A política indigenista e a eleição de 2014, Por Marcelo Zelic

 
O candidato Aécio Neves, em campanha no Mato Grosso do Sul, falou aos jornalistas e aliados, tucanos e ruralista, sobre um dos temas pouco discutidos e dos mais escondidos desta campanha. O PSDB propõe repetir o General Figueiredo que adotou, com o “Grupão”, modelo semelhante para gerir a política indigenista na ditadura e que, como tem apurado a Comissão Nacional da Verdade nestes últimos dois anos, não resultou em boa coisa aos índios e à história do país.
 
Aécio defendeu que mais órgãos além da Funai atuem nas questões indígenas, mostrando o quanto incoerente é a posição de Marina Silva que tinha neste tema um dos pontos programáticos de sua negociação para embarcar na campanha tucana.
 
“Para o candidato, as comunidades indígenas precisam de apoio social, saúde de
qualidade e segurança. “Há uma omissão clara no governo federal nessa questão que não
haverá no nosso governo. [As comunidades indígenas] precisam de outro tipo de garantia
que permita que eles vivam adequadamente com os seus valores, com as suas tradições e
com a sua cultura”.
 
“O que pretendo é envolver nessa questão não apenas a Funai [Fundação Nacional
do Índio], mas outros órgãos do Estado, tanto do governo estadual como, por exemplo, a
Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária], que podem ajudar a dar a essas
regiões também ou a essas comunidades tranquilidade para que possam ter uma renda, que
possam viver com saúde, possam viver em segurança”1
 
É leviano, para usar um termo muito usado nesta eleição, o que Aécio Neves, Marina Silva e a nova direção nacional do PSB pretendem fazer neste ponto “programático”, pactuado para “agregar valor ao camarote” da candidatura do PSDB, jogando para galera com um dos conflitos sociais mais agudos e violentos, vivido pela maioria das etnias brasileiras em nossos dias, num total desrespeito à condição de cidadão do índio brasileiro.
 
Tucanos, marineiros e o PSB representam um retrocesso, um passo atrás, pois apresentam a mesma proposta feita pelo Ministério da Justiça e combatida pelos índios ao longo do governo Dilma, tripudiando assim sobre a luta e resistência do movimento indígena e seus apoiadores.
 
Sobre o envolvimento da Embrapa, por exemplo, o Ministro José Eduardo Cardoso já havia recuado em 2013, mediante a pressão dos índios mobilizados em Brasília e também por ter sido alertado em ofício da 6ª Câmara do Ministério Público Federal, que encaminhou estudo que recebeu via representação, sobre a vinculação efetiva desta empresa com a bancada ruralista do Congresso, mostrando análise do volume de recursos recebidos pela EMBRAPA através de emendas parlamentares de Deputados Federais e Senadores ruralistas, podendo configurar conflito de interesse para as pretensões do estado brasileiro de acolher opinião desta instituição sobre as demarcações de terras indígenas.
 
A inoperância do estado na demarcação de terras indígenas e do reconhecimento de seus direitos, gerou nos últimos 11 anos mais mortos que os reconhecidos atualmente nos 21 anos da ditadura militar. Segundo relatórios do CIMI de 2003 a 2013 pelo menos 616 indígenas foram assassinados no país e em sua grande maioria vítimas de conflitos gerados no contexto da luta por suas terras e do respeito à sua cultura e direitos.
 
Estive na PUC e pulei com a presidenta Dilma pois meu voto não é tucano, mas não podemos deixar de reconhecer, que os povos indígenas, estão incluídos naqueles casos retratados no jingle em que “o que não está bom tem de melhorar” e que junto com muitos cidadãos e cidadãs temos cantado nas ruas e praças, nos colocando em campanha em 2014, para o avanço da democracia e dos direitos humanos em nosso país, acreditando na construção deste processo de transformação iniciado em 2003 com a eleição do presidente Lula.
 
A proposta do PSDB, desrespeita as posições públicas tomadas ao longo dos governos Lula e Dilma pelas organizações indígenas, indigenistas e de direitos humanos, apresentadas inúmeras vezes à Presidência da República, Ministério da Justiça, Congresso Nacional, MPF e na Justiça, atual gargalho e desculpa para a não demarcação de suas terras e cortina de fumaça para a retirada de direitos através de mesas de diálogos. Neste tema a nova política que Marina Silva e o PSB propuseram ser incorporada ao programa do PSDB e Aécio expôs a síntese dos entendimentos à sociedade na coletiva de imprensa em Campo Grande é o atraso do atraso, é somente mais do mesmo, é proposta contra os índios brasileiros, é portanto um passo atrás.
 
