Brasil em Transe: necropsia do primeiro turno

– Bolsonaro venceu porque encarna o candidato anti-sistema, ao personificar o sentimento “contra tudo que está aí”. entretanto, ninguém melhor do que Bolsonaro para representar o que há de pior na classe dominante no Brasil;

– as Eleições de 2018 marcam a obsolescência da TV e das pesquisas eleitorais como arma de manipulação da população, função agora executada com mais alcance e eficácia por um processamento online através das redes sociais e dos aplicativos de troca de mensagem;

– o mito Bolsonaro é uma bolha de pós verdade mantida inflada por um fluxo incessante de fake-news. mas todas as bolhas são infladas apenas para virem a estourar. e como Bolsonaro não passa da representação mais genuína de “tudo que está aí”, seu governo está fadado a ser mais um estelionato eleitoral, aprofundando a crise de representação e encurralando o Brasil no beco sem saída da via institucional;

– por sua vez Haddad não pode, e não quer vir a ser, o candidato anti sistema. tanto por se recusar a fazer a crítica do Lulismo como pela insistência em se manter disponível para um pacto com a classe dominante;

– a principal crítica a ser feita ao Lulismo não é seu envolvimento com a corrupção sistêmica brasileira, e intrínseca ao Capitalismo, e sim o abandono da organização pela base e a despolitização da população, com o consequente esvaziamento dos movimentos sociais;

– a insistência do Lulismo, e de Haddad, num pacto com a classe dominante é um sonho impossível. longe de estarmos num período de expansão, o atual ciclo de “ajustes” e contração do Capitalismo globalizado implica numa imediata e violenta espoliação da renda, do patrimônio e dos direitos coletivos;

– os mitos Lula e Bolsonaro, assim como seus seguidores, são em vários aspectos equivalentes, dominados por um forte componente irracional avesso a toda e qualquer crítica. ambos exigem a figura da liderança salvadora, que, de fora para dentro e de cima para baixo, conceda à sociedade uma solução mágica para livrá-la de seus dilemas e demandas;

– não há nenhuma solução mágica para os nossos problemas. ninguém irá resolvê-los a não ser nós mesmos, através de nossa luta coletiva e organizada;

– o sistema de poder está ruindo. em seu vácuo surgem os fenômenos bizarros e as criaturas monstruosas, como um dos sintomas mórbidos da reorganização política da classe dominante. Bolsonaro e suas crias são a primeira ninhada deste processo, o qual neles não se completa pois a cadela do fascismo está sempre no cio;

– a Esquerda continua perdida no tempo e no espaço, como se ainda vivêssemos em 2002 e fosse viável uma reedição de Lulinha Paz e Amor e sua “Carta aos Banqueiros Brasileiros”.

– os dias mais difíceis ainda nem começaram…

p.s.:

hoje na chegada ao Rio de Janeiro, foi assustador se deparar com uma cidade inusitadamente deserta.

desde a Dutra, passando pela Linha Vermelha, Francisco Bicalho, Presidente Vargas. nenhum engarrafamento e pouco movimento.

Centro, Bairro de Fátima, Ipanema, Botafogo, Laranjeiras, por todo lado pouca gente e pouco trânsito.

indagando a algumas pessoas, inclusive moradores de subúrbios e periferia, a percepção era a mesma: pontos de ônibus e comércio vazios.

além disto, uma atmosfera lúgubre, com a chuva fina e vento constante, criava um clima de enterro por toda parte.

alarmado, cogitei do que poderia se tratar: já teriam matado a viadagem toda? as mulheres teriam sido reconduzidas para a cozinha? os negros para a senzala?

as pessoas estão deprimidas e com medo. com muito medo. à beira da síndrome de pânico.

agora à noite, pouco antes de postar o texto acima, começo a escutar uma gritaria. o som reverberava vindo das ruas abaixo. a palavra de ordem se ouvia nitidamente: “#EleNão!”.

vozes da juventude, percorrendo os quarteirões, soltando morteiros e angariando adesões.

por alguns minutos, a atmosfera de velório se dissipou em perspectiva de luta.

ir ao combate sem temer. ousar lutar, ousar vencer. somente a luta muda a vida! unidos somos muito mais fortes!

.

Redação

7 Comentários

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  1. Desabafo
     

    “bonitinho mas ordinário” como o velho filme.

    Arques, desanimar por quê?

    Se ajudasse, eu te dava a mão.

    Pense num governo do coiso, com um ministro da justiça como o moro,

    um ministro da educação nem bonitinho, mas ordinário ator pornô.

    pense no seu vice que “prende e arrebenta”

    Pensou?

    Gostou?

    Se não,  pensar uma alternativa é obrigatório.

    Enquanto a imaginação anteceder a criação, há esperança.

     

     

    1. Brasil em Transe: necropsia do primeiro turno

      -> Arques, desanimar por quê?

      mas não estou desanimado! o texto passou desânimo? acho que não.

      -> Se não,  pensar uma alternativa é obrigatório.

      infelizmente, o Brasil precisa passar por um governo Bolsonaro. enquanto coletividade, escolhemos o caminho feio,longo e difícil.

      mesmo se Bolsonaro não for eleito, continuará como uma forte posição política. ou seja: Bolsonaro não pode ser derrotado com eleições, só politicamente.

      .

      1. Protejamo-nos
         

        Eu estava pensando nisso agora.

        Se for a escolha do povo, que a viva e se arrependa depois.

        Toda geração procura a crise que precisa.

