Deleuze, Cinema e o Estado Novo, por Rogério Mattos
“O que constitui a imagem audiovisual é uma disjunção, uma dissociação do visual e do sonoro, ambos heautônomos, mas ao mesmo tempo em relação incomensurável ou um “irracional” que liga um ao outro, sem formarem um todo, sem se proporem o menor todo. É uma resistência oriunda do arruinamento do esquema sensório-motor, e que separa a imagem visual e a imagem sonora, mas integrando-as, mais ainda, numa relação não totalizável. Marguerite Duras irá cada vez mais longe nesse sentido: centro de uma trilogia, Indian song estabelece um extraordinário equilíbrio metaestável entre uma imagem sonora que nos faz ouvir todas as vozes (in e off, relativas e absolutas, atribuíveis e não-atribuíveis, todas rivalizando e conspirando, se ignorando, esquecendo, sem que nenhuma tenha a onipotência ou a última palavra), e uma imagem visual que nos faz ler uma estratografia muda (personagens que mantêm a boca fechada mesmo quando falam do outro lado, tanto assim que o que dizem já está no passado composto, enquanto o lugar e o acontecimento, o baile na embaixada, são a camada morta que encobre um antigo estrato ardente, outro baile em outro lugar). Na imagem visual descobre-se a vida sob as cinzas ou por trás dos espelhos, assim como na imagem sonora se extrai um ato de fala puro, mas polívoco, que se separa do teatro e se arranca à escritura. As vozes “intemporais” são como quatro lados de uma entidade sonora, que se defronta com a entidade visual: o visual e o sonoro são perspectivas abertas sobre uma história de amor, ao infinito, a mesma e, no entanto, diferente“. (DELEUZE, Imagem-tempo, 2007 (Brasiliense), p. 303-4)
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