O machismo grassa e não tem graça, e irrita feministas

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Enviado por Gunter Zibell

Da Carta Capital

O que as feministas não aguentam mais ouvir

Aposentadoria, alistamento militar obrigatório, ingresso mais barato na balada – isso não é privilégio, é machismo

Por Nádia Lapa

O feminismo é pauta constante em conversas, na mídia, na mesa do boteco. E, como muita gente não reconhece o movimento como legítimo, de bases históricas, de militância incansável e estudado  na academia, repetem absurdos a respeito do tema. Acham que o senso comum resolve. Ignorância ou má fé? Não sei, mas o primeiro dá para resolver – tem um monte de livros bacanas, blogs interessantes (inclusive esse aqui!) e perfis no Twitter que falam de feminismo o tempo todo.

Mas sempre que chega alguém “novo” no rolê, a pessoa faz questionamentos pueris, quase nunca com o desejo de saber mais. A intenção – nota-se pelo tom da voz – é “desmascarar esse tal feminismo“.

Eu prefiro desmascarar as falácias.

1) Feminismo é contrário de machismo.

Bom, quem diz isso ainda está na fase “feminismo para dummies”. Machismo é um sistema patriarcal, institucionalizado, de opressão de um gênero sobre o outro. Feminismo é um movimento que visa a igualdade e, mais do que isso, desafia esse sistema. Há muitos feminismos, e cada um deles propõe uma forma de acabar com o machismo. Há anarcafeministas, feministas radicais, feministas liberais, e por aí vai. Tem quem queira repensar o capitalismo, tem quem lute pelo empoderamento da mulher sem mexer nas estruturas do capital. Mas basicamente feminismo e machismo não são nada similares.

2) Por que mulher se aposenta antes? Nessa hora ninguém reclama!

Sim, reclamamos, mas não lá, aos 60 anos.

Reclamamos antes, pela “obrigação” de lavarmos a louça, tirarmos a toalha molhada da cama, varrermos o chão e esfregarmos a privada que você usou. Na divisão sexual do trabalho, as mulheres exercem a atividade mais mal remunerada do mundo: cuidar da casa. Mal remunerada porque simplesmente não é remunerada.

Segundo a Pesquisa Nacional de Domicílios (Pnad), do IBGE, mulheres gastam 23,9 horas da semana cuidando de afazeres domésticos, enquanto os homens ficam com apenas 9,7 horas. Em alguns estados, a diferença é ainda mais gritante: na Paraíba, mulheres gastam 27,8 horas semanais cuidando da casa; os homens, 10,6 horas. É quase o triplo.

A pesquisa abrange moradores acima de 10 anos de idade. O resto é só matemática. Se a jornada de trabalho normal no Brasil é de 40 horas semanais e a mulher trabalha em casa, sem remuneração, por 24 horas por semana, no fim do ano ela trabalhou 1.147 horas, enquanto o homem, apenas 465. Multiplique pelos anos até a aposentadoria, e aí você saberá a razão da diferença.

Você conhece algum casal que compartilha as tarefas domésticas? Ótimo. Por enquanto, eles são a minoria da minoria. Quando isso for a regra, e não a exceção, não tenha dúvida: a idade para aposentadoria da mulher vai aumentar (ou você acha mesmo que o governo quer deixar de receber as contribuições e já começar a pagar?).

Importante apontar, também, que 93% das crianças e adolescentes envolvidos em trabalho doméstico no Brasil são meninas.

3) Por que vocês não lutam pelo alistamento militar obrigatório?

Essa parte, confesso, me faz rir.

Por que alguém lutaria por uma obrigação?

Nem precisaria explicar depois disso, mas sou insistente: as mulheres (não necessariamente feministas) lutam para fazer parte dos quadros das forças armadas. Os Colégios Militares, por exemplo, só aceitaram alunas mulheres depois da Constituição Federal de 1988. Até hoje concursos simplesmente não aceitam mulheres. Leis e ações judiciais, como esta do Ministério Público do Distrito Federal, tentam reverter isso.

Além disso, existem feministas – como eu – que são contra o militarismo. Outras são a favor de que seja voluntário para homens e mulheres.

4) Feminista até paga menos na balada/pagar o motel/chegar a conta.

Mulheres pagam menos na balada porque são usadas como iscas. Homens heterossexuais não costumam gostar de ir para festas onde “só tem marmanjo”. Isso é machismo, não feminismo.

Sobre o motel, realmente muitas mulheres acham que o homem tem que pagar. Sabem o motivo? Fomos ensinadas de que o cara “aproveitou”, que nós fizemos algum tipo de concessão, sei lá, e que o cara precisa pagar por isso. Isso é machismo, não feminismo. O mesmo vale para a conta.

5) Quem vai abrir potes se vocês acabarem com os homens?

Ninguém quer acabar com os homens, por favor.

E sabemos abrir potes. Tivemos aulas de física e aprendemos que o calor dilata metais. Logo, é só esquentar um pouquinho a tampa que ela vai ficar mais frouxa. Também dá para fazer uma alavanca com a colher. E, vejam só, existem até utensílios que fazem tudo isso por nós.

Como diria Simone de Beauvoir, em tempos tecnológicos, não há que se falar em força física para tarefas normais do cotidiano. A roda já foi inventada. E, putz, que existência desgraçada a de quem acha que sua função no mundo é abrir potes para mulheres indefesas, hein?

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

24 Comentários

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  1. Há tanto a mais do que isso…

    A autora tocou em pontos importantes, mas há bem mais que isso. Por ex., o machismo “natural”, disseminado no “ar” que respiramos: piadinhas idiotas, e até “gentilezas” descabidas, que nos colocam como menores. O que chamo de machismo bocó, diferenciando-o do muito mais grave machismo violento. 

    1. No final ela diz

      que continuará em novo post e também recomenda um artigo de Aline Valek. Parece que isso ficou em nota de rodapé, se seguir o link para o artigo original vai achar.

      A conceituação de ‘machismo condescendente’ foi bem explorada em artigo de Cynara Menezes, que já foi post aqui (não achei o post no GGN, mas no blog original):

      http://socialistamorena.cartacapital.com.br/feministas-contra-o-cavalheirismo-e-machismo-benevolente-ou-nao/

       

       

      1. Nossa, Gunter. Pena que li

        Nossa, Gunter. Pena que li este artigo da Cynara só agora, por sua indicação. Se tivesse lido antes, não teria ofendido tão gravemente uma moça, cerca de uma semana atrás. Sem me dar conta do meu machismo “condescendente”, auxiliei-a a subir uma pesada mala nas escadas da estação Clínicas do metrô de Sampa.

    1. “Quando eu passo você

      “Quando eu passo você olha
       Assobia faz fiu fiu
       Todo dia, toda hora
       Vai pra puta que pariu

       Papo tipo ricardão
       Quer me botar na sua lista
       Ok, comigo não,
       come a capa da revista
       Fiu fiu, fiu fiu

       Na muvuca do metrô
       No abuso do busão
       Lá no bonde, minha avó
       Tira o olho, tira a mão

       Tem cachorra e popozuda na telinha dando ibope
       Comigo não tem papo
       Vai trepar com o laptop
       Então…
       Fiu fiu, fiu fiu”

    2. Excelente, Assis. É esse tipo de coisa q chamo d “machismo bocó”

      E há homens que ainda acham que “homenageiam” as mulheres com esse tipo de idiotice. 

        1. “há muitas que se sentem homenageadas”

          Provavelmente sua mãe, sua mulher, suas irmãs, as mulheres de sua convivência; fala de experiência própria.

  2. viajando na maionese

    Estava, como diz o outro, dando um rolé na internet. Num site de tecnologia norte americano fizeram uma experiência no mínimo exótica.  Os processadores de computador atuais emitem muito calor e todos precisam de um sistema de refrigeração. O sistema mais comum é colocar uma ventoinha com base de cobre sobre a parte de metal do processador. Dessa maneira, o calor emitido passará por contato para a base da ventoinha e esta o dissipará. Mas para haver um bom contato térmico entre a base de cobre da ventoinha e a capa de metal do processador, é necessário usar pasta térmica, uma pasta caríssima (uns R$ 50,00 um pacotinho com 5 gramas), que melhora a transferência de calor entre o processador e o ventilador. Pois é, esses doidos do site descobriram que passar maionese no lugar da pasta faz o mesmo efeito. Passaram maionese no processador e deixaram o computador funcionando por 12 dias, 24h/d. Isso que eu chamo de “viajar na maionese”.

  3. Sinto muito Gunter, mas acho

    Sinto muito Gunter, mas acho que a autora não foi feliz com o texto. A parte de pagar motel e contas, então, é uma lástima. Fomos “ensinadas”? Essa é fraca demais e, a meu ver, coloca as mulheres em condição de vítimas para tudo. Mulheres não pagam as contas porque não querem e não acham que devem pagar. Algumas coisas são simples mesmo.

