Debate econômico é necessário para processo de reconstrução do país

Tatiane Correia
Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.
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Em entrevista exclusiva à TV GGN20 horas, Luiz Gonzaga Belluzzo apresenta pontos que precisam ser considerados pelo próximo presidente

Luiz Gonzaga Belluzo

Jornal GGN – O maior desafio para um eventual novo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à frente da presidência brasileira é o modelo econômico atualmente vigente no Brasil.

Para discutir mais a respeito do tema, o Luis Nassif recebeu na TV GGN 20 horas desta terça-feira (21/12) o professor e economista Luiz Gonzaga Belluzzo.

Sobre os dados da covid-19 no Brasil, Nassif lembra que eles continuam inacessíveis – “eles anunciaram no começo que era uma coisa simples e, até agora, impressionante (…) O Ministério da Saúde do Brasil, em uma pandemia em que a informação é um ponto essencial e que o ministro da Saúde e o próprio Bolsonaro lutam contra a informação, daí desaparece esses dados”

Os desafios para o próximo presidente

Nassif explica que, quando se analisam os desafios do provável futuro governo Lula, um é montar um grande leque de apoio, e o outro é não fazer concessões em áreas cruciais.

“Um dos pontos centrais é justamente a questão da economia, que ficou presa em um conjunto de bordões… É inacreditável”, diz Nassif. “O grande desafio é: como seria uma política econômica em um futuro governo Lula?”, questiona Nassif, convidando o professor e economista Luiz Gonzaga Belluzzo.

Segundo o professor, o primeiro ponto a se fazer é fugir das crenças que conduziram a economia até o momento. “Eu me sinto na obrigação de fazer uma avaliação bem, historicamente bem longa e profunda sobre o que aconteceu na economia brasileira, quando nós fomos dando saltos de buraco em buraco nos últimos anos”, explica Belluzzo.

O primeiro ponto explorado no debate é o câmbio, e Belluzzo cita como exemplo as fortes desvalorizações vistas pelo real, da lira turca e da moeda chilena.

“Acho que, no debate econômico, há uma falha estrutural que eles não reconhecerem as consequências da abertura financeira que foi empreendida a partir dos anos 80 e se acentuou nos anos 90”, afirma Belluzzo. “E aí nós temos que atribuir uma responsabilidade muito grande para o declínio da economia brasileira a abertura financeira com a gestão do Plano Real”.

Neste caso, Belluzzo não fala do Plano Real como uma política de combate à inflação, mas lembra que existem bens que vem para o mal – “ao longo desse período, iniciou-se um rapidíssimo processo de desindustrialização no país. E isso tem a ver com câmbio e juros”.

“Eu digo que essa relação de câmbio e juros é uma relação monetário-financeira. Os economistas tradicionais vem com a história da poupança e da taxa real de juros”, diz Belluzzo.

“Estamos em uma situação em que, sobre essa variável, nós não temos controle. Nós não temos controle, então é preciso ver isso como uma restrição”, pontua Belluzzo

“Nós precisamos entender muito claramente, saber as restrições, porque isso tem impacto sobre a política econômica”, diz Belluzzo. “Veja que o (Gabriel) Boric foi eleito (presidente do Chile) e os mercados deram um recado ‘olha aqui, não vem que não tem'”.

O discurso da mídia , ‘bacuraus’ e o impacto da financeirização

Para Belluzzo, o Brasil está em uma situação em que “ninguém percebe nada, porque a mídia oficial é um desastre, é uma catástrofe o que eles falam de economia”.

O professor da Unicamp ressalta ainda a necessidade de uma ação, e isso é uma ação internacional, do Brasil, da Argentina, do Chile, no México talvez, no sentido de articular uma forma de cooperação que defenda esses países da sua vulnerabilidade externa.

“Aí é o seguinte – o que dizem os bacuraus (os economistas) da vida, eles dizem que é um risco fiscal. Então, tem risco fiscal no Chile, risco fiscal na Turquia, tem risco fiscal no Brasil (…)”, afirma Belluzzo.  “É uma resposta tola, irrealista e de desconhecimento de como funciona esse capitalismo de hoje”.

Segundo Belluzzo, tanto na Europa como nos Estados Unidos estão sendo organizados debates que chegam a questionar a dimensão da financeirização. “A financeirização envolve outras coisas – envolve, na verdade, o pagamento de dividendos e recompra de ações acima do investimento produtivo”.

“A financeirização supõe também que a expansão do crédito no mundo inteiro, intrafinanceira (dentro do sistema financeiro), financia a valorização de ativos, recompra de ações, etc, foi muito maior que o crédito destinado às empresas e às famílias”, diz Belluzzo.

“Aí o pessoal vem com a teoria da poupança, por que é muita poupança – não é muita poupança. Muita poupança não, é muita riqueza financeira se transladando”, diz Belluzzo. “Não tem nada de muita poupança”.

Reconstrução doméstica

Para Luiz Gonzaga Belluzzo, o Brasil precisa de uma reconstrução institucional. “Em vez de ficar discutindo apenas e tão somente as questões macroeconômicas, o que é importante também, mas nós temos que nos voltar para o redesenho institucional da economia brasileira”.

“Redesenho institucional significa o que: quais são os atores que nós vamos mobilizar para recuperar a economia brasileira”, afirma Belluzzo. “Os atores tem que ser, como dizia o Keynes, não precisa estatizar tudo, é atores públicos e privados, como os chineses fazem”

“Atores públicos, quais são: os bancos públicos, pois cá entre nós o nosso sistema de crédito (…) as grandes empresas estão recebendo crédito abundante, e isso provoca uma assimetria na economia porque as pequenas e médias não recebem esse valor, e aí só o crédito público resolve isso – e nós já temos experiência, muita experiência disso no passado”

“Eu fui um crítico do regime militar (…) mas a gente tem que reconhecer que os militares daquele tempo não desmontaram a estrutura institucional que foi criada desde o Getúlio, Juscelino, BNDES, Banco do Brasil, CEF”, explica Belluzzo.

“Você tinha crédito direcionado. Aí quando você fala isso, para um economista frufru desses aí, vai falar ‘não, mas como é que é, como é que faz?” Crédito direcionado você teve na Europa do pós-guerra o tempo inteiro”, explica o economista.  “Pessoal não sabe que a economia social de mercado tinha, na verdade, direcionamento do crédito – nos EUA menos, mas você tinha controle da taxa de juros que as pessoas também não sabem”

Segundo Belluzzo, o sistema financeiro e monetário que o capitalismo inventou é muito importante, e pode ser colocado a serviço do investimento produtivo, etc, como já foi em outros períodos, dentre eles o pós-guerra – “estou falando do pós-guerra porque ninguém pode explicar a recuperação das economias europeias sem o direcionamento do crédito. Não há a menor possibilidade, porque aquilo foi uma coisa articulada”

“Aqui nós estamos no mundo da Lua ou de Netuno, porque as pessoas ficam usando arranjos mentais, mas o fato é que as concepções, as visões, elas tem muita importância e, no caso do Brasil, isso foi devastador – se você vai observar o comportamento, digamos, do que sobrou do empresariado brasileiro, você vê que todos eles repetem essas chorumelas, eles não têm exatamente noção do seu papel social”, diz Belluzzo.

Veja a análise de Luiz Gonzaga Belluzzo sobre a economia brasileira e os seus desafios na íntegra da TV GGN 20 horas. Clique aqui e confira!

Tatiane Correia

Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.

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