Os riscos da nova expansão dos Institutos Federais (IFs), por Medeiros & Faria

O problema é que em relação ao déficit orçamentário crônico dos campi da rede dos IFs, nada tem sido dito, feito ou planejado.

Ricardo Stuckert/PR

Os riscos da nova expansão dos Institutos Federais (IFs)

por Rodrigo Medeiros e Luiz Henrique Faria

Conforme foi divulgado recentemente pela imprensa, o governo federal anunciou a construção de 100 novas unidades de Institutos Federais (IFs), prevendo a criação de 140 mil novas vagas na rede, a maioria de ensino médio integrado ao técnico. O Nordeste será a região mais favorecida, com 38 campi, seguida pelo Sudeste (27) e o Sul (13). Cem novos IFs serão construídos sobre as perdas inflacionárias acumuladas pelos servidores públicos da educação federal desde o governo Temer (2016-2018), que foi o vice escolhido para a ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

De acordo com o Ministério da Educação (MEC), serão investidos R$ 3,9 bilhões para a construção dos IFs e melhorar os que já existem. O problema é que em relação ao déficit orçamentário crônico dos campi da rede dos IFs, nada tem sido dito, feito ou planejado. Esse problema está presente há pelo menos dez anos em muitos campi da rede. Ademais, há vagas ociosas na rede e necessidades diversas de reestruturação de cursos em um contexto no qual o estudo foi desvalorizado no mercado de trabalho. Não se pode negligenciar o fato de que ocorreram erros, além de interesses políticos, no dimensionamento e na localização de muitos campi.

Segundo Fernando Canzian, em matéria publicada na Folha de S.Paulo, no dia 4 de setembro de 2023, “os últimos dez anos foram trágicos em termos de renda e qualidade de empregos para os brasileiros que se esforçaram para estudar mais, terminar o ensino médio ou ingressar na faculdade”. A matéria citou uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV), que teve como base os dados do IBGE.

Quem estudou mais perdeu até 16,7% nos rendimentos nos últimos dez anos. Também houve um aumento da informalidade para esse grupo. Os resultados da pesquisa, segundo Canzian, “revelam uma economia que cria predominantemente empregos de baixa qualidade e pouco produtivos”. Tal fato, ainda de acordo com os resultados da pesquisa, “empurra os mais escolarizados para vagas que pagam menos e que são, cada vez mais, informais – comprometendo o crescimento potencial do país”.

O Novo Arcabouço Fiscal (NAF), por sua vez, prevê que o governo buscará superávits primários de 0,5% e 1% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2025 e 2026, respectivamente. No entanto, a economia brasileira não cresceu a partir do terceiro trimestre de 2023 e a taxa de investimento (FBCF) caiu. Portanto, com um baixo desempenho da economia, a elevação do custeio da rede dos IFs deverá ser “paga” com o aprofundamento da precarização das carreiras dos servidores públicos da educação federal e a deterioração das condições de trabalho nos campi.

Para quem estiver interessado em maiores detalhes analíticos sobre o histórico da expansão dos IFs, recomendamos a tese de doutorado da professora Cíntia Tavares do Carmo, cujo título é ‘Rede federal de educação profissional no Brasil: a trajetória de expansão de uma política pública’ (2016), documento defendido no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Sociologia Política da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf). Como síntese, a professora avaliou que “surgiram fatos e variáveis decorrentes do processo de formulação e implementação dessa política, que levaram a se compreender como se faz de uma política pública (policy) uma política (politic)”. A problemática da relação entre o avanço da expansão da rede e a sua capilaridade para o atendimento de municípios politicamente vinculados à base governista emergiu na pesquisa.

