele juiz que prendeu a agente de trânsito que estava cumprindo o seu dever, mas ainda são raros e, mesmo em relação a esses, pouco sabemos dos desfechos. Você tem plena razão: o silêncio, nesses casos, é cúmplice do autoritarismo. Porém, como disse no texto, tanto faz parte de nossa cultura o mandar, como o obedecer. Precisamos romper com esse atavismo que hierarquiza uma sociedade que, no que concerne aos direitos da cidadania, deveria se pautar pela igualdade. Obrigado pelo comentário.

      1. certíssimo

        Marcio, ficamos muito tempo sem poder de decisão e atados a convenções pouco produtivas e representativas de formas arcaicas de dominação. Leva um tempo até que possamos entender a melhor forma de proceder e mesmo os novos códigos que se estabelecem nas relações, que quando novas e ou modificadas, nem sempre acomodam-se com a velocidade desejada. Mas nada é definitivo. Alterar um padrão de comportamento é uma questão de vontade, de boa vontade, e isso não nos falta. Ainda mais quando a mudança é para uma situação mais igualitária e benéfica para todos. Creio que é uma questão de correção de conduta e todos então ficaremos satisfeitos. Eu é que te agradeço os lúcidos esclarecimentos; ficarei atenta eu mesma para não incorrer nestes erros que nos acompanham há tanto tempo. 

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