Na ótica do respeito aos direitos humanos, no começo do ano alertamos que não se troca direitos indígenas por acordos eleitorais, a derrota de Gleisi Hoffmann no Paraná, recebendo 881.857 votos, portanto muito menos do que os 29,50% obtidos quando foi eleita senadora com 3.196.468, demonstra que a sociedade quer coerência e universalização de direitos para todos, onde o pouco caso com os direitos de uns, põe em cheque a confiança sobre a conduta do candidato frente aos demais direitos de todos. A diminuição de sua base eleitoral ao trair com a paralisação das demarcações de terras no Paraná e no sul do país, sem dúvida contribuiu para a percepção para aqueles que nela votaram em 2010 de que não é bom jogar com o direito alheio.
 
Na questão indígena o voto em Dilma, se expressa em parte na posição do Freixo sendomais um veto a Aécio, que uma concordancia com Dilma, voto expresso também em solidariedade à luta do movimento indígena como o voto do PSOL, membros de coletivos e de militantes indigenistas e de direitos humanos, desiludidos com a política destes últimos 4 anos.

Outra parte é voto de confiança de que Dilma e o PT mudem a orientação da atual política indigenista, fortalecendo a FUNAI, afinando prioridades e demarcando terras, ampliando os limites do que é possível e não ceder ao agronegócio, desenvolvendo políticas públicas que incluam as pautas das retomadas e protestos realizados pelo movimento, considerando os interesses dos índios nas discussões sobre a reforma politica e incluindo os povos indígenas definitivamentee incluindo os povos indígenas definitivamente neste ciclo de mudanças que vivemos no Brasil. 

 
A continuidade das investigações iniciadas pela Comissão Nacional da Verdade, o desenvolvimento de mecanismos de reparação coletiva às violências vividas pelos povos indígenas entre 1946­1988, o reconhecimento de seus direitos e o esclarecimento destes à sociedade são pautas de direitos humanos que se somam às apresentadas pelo movimento indígena brasileiro, onde destaco a demarcação de suas terras, o atendimento pelo Estado a sua saúde, a proteção de seus territórios e cultura, bem como o desenvolvimento de uma real representação nos poderes da república, para fazer valer uma efetiva escuta aos povos indígenas do Brasil sobre projetos de desenvolvimento e mineração que venham a atingi­los.
 
Dia 26 voto 13 em respeito aos povos indígenas e o faço como um voto de confiança numa proposta de um Brasil Sem Miséria e para Todos, na esperança de que não será possível continuarmos com uma política indigenista que fique mais quatro anos no mesmo patamar do proposto pelo PSDB. Confiando que em um novo governo Dilma, a presidenta não desconsidere a formulação de idéias novas também para a inclusão dos povos indígenas na onda do Muda Mais Brasil que esperamos sair vitorioso das urnas.
 
 
*Marcelo Zelic é vice­presidente do Grupo Tortura Nunca Mais­SP, membro da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo e Coordenador do projeto Armazém Memória
 
 
 
1 Agencia Brasil ­ Aécio defende mais órgãos além da Funai nas questões indígenas:
http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2014­10/aecio­defende­mais­orgaos­alem­da­funai­envolvidos­nas­questoes­indigenas parte da fala encontra­se em Tv Campo Grande ­ SBT: : https://www.youtube.com/watch?v=pnjUpfxBcLQ a partir de 1:18.
2 Ver entrevista à revista Forum: http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/10/marcelo­freixo­vou­votar­na­dilma­segundo­turno/
3 O caso dos indígenas é um pouco mais complexo, porque nós estamos falando de diversas culturas, falantes de diversas linguagens e que tem sistemas políticos diferenciados também, internamente às aldeias, enfim, eles têm uma outra lógica cultural, porém, entendendo também que os indígenas estão na vida política nacional, tem as suas reivindicações, estão organizados em associações, o ideal é que eles estivessem um pouco mais representado aí. Em 25.919 candidaturas apenas 83 se autodeclararam como indígenas, é um número extremamente baixo. Citação feita em Perfil dos Candidatos da eleição de 2014 ­ subrepresentação de negros indígenas mulheres desafio à democracia de Carmela Zigone: https://www.youtube.com/watch?v=xifUZEOPHoQ
 

 

Redação

2 Comentários

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  1. Fui um dos que não votaram na

    Fui um dos que não votaram na Gleisi por causa da tentativa dela de retirar da FUNAI a decisão nos casos de demarcação de terras.

    A derrota dela foi merecida. Ela é um retorcesso, assim como os donos do agronegócio no Brasil.

     

    Dilma 13 para corrigir o que está errado. E a política indígena do governo federal está errada.

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