Mais espaços e representatividade para a mulher na política, por Rosa Neide

Frente à disputa estabelecida em torno do relatório sobre as mudanças no Código Eleitoral Brasileiro, se faz necessária a unidade das mulheres para que não haja retrocessos

Ilustração: Reprodução

por Rosa Neide* 

Recentemente, os resultados eleitorais para a Assembleia Nacional Constituinte do Chile surpreenderam positivamente, com uma renovação significativa e uma vitória expressiva de mulheres, que pela primeira vez ultrapassaram os percentuais de paridade, vindo a ceder espaço para os homens.

Entretanto, infelizmente, os bons ventos que sopram em países da América Latina se dispersaram antes de alcançar o Brasil. Aqui, enquanto os movimentos feministas e de mulheres que atuam nos partidos desenhavam propostas de avanços no campo da representação política feminina, nos subterrâneos se gestava um profundo retrocesso no âmbito da reforma política em debate no Congresso Nacional.

Frente à disputa estabelecida em torno do relatório sobre as mudanças no Código Eleitoral Brasileiro, se faz necessária a unidade das mulheres para que não haja retrocessos. As ameaças estão voltadas à retirada da obrigatoriedade de candidaturas femininas e do correspondente financiamento.

Ninguém mais do que nós, mulheres que atuamos dedicadamente à política, sabe das limitações presentes nas ações afirmativas estabelecidas pela legislação eleitoral nos últimos 25 anos no Brasil. Mas sabemos também que sem estes marcos legais jamais teríamos alcançado uma representação de dois dígitos nos poderes legislativos. 

É preciso destacar que este processo de ampliação da presença de mulheres nos espaços de poder político no País é muito recente.  A legislação só passou a ter efetividade a partir de 2009, por meio da Lei 12.034/2009, que estabeleceu a obrigatoriedade do preenchimento do percentual mínimo de 30% de candidaturas de mulheres nas chapas proporcionais.

A lei estabelece também percentual de 5% do Fundo Partidário para investimentos em mulheres e o mínimo de 10% de programas de propaganda partidária gratuita destinada a elas. Na sequência, Resolução do TSE de 2014 desencadeou uma fiscalização mais rigorosa das medidas, aplicando sanções aos partidos pelo seu descumprimento.   

 Mas o avanço mais significativo se deu às vésperas das eleições de 2018, com o julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5617) pelo Supremo Tribunal Federal. A Suprema Corte estabeleceu que o artigo 9° da lei garante a igualdade na distribuição dos recursos, definindo que o recém-criado Fundo Especial de Campanha Eleitoral destinasse 30 % mínimo dos recursos às candidaturas femininas, bem como a observância da mesma regra no uso dos recursos do Fundo Partidário, quando aplicado em campanhas eleitorais.

Essas medidas mais recentes fortaleceram as cotas e demonstraram o seu potencial de efetividade no País. Nossas representações se ampliaram significativamente nas eleições de 2018 e 2020, além de apresentarem a diversidade das mulheres brasileiras elegendo muitas jovens, negras e LBTs, entre outras. Mesmo assim,900 municípios não elegeram sequer uma vereadora.

 Não aceitaremos retrocessos. Queremos que permaneça garantido o percentual mínimo obrigatório de 30% de candidaturas de mulheres nas chapas e a obrigatoriedade do percentual de recursos do Fundo Eleitoral destinados às candidaturas femininas, de forma proporcional ao número de candidaturas.  Além disso, nós mulheres, junto com aliados e defensores de uma sociedade mais justa e igualitária, devemos desafiar o Congresso Nacional a ousar, ao estabelecer a reserva de cadeiras nos poderes legislativos de todos os níveis, alcançando a paridade. 

Segundo o Instituto IDEA – Institute for Democracy and Electoral Assistance, e do IPU –União Interparlamentar, 26 países já possuem este tipo de medida, sendo que destes 20 estabelecem cotas mínimas de 20% a 1/3 dos assentos.  Em 2019,quando as primeiras propostas de reservas de vagas foram apresentadas no Congresso Nacional, entre elas uma de autoria da presidenta do PT, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR), o Brasil figurava na 108ª posição no ranking do IPU. Atualmente nosso país está na 142ª posição.

 Somos a maioria da população e do eleitorado; portanto, o que propomos está fundado em princípios básicos de justiça. Somos uma maioria excluída. Sabemos do longo caminho a ser percorrido para que alcancemos no Brasil uma democracia mais efetiva, e temos certeza de que ela só será substantiva com a presença das mulheres nos espaços de representação e poder político. 

*Rosa Neide é deputada federal (PT/MT) e segunda coordenadora-adjunta da Secretariada Mulher na Câmara dos Deputados

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