Rodrigo Medeiros e Luiz Henrique Faria são professores do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes)

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Rodrigo Medeiros

20 Comentários

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  1. OS IFETs surgiram em 2007, a partir de proposta de Haddad para reordenar a estrutura de CEFETs criada por Paulo Renato após a reforma do ensino técnico de 1996-97. Até 1997, haviam 5 CEFETs (MG, PR, RJ, BA e MA). Paulo Renato expande a denominação, sem lhes dar autonomia e estrutura. O MEC de Haddad, então, impõe a estrutura de IFET, centralizados na SETEC, sem a mesma autonomia que os CEFETs MG e RJ possuem. A SETEC tudo controla, até mesmo o modelo de página de internet é equivalente. A SETEC impõe controle de ponto de docentes, impõe alta carga horária, impõe modelos de cursos (preferencialmente concomitância externa, mitigando a existência de cursos técnicos médios na modalidade integrada). Impõe a criação de cursos de licenciatura e cursos de tecnólogos. Na prática, expande e acelera a reforma do ensino técnico realizada por FHC/Paulo Renato, segundo o modelo do Banco Mundial.

    Com a expansão, a categoria docente EBTT (Ensino básico técnico e tecnológico) se torna, é certo, uma das maiores em termos de contingente, no Serviço Público Federal (SPF), provavelmente tendo hoje quase que o mesmo número de docentes que a categoria de docentes do magistério superior. Os recursos para a atual expansão, é certo, seriam aqueles que poderiam ser usados para a melhoria das condições atuais de trabalho, especialmente os salários. A categoria docente hoje tem os mais baixos salários de entrada e teto de todo o SPF (para mesmo nível de formação e mesma carga horária e vínculo de trabalho). Mesmo um professor titular-doutor, com pelo menos 20 anos de carreira e produção científica, posição que é o teto da carreira, recebe um salário que é menor que o salário de entrada de auditores ficais da receita (R$22921,71 para os auditores e R$22377,72 para os professores titulares doutores). Em 15 meses de governo, o ministro Camilo nunca recebeu para audiência as representações sindicais de docentes para qualquer tipo de diálogo, assim como a ministra Esther também não recebeu, apesar de ser docente da UFRJ.

    1. Interessante, não sabia de nada disso.
      Não existe no Brasil uma forma dos IF’s, possuir uma entidade ou algo do tipo como um braço para desenvolver e vender tecnologias e conhecimento como forma de obter lucros para reverter para suas próprias instituições?
      Imagino ser uma forma positiva de fazer isso.

      1. Existe mas são uma minoria, que eu conheço talvez que exerça isto é o IFSC. Existe outros IFs que conseguem gerar recursos próprios mas o excedente é obrigado depositar pra união, e algum produto que sobra serve para algum escambo com empresas para atender demandas cotidianas para o funcionamento do Instituto afim de contornar o burocrático e lento sistema de aquisição de bens e serviços.

    1. 22 mil, meu caro, é o salário bruto, sem descontar contribuição previdenciária e imposto de renda. Esse é o primeiro ponto. Ademais, você atinge esse salário apenas no topo da carreira, se chegar a ser professor titular. Não são todos os docentes que vão atingir esse topo da carreira.

      O que o colega está comparando é o salário INICIAL da carreira de auditor, que só exige o título de graduação, com o salário FINAL da carreira de um professor da rede de magistério superior (no caso dos IFET’s em geral dando uma quantidade absurda de aulas, o que impede de se fazer projetos de pesquisa e extensão), onde vai se exigir que o camarada tenha graduação, mestrado, doutorado… e por aí vai.

  2. No Brasil, a educação só evolui através da criação de problemas! Apenas boas ideias e pensamento lógico não cria raízes. Não é política de Estado e sim de governos. Vida que segue.😁

  3. É se não existisse os IF, não teriam professor travando, nem aluno estudando. É o Bozo que causou um desastre na saúde e Educação, foram 6 anos 2 do Temer e 4 do Bozo, além de não construírem nada, atrasou, desmontou lascou com a educação do começo só fim.. Avança Democracia.

  4. Resumindo o texto não adianta abrir mais unidades pois quem estudou perdeu mais nos últimos dez anos, tô voltando pra cama e não vou estudar mais nada da qui dez anos acordo mais rico e quem sabe já diminuíram o número de escolas ….

