O pibinho e o vírus da incompetência, por Orlando Silva

Os números divulgados pelo IBGE sobre o PIB de 2019 – 1,1%, abaixo até mesmo do 1,3% de Michel Temer, em 2017 e 2018 – falam por si e jogam água no chope de quem comemorava uma “retomada vigorosa” da atividade econômica.

O pibinho e o vírus da incompetência

por Orlando Silva

Bolsonaro assumiu a presidência da República em meio a uma onda de euforia dos agentes econômicos. Pudera, sua candidatura foi o desaguadouro do apoio da banca financista e do grande empresariado nacional e internacional, ávidos pela imposição de uma nova ordem econômica, política e jurídica que enterrasse as conquistas e garantias expressas na Constituição de 1988.

Para a turma do bilhão, a vantagem adicional no apoio a Bolsonaro foi que, como a campanha eleitoral passou ao largo do debate programático, o candidato da extrema-direita não precisou firmar compromisso ou negar medidas que viria a tomar no governo. Representou, por assim dizer, um livro aberto para que o ultraliberalismo selvagem pudesse escrever suas páginas, sem quaisquer pruridos que mitigassem os reflexos antissociais de sua agenda. A hora e a vez do mercado puro sangue dar as cartas na economia.

Desde logo, os economistas ventríloquos de banqueiros se apressaram a cravar crescimento de 2,5% em 2019. Talvez mais, caso se privatizasse até o Palácio do Planalto, como disse Paulo Guedes, e todo o cardápio de reformas usurpadoras de direitos do povo fosse aprovado. Quem não se lembra das previsões edulcoradas – ou mentiras deslavadas – com a aprovação da Reforma da Previdência?

Pois bem, a dura realidade começa a se impor. Os números divulgados pelo IBGE sobre o PIB de 2019 – 1,1%, abaixo até mesmo do 1,3% de Michel Temer, em 2017 e 2018 – falam por si e jogam água no chope de quem comemorava uma “retomada vigorosa” da atividade econômica. Mesmo no último trimestre, quando há a alavancagem natural das festas de fim de ano, o avanço foi pífio: 0,5% frente ao anterior.

O miserê do pibinho foi tal que atingiu até a Agropecuária, com avanço módico de 1,3%, ladeada pelo setor de Serviços (1,3%) e pela semi-estagnada Indústria, que se arrastou a 0,5%. Registre-se que estamos tratando de crescimento medíocre e sobre uma base bastante depreciada, uma vez que o histórico recente do país é de um biênio de recessão (2015/2016) e outro de estagnação (2017/2018).

Outro dado que chama atenção no quadro desolador é que, no que diz respeito ao setor externo, as Exportações de Bens e Serviços sofreram queda de 2,5%, ao passo que as Importações de Bens e Serviços se ampliaram em 1,1%. Se a tendência se projetar para 2020, estaremos diante de uma situação tétrica, pois o dólar atingiu estratosféricos R$ 4,65, após altas sucessivas.

Os ilusionistas do Planalto iniciaram o ano projetando novamente crescimento superior a 2%, no que receberam o apoio cúmplice dos analistas da banca, viciados nas jogatinas da Bolsa e alheios à economia da vida real. Não se sabe com base em que são feitas tais projeções, já que um dos esportes preferidos dessa turma é revisar, para baixo, a estimativa de crescimento a cada boletim Focus.

Como pode voltar a crescer um país que virou pária internacional e que tem um presidente sem nenhuma credibilidade? Como voltar a crescer se o governo dobra a aposta numa receita recessiva insana? Quem fala não sou eu, deputado de oposição. Os números estão aí. O Brasil sofreu uma debandada de 44,7 bilhões de dólares em 2019 – os tais “investidores”, presume-se -, o pior resultado em 38 anos! Por outro lado, a taxa de investimento segue ao rés do chão, na base de 15,4% do PIB.

Bolsonaro e Paulo Guedes venderam ao povo que as reformas ultraliberais gerariam crescimento econômico e empregos. Nem um nem outro. O resultado é o desastre de 2019, que se projeta também para 2020, com os efeitos conhecidos de desemprego, subemprego, degradação do tecido social e ruína das contas públicas. Como bem afirmou Daniel Pereira de Andrade, professor de Sociologia da FGV, “para os neoliberais, se a economia não funciona como o previsto, não é porque seus modelos lógico-dedutivos não são capazes de explicar a realidade, mas, inversamente, é porque a realidade política e social está atrapalhando o funcionando idealmente previsto do mercado”.

Sem ter o que mostrar, Bolsonaro agora ocupa o centro do picadeiro para distribuir bananas e culpar o Corona vírus pelo baixo crescimento que já se antevê para este ano. Não! A verdadeira ameaça que paira sobre nossa economia é o vírus da incompetência, cujos sintomas estão evidentes no pibinho de 2019.

Orlando Silva é deputado federal pelo PCdoB-SP

Redação

2 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Tenho visto artigos muito bons no GGN, mas uma coisa frequentemente me chama a atenção, que são os comentários sobre a crise que se aprofunda. Nunca alguém disse, só talvez de passagem, que esta CRISE foi veementemente incentivada pela DIREITA para chegar ao impeachment que conseguiu, para implementar seus planos “pessoais”, digamos assim, porque imagino que os interessados estão sacando sua parte da traição ao país.

  2. Eu discordo dessa crítica que bate na incompetência ou na competência.
    Pense bem. Se a finalidade é desmonte do Estado, por qual motivo faria funcioná-lo?
    Fuga ao tema? Ué, até o Nixon fez isso. Ele falou até do próprio cão. Então, o lance é esvaziar a política e falar dos políticos, do que ele faz. Vale Witzel empunhando arma, ou o Collor fazendo cooper. É a estratégia.
    Como o neoliberalismo fracassou? Olha, passou a reforma da previdência, com o Congresso, a reforma trabalhista.
    Feliz essa classe média, que reclamou da classe C de chinelo no avião e, agora, não vai pra Disney pois ficou de chinelo e a classe C ficou descalça.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador