Doria lança decreto para “apagar” pessoas do espaço público da cidade, por Renan Quinalha

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – Mais do que apagar grafites e pichações dos muros de São Paulo, o prefeito de São Paulo Joao Doria (PSDB) assinou um decreto que “apaga” a visibilidade já em baixa das pessoas em situação de rua na capital.

Segundo informações de Renan Quinalha, do portal Justificando, o decreto revogou normas instituídas na gestão de Fernando Haddad (PT) para garantir que os serviços que interferem na vida dos moradores de rua sejam feitos de forma transparente e sem violações aos direitos humanos.

Doria deu nova redação revogando esses princípios e, agora, esse público pode ser alvo de operações “higienistas” a qualquer hora, sem aviso ou justificativas.

Por Renan Quinalha

Higienismo de Dória e a população de rua

Em Justificando

Dória publicou hoje no Diário Oficial, às pressas e sem qualquer discussão pública, alterações muito graves no decreto de zeladoria urbana que afetarão duramente a população em situação de rua.

O decreto n. 57.069, de 2016, foi construído depois de muita crítica à gestão Haddad, que cometeu equívocos enormes àquela época no tratamento com a população de rua. Defensoria, MP e entidades da sociedade civil discutiram um marco legal para restringir o “poder de polícia” da GCM contra a população de rua. Apesar dos seus limites e dificuldades de implementação, foi um avanço importante na efetivação dos direitos humanos desses segmentos vulneráveis.

Esse decreto consagrou o princípio da mediação para solução dos conflitos, que foi agora excluído. Além disso, o princípio da transparência das ações públicas com ampla divulgação de informações à população também foi alterado na nova redação.

Sob esse decreto, as ações de “zeladoria” deveriam ser preferencialmente realizadas das 7h às 18h, de segunda a sexta, para evitar ações, por exemplo, enquanto as pessoas estivessem dormindo; agora, estão liberadas as ações em qualquer dia e horário sem justificativa.

Além disso, era vedado subtrair das pessoas em situação de rua “itens portáteis de sobrevivência, tais como papelões, colchões, colchonetes, cobertores, mantas, travesseiros, lençois e barracas desmontáveis”. A redação anterior estabelecia, ainda, que, “em caso de dúvida sobre a natureza do bem, os servidores responsáveis pela ação deverão consultar a pessoa em situação de rua”.

Ambos dispositivos foram suprimidos nessa modificação de hoje. Ou seja, as forças de segurança poderão retirar itens de sobrevivência das pessoas em situação de rua, o que sabemos que pode levar até ao óbito sob condições de clima muito frio.

Outro ponto bastante grave foi a supressão o item que obrigava, em caso de resistência das pessoas em situação de rua, que “o diálogo será adotado com primeira e principal forma de solução de conflitos, não sendo admitidas atitudes coercitivas que violem sua integridade física e moral”.

Abre-se, assim, ainda mais margem para a atuação arbitrária das forças de segurança contra essa população já tão sujeita a diversas formas de violências.

É preciso destacar, ainda, que antes o decreto permitia que fossem recolhidas “barracas montadas durante o dia, desde que não sejam removidos pelo possuidor ou proprietário”. A nova redação fala apenas em “barraca”, sinalizando que poderão ser imediatamente retiradas sem qualquer possibilidade de a própria pessoa retirá-la.

Apagar pichações e grafites já seria bastante grave. Mas o higienismo da gestão Dória vai muito além disso, quer “apagar” pessoas do espaço público da cidade. Todo governo conservador mobiliza o discurso da “limpeza pública”, da “higienização social” e do “saneamento moral” para atacar populações vulneráveis e consideradas indesejáveis, como pessoas em situação de rua, prostitutas, pessoas LGBT, negros e outros.

É preciso denunciar amplamente essa medida para que as alterações sejam revertidas. A “cidade linda” do Dória se anuncia contra os seres humanos e na base da repressão. Não é isso que queremos para São Paulo. Não é isso que nossa cidade merece.

Renan Quinalha é advogado e militante de direitos humanos, com formação em Direito e em Ciências Sociais na Universidade de São Paulo (USP), onde defendeu o Mestrado em Sociologia do Direito e, atualmente, cursa o Doutorado em Relações Internacionais. 

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

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  1. É de fato muito natural
    Que

    É de fato muito natural

    Que a mente cinza

    De um ogro ranzinza

    Banalize o ódio

    A quem com amor

    Pintou um belo mural

  2. Pobre menino rico

    Lacerda tem um idolo e parece que Doria vai mesmo se inspirar no corvo para sua administração reaça. Daqui a pouco, se não conseguir transformar os moradores de ruas em pessoas totalmente invisiveis (mais ainda do que ja são), quem sabe a velha receita de mandar afogar ainda poderia ser usada…. 

    1. pobre…

      Ao invérs de encherem a paciência do Prefeito com esta esquerdopatia que tomou um pé na bunda das urnas, porque não o cobra daquilo que o Haddad se omitiu. Ao invés de gastar uma fortuna milionária doando terreno gigantesco de valor extraordinário para fazer um gigantesco Elefante Branco, que consumiu milhões e milhões de reais em cidade que não oferece creche para suas crianças, mais o perdão de milhões de reais erm dividas e IPTU de Escolas de Samba, poderia ter usado este dinheiro e juntamente com toda esta pressão, para construir ciclovias nas Marginais Tiete e Pinheiros. Pistas planas que interligam toda a metrópole. Ou usar desta pressão para que a linha de trem que atravessa a parte nobre da Marginal Pinheiros e que funciona como o Metrô, muito acima do nível caótico do  restante do sistema, fosse estendido à toda extensão das marginais. Por que funciona tão bem em frente à Berrini e aos Jardins, embaixo dos estúdios da RGT? Porque o trem neste trecho não é igual aquele lixo que presta um serviço mediocre ao restante da Grande São Paulo? Por que ciclovia para “playboys” bem-nascidos que fazem média com o Prefeito anterior não foi estendida a todos os bairros às margens destas vias? E pior, porque não se cobra por isto?    

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