    Ao final, fala que não precisa de força física para as tarefas normais do cotidiano depois de fazer a apologia do trabalho extra das mulheres em casa. Uma pena, porque poderia ter sido um bom texto.

  4. A economia política é a mais machista das ciências.

    “Na divisão sexual do trabalho, as mulheres exercem a atividade mais mal remunerada do mundo: cuidar da casa. Mal remunerada porque simplesmente não é remunerada”.

    Em todas teorias econômicas modernas, a esfera econômica doméstica é vista como não-economia; simplesmente não abordam com a intensidade merecida e principalidade o assunto, nunca desnvolveram o tema, o máximo que reconhecem é a importância da economia doméstica em sociedades primitivas. O marxismo está aí incluso, podem baixar o pau, mas ele, como todas as demais correntes econômicas, é omisso sobre o tema; viu, ainda vê e saudou a inclusão das mulheres no mercado de trabalho do capitalismo, como inclusão das mulheres no “sistema produtivo”, como se o trabalho doméstico fosse não-produtivo e a mulher dedicada a ele uma alienada e excluída da sociedade. Isso tudo é suprema ironia, pois etimologicamente economia significa as normas do lar, é no lar que se realiza o principal produto e finalidade da economia: a produção do ser humano. Luta-se para que se tenha um salário digno, que dê ao trabalhador quantia para adquirir seus alimentos, suas roupas e obter um lugar onde morar, mas nunca se remunera quem prepara os alimentos, lava suas roupas e mantém sua casa limpa e arrumada; a sonegação desses provimentos é mais-valia retirada da economia doméstica, ou seja, do trabalho das mulheres. Não é à toa que os fundadores de todas as escolas econômicas são homens, que desprezam o trabalho doméstico como não pertencente à economia.

  5. Mulheres:

    Mulheres: 40h*46semanas+24h*50semanas=3040h

    Homens: 44h*46semanas+10h*50semanas=2524h

    E quem decide o serviço de casa? Quem decide que a casa vai ter bibelôs, cortinas, tapetes, etc?

    Quem decide continuar casada com um traste que não ajuda em casa?

    E os solteiros que moram sozinhos? E as mulheres que tem empregadas?

  6. Ou feminismo é luta por

    Ou feminismo é luta por igualdade e deve lutar pelo fim do alistamento obrigatório para os homens ou pela extensão do alistamento obrigatório para as mulheres.

    Ou o feminismo é luta por direitos exclusivamente para as mulheres (o que eu acho perfeitamente legítimo) e continua desqualificando a questão do alistamento obrigatório.

  7. Feminismo?

    Acho curiosa essa questao do trabalho domestico. Se na maioria das casas as mulheres que “cuidam” da casa, sera que tambem nao ha falta de interesse dos homens? Os homens exigem q a louca esteja sempre lavada, a cama sempre arrumada, o banheiro limpo todos os dias, os moveis impecaveis? A maioria dos homens nao faz trabalho domestico simplesmente pq nao se importam com isso, ou se importam muito menos que suas esposas. Eu quero meu carro lavado todos os dias e peco pra minha esposa lavar dia sim dia nao e eu faco o mesmo, eh evidente q ela vai se negar pra q ela iria querer o carro lavado todos os dias? A divisao igualitaria do trabalho domestico essencial eh mais do que justa, agora quando voce diz:

    ” mulheres gastam 23,9 horas da semana cuidando de afazeres domésticos, enquanto os homens ficam com apenas 9,7 horas” O que exatamente isso quer dizer?

    Basta comecar a chutar umas pesquisas irrelevantes do tipo em 90% das residencias quem lava o carro do casal eh o homem, o homem que vai ao mercado em 60% das residencias, ou essa que abre o pote, ou sei la mais o que. Isso eh puro fla x flu cheio de irrelevancias.

    Concordo em algumas coisas do texto mas esse papo de que mereco aposentaria 5 anos antes porque faco dupla jornada eh uma tremenda luta por privilegios disfarcada de feminismo, ainda mais se levarmos em conta a diferenca nas expectativas de vida. Faca um teste, pare de limpar a sua casa, o que vai acontecer com vc? Gaste exatamente o mesmo tempo q o seu marido com as tarefas domesticas. O que vai acontecer? Vc vai apanhar do marido? Agora se vc parar de trabalhar… A verdade eh q infelizmente a escravidao continua e nao apenas para as mulheres.

    1. “Eu quero meu carro lavado todos os dias”

      Sim, carro lavado é essencial para a vida. Imagino como fica sua masculinidade, quando anda de carro sujo. Você deve ser daquele tipo, que quando alguém bate no seu carro, sente uma dor tremenda nos testículos, não entende como a humanidade viveu e se reproduziu antes da era do automóvel.

      1. Parece que o meu texto ficou de difícil compreensão

        Infelizmente você não entendeu uma só palavra do que eu escrevi e fez esse ataque histérico e infantil… Não tenho carro e detesto dirigir, nosso carro fica com a minha esposa, ela sim adora dirigir…

  8. É uma pena que o blog

    É uma pena que o blog “opinativo” da Nádia tenha censura para quem não concorde com tudo aquilo que ela escreve.  Foi no mínimo vergonhoso o modo como isso ocorreu no caso da letra do Emicida. Não passa de uma manipuladora. Falar em “feminismo”, no genérico, é bom para limar as diferenças. Não confio nela nem um pouco; esgrime-se do debate de ideias com o “este blog é opinativo”. No fim das contas, os fatos pouco contam; assim, é um tiro no pé, pois esvazia qualquer validade de seu próprio discurso. Num país conservador como o Brasil ela passa por progressista…

  9. Pela “lógica” da

    Pela “lógica” da aposentadoria pra recompensar o trabalho doméstico, caberia então conceder aposentadoria antecipada também pra quem é solteiro independente de sexo, pois nesse caso, a pessoa não tem nem com quem dividir a bronca. Estará condenada a enfrentar a dupla jornada em sua totalidade.

    E não podemos esquecer de caçar tal benefício de quem tem doméstica, é claro, pois é um abuso claro do sistema.

    Por sinal, em alguns países a idade de aposentadoria já é a mesma para os 2 sexos:

    http://en.wikipedia.org/wiki/Retirement_age

    Pra finalizar, se @ parceir@ não ajuda em casa, o problema é de quem casou com el@, e não da Previdência e do Estado, que acaba sendo onerado no processo.

    1. O tempo não para.

      Uma pessoa aolteira trabalha em casa para si, não para sua (seu) esposa e filhos. Ele é solteiro e vive sozinho, esqueceu?

      Nesses países provavelmente o homem participa bem mais dos afazeres domésticos.

      Então você propõem que os homens que não ajudam suas esposas estão certos e que elas não devem reclamar por isso? É só o que elas pedem, que mudemos nossa maneira equivocada e preguiçosa de ser “homem”.

      Eu espero ser um homem melhor todo dia, busco evoluir e não aceitar uma situação só por que ela me beneficia, mas traz transtorno para minha esposa e filhas.

      Parou no tempo meu amigo?

      1. Se uma filha sua se casar com

        Se uma filha sua se casar com um cara que não ajuda em casa qual seria seu conselho para ela? Combinar, de preferência antes do casamento, a divisão de tarefas? Divorciar do traste? Continuar casada e reclamar casamiga? Esperar 30 anos para se aposentar mais cedo?

        1. Um contrato pré-nupcial mais

          Um contrato pré-nupcial mais amplo não seria uma má ideia. Por outro lado, parece ser mais um reflexo da judicialização da sociedade.

      2. Uma pessoa aolteira trabalha

        Uma pessoa aolteira trabalha em casa para si, não para sua (seu) esposa e filhos. Ele é solteiro e vive sozinho, esqueceu?

        Não muda o fato que existe o esforço e menos tempo livre para o lazer. Quem não tem “patrão” tem o mesmo direito de aposentadoria de quem tem.

         

        Então você propõem que os homens que não ajudam suas esposas estão certos e que elas não devem reclamar por isso? É só o que elas pedem, que mudemos nossa maneira equivocada e preguiçosa de ser “homem”.

        De forma alguma, muito pelo contrário, então não tente me acusar de algo que eu não disse. Concordar com uma causa não é o mesmo que aceitar qualquer argumento na defesa dela. O meu ponto é que essa questão da divisão do trabalho doméstico deve ser resolvida pela sociedade. E não pelo Estado, que só  “ameniza” a situação, mas não fazendo nada para que o status quo seja modificado.

        1. Justiça social.

          Uma sociedade democrática não é aquela que trata todos iguais, e sim que trata os diferentes de forma diferente de forma que o diferente alcance uma situação de igualdade. Porém isso leva tempo.

           

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