Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
[email protected]

Folclore de roça, por Rui Daher

Folclore de roça

por Rui Daher

em CartaCapital

Dediquei a coluna anterior aos folguedos carnavalescos em suas incongruências e funções antropológicas e etnográficas. Embora a professora Maria Laura tenha ido aos bois bumbás de Parintins, no Amazonas, não me senti aparelhado para chegar lá. Preferi apontar formas de acesso aos estudos da antropóloga da UFRJ.

Hoje volto, porém, mais perto de minhas Andanças Capitais, como mascate de uma agropecuária sadia, natural, mais barata e, eminentemente, nacional. Mesmo com a famigerada mão esquerda fraturada, nos próximos 60 dias, viajarei pelos sertões, a palestrar, conversar com caboclos, campesinos e ruralistas sem terras, assentados, provando galinhadas, feijões bem temperados e algumas cachaças de boa procedência.

A propósito se houver interesse, cobro barato: o valor do mais antigo SUV de Doriana Júnior.

Como cantava Geraldo Vandré (Terra Plana, 1968): “Não separo dor de amor (…) deixo claro que a firmeza do meu canto [escrever], vem da certeza que tenho, de que o poder que cresce sobre a pobreza e faz dos fracos riqueza, foi que me fez cantador [escritor].

Depois de anos, para entender o mundo rural, lendo a visão do alto sobre os primórdios do agronegócio, seus benefícios e prejuízos, e com a lupa, as teses de Caio Prado Jr., Gondim da Fonseca, Francisco Julião, Antônio Cândido, João Batista Borges Pereira, curioso, adquiro “O Homem do Campo Paulista” (Editora Horizonte, 2014).

Logo de cara, noto ser patrocinado pela Syngenta (hoje, ChemChina) e traz uma coletânea de histórias de dez famílias produtoras no estado de São Paulo, prováveis depoimentos de clientes da Syngenta. Nada contra, mas não o que gostaria de ler para aprender. Vale apenas pelas fotos.

Na coluna anterior, vimos que as antropologia e etnografia trazem aos nossos folguedos o catolicismo ibérico e a cultura africana serviçal da escravidão. Notem a primeira interiorizada e a segunda litorânea, colonizada pelos conquistadores, a partir dos mares, conforme adentravam os sertões em sua dominação catequista.

Em ambos, seres e fatos míticos, fantásticos, habitam o imaginário dos folguedos, atualizados pelo passar dos tempos, mas sempre com origem identificável. Afinal, quando brincamos ou não, somos portugueses, indígenas e africanos, mas tão plásticos que aceitamos facilmente o que nos trouxeram os imigrantes.

Um país de dimensões tão grandes, natureza exuberante, clima e biodiversidade significantes, pode se pulverizar em manifestações culturais as mais diversas. É o que nos dizem música, representações audiovisuais, gastronômicas, literárias e arquitetônicas.

Largo, por alguns segundos, a minha AK-47 política, econômica e social, para lembra-los do “Curupira”, protetor das floresta, plantas e animais silvestres. Não é reconhecido por Ronaldo Caiado.

Do boto cor-de-rosa, que poderíamos pintar de amarelo para não insuflar os ânimos das minorias (?). Afinal, dizem que ele engravida as mulheres e desaparece. Um estuprador? O saci-pererê. Travesso. Vive de receitar ervas medicinais. Cannabis está dentro. E a bruxa velha com cabeça de jacaré que come crianças desobedientes? “Fez a lição de casa, moleque? Não? Vou chamar a Cuca”.

Meninas, alguma dadeira por aí? Cuidado! Ela, a mula descabeçada anda me perguntando de você. Para ela, mulher que não guarda a virgindade para o marido vira mula-sem-cabeça. Machista, não? Mais apropriado jumento (êpa!) sem cabeça ou com dimensões enormes.

A Iara, mãe d’água, é minha. Não a cedo nem ao juiz de finos lábios e camisas pretas, Sérgio Moro. Delato arcanjos e santos. Sereia sedutora que atrai os homens para morrerem afogados no rio. Será um prazer.

E para folgar temos de tudo, leitores e leitoras. Brincamos, soltamos pipas, fazemos pega-pega e esconde-esconde, vaca amarela e cabra-cega, jogamos amarelinha, festas juninas (aquelas proibidas em Brasília por Danuza Leão), Folia de Reis, Círios, Sambas de Roda, Cirandas, Maracatus, Quadrilhas, Frevos e Carimbós.

E o minueto da produção agrícola de grãos, não falará nada? Será recorde, mas isto escrevi há seis meses.

Nota: serviu-me de consulta o site Significados do Folclore Brasileiro.

https://www.youtube.com/watch?v=Yq0u4e3Er5k

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

10 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Danusa proibiu

    Mas os patos amarelos do panelaço gostam de quadrilha!

    Não estou falando do eliseu. Nem do parente alienador.

    É quadrilha com recurso no bolso, iluminada pela termelétrica dessa Pohajucá.

    Não tem padre, mas tem vampiro. Agora sem phaixa.

    Ô tristeza!

    1. Caro Otávio,

      obrigado. Voltarei ao tema quantas vezes forem necessárias para mostrar que vivemos num país de excepcional diversidade e qualida culturais, dispersas em 90% de comentários repetitivos sobre os mesmos personagens políticos de sempre. Nossa resistência deveria vir de nossos agentes culturais e pararmos dessa mofina vira-lata.

      Abraços

  2. Rui, você ilustra tão bem os

    Rui, você ilustra tão bem os seus escritos com música. Lembro dessa. Espero que goste.

     

    [video:https://www.youtube.com/watch?time_continue=3&v=fEmnJf0rTP8%5D

    Meus tempos de criança

    Ataulfo Alves

    Eu daria tudo que eu tivesse
    Pra voltar aos dias de criança
    Eu não sei pra que que a gente cresce
    Se não sai da gente essa lembrança

    Aos domingos, missa na matriz
    Da cidadezinha onde eu nasci
    Ai, meu Deus, eu era tão feliz
    No meu pequenino Miraí

    Que saudade da professorinha
    Que me ensinou o beabá
    Onde andará Mariazinha
    Meu primeiro amor, onde andará?

    Eu igual a toda meninada
    Quanta travessura que eu fazia
    Jogo de botões sobre a calçada
    Eu era feliz e não sabia

    1. Cafezá,

      você deve se lembrar do narrador de futebol, circa 1970, José Geraldo de Almeida. Como eu, diria: lindo, lindo, lindo!

      Agora a melhor: no texto em que falo do  risco de terrorismo por parte do crime organizado com o exército no Rio, um gajo me chamo de “irresponsável e que não passo de uma ceiança”.

      O irresponsável caguei. O não passar de uma criança me fez feliz.

      Abraços

  3. Folclore….

    Homem do Campo Paulista? Ou Homem Paulista do Campo? Ou Homem Paulista do Campo Paulista? É disto que comento, que se perde, juntamente com a Agropecuária e quem a conhece. Não é somente semente transgênica , nem Syngenta. É O Brasileiro e toda sua História e Cultura. Se perde e se perderá, se aqueles que conhecem profundamente, não deixarem seu conhecimento, sua vivência, seu legado e seu testemunho, produzidos em Andanças Brasileiras. É o Brasil. O Brasil é o Saci que rodopia no meio do campo e amarra o rabo do burro. Não é Halloween. Não é Universidade Americana que precisa estudar, analisar e projetar o Brasil. O Campo Paulista é Santana do Parnaiba, Pirapora, Cabreuva, Itu, Salto, Tiête, Berço do Brasil, um dos lugares mais bonitos deste país. E que será ainda mais maravilhoso, no dia em que o rio Tiête voltar a ser limpo.  Campo Paulista. abs.  

    1. Zé Sérgio,

      Hoje saí cedinho de Avaré para Piracicaba, onde estou agora. Passei em vários lugares que você conhece e falei para quem dirigia: que maravilha! onde você vê devastação, desrespeito às matas, latifúndios, monocultura canavieira. Só diversidade. É preciso andar!

      Abraços

  4. Prezado Rui,
     
    Já andei muito

    Prezado Rui,

     

    Já andei muito pelos sertõezões da Bahia, Ceará, Alagoas, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte; anteriormente, lá pelos oitenta, noventa do século passado, voei e naveguei pelos dois Mato Grosso, Maranhão, Piauí, Pará, Tocantins, Goiás e até um pouco do Amazonas. Não lembro de menções a nosso folclore em lugar nenhum (devo ter encontrado alguma coisa), mas o que vi de convites para halloween, geralmente pintados em muros de escolinhas, particulares e públicas, me deixa cabisbaixo.

    1. Edemar,

      na [epoca que você menciona, impossível. Só em grandes cidades ao redor de plantações de grãos, onde prefere, morar os donos de terras. Não precisa ir muito longe. No Globo Rural, TV Globo aos domingos, veja quanta brasilidade nas festas e eventos. Halloween nem por um carvalho.

      Abraços

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador