Mídia, Brasil e Biodiversidade

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Comunicação, ciência e agronegócios

por Redação em 24/05/2011

É curioso e contraditório observar que a cobertura de temas agrícolas pela mídia de interesse geral no país vem perdendo espaço, relevância e qualidade no correr deste século, exatamente quando o Brasil ganha mais reconhecimento mundial por seu desempenho na área

Por Carlos Eduardo Lins da Silva*

É provável que pouca gente saiba atualmente que um dos campos de estudo que ajudaram a solidificar o conhecimento científico dos fenômenos da comunicação social foi o da difusão de informações para a produção agrícola.

Na década de 1940 começaram a ser formuladas linhas de pesquisa, com indisfarçada orientação funcionalista, para verificar na realidade – e a partir daí talvez gerar teorias – como inovações de técnicas com o objetivo de aumentar a produtividade no campo se disseminavam com rapidez e eficiência.

No contexto da Guerra Fria, os EUA investiam pesadamente nesse tipo de pesquisa em países subdesenvolvidos para associar sua imagem à do progresso e do desenvolvimento econômico.

Um dos livros mais famosos nesse período, que em português se intitulou Comunicação e Mudança nos Países em Desenvolvimento (Edusp, 1973), tinha na sua versão original (1967) prefácio do então presidente americano, Lyndon Johnson. Isso dá uma dimensão de como esse tema era estratégico para os EUA.

Apesar da vinculação ideológica, que naqueles anos difíceis transformou essa vertente de conhecimento em algo quase maldito no establishment cultural brasileiro, é indiscutível que dela ficou muita coisa de útil tanto em termos de metodologia quanto de informações obtidas nos inúmeros trabalhos de campo realizados por pessoas inteligentes e capazes, com Everett Rogers, Daniel Lerner e Wilbur Schramm, apenas para citar os três mais conhecidos.

Duas reportagens desta edição, inclusive a de capa, tratam de temas do agronegócio, setor econômico em que o Brasil se destaca já há décadas no cenário internacional e que se tornou de absoluta relevância para o país.

A comunicação para o campo no país não segue mais os princípios do difusionismo, embora tenha se apropriado e reciclado para os novos tempos muitas de suas descobertas. Mas continua sendo importante para o contínuo aperfeiçoamento das empresas agroindustriais.

A Embrapa, criada em 1973 e que dava ao seu setor de comunicação naquele tempo orientação marcadamente calcada nas teorias da difusão de inovações, vem se adaptando aos novos tempos em vários sentidos, inclusive neste, da comunicação, incluindo nele, entre outros aspectos, o da inserção mundial do Brasil nesta área.

É curioso e contraditório, no entanto, observar que a cobertura de temas agrícolas pela mídia de interesse geral no país vem perdendo espaço, relevância e qualidade no correr deste século, exatamente quando o Brasil ganha mais reconhecimento mundial por seu desempenho na área.

Os suplementos agrícolas dos grandes jornais diários, alguns com quase seis décadas de publicação (como o do Estado de S. Paulo) estão muito mais magros do que jamais foram.

Apesar da grande geração de conhecimento que se tem nesse setor, notícias e reportagens com destaque sobre ele são raras, exceto no que diz respeito à numerologia de exportações e preços, às tendências de mercado e a debates de ordem político-ideológica.

Por conta disso, publicações especializadas em ciência, como esta, têm se tornado os veículos mais importantes de difusão do conhecimento gerado sobre agricultura no país. É uma coisa boa, mas não suficiente.

O grande público, que infelizmente (por enquanto) ainda não consome este tipo de veículo, precisa estar bem informado sobre os avanços, desafios, perigos (de qualquer tipo) que envolvem o agronegócio no Brasil, e não apenas em situações específicas, como a grande celeuma que cercou a questão dos transgênicos, no início da década passada.

Embora esta e outras revistas e jornais científicos estejam fazendo sua parte, assim como as agências de divulgação de universidades e fundações, é indispensável que a chamada “grande imprensa” restabeleça prioridade na cobertura desses assuntos, pois isso atenderá certamente ao interesse nacional.

Coluna publicada na edição de maio/2001, veja em pdf.

* Carlos Eduardo Lins da Silva é livre-docente e doutor em Comunicação pela USP e mestre pela Universidade Estadual de Michigan. É presidente do Conselho Acadêmico do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais da Unesp, editor da revista Política Externa e diretor do Espaço Educacional Educare.

Luis Nassif

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