TV brasileira: a mídia sem regulação, por Gustavo Gindre

Por Gustavo Gindre (*)

A recente recusa da presidente da República em convocar a tradicional cadeia de rádio e TV no Dia do Trabalhador, 1° de maio, foi defendida por parte da militância do Partido dos Trabalhadores (PT) como prova de perda de importância da TV aberta. Mas, será mesmo?

Segundo a pesquisa TIC Domicílios, do Comitê Gestor da Internet (CGI.br), provavelmente a mais confiável sobre a realidade brasileira do setor, em 2013, 52% dos lares urbanos e 85% daqueles em áreas rurais não possuíam um computador ou um tablet conectado a Internet. No total, eram 56% das residências brasileiras sem acesso. Como não poderia deixar de ser, este percentual aumenta nas camadas menos remuneradas. Cerca de 88% de quem ganha até 1 salário mínimo e 73% daqueles que recebem entre 1 e 2 salários mínimos não possuem acesso residencial à Internet.

Quando analisamos a qualidade da conexão, entre os 88% que souberam dizer qual a velocidade contratada em sua casa, 43% acessam com velocidade inferior a 2 Mbps, sendo que 11% ainda o fazem em conexões de até 256 Kbps.

Mesmo a TV paga, que teve crescimento vertiginoso nos últimos anos, segundo a Associação Brasileira de Televisão por Assinatura (ABTA), está disponível em cerca de 30% dos lares brasileiros.

Como é bem provável que exista uma enorme coincidência entre assinantes de TV paga e de conexões à Internet, podemos afirmar com relativa segurança que mais da metade dos domicílios brasileiros não possui nem Internet nem TV paga e seu único acesso ao consumo de conteúdos audiovisuais se dá através da TV aberta, presente em mais de 96% dos lares. A única exceção sendo o 3G e o 4G da telefonia celular.

Portanto, embora seja verdade que a audiência da TV aberta é declinante em todo o mundo, inclusive no Brasil, e particularmente entre o público mais jovem, em nosso país este declínio ainda é contido pela reduzida penetração da Internet, notadamente em velocidade e qualidade compatíveis com o consumo de vídeos.

Isso significa que não é admissível que o poder público vire as costas para a TV aberta como se essa mídia não tivesse mais importância no Brasil. Ao contrário, é através dela que boa parte da população brasileira se informa. A situação é ainda mais grave se lembrarmos que a TV aberta é operada mediante concessões públicas que utilizam um bem escasso: o espectro eletromagnético. Mesmo que não concordasse com a manutenção da importância da radiodifusão na realidade brasileira, o poder público tem a obrigação constitucional de fiscalizar o funcionamento da TV aberta e dela não pode abrir mão.

Infelizmente, contudo, o Estado brasileiro jamais teve políticas públicas para a TV aberta e os governos petistas não fugiram à regra. A única lei existente para o setor data de 1962. Além de extremamente conservadora em sua origem, a lei brasileira está tão defasada que boa parte não pode ser mais implementada na realidade do século XXI. Na prática, trata-se de um setor sem regulação, que vive à margem do poder público, utilizando suas concessões como bem entende, inclusive para finalidades políticas.

(*) Gustavo Gindre é membro do Coletivo Intervozes, ex-conselheiro eleito do Comitê Gestor da Internet (CGI.br) e doutorando em História das Ciências, das Técnicas e Epistemologia (UFRJ).

Publicado no blog Brasil em 5 – a conjuntura em cinco minutos.
Fonte: http://brasilem5.org/2015/05/10/tv-brasileira-a-midia-sem-regulacao/

 

Redação

8 Comentários

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  1. Gustavo, teu sobrenome está

    Gustavo, teu sobrenome está grafado errado, é Gindri. Mês passado minha filha esteve em Ceres-Piemonte, origem de nossa familía. Nosso sobrenome aparece em uma placa enorme, vista de muito longe, onde era o hotel da família. 

  2. Foi um erro crasso de Dilma.

    Foi um erro crasso de Dilma. Ao não falar pela TV, ela deixou de levar sua voz à 90 do seu eleitorado, os mais pobres desse país que não têm internet. 

  3. Concordo inteiramente com o

    Concordo inteiramente com o texto. Alguns blogueiros progressistas, no afã de atingir e diminuir a Globo, parecem que querer tapar o sol com a peneira escrevendo por aí que só o que interessa agora é a internet. e que a TV aberta já está morta. Pesquisas como essa mostram que a realidade não é assim.

  4. A maioria absoluta dos mais

    A maioria absoluta dos mais pobres, que tem a TV Aberta como principal meio de entretenimento e informação, votaram na Dilma na última eleição. A maior fatia dos que não votaram nela, é exatamente de quem tem acesso a outros meios de informação. Ou seja, a Globo ajuda mais ao PT do que atrapalha. E que desculpa esfarrapada para a recusa da Dilma em fazer o discurso do dia dos trabalhadores na TV? Melhor, desculpa esfarrapda não, desculpa mentirosa.

  5. Ainda sobre Dilma não ter ido à TV no 1o de Maio

    Salve Gustavo,

    Bom reencontrá-lo por aqui.

    Ainda sobre a Presidente não ter ido à TV no 1o de Maio, vi alguns apoiadores enaltecendo a estratégia de só falar pelas redes sociais, dispensando cadeia nacional e inaugurando a tal “comunicação do futuro”. De quebra, evitar panelaços que seriam amplificados pela mídia que tanto a maltrata.

    Sinceramente, haja esforço para tentar positivar sabidas más escolhas, que quando chegam à militância já estão consumadas para difícil defesa. Mais uma.

    Essa estratégia até seria mais digerível se fosse um Governo que se manifestasse regularmente, se comunicasse bem (inclusive no mundo virtual), tivesse um porta-voz que viesse a público 2 a 3 x por semana, como em outros países. Mas não é o caso. Um Governo já calado que ficou mais calado ainda, isso com a agenda trabalhista bombando.

    Panelaço dura alguns minutos, a mídia iria explorá-lo por uns dias, mas depois apareceria (e tb ficaria registrado) o conteúdo do discurso. E nem ficaria tão mal assim, em cadeia nacional com as panelas batendo, o vídeo da cutucada em Beto Richa, de que é preciso se acostumar com as manifestações, reconhecer os pleitos, sem violência ou repressão.

    Sem ousar, enfrentar, numa política que não perdoa, além do desgaste que tb gera, acaba acumulando munição para armar ainda mais as panelas num eventual próximo discurso. Ou Dilma nunca mais vai falar na TV nesses quase 4 anos que restam de mandato?

    O paradoxo é o PT entrar em rede nacional na TV apenas alguns dias depois (aliás, sem Dilma). Neste caso, o momento definido não foi dos melhores.

  6. dilma não entrou em rede de

    dilma não entrou em rede de televisão no primeiro de maio porque não queria repetir que as perdas trabalhistas não passariam “nem que a vaca tussa”, como prometeu nas eleições de 2014.

    como a vaca vai tussir, e a presidente não vai vetar, o governo preferiu não se colocar nessa saia justa.

    a tática é a mesma há 4 anos: se fingir de morto.

  7. COMUNICAÇÃO É COMUNICAÇÃO

    Não seremos e nem somos contra a excelentíssima Senhora Presidenta Dilma Roussef se comunicar com os cidadãos brasileiros. Se ainda tem alguém que não sabe: a maioria dos canais de comunicação televisiva não votaria nas urnas na senhora presidenta do Brasil eleita em seu segundo mandato/turno. É mais que natural que ela se comunique nos  meios de comunicação; segundo a sua equipe responsável por divulgação. Simples; não é preciso comentários deslocados com outras conotações.

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