Justiça Global denuncia à ONU despejo de moradores da Favela da Telerj

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Terreno da operadora de telefonia Oi, na zona norte da cidade, invadido há mais de uma semana por moradores de comunidades localizadas no entorno (Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Terreno da operadora de telefonia Oi, na zona norte da cidade, foi desocupado em uma operação policial no dia 11 de abrilTânia Rêgo/Agência Brasil

A organização não governamental (ONG) Justiça Global formalizou denuncia à Relatoria Especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Direito à Moradia Adequada sobre a violência policial no despejo dos moradores da Favela da Telerj, que foi construída no terreno da Oi. Para a ONG, houve negligência da prefeitura Rio de Janeiro no reassentamento das famílias.

Na denúncia, a Justiça Global solicita à ONU que “exija” do governo brasileiro explicações sobre os fatos descritos e que tome medidas urgentes para prevenir a ocorrência “de mais violações de direitos humanos”. No entendimento da Justiça Global, a desocupação do terreno – ocorrida no dia 11 de abril – “foi arbitrária, com uso exclusivo do aparato militar e sem a presença de oficiais de Justiça no local, caracterizando a ilegalidade da ação”.

Ainda no entendimento da Justiça Global, a remoção começou às 5h da manhã, em desacordo com a normativa que afirma que tais procedimentos só podem ser feitos a partir das 6h, e se deu sem que houvesse qualquer assessoria jurídica durante o despejo, não tendo sido garantida a ampla defesa aos moradores.

 

“Foram inúmeros os atos de intimidação e violência durante o processo. Os policiais utilizaram cassetete, spray de pimenta, bomba de gás lacrimogêneo e balas de borracha para expulsar os moradores. Muitos objetos e pertences foram destruídos e boa parte das habitações que haviam sido construídas com madeira foi incendiada. Além disso, os agentes do Bope [Batalhão de Operações Especiais] estavam armados com fuzil e utilizavam touca ninja por baixo do capacete. Até disparos de arma de fogo foram feitos na ação”, diz a Justiça Global na denúncia.

A ONG sustenta, ainda, que durante a ação do governo do estado e da prefeitura, 21 ocupantes foram detidos. “Entre eles, 12 eram crianças e adolescentes – de 11 a 16 anos – que, contrariando o previsto na lei, não foram encaminhados para a delegacia especializada, tendo sido conduzidos, juntos com os adultos, para as delegacias da região”.

Em entrevista à Agência Brasil, a advogada da Justiça Global, Marisa Viegas, disse que a intenção da entidade com a denúncia é abrir conversa com a relatoria para estabelecer outra forma de diálogo com o Estado brasileiro, uma vez que vem sendo difícil mantê-lo diretamente com a prefeitura e o governo do Rio. “A gente quer que o Brasil se explique internacionalmente por meio do governo federal e diga o porquê de ele não estar cumprindo internamente normas com as quais ele se comprometeu com a comunidade internacional”.

A advogada diz que o direito à moradia adequada está previsto no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, “um dos pactos da ONU assinados pelo Brasil” e que prevê o direito à moradia. “A postura internacional do Brasil é de ser sempre muito aberto, muito democrático, participa das discussões, assina os tratados, mas tem essa incoerência de, no plano interno, não cumprir as normas com as quais ele se compromete internacionalmente”, disse.

Na avaliação da advogada da Justiça Global, a relatoria da ONU, provavelmente, vai pedir explicações ao governo federal, que, por sua vez, vai entrar em contato com os governos municipal e estadual para saber o que aconteceu e deverá, presumivelmente, responder aos questionamentos. “Na verdade a iniciativa é mais uma questão politica e o seu objetivo é dar maior visibilidade ao problema, uma vez que o sistema de relatoria da ONU não é um sistema jurídico: é mais um dialogo político do que jurídico”, esclareceu.

No entendimento da advogada da Justiça Global, a partir da denúncia, a relatora especial do Conselho de Direitos Humanos da ONU, a brasileira Raquel Rolnik, deverá entrar em contato com o governo brasileiro que tem “uma imagem internacional a zelar”. “Muita vezes ações como esta são muitos mais importantes do que uma sentença condenatória. Então não se trata de uma ação inócua. Já tínhamos mandado uma denúncia inicial e eles pediram mais informações. E na noite da última quinta-feira nós formalizamos a denúncia”, finalizou. 

Agência Brasil tentou contato com o governo do estado do Rio de janeiro, mas não obteve resposta  em razão do feriado.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

10 Comentários

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  1. Não julgar
    Só quem morou

    Não julgar

    Só quem morou perto ou dentro de uma favela ( que muitas vezes apresenta altos índices de violência, criminalidade, ameaças, clima de guerra, domínio do tráfico, e o cidadão acaba ficando como que refém num lugar destes) é quem pode realmente julgar o horror que leva o poder público aos extremos.

    Muitas vezes, as ONGs vêm lá do outro lado do mundo onde não tem favela, nem pobreza,  nem nada, e acabam por se arvorar a juízes sobre assuntos dos quais não fazem a menor idéia.

    Interessante também porque estas ONGs não julgaram os EUA nas suas guerras imperialistas, como a do Iraque por exemplo.

    Mas tem o outro lado da moeda também. As cidades incharam e houve explosão demográfica no país após a ditadura militar, que foi incentivada pela elite deste país. Antes