    1. Não, meu caro… a coisa não é por aí. A questão é que: 1) hoje, pelo menos, não há recursos para se bancar mais cem novos institutos federais. O montante de 4 bilhões de reais sequer será suficiente para a implantação dessa estrutura. Se implantar, já vai começar sucateada, com problemas para cursos que exijam bons laboratórios, por exemplo. Montar, você monta… mas a montagem é precária e com pouco tempo os problemas começam a aparecer; 2) A rede hoje possui uma quantidade absurda de vagas que estão ociosas, com cursos que foram abertos sem levar em conta demandas regionais ou mesmo nacionais. Dos que entram, boa parte acabam deixando os cursos e vão embora. Nesse cenário, é importante pensar em reestruturar o que já existe, mantendo o funcionamento com qualidade e fazendo com que a estrutura atual não fique sub-utilizada.

  5. Sem dúvida a educação foi precarizada e não houve nenhuma política educacional durante os governos Temer e Bolsonaro. As universidades e institutos federais sofreram com isto. No Brasil sempre que há uma expansão pipocam críticas dos que já estão no sistema de ensino superior, seja porque temem ser afetados por isto seja porque acham que na educação devemos prestar mais atenção nas planilhas do que ousar com um futuro, sempre incerto. Todos defendem que a saída para o país é a educação, mas muitos não acreditam realmente nisto. Todos apresentam dados contestáveis. No momento depois de um ataque destruidor que a educação sofreu é natural sempre se perguntar se o objetivo e quase sonho de tornar o país uma terra de pessoas capacitadas criativas e geradoras de coisas novas cabe no nosso bolso e na nossa economia. Logo aparecem os que acreditam que a educação e o conhecimento nasceu para ser submisso a um mercado gerido por uma classe que jamais ousou, e que acha que tecnologia é um objeto de consumo e não um objeto da criação. Não poderemos jamais esperar que nossa burguesia que jamais fez sua revolução industrial possa abraçar a educação e a pesquisa. Temos que continuar fazendo o que sempre fizemos, insistir e ousar. Criar institutos é ousar.

  6. Em São Paulo há uma gradução em LÍNGUA PORTUGUESA, num cenário já repleto de graduados em letras. Nem uma carga horária mínima de inglês (língua imperialista que cubanos desavisados dominam bem), daí dá pra ver o bom planejamento da rede.

  7. Hoje vi um vídeo de LULA, pedindo desculpa a Brizola, por parte do PT ter sido contra os CIEPS, estou vendo isso agora, ninguém fala do plano safra que financiam o AGRO milionário, ninguém fala do financiamento partidário, ninguém fala dos 29 bilhões só em 2023 pagos a viúvas e filha de militares que não se casam, a hipocrisia invadiu a mente de pseudo economistas cegos ou vesgos de desenvolvimento do povo, se calem, estão no mundo da lua do mercado, estudem história das nações desenvolvidas.

  8. Obviamente que o investimento em escolas técnicas recoloca o brasil do neocolonialismo do agro, na rota de países industrializados e que agrega valores aos rodutos.

  9. O bolsonarismo odéia quaquer iniciativa, que tenha à haver com educação, cidadão esclarecido ñ participa de atos como o 8 de janeito, cidadão esclarecido não aceita passagens de onibus grátis para ir em manifestações na Av Paulista.

  10. Todos os problemas apontados no artigo advém da estagnação econômica e da paralisação dos investimentos do BNDES em setores que sofisticam a cadeia produtiva. Sendo retomada a política de industrialização, precisamos desse forte investimento em ensino tecnológico, do contrário em pouco tempo o pessoal vira o disco e vem com a ladainha do “tá faltando engenheiro e mão de obra qualificada no mercado” (música para os ouvidos da classe trabalhadora, derrubaram uma Presidenta da última vez que isso aconteceu).

  11. Cumpanhêro, vamo abrir mais 100, 200 ifes, aí a galera vota em nóis…
    “Mas, aí vai acabar com a credibilidade dos ifes, pq não temos planejamento “
    Q nada cumpanhêro, aí nóis já ganhamo… hehe!

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