A trapalhada de conter matança nos presídios com força militar, por Arnaldo César

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Tanques de guerra subiram no Vidigal em 2011

Por Arnaldo César

Temerosa trapalhada

Do blog do Marcelo Auler

Qualquer recruta recém-chegado no quartel sabe que o Exército não é força de contemplação. Ao contrário. Trabalha sobre a lógica da eliminação de alvos e de inimigos. Quem já passou por uma escola militar, certamente, já ouviu a história da velinha e uma criança de colo que estão cruzando uma ponte prestes a ser dinamitada por um grupamento militar.

Aos iniciantes pergunta-se: o que fariam numa situação dessas? Aguardariam a senhora e sua acompanhante a completar o trajeto e depois executariam a missão? Antes de levarem uma bronca do instrutor todos optam por dar uma chance à dupla. A lição é que a destruição terá que ser feita não importando quem esteja dentro o próximo do alvo.

Essa história de caserna é corriqueira. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, e o presidente golpista Michel Temer parecem desconhecê-la por completo. Talvez, se soubessem não teriam colocado a principal força militar do País numa roubada de tamanha envergadura: conter matanças em presídios.

 
Em novembro de 1994, aoocupar o Morro do Borel, na Tijuca (RJ) o Exército deixou um rastro de pessoas torturadas e ainda desmontou o Cruzeiro que a Igreja tinha colocado no alto da comunidade, achando que era coisa dos traficantes. Diuas depois, na Câmara Federal, o ministro do Exército, Zenildo Lucena, desculpou-se na Câmara Federal quando cobrado pelo deputado Miro Teixeira.

Em novembro de 1994, ao ocupar o Morro do Borel, na Tijuca (RJ) o Exército deixou um rastro de pessoas torturadas e ainda desmontou o Cruzeiro que a Igreja tinha colocado no alto da comunidade, achando que era coisa dos traficantes. Dias depois, na Câmara Federal, o ministro do Exército, Zenildo Lucena, desculpou-se na Câmara Federal quando cobrado pelo deputado Miro Teixeira.

No final de 1994, o recém-eleito governador do Rio, Marcello Alencar – temendo a escalada da violência no Estado que ia comandar – não se conteve e pediu a intervenção das Forças Armadas. Como era o desejo dele, as favelas foram sitiadas, em novembro daquele ano, nos estertores do segundo governo de Leonel Brizola (na verdade, quem ocupava a cadeira no Palácio Guanabara, naqueles dias, era o vice Nilo Batista).

As incursões nos morros receberam os nomes de: “Operação Rio I e II”. Foi um tremendo fracasso. Depois se repetiram nos anos 2000 para a implantação das UPPs. Por muita sorte, não se registraram confrontos sangrentos. Embora inocentes tivessem sido torturados e se registrassem muitas trocas de tiros. A captura de armas, drogas e de bandidos seguiu o mesmo padrão do que vinha sendo realizado pelas forças policiais locais.

"Resta torcer para que os militares não saiam (das operações nos presídios) mortos ou humilhado". Em novembro de 201o um soldado do Exército foi ferido quando a tropa ocupou o Morro do Alemão (Zona Norte do Rio)

“Resta torcer para que os militares não saiam (das operações nos presídios) mortos ou humilhado”. Em novembro de 201o um soldado do Exército foi ferido quando a tropa ocupou o Morro do Alemão (Zona Norte do Rio)

O coronel PM, Jorge da Silva, um dos pioneiros do estudo da violência nas grandes metrópoles , analisou os resultados desta aventura do tucano Marcello Alencar. Em 1995, recorda Silva, o número de homicídios no Estado do Rio bateu o recorde ao atingir  8.348 ocorrências. A bandidagem, depois da presepada de colocarem canhões mirando para favelas, saiu mais fortalecida do episódio. Se eram 3 mil, em 94, no ano da ‘Operação Rio”, em 95, já somavam 5 mil bandidos em armas.

Duas das instituições de maior credibilidade do País – o Exército e a Marinha – saíram humilhadas daquela encrenca. Já se passaram 23 anos da desastrada experiência e a lição não foi absorvida. Resta torcer para que os mil militares que serão mandados para colocar ordem nos presídios comandados pelo PCC e FDN não saiam de lá mortos ou humilhados.

Temer joga para a plateia ao convocar Exército para enfrentar crise nos presídios (Reprodução Brasil 247)

Temer joga para a plateia ao convocar Exército para enfrentar crise nos presídios (Reprodução Brasil 247)

Todo mundo já disse e escreveu que o usurpador Temer e seus jacarés amestrados não são os únicos responsáveis pelas cabeças cortadas e corações arrancados da mais recente crise da segurança pública brasileira. A coisa vem de longe. Do fim da ditadura para cá todos os governantes tiveram oportunidade atacar o problema. O fizeram com paliativos.

O pendular Temer está conduzindo a questão ao seu modo. Numa hora, minimiza as carnificinas nos presídios chamando-as de “acidente”. Depois, recrudesce prometendo mandar o Exército. E, muito provavelmente irá recuar, quando os amotinados do PCC e demais organizações criminosas direcionarem seus facões para os pescoços dos soldados.

Assim como na liberação (e agora contenção) dos créditos do FGTS, o atarantado Temer joga para a plateia. É oportuno lembrar que não está sozinho nesse picadeiro.

Ao encontrar-se com Temer, no sábado (07/01) a ministra Carmem Lúcia anunciou o censo nos presídios: "É muita desmoralização! Nem o número de pessoas encarceradas a presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça sabe ao certo".

