Armando Coelho Neto
Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.
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Notas confusas sobre Foucault, Stalin e Sérgio Moro, por Armando Coelho Neto

Notas confusas sobre Foucault, Stalin e Sérgio Moro

por Armando Rodrigues Coelho Neto

Estudiosos da filosofia do Direito enxergam a lei como instrumento da coexistência pacífica em sociedade – tanto quanto possível. A pena para um infrator da lei teria, em tese, função preventiva. O Estado (como tal organizado e de cunho abstrato) é em si uma abstração sem espírito anímico/humano. Portanto, o estado não odeia, não pode odiar e sob seus fios invisíveis vivem o cidadão. Por mais reprovável que seja a conduta de um ser, sob império do Estado, a pena para o infrator não é vingança. Eis uma grosseria síntese do que diz Foucault, aceita pelo mundo civilizado.

O problema é quando o privado confunde-se com o público e o Estado começa a odiar, se distorcer. Na a euforia do filme Tropa de Elite, até eu e minha falecida esposa fomos vítimas da truculência da assassina Polícia Militar de São Paulo, cuja “tropa de elite” resolveu prejudicar a concorrência entre três vendedores de sorvete. O alvo foi aquela onde havia cidadãos de pele escura e o assunto foi parar na corporativista Corregedoria PM/SP. Claro! A exemplo de outras denúncias, acabou dando em nada. Prevaleceu o espírito de aceitação da síndrome do Capitão Nascimento.

Vivemos tempos de ódio, muito ódio – da maçonaria aos grupos fechados de delegados da PF; das rodas de empresários aos churrascos periféricos nas lajes afora. São tempos de pós-Aécio (o Aqueronte que aliou a todos os ódios – do fundamentalismo religioso a homofobia, do fascismo a xenofobia, reforçado pelo preconceito de cor, origem, orientação sexual, reencarnação de bruxas e fogueiras medievais). Eis o contexto no qual se desenrola a Farsa a Jato, ora com feições de “Mãos Limpas de Nove Dedos”, ora com ares de boca de urna, ora com a face do direito penal do inimigo.

O Estado está odiando, gerando perplexidades, controvérsias. Por exemplo, o testemunho de Eike Batista (20/05/16) só deu margem a prisão do ex-ministro Guido Mantega dias atrás, quando sua esposa estava num centro cirúrgico em São Paulo. A bisbilhoteira PF, que criminosamente fuçou telefonemas da presidenta Dilma Rousseff (Fora Temer!) “nada sabia” sobre a saúde da Senhora Mantega. Mais cruel que a intimação do filho de Lula, às altas horas, no dia do aniversário deste. Tão repudiante quanto o “convite coercitivo” do juiz Sérgio Moro para Lula, na sua concorrência com o MP/SP.

A Farsa Jato é o ódio fabricado pelo coronelismo eletrônico que levou o povo para as ruas gritar “Somos Todos Cunha”, a serviço de um golpe de estado. Em clima de vingança privada seus próprios oficiantes tentam impor a ideia de que o problema do Brasil é Dilma/Lula/PT, ao invés de consequência.

Eis o clima propício para sentenças de dois minutos. O mesmo ódio que levou a 4º Vara Federal/DF a impedir que Lula se tornasse ministro, quatro minutos antes desse pedido entrar no sistema da JR/DF. De outro giro, como o que vale é a prova admitida em Direito e não meras “convicções”, um juiz do Guarujá/SP aceita uma ação de cobrança de condomínio do real proprietário do tríplex, que Moros e Marinhos dizem ser do Lula, enquanto a mídia insufla o “crime de turba”, que se move a ódio intenso e difuso!

E assim, Eduardo Cunha foi preso.  Sem algemas ou escarceis, como devem ser tratados os bandidos de estimação ( muitos “sim senhor” e “por favor”). Preso após coagir seu bando ao golpe, aprovar projetos de interesse da Fiesp e Judiciário, depois de dar posse ao impostor (Fora Temer!), entre outros mistérios. Mas… Qual o fato novo? Preso para falar ou para calar? Enquanto isso, um projeto de anistia para seus principais crimes está em curso no Congresso Nacional.

O Capitão Nascimento inspirou síndicos de prédio, porteiros de boates, entregadores de comanda de padarias, aeromoças e bedéis. Todos viraram autoridades. A Farsa Jato segue o mesmo caminho, com efeitos legisferantes –   virou poder derivado e originário. Escrivão de polícia, jornalistas, operadores de triagem nos prontos socorro… todos legislam, todos se permitem subjetividades em detrimento da objetividade inexorável e inerente ao Estado de Direito. Enquanto isso, cenas de ódio e ódio e violência se multiplicam nas redes sociais.

Tropa de Elite, a pretexto de combater o crime, transformou torturadores em heróis e a Farsa Jato segue o mesmo caminho. Eis as notas confusas de minha imaginária conversa com Stalin,  Sérgio Moro…

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

Armando Coelho Neto

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.

14 Comentários

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  1. Palavras de ex-DPF que conhece as entranhas da PF, do MP e do PJ

    Prezados,

    Em relação aos artigos de Armando Coelho Neto cabe a nós leitores reconhecer e admirar a coragem e espírito público demonstrados por ele, colocando-se contra o espírito de corpo, que acoberta as ilegalidades criminosas dos PFs, como vemos na Fraude a Jato, em especial na SR/DPF/PR. Seria interessante se Armando fosse mais incisivo, apontando casos onbjetivos de ilegalidades e crimes cometidos por policiais federais, procuradores do MP e juízes, como sérgio moro.

