EBP é investigada pelo MP e pelo TCU

De O Globo
EBP, que fez desenho de concessões de portos e aeroportos, é alvo de processos no TCU e no MP

Contratos provocaram reações e suspeitas de favorecimento à empresa por parte do governo federal
Processo questiona o motivo de a empresa ter vencido concorrência no Galeão, mesmo cobrando R$ 4 milhões a mais

BRASÍLIA — No momento em que as concessões de grandes obras de infraestrutura se tornam a principal arma do governo para puxar o crescimento, uma nova gigante se consolida no setor de elaboração de projetos: a Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP), formada pelos principais bancos do país, incluindo o BNDES, e que, por isso, precisou de autorização do Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade) para funcionar. Com apenas 17 funcionários, a empresa é responsável por fazer o desenho de todos os 162 terminais de portos que serão licitados, de aeroportos e seis mil quilômetros de rodovias. Tantos contratos provocaram reações e suspeitas de favorecimento à empresa por parte do governo federal, o que resultou em dois processos no Tribunal de Contas da União (TCU) e mais dois no Ministério Público Federal. Em um deles, uma concorrente questiona o motivo de a EBP ter vencido uma concorrência no Galeão, mesmo cobrando R$ 4 milhões a mais em sua proposta.

A estreita proximidade da empresa com o aparato estatal levou o deputado Augusto Coutinho (DEM-PE) a fazer uma denúncia aos órgãos de controle. Ele alega que houve um claro direcionamento na condução dos projetos dos portos. Não foi feita licitação para escolher o responsável pelo redesenho dos terminais depois da nova lei aprovada pelo Congresso Nacional.

Uso de instalações da secretaria de aviação

Uma autorização foi dada pela Secretaria Especial de Portos (SEP) à EBP. A portaria abriu espaço para as concorrentes. No entanto, o texto proibiu que fosse feito um estudo específico para cada terminal. Cada participante teria de fazer projetos para todos os portos do país de uma única vez. Apenas uma outra empresa se inscreveu, mas logo desistiu. O prazo para o recebimento das propostas foi curto: dez dias para o projeto de redesenho de todos os portos e mais 20 para que detalhassem os nomes dos técnicos que seriam responsáveis pelos estudos em todo o país. A EBP cumpriu esse prazo.

“Da forma como foi apresentada a autorização dirigida à EBP, infere-se que certamente ocorreram tratativas prévias entre aquela companhia e a SEP/PR, de modo que inequivocamente houve favorecimento, possibilitando, no mínimo, que a companhia pudesse obter informações privilegiadas e até mesmo projetos já apresentados à Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquáticos)/SEP por outras empresas do setor, pelos quais a EBP será ressarcida”, diz o deputado na denúncia que está no TCU.

A Secretaria Especial de Portos admite que teve reuniões com os representantes da EBP antes da autorização, em uma defesa encaminhada ao Ministério Público. Nela, diz que “não se furta a realizar reuniões com quem as solicite”.

Na Secretaria de Aviação Civil (SAC), técnicos da EBP despacharam durante vários dias nas dependências do órgão. No caso dos aeroportos, assim que anunciou a concessão dos três primeiros (Guarulhos, Viracopos e Brasília), o governo autorizou a EBP a realizar os estudos para elaboração dos editais sem licitação.

Diante da repercussão negativa, no dia 27 de julho de 2011, a Anac fez um chamamento público e autorizou outras empresas a participar, só que deu prazo de um mês. A EBP começou a coletar os dados mais cedo. Para isso, usou as instalações da SAC em Brasília e da Infraero, em São Paulo. Oito empresas concorreram, mas a EBP foi vencedora e recebeu dos concessionários R$ 17,1 milhões.

Na segunda rodada de concessão (Galeão e Confins, prevista para outubro), novamente o governo autorizou a EBP a elaborar os estudos, e no fim de janeiro deu prazo de dez dias para que outras interessadas também pudessem se apresentar à Anac. A IQS Engenharia concorreu e perdeu, apesar de ter uma proposta mais barata, com menor impacto ambiental e maior número de movimentos de aeronaves. E entrou com um processo no TCU, que está sob a análise da ministra Ana Arraes.

A justificativa da SAC foi que o projeto da EBP era mais consistente e atendeu a maior parte dos requisitos. A empresa receberá R$ 19,1 milhões pelo trabalho realizado.

Os pagamentos só serão efetuados quando a licitação for feita. Como a EBP foi criada por Banco do Brasil, Bradesco, BNDES, Itaú, HSBC, Santander, Citibank, Banco Espírito Santo e Banco Votorantim, assume risco dos projetos com dinheiro próprio. Tem capital suficiente para aguentar de dois a três anos para receber seus honorários.

Como seu quadro de funcionários é pequeno, a EBP terceiriza toda a produção dos projetos. Hoje, faz desde projetos de saneamento, hospitais, estádio de futebol (Mineirão), rodoviárias, estacionamentos, captação de água e até para o circuito de compras de sacoleiras em São Paulo. No caso dos aeroportos, uma das consultorias subcontratadas foi a americana Leigh Fisher, do ex-diretor da Anac Alexandre Barros.

A EBP já entrega para o governo o serviço completo, inclusive as minutas de editais e contratos de concessão. Esse foi o ponto que mais chamou a atenção do TCU durante uma apresentação feita pelos técnicos da empresa.

Segundo fontes do setor portuário, a proximidade com o Estado é tanta que se confunde no dia a dia. Técnicos terceirizados pela EBC têm ido aos terminais e pedem acesso até a projetos particulares feitos por outras empresas privadas.

A Secretaria dos Portos negou que a EBP tenha tido acesso a informações privilegiadas.“Todas as empresas tiveram o mesmo tempo para se preparar”, disse a Secretaria em nota. Assegurou que houve ampla divulgação das mudanças envolvendo a licitação de terminais e portos. Sobre a autorização dada à EBP de fazer sozinha os estudos para a licitação de 162 terminais em 34 portos, a Secretaria explicou “que não houve limitação para que outras empresas participassem do processo”. Destacou a importância de analisar o conjunto dos terminais dentro do plano de logística integrada do governo. “Apenas a análise em conjunto dos terminais e portos é capaz de capturar as complexas transformações na malha logística nacional e otimizar a vocação de cada terminal portuário”.

A SAC também negou favorecimento à EBP pelos estudos dos aeroportos. “A autorização definitiva foi dada a todas as empresas num mesmo ato, ou seja, as empresas tiveram o mesmo tempo para desenvolver os estudos”, disse a Secretaria em nota. Sobre a escolha dos estudos da EBP para Galeão e Confins, a SAC informou: “Os critérios balizadores da seleção foram completude, consistência e qualidade do trabalho apresentado”.

Colaborou Danilo Fariello

Luis Nassif

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