Maira Vasconcelos
Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).
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Javier Milei assume a presidência dia 10 de dezembro

Milei afirma uma agenda ultrareacionária que inclui choque fiscal, privatização irrestrita e repressão a protestos, “se aplicará a lei”.

Javier Milei assume a presidência dia 10 de dezembro: “os primeiros seis meses serão muito duros, o ajuste virá de qualquer maneira”

por Maíra Vasconcelos, Especial para Jornal GGN

Mauricio Macri venceu como estrategista e um dos principais condutores de Milei ao cargo de presidente, ao liderar o movimento de aliança da direita com os libertários.

Poucas horas após o triunfo e vitória contundente, no último domingo, 19, com 55,7% dos votos, a maior vitória em um segundo turno, desde a redemocratização, o novo presidente eleito Javier Milei reafirmou algumas medidas de seu governo, como a privatização da petrolífera YPF e de meios de comunicação como a agência de notícias Telam, a maior da América Latina, a Rádio Nacional e a TV Pública argentina. Em sua primeira entrevista após os resultados do segundo turno, o extremista libertário afirmou que “tudo o que possa estar nas mãos do setor privado, estará nas mãos do setor privado”. O chamado “pai das privatizações” menemistas, durante o governo do ex-presidente Carlos Menem (1989-1999), Roberto Dromi, hoje, é assessor de Milei. O libertário é o único político, desde então, a reivindicar o menemismo. Num programa de notícias do canal de televisão C5N, ainda que seja um veículo alinhado ao governo, um titular dizia que nos próximos meses a Argentina viverá uma espécie de “menemismo 2024”. Mas essa alusão aos anos 90 também traz à tona as memórias da pior crise argentina, das últimas décadas, a “crise de 2001”.

No que diz respeito ao atual governo, entre idas e voltas, Sergio Massa confirma que seguirá à frente do Ministério da Economia, após derrota do peronismo nas urnas, com 44,3%. No mais, além de um café da manhã entre Alberto Fernández e Javier Milei para alinhar a transição de governo, a agenda pública está voltada ao que poderá suceder de hoje até o dia da assunção de Milei, dia 10 de dezembro, além dos anúncios sobre a nova gestão extremista  dos libertários. Principalmente, se haverá ou não uma corrida cambiária, quer dizer, uma disparada do dólar em relação ao peso argentino, como alguns haviam previsto. Mas o atual governo tomou medidas para conter o câmbio, ao menos, até a assunção do novo presidente.

Entre suas últimas declarações, ontem, em uma entrevista de pouco mais de 25 minutos, concedida ao consultor e analista econômico Manuel Adorni, Milei afirmou que aplicará “um forte ajuste fiscal para pagar a dívida”, disse, “os primeiros seis meses serão muito duros, o ajuste virá de qualquer maneira”. Milei propõe que “a política pague o ajuste”, quer dizer, se supõe que haverá recortes na estrutura estatal, privatizações, além de aumento nas tarifas de transporte, água, gás e luz. “Se não fizermos o ajuste fiscal, vamos entrar em hiperinflação, 95% de pobres e 70/80% de indigentes. Se você quiser gastar mais: hiperinflação e 95% de pobres. A Venezuela fez isso. Quando enfrentou a mesma situação, o Equador dolarizou, multiplicou os salários por 10 e exterminou a inflação”. Milei afirmou que o ajuste não será gradual, será um ajuste de choque.

Sobre os possíveis protestos e manifestações como resposta aos ajustes previstos pelo novo presidente eleito, o entrevistador ponderou a Milei, “você sabe que a Argentina é um país muito complexo nas ruas, e a rua históricamente foi do peronismo e, muitas vezes, essa rua tem sido perseguida com violência”, ao que o libertário respondeu que “se aplicará a lei e não me deixarei extorsionar”, concluiu, assim, deixando um claro recado ao peronismo, que sabe o que significa esse uso da lei.

A redução dos gastos públicos é a prioridade do seu governo. “O equilíbrio fiscal não está em discussão, o ministro que gaste a mais, eu despido”, afirmou em entrevista. Por outro lado, o governo eleito ainda não mencionou nenhuma política de contenção, após a aplicação do ajuste anunciado. Nas últimas horas, e no dia seguinte ao pleito, apesar de que foi feriado na Argentina, também houve alguns anúncios de ministérios. Considerando que Milei irá reduzir o número de ministérios para menos da metade, cumprindo assim com parte do que prometeu em campanha. Serão eliminados os ministérios da educação, saúde, cultura, entre outros. Essas áreas estariam reunidas em um só ministério chamado Ministério do Capital Humano. 

Milei afirmou que irá recortar também o setor de obras públicas, mesmo aquelas obras que já foram licitadas, e afirmou que o setor privado é que deverá terminá-las. “As obras podem ser entregues ao setor privado e eles terminam,  nós não temos dinheiro”, disse, reafirmando que irá seguir o modelo chileno, que não está totalmente claro como será, onde o setor privado conduz a área de obras públicas. 

No que diz respeito ao Brasil, fala-se sobre a possibilidade de que Daniel Scioli, atual embaixador da Argentina no país, continue ocupando o cargo, pois, além de ser um político que poderia servir a ambos lados partidários, Scioli, que também foi vice-presidente (2003-2007), conseguiu manter as relações estáveis durante a gestão de Jair Bolsonaro (2019-2022). Milei convidou o ex-presidente Jair Bolsonaro para a cerimônia de posse, e foi ventilado na mídia que o presidente Lula da Silva enviaria o vice Geraldo Alckmin para representar o país. Há uma atenção especial às relações entre o governo Lula e o futuro governo do extremista Javier Milei, pois o libetário insultou o presidente brasileiro em diversas ocasiões, além de considerar que o Mercosul deve ser “reformado”, após amenizar suas falas sobre o bloco, e essas posturas prometem, então, um novo capítulo nas relações bilaterais.

Maíra Vasconcelos – jornalista, mora em Buenos Aires, publica artigos sobre política argentina no Jornal GGN, desde 2012, e cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. 

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Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).

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