        Quem não escolheu que se proteja.

        ET- Otimismo faz parte da auto-proteção.

        Mostra-nos alternativas e coloca-nos longe de extremismos.

        O caminho do meio é a solução.

          

        1. Brasil em Transe: necropsia do primeiro turno

          -> coloca-nos longe de extremismos. O caminho do meio é a solução.

          vou lhe escrever algo, mas vê-se não me entende mal, ok?

          compreendo perfeitamente seu ponto de vista. pode ter certeza disto. e não sou do tipo de pessoa que pretende mudar a opinião dos outros. muito menos a sua.

          mas para que vc compreenda o meu ponto de vista: só de ouvir falar em “caminho do meio”, já entro num “surto extremista”.

          aliás, igual ao que acabei de entrar justo ao final da sessão de “Um Noite de 12 Anos”. só que desta vez, como em muitas outras, meu “surto extremista” foi muito bem recebido pela platéia.

          e num é que tinha um cara conhecido meu no cinema! depois veio conversar comigo!

          -> Se for a escolha do povo, que a viva e se arrependa depois. Toda geração procura a crise que precisa.

          pois é… tenho comentado muito sobre isto. as crises fazem parte do processo de amadurecimento, nosso e das coletividades.

          mas há superações bem mais fáceis e rápidas do que Bolsonaro. enfim, não decidimos por todos. decidimos apenas por nós mesmos.

          mesmo com Haddad não será uma superação fácil.

          acho que estamos exatamente na mesma situação daquele trecho do filme “The Counseler”.

          .

           

          1. Escolhas do povo e os 3 ps

            O pedreiro do meu prédio é preto, pobre e pastor.

            Aos seus ppp acrescente-se o baiano.

            Enrolado como ele só, perguntei-lhe brincando em quem ele tinha votado.

            Encheu o peito e com alegria, do alto de seu jaleco azulão disse-me

            Voltei no bolsonaro e ainda consegui mais 200 ou trezentos votos de minha familia e amigos lá no norte.

            Mas seu fulano, eu disse – o seu candidato não gosta de preto, nem de pobre e nem de nordestino.

            -“Conversa- ele disse.  Isso é invenção.

            Mas seu fulano, são palavras dele.

            É nada..

            Seu fulano, o sr. e a sua família vão se arrepender amargamente dessa escolha.

            Melhor arrependido e feliz por ter votado em quem eu quis votar.

            Ainda bege, desconversei e falei sobre o vazamento na coluna do apto.

            No domingo da votação, desci e fui intimando o rapaz da portaria, que trabalha 24 horas por 36 ou algo assim e mora longe pra bedel.

            E ai, fulano, já votou?

            Ô, as 8 da manhã.

            Em quem?

            Baixou a cabeça e disse – Cravado no 17

            Falei – e quem é 17?

            Ele falou – acho que é o bolsonaro.

            Mas fulano, ele não gosta de preto e nem de pobre. Sua vida vai azedar ainda mais.

            Ah! mas tá todo mundo votando. A gente vai mudar isso que está ai.

            Vai sim, eu disse.

            Vai mudar pra pior. Voce e suas próximas gerações vão se arrepender amargamente.

            Será? – disse ele cabisbaixo.

            *******

            Nessas horas, a  gente respira fundo e vai cuidar da vida.

            Foi o que eu fiz e é o que eu tenho feito.

            Gente que eu tinha em mais alta conta, pessoas cultas, instruidas, espiritualizadas, estão fazendo campanha para o coiso.

            Então, Arques, ou a gente vai pro mato ou tira o passaporte.

             

             

              

    1. Brasil em Transe: necropsia do primeiro turno

      -> Voltei no bolsonaro e ainda consegui mais 200 ou trezentos votos de minha familia e amigos lá no norte.

      -> Baixou a cabeça e disse – Cravado no 17

      -> Gente que eu tinha em mais alta conta, pessoas cultas, instruidas, espiritualizadas, estão fazendo campanha para o coiso.

      -> Então, Arques, ou a gente vai pro mato ou tira o passaporte.

      veja só. estou aqui escrevendo sobre isto desde 2015.

      Bolsonaro é o previsível resultado de longos anos de despolitização da população, levados a cabo pelos governos Lula/Dilma num contexto de grave crise do capitalismo.

      ao menos após o Golpe de 2016, isto deveria ter mudado. mas a cada vez que alguém (não só eu) apontava os equívocos cometidos e seus perigosos desdobramento era acusado de “agente da CIA”.

      convenhamos, seria até cômico se não provocasse tanta tragédia…

      quanto a ir “pro mato”, e nele que estou há quase 13 anos acumulei muita experiência, aprendi muita coisa, tenho muita história para contar.

      já meu passaporte, após preencher as páginas viajando por boa parte do mundo, está vencido há bastante tempo. já tomei até esporro por causa disto.

      andei lendo algo que vc postou tempos atrás (link), bastante útil para compreender a onda Bolsonaro:

      ” Onde as desordens destes tempos em que vivemos nos confronta com as nossas convicções, nós as negamos para seguir vivendo.

      Mais que isso, creio que fazemos parte de um experimento de poder em que populações inteiras são hipnotizadas subrepticiamente através dos os meios de comunicação, sendo levadas a  funcionar como  estações repetidoras e ampliadoras de  egrégoras de ódio.

      Parace um trabalho de alta magia voltada para o mal,  associado a profundos  conhecimentos de psicologia e domínio de multidões.”

      .

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