Só o político pode salvar o economista, por Delfim Netto

Jornal GGN – Em sua coluna no jornal Valor Econômico, o economista e ex-ministro Antonio Delfim Netto aborda a relação entre política e economia, dizendo que o caminho para a construção de uma sociedade civilizada não é econômico, e sim político. “Como levá­-la [a sociedade] a escolher o caminho mais virtuoso que exige sacrifício e paciência?”, questiona. Para ele, a situação econômica é “um problema sem solução” porque a organização política é “trágica”, com um “presidencialismo de coalização em que a presidente nem assume o seu protagonismo, nem se coaliza” e com um Congresso que se ocupa de propostas que ignoram o interesse nacional e que gastam energia em “um sinistro retrocesso civilizatório”. 

Do Valor

Só o político pode salvar o economista

por Antonio Delfim Netto

Temos insistido que a economia é uma disciplina na qual se enfrentam sempre os mesmos problemas. O que muda são suas soluções, de acordo com a ampliação do entendimento de como funciona o sistema econômico; dos avanços da psicologia, que mostra que o homem é um bicho mais complicado do que costumava ser, que no seu processo decisório combina, em graus diferentes, a “razão” e a “emoção”; de como se manejam os novos instrumentos analíticos de que se dispõe para simplificar (e entender) essas decisões e de como se aproveita o ensinamento da história, que vai acumulando os efeitos das soluções fracassadas.

O reconhecimento da complexidade que domina a interação dos indivíduos, imersos numa sociedade na qual emerge uma certa ordem “espontânea” e que pode produzir “emergências” (a quebra de todo “equilíbrio”), está impondo um comportamento cada vez mais humilde ao economista. Este torna­se perigoso quando é portador de uma “ciência”, ou de uma “ideologia”, que recusa os resultados da organização social a que chegamos pela seleção histórica e que combina, de fato, ainda que imperfeitamente, uma certa liberdade de iniciativa, uma crescente igualdade e uma relativa eficiência produtiva, que levaram 20 ou 30 nações do mundo ao nível de bem­estar de que dispõem hoje. Acredita que o homem e a sociedade, na qual ele vive, responderão mansamente aos seus desígnios (o que a história demonstra que nem o poder “absoluto” é capaz de produzir).

Isso deveria nos ensinar duas coisas: 1) que o caminho para a sociedade civilizada é conhecido. É longo e pedregoso. Percorrê-­lo exige paciência e persistência. Raramente admite atalhos que não sejam adaptar soluções que os que estão na frente conseguiram com sucesso; e 2) que é preciso respeitar a história, a geografia, as restrições físicas e os conhecimentos acumulados pela disciplina econômica ao longo de séculos, além de prestar atenção às novas respostas (sugeridas pelo esforço teórico) às velhas questões que nos acompanham.

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Redação

9 Comentários

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  1. ADULTO

    Delfim usou bem as palavras. E matou logo no começo quando “Para ele, a situação econômica é “um problema sem solução” porque a organização política é “trágica”, aí parei.

    Quando diz que Dilma não assume seu protagonismo, é um mero palpite. Talvez não corresponda às suas expectativas, mas pra mim, ela tá fazendo direitinho muito mais além do que esperava. Claro, que vejo isso olhando pra política macro e de longo prazo, e em destaque o Social da sociedade brasileira.

    “-Política é tudo!” dizia um professor da faculdade;

    Quando percebi isso, virei adulto.

  2. Curto, grosso… e tolo

    É recorrente o “discurso” da imaturidade da democracia, ou do sistema político que aqui a imita, com pouco sucesso, como causa dos nossos problemas econômicos (sem solução, então, antes de que a República fique “velha”?).

    Balela! As soluções estão aí e estão online! O que nos atrapalha não é a “história”, mas sim a cultura da pilhagem, a apropriação indébita do público pelo privado e, também, o imenso apego dos péssimos políticos nacionais pelo protagonismo, reinventando a roda todas as vezes que vão montar uma carroça.

    Também atrapalha, e muito, a verdadeira diarréia legislativa que são capazes de produzir (caudalosos rios da mais pura merda todos os dias) e o inexplicável desapreço pela estabilidade jurídica que nos é característica, a partir do absoluto desprezo, da própria Justiça, pelos contratos civis.

    Querem crescer como, agindo assim?

  3. Política
    Ele diz que política é tudo, e eu concordo plenamente, mas logo em seguida nega a política. O embate está acontecendo e os agentes estão desempenhando seu papel neste ataque nazista da mídia e seus associados.
    Estes sim, negam a política, inclusive o jornal onde escreve.
    Um juríciário inocente, para dizer o mínimo, que ataca partidos e libera delatores mentirosos e se liga ao pig criminoso, é o desastre político, e econômico atual. E tem que ser vencido pela política a duras penas. E está sendo vencido, a duras penas, mas está.
    Economista…

  4. O Delfim Netto que vai entrar

    O Delfim Netto que vai entrar para a história:
     

    “Criação, em São Paulo, da Operação Bandeirante (OBAN), um organismo misto formado por oficiais das três Forças e por policiais civis e militares, programada para combinar coleta de informações, interrogatórios e operações de combate. A Oban foi financiada por empresários paulistas e executivos de empresas multinacionais: Ultragaz, Ford, Volkswagen, Supergel, Copersugar – que se reuniram com o então ministro Delfim Netto num encontro organizado pelo banqueiro Gastal Vidigal, dono do Banco Mercantil de São Paulo, e estabeleceram um sistema fixo de contribuições.”

    Schwartz, L; Starling, H. Brasil: uma biografia. São Paulo: Cia das Letras, 2015.

    1. Pois é, quando alguém que

      Pois é, quando alguém que disse a pouco tempo que não se arrepende de ter assinado o AI-5 fica falando na necessidade de mudar a politica, sinto calafrios na espinha…

    2. Collingwood,
      Desculpe a

      Collingwood,

      Desculpe a sinceridade, mas esse tua inscrição é ociosa. Quem minimamente letrado, em especial os que vivenciaram as décadas de 60,70 e 80, desconhece a biografia do ex-ministro? Mesmo os da geração atual tem a dispor toneladas de fontes para “beberem” acerca da vida e obra do economista Delfim Netto. 

      Retrucar com uma ad hominem uma argumentação instigante como a que ele faz nesse artigo é jogar pela janela uma ótima oportunidade de enfrentá-lo no campo das ideias. 

      Entenda: não o censuro. Apenas lamento a perda de oportunidade para um debate do tema com foco no presente e no futuro, e não  em épocas que, merce das tragicidades, nada acrescentarão em termos concretos.
       

      1. JB, taís sendo justo.

        JB, taís sendo justo. Resgatar o debate é essencial. Poucos fazemos isso, agimos mais como cães de Pavlov, ao vislumbrar um suposto “iminigo” começamos a salivar.

         

  5. Não há menor dúvida que ele tem razão,

    Afinal isto é o que tem sido cobrado insistentemente da Dilma, uma atuação política. Não esta política de grêmio de escola infantil, onde o principal ator, se esconde atrás de um mal ajambrado Republicanismo.  Tivesse ela mellhores conselheiros, tivesse ela ouvidos para ouvir e cabeça para meditar,  as coisas seriam diferentes.  Deixasse ela desta impulsividade para sair fazendo coisas que lhe vem à telha, falar o que quer, sem pensar nas conseauências políticas do que fala.  Enfim, tivesse ela a capacidade para fazer Política maiúscula, capacidade para colocar no Ministério da Justiça uma pessoa firme, realmente republicana, que defendesse que a lei vale realmente para todos, que coibisse firmemente os abusos, que fosse um ator e não um estúpido esperando que seja acionado para agir mal e porcamente, estaria o Brasil noutro astral bem melhor.  

  6. Penso que o ponto de apoio da reforma é fora da política

    Está nas mentes dos representantes legais, que têm de comprar a idéia que a Astrologia, Tarot e Geometria trarão ordém e eficiência para a administração pública, produzindo o que eles mais querem, riquezas a serem apropriadas e reeleições ou seus suscedâneos mais modernos para sí ou seus protegidos.

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