Ao encontrar-se com Temer, no sábado (07/01) a ministra Cármen Lúcia anunciou o censo nos presídios: “É muita desmoralização! Nem o número de pessoas encarceradas a presidente do STF e do Conselho Nacional de Justiça sabe ao certo”.

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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

7 Comentários

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  1. a….

    Interessante o que é Politica. Onde está o povo dos Direitos Humanos, que ainda não acusaram o Brasil, junto à ONU de Crimes Contra a Humanidade? Será que certos governos de centro-esquerda, certas figuras inclusive do Judiciário, devem ser preservadas, mesmo diante de tamanho genocídio?  Chacinas quase diárias em SP, investigação alguma, doenças medievais sem prevenção do Estado, barbárie sem controle em decapitações diárias em presidios brasileiros. Ainda está faltando algo? 30 anos do Politicamente Correto exercido por figuras ditas perseguidas politicas sob a direção de uma nova Constituição. Nada como um dia após o outro. Na falta de vocabulário mais diversificado, não encontro  palavra melhor para adjetivar estes últoimos 30 anos: Mediocridade.    

    1. a segurança publica e a poltica

      Fala coragem cívica para que se enfrente a questão da segurança pública. Não precisa ser especialista na área para entender o que se passa no Brasil e, é assim, com pioras e melhoras, sem mudar a essência, há séculos.

      De um lado temos uma sociedade que busca compensação e reparação, não importa bem do quê, se do criminoso, dos efeitos do crime ou se pela mera satisfação de ver alguém ser punido. A publicidade aos açoites e execuções que antigamente era feita para reunir a multidão em praça pública, proclamando data, hora e a que tipo de martírio o malfeitor seria submetido, foi substituída pela televisão e, mais recentemente, conta com a internet.

      Independente da forma com que se manifeste a mentalidade é a mesma. De um lado as pessoas são satisfeitas na sua necessidade de descarregar frustrações de toda a ordem, seja como for, e, de outro, a ideia de que o crime é erradicado pela força da lei e da ação de polícia prevalece. Tal conjugação de fatores leva à política de encarceramento em massa e de desumanização daqueles que cometem crimes ou disso são acusados. Isso, por seu turno, justifica o abandono em que as pessoas que “entram” nesse sistema são submetidas e elimina a responsabilidade de todos pelo que ocorre. O vácuo de responsabilidade vai desde o promotor que, pela falta de provas causada por uma investigação mambembe, acusa com base em “convicções”, ao juiz que condena com base nessa acusação, não raro atuando como agente suplementar ao Ministério Público, passando pelas autoridades responsáveis pelo sistema prisional, até alcançar o agente penitenciário no chão da cadeia. Todos colaboram para atulhar o sistema carcerário e para mantê-lo em condições medievais e ninguém se importa.

      Quando a “coisa” alcança o ventilador e respinga em toda a sociedade assistimos a um surto de “indignação moral” e a sucessivas promessas e planos de correção. Isso dura apenas o tempo necessário para que o assunto perca o interesse e tudo volte a ser como antes.

      Investimentos em segurança pública que não sejam em efetivos, veículos, equipamentos e tecnologia de vigilância, para os políticos, é muito pior do que investir em saneamento básico, cujas inversões por se assentarem em ações de educação da população, melhoria da qualificação técnico-operacional das instituições e em obras de infraestrutura abaixo da terra que por não serem ou não estarem aparentes, não dão votos. Já, os investimentos que seriam necessários para tratar a segurança pública corretamente não saem e não sairão tão cedo porque isso implicaria, não somente em não conquistar votos, mas, com certeza, em perdê-los. Investir em segurança pública, para alterar os paradigmas e parar de “enxugar gelo” exigiria uma radical mudança da mentalidade atual nos 3 poderes, em todos os níveis da Federação e nas pessoas.

      Qualquer um que pense que, desta vez, será diferente será, novamente, frustrado. Resolver esse problema não é responder a emergências. Todo o sistema judiciário na área penal teria de ser repensado e modificado e ninguém, seja político, governante, parlamentar ou membro do judiciário, juiz, procurador ou promotor fará nada até que tal reengenharia aconteça. Quando? Nem o diabo sabe.

       

       

  2. As operações tem tudo para dar errado.

    Só um exemplo, um blindado sobe o morro, dois traficantes atiram contras ele, em resposta o blindado responde com uma .50.

    O que acontece?  Certamente os traficantes serão mortos e com eles mais umas 40 pessoas na vizinhança!

    1. Não conta para ninguem

          Como o MinDef Jungmann e o Michel publicaram que as FFAA somente realizariam “varreduras” nos presidios, o Exército e a Marinha ( CFN ) responderam a esta ordem da forma como militares entendem o que significa “varredura”, uma operação técnica de engenharia de combate ( analise, detecção, supressão de artefatos não condizentes com o local ), portanto estas tais “equipes” serão oriundas destas unidades, basicamente as que receberam tanto equipamentos como treinamentos especificos, anteriormente realizados para a Copa do Mundo/2014 e Olimpiadas/2016.

            Só que somados os especialistas do EB com os do CFN, não exsitem meios para “30 equipes”, alem do que é uma ação ( de acordo com a visão militar ) publicitária, pois é obvio que os reclusos ao saberem de antemão que seus pavilhões serão vistoriados, vão esconder em outros locais qualquer arma, celular, notebook..etc, o “pavilhão” estará “limpo”, alem do que em certos presidios, para esvaziar uma ala/pavilhão, a PM tem que negociar com antecedencia.

             Esta portaria “temerosa” é pura pirotecnia.

             P.S.:  Em seu exemplo, o “blindado” reage com seu armamento organico ( .50 ), em cobertura, mas a “resposta” começaria com um 60mm.

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