A faca de Moro no pescoço do STF, por Frederico de Almeida

Do Justificando

A faca de Moro no pescoço do STF
 
Frederico de Almeida

Nessa altura, parece-me desnecessário dizer que a quebra de sigilo de interceptações telefônicas do ex-presidente Lula praticada pelo juiz Sergio Moro na semana passada é ilegal e politicamente irresponsável. Ilegal porque contraria expressamente a Lei n. 9296/96, que dispõe que gravações inúteis à investigação devem ser destruídas, e não reveladas, e porque parte delas foi obtida quando não vigia mais ordem judicial. Politicamente irresponsável porque serviu deliberadamente para inflamar os ânimos políticos em um momento de já alta e perigosa conflituosidade, e para oferecer munição de ataque de atores políticos à nomeação de Lula como ministro do governo Dilma. A justificar tanto sua ilegalidade quanto sua irresponsabilidade, Moro apela demagogicamente para um suposto e difuso “interesse público” no conhecimento do conteúdo das gravações, mesmo que elas não fornecessem indícios da prática de crimes, como o próprio magistrado admite.

Como consequência de acerto prévio ou por puro oportunismo político, a oposição parlamentar e Gilmar Mendes fizeram da irresponsável e ilegal ação de Moro a base de um novo lance da ofensiva política e judicial contra o governo Dilma, com a suspensão da nomeação de Lula como ministro e a afirmação do foro de Curitiba para investigar eventuais irregularidades verificadas a partir das conversas interceptadas. Assim, Mendes trouxe para dentro do STF a instabilidade política e jurídica que Moro, o MPF, a PF e a oposição parlamentar vinham criando desde Curitiba.

Por isso, é preciso reconhecer que Moro não apenas incendiou o debate político e acuou juridicamente Lula e Dilma no âmbito da Lava Jato. Ele também colocou a faca no pescoço do STF, e o fez com a ajuda de um ministro do que por meio de seu proselitismo e de seu radicalismo político-partidário vem há tempos corrompendo a integridade e a serenidade necessárias à corte em um momento de tamanha instabilidade política.

Por enquanto, apenas Marco Aurélio Mello vem publicamente criticando as atitudes de Moro e os excessos da Lava Jato; sabe-se, porém, que outros ministros do Supremo têm se mostrado desconfortáveis com as atitudes e excessos do juiz federal. O problema é que a faca de Moro no pescoço do STF coloca o tribunal diante de um dilema. Se o Supremo começar a atuar contra os excessos de Curitiba, corre o risco de ser mal visto pela opinião pública, e devemos admitir que desde pelo menos o chamado “mensalão”, passando pela recente decisão sobre a execução antecipada da pena após condenação de segunda instância, os ministros do STF têm se mostrado bastante e perigosamente sensíveis aos “clamores populares” por “justiça”. Se além de coibir excessos, o STF atacar diretamente Moro – reprovando publicamente sua conduta ou mesmo determinando correição e eventual punição disciplinar por seus atos – pode ainda transformá-lo em mártir ou herói, o que parece fazer parte dos cálculos de um juiz que, aclamado pelas manifestações pró-impeachment do último dia 13, deu-se ao trabalho de responder e agradecer aos manifestantes por meio de uma nota no mesmo domingo, como um típico líder demagogo.

Por outro lado, se os ministros do STF não reagirem a Moro, correm o risco de rebaixar uma das mais importantes instituições democráticas aos caprichos de um juiz de primeira instância voluntarioso e demagógico. Se isso acontecer, não podemos minimizar o papel de Gilmar Mendes nesse rebaixamento, pois além de trazer a faca de Moro para o pescoço do STF, o ministro expressamente diminuiu o STF diante da Vara Federal de Curitiba, ao sugerir que o foro privilegiado de Lula no Supremo representaria uma tentativa de escapar à justiça; se só há justiça sob Moro, para que serve o Supremo Tribunal Federal?

Frederico de Almeida é bacharel em Direito, mestre e doutor em Ciência Política pela USP, e professor do Departamento de Ciência Política do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP.

 

Redação

10 Comentários

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  1. Ainda acredito que o governo

    Ainda acredito que o governo deveria ir para um gesto mais dramatico, se esperar pelo acovardado stf e seus ministros empolados que se escondem atras da toga nas horas que mais necessitam mostrarem ao que vieram irá mansamente cair, e é o que a opsição justamente quer; deveria convocar uma rede nacional e informar ao povo o que está em jogo, os motivos dessa ferocidade contra o país. o que perderemos, converso com as pessoas e elas não sabem quanto vale o pre sal, as centenas de anos de exploração já garantidas, a midia as deixam propositalmente na ignorancia, cabe ao governo explicar e informar que querem acabar com a valorização do minimo, flexibilizar a clt, aumentar a idade das aposentadorias quase inviablizando o trabalhador de se aposentar, o fim do fies e outros incentivos estudantis, entre outros beneficios sociais, tem que ser agora o impedimento está batendo na porta, se mesmo assim assim o brasileiro não acordar não será por falta de aviso, a hora é de atitude.

  2. Esse STF entregaria Olga aos nazistas

    Quem age não com base no direito e na Constituição, mas no que a rodinha de amigos ou familiares pensa, tem que pedir pra sair, não tem estatura pra ser Ministro do STF. Do jeito que a coisa está, com uma Suprema Corte tão ridiculamente acovardada perante a mídia, não tenho a menor dúvida que entregariam Olga Benário aos nazistas sem nem parar pra pensar duas vezes.

  3. Ilusões jurídicas …

    No trecho, com itálicos adicionados:  

    Por isso, é preciso reconhecer que Moro não apenas incendiou o debate político e acuou juridicamente Lula e Dilma no âmbito da Lava Jato. Ele também colocou a faca no pescoço do STF, e o fez com a ajuda de um ministro do que por meio de seu proselitismo e de seu radicalismo político-partidário vem há tempos corrompendo a integridade e a serenidade necessárias à corte em um momento de tamanha instabilidade política.

    Como se o STF, alguma vez em sua história, tivesse a serenidade e a integridade da qual se fala. Nunca teve. Como o resto do judiciário (no qual exceções confirmam a regra), o STF sempre foi oportunista e conservador.

  4. Faca no pescoço ?

    Será que os doutos ministros do STF vão aceitar a faca colocada pelo “clamor das ruas” ? Afinal não dependem de voto.

    Pq o Gilmar Mendes , que continua como Presidente do Supremo, e tb leva essa faca aos colegas, sem qualquer reação ? Muito esquisito isto.

    Aliás, nossa política, incluindo os Egrégios (que tb se tornaram políticos), anda muito esquisita, fornecendo material suficiente para que cheguemos à conclusão de que os acontecimentos atuais não passam de uma GRANDE CONSPIRAÇÃO, que os vira-latas brasileiros são incapazes de,  sozinhos darem conta do serviço de tamanha invergadura.

    Pena que talvez eu já não esteja mais aqui p/ presenciar a verdade, quando finalmente ela for descoberta.

  5. clamor

    O “clamor das ruas” bem escrito entre aspas pela nossa comentarista Lenita, é coisa que nâo existe naturalmente. O clamor das ruas é produzido na cabeça da boiada pelo PIG, globobo à frente. Isso porque não há canal contraditório, tendo os existentes cancelado o direito de defesa através da convocação de pinicaços. 

    Com a massiva campanha contra o PT , a quantidade de divulgação de “qualquer lixo serve” contra o PT é de se estranhar que o pais ainda não tenha entrado em convulsão social. A coisa é tão sufocante que quem discorda corre riscos sérios.

    Como, de outra maneira, explicar que simpáticas velhinhas corocas de cabelino azul, expectadoras das novelas e frequentadoras de novenas carreguem cartazes lamentando o não enforcamento de uma senhora de mais de 60 anos que não cometeu nenhum crime e por acaso é a presidenta do pais? 

  6. Ué, achei que era o STF que

    Ué, achei que era o STF que estava com a faca no pescoço do Moro. Até ontem todos aqui davam como certo que ele seria retirado da Lava Jato.

  7. ÉFeitiço contra o feiticeiro

    Ontem ainda, o STF sorria na ação penal 470 o “mensalão”, pois tinha o apoio da midia, para fazer o que quisessem com seus réus.

    Hoje percebem que esta ajuda da midia tem um preço amargo. Agora, são vassalos da midia. A midia não só da poder, como cobra que o poder seja exercido apenas quando e como ela quiser.

    E seria tão fácil quebrar esta escravidão. Bastaria, que os Ministros, ou melhor ainda, o Congresso, aprovasse uma lei obrigando o Supremo a votar em sigilo e conduzir em sigilo qualquer processo, longe dos olhos da mídia. Aí a serpente ficaria cega.

    Mas parece faltar um louco para fazer isto e liderar uma frente anti midia.

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