Bolsonaro, um Salazar brasileiro, por Ana Sá Lopes

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Jornal GGN – O jornal português Público, em seu editorial, focou nas semalhanças entre o que se inicia hoje no Brasil e a ditadura de Salazar. Diz que o novo presidente brasileiro traz oficialmente para a pauta toda a cartilha da ditadura portuguesa: ódio às ideologias, religião como parte do Estado, defesa dos valores ultraconservadores, horror aos ‘vermelhos’. 

No editorial a afirmativa de que os discursos de Bolsonaro prenunciam o pior. As declarações de Bolsonaro de colocar fim à ideologia de gênero dão o toque moderno àquilo que saiu da pauta portuguesa em 1968. E, tal qual, Bolsonaro subiu ao poder com forte apelo populista e um prenúncio de volta às cavernas.

Diz que a democracia do Brasil é extremamente jovem, mas que, lamenta o editorial, democracias jovens também podem morrer.

Leia o Editorial a seguir.

do Público

Bolsonaro, um Salazar brasileiro

por Ana Sá Lopes

Bolsonaro traz para ideologia oficial do Brasil tudo aquilo que foi a cartilha da ditadura portuguesa, o mesmo ódio às “ideologias”, a religião como parte do Estado, a defesa dos valores das famílias ultraconservadoras, o mesmo horror aos “vermelhos”.

Os dois discursos que ontem Jair Messias Bolsonaro fez na tomada de posse prenunciam o pior. Já sabíamos, evidentemente, desde o início da campanha, mas o capitão reformado entendeu não desiludir quem o elegeu para o cargo de Presidente do Brasil. O elevado grau de aprovação com que Bolsonaro chega ao Planalto é, evidentemente, um susto para quem defende a liberdade e a democracia no sentido ocidental do termo. 

Para nós, portugueses, assistir ontem aos discursos de Bolsonaro, trouxe reminiscências dos discursos de um homem que saiu do poder em 1968, embora isso tivesse acontecido por doença: Oliveira Salazar. Bolsonaro traz agora para ideologia oficial do Brasil tudo aquilo que foi a cartilha da ditadura portuguesa, o mesmo ódio às “ideologias”, a religião como parte do Estado, a defesa dos valores das famílias ultraconservadoras, o mesmo horror aos “vermelhos”.

Há uma frase que não poderia nunca ter sido usada durante a ditadura, porque naquele tempo a expressão “ideologia de género” era desconhecida, mas é todo um programa: “Vamos unir o povo, valorizar a família, respeitar a religião, a nossa tradição judaico-cristã, combater a ideologia de género, conservando os nossos valores. O Brasil voltará a ser um país livre de amarras ideológicas”. A ideologia dos que são “contra os políticos” foi expressa por Salazar na sua época – aliás, a sua ascensão ao poder e o golpe de 20 de Maio de 1926 tiveram, como tem agora Bolsonaro, um esmagador apoio popular. 

Tudo naquela cerimónia de posse foi um monumento à tragédia anunciada: o discurso do número 2, o general Hamilton Mourão, foi um regresso às cavernas que o povo aplaudiu em delírio; o fim do discurso de Bolsonaro, quando ergue a bandeira brasileira em conjunto com Mourão e grita: “Esta é a nossa bandeira, que jamais será vermelha, só será vermelha se for do nosso sangue derramado para a manter verde e amarela”.

Bolsonaro vem preencher um anseio profundo da população, o da segurança seja de que maneira for. “Temos o desafio de enfrentar a ideologia que descriminaliza bandidos, pune polícias e destrói famílias, vamos restabelecer a ordem no país”, disse ontem, já depois de ter prometido liberalizar o acesso às armas. O anseio da “ordem” também foi o que levou Salazar ao poder. A democracia brasileira é demasiadamente jovem, mas também as democracias jovens podem morrer. 

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

10 Comentários

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  1. “Mas não sê tão ingrata!
    Não

    “Mas não sê tão ingrata!

    Não esquece quem te amouE em tua densa mataSe perdeu e se encontrou.Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal:Ainda vai tornar-se um imenso Portugal!” Que não se cumpra a profecia e viremos uma Portugal de Salazar.

  2. bom post

    Mas há diferenças, também. 

    Salazar já era professor universitario em Coimbra quando foi chamado pela primeira vez.

    Tinhum um bom curriculum.  Pelo menos no inicio  mostrou desapego ao cargos demitindo-se quando contrariado.

    Depois tomou gosto pelo poder,

    Desconfiava enormemente das grandes potencias inclusive os EUA. Entendia que elas, com razão, conspiravam para acabar com o imperio portugues na Africa.

    Estou aqui com uma bibilografia do Salazar, só preciso tomar coragem para ler as 800 paginas…

  3. Historicídio

    1968 é passado. O futuo, agora, é 1500.

    Descobrimos que não houve ditadura, ou ditadura suficiente, no Brasil; tampouco houve escravidão ou, se houve, foi culpa dos negros que – africanos – apresavam outros negros para abastecer o tráfico dos brancos, hoje absolvidos; o que mais virá: nós nunca maltratamos negros – foram eles, os feitores, escravos eleitos entre escravos para açoitar outros negros seu verdadeiro flagelo.

    E os Senhores doces como rapadura.

    Hoje eleitos por brancos quase escravos de tão úberes sob aplausos de negros sem memória nem cor nesse engenho dourado chamado Brasil!

  4. A comparação parece forçada.

    A comparação parece forçada. Nada mais diferente do que as biografias de um e de outro. Salazar nunca foi eleito,

    tinha atitude e postura de monge, professor de economia, dirigiu um Pais pequeno, de economia simples e pobre,

    em meio a grandes conflitos continentais nos quais ele conseguiu ficar neutro, nada que se pareça com Bolsonaro.

    1. Salazar “casado com a pátria” ?

      Salazar “casado com a pátria” e avesso às mulheres, parece que não. criação para efeitos da propaganda.
      Os “casos” de Salazar começam, logo aos 16 anos, com Felismina Oliveira, menina que o levou a deixar o seminário. Seguem-se Júlia Perestrelo, a menina rica que tinha explicações com o homem de Santa Comba Dão, e Maria Emília Vieira, uma astróloga que andava a cavalo no Chiado, frequentava cabarets e tinha relações bissexuais. No fim, surge a aristocrata Carolina Asseca que esteve quase a casar com o ditador.
      Sem esquecer a incontornável governanta Maria e a jornalista francesa Christine Garnier.

       

  5. Bolsonaro é um novo Salazar
    MINHAS ESPERANÇAS
    Têm cheiro: cravo;
    Têm cor: vermelha e
    Têm data: 25 de abril.

    MINHAS AÇÕES
    Têm dogma: a ciência;
    Têm religião: a verdade e
    Têm uma certeza: a luta.

  6. Erraram por pouco. É do outro lado da fronteira.

    O esteriótipo é Franco,  com o franquismo, regime de tipo conservador, de cunho religioso e anticomunista.

    1. Diria eu

      Diria eu mezzo-Salazar-mezzo-Franco. Mas estão lá todas as grandes características internas do bolsonarismo: a rejeição completa à modernidade (chamada de “marxismo cultural”, não por acaso ligada à Revolução Francesa e a volta a um mundo religioso pré-moderno (mesmo que, no caso dos neopentecostais, tenha a capa moderna das pregações eletrônicas); o autoritarismo mais rudimentar; a guerra ao diferente… está tudo lá.

  7. Nota de reparo:
    Os 65% de aprovação do Bozo, assim como o escasso público que compareceu a sua posse, são bem inferiores aos números equivalentes obtidos pelos quatro governos petistas.

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