    1. Armando Coelho Neto

      Caro João de Paiva:

      O autor do texto, S. Armando  Coelho Neto já nos presta

      mais do que relevantes serviços com suas informações

      corretas e acuidade política. Pedir-lhe que ponha as

      mãos na lama e nos aponte nominalmente os meliantes

      é pedir-lhe demais.  Seus textos não se prestam a isso.

      Há tempos se antevê que ele não tem a mínima vocação

      para X9.  Creio já nos bastar a coragem de sua exposição.

      1. Entendo tua crítica, mas não concordo com ela.
        Prezado Walter Araújo,

        Quem delata normalmente é o criminoso apanhado e contra quem há provas da prática criminosa; ele lança mão do expediente da delação, entregando outros que façam parte da organização criminosa, na expectativa de ter a pena reduzida. Não é isso que’ cobro’ de Armando Coelho Neto; o que peço a ele é que denuncie os integrantes da PF que ele sabe terem cometido crime. E Armando deve conhecer muitos; e deve ter muitas provas. Denunciar atos criminosos de policiais federais, mesmo tendo sido um, não é se portar como X9, mas sim como cidadão com espírito público, de bem servir ao País.

        Apesar de discordar de ti, respeito teu ponto de vista.

        Saudações.

  2. Não enxergo ódio nem nos que

    Não enxergo ódio nem nos que bancam e promovem, nem nos que bolam e nem nos que executam essas sacanagens atualmente no Brasil. Mas, são sacanagens que geram ódio, e provávelmente essas sacanagens são lançadas com esse objetivo, principalmente. Consigo enxergar um cidadão que, com um pedaço de pau cutuca o osso de um cão que o esta roendo. O cão rosna, e chega até a atacar, babando, o pedaço de pau. Nesse quadro, a pessoa que que cutuca são os que executam a sacanagem, que são várias figuras que todos conhecemos bem, e que ocupam esse papel nos meios da imprensa, da política, das polícias, dos jurídicos etc… O cão raivoso representa os que são ameaçados com a retirada do osso que representa suas conquistas e seus status quo. O pedaço de pau são os cidadãos usados para serem os culpados pela mexida no osso e para receberem as mordidas. Falta aí a figura dos que promovem, onde podemos ficar a vontade para advinhar e, o certo é que quando atingem seus objetivos, sem um pingo de ódio continuam promovendo sarcásticamente, rindo e se divertindo com o quadro formado com as pessoas que executam, com os cães raivosos bravos com seus ossos cutucados bem como pelos pedaços de pau atacados.  

  3. ”O mesmo ódio que levou a 4º

    ”O mesmo ódio que levou a 4º Vara Federal/DF a impedir que Lula se tornasse ministro, quatro minutos antes desse pedido entrar no sistema da JR/DF.” Fico  a imaginar ao grau que chegaram  a ansia , a sede de sangue, nos minutos que  antecederam estes quatro antes  que a ordem fosse dada.

    Mas o povão  já não acreditava no sistema judiciário mesmo . E a classe mérdia ainda fasz de conta qwuer não sabe. Até um filhinho seu cair nas malhas do “O Processo”…

     

  4. O Sr. Armando Rodrigues

    O Sr. Armando Rodrigues continua iluminando nossas mentes com textos lúcidos e perspicazes. Ele é uma pérola rara em uma instituição falida e corporativa, cuja as competências constitucionais minguaram para um único objetivo: Fora Lula!

  5. Boa!

    Pena que a maioria de brasileiros ainda não saiba pensar por conta própria. Culpados disto são vários, mas o que podemos fazer para reverter essa situação de analfabetos políticos? Infelizmente perdemos a oportunidade com um governo federal progressista que esqueceu de traçar estratégias realmente civilizatórias. Não bastou dar o peixe e a ensinar a pescar. Esqueceram de ensinar que o peixe dado ou pescado vem de um rio que deveria ser irrigado pela participação popular, pela democracia de fato. Agora pagamos o preço. Mas, convenhamos que pouco fizemos na prática. Faço mea culpa: apenas digitar e participar de blogs progressistas não resolve nada. Por isso nesta última eleição municipal participei mais ativamente, diretamente com um vereador ligado às causas sociais. Felizmente foi eleito, apesar de toda campanha contra e difamatória que sofreu.

  6. o bem e mal, disputa eleitora

    o bem e mal, disputa eleitora de curitiba mostrou que lava jato é seletiva, dois candidato que são de direita, estão mostrando os podres de um do outro de até  vinte anos atras,  a PF nunca viu nada,, Mpf  tambem não,  pergunte cade o moro. chacarra de atibaia  o cafe pequeno.  

    1. Trecho…

      SegundoSegundo o entrevistado, os parlamentares estão com medo dos juízes e promotores. Sugeriu uma espécie de chantagem corporativista! 

      São os tempos!

  7. Coitado do Foucault! Em que companhias o título o pôs!

    Ele deve estar se virando na tumba, rs. (Sei que o espírito do texto nao foi igualar Foucault aos outros, mas o título o pôs ligado aos outros por coordenaçao, que, segundo as gramáticas, une coisas da mesma natureza e funçao…)

  8. Devemos lembrar que Lula só

    Devemos lembrar que Lula só foi impedido de ser ministro porque ele é um dos poucos políticos no Brasil (possivelmente o único) que tem capacidade para desatar os nós e tirar o país da crise em que está. Ele foi impedido justamente porque iria resolver a coisa e, dessa maneira, adiar o golpe. E hoje ele é o único que pode tirar o país da crise em que está, sendo perseguido pelos mesmos motivos. A elite brasileira é mesquinha e, no limite, suicida. Premia Cunha, Temer e outros políticos medíocres e descarta aquilo que o país tem de melhor. Historicamente a conta a ser paga por essa cegueira vai ser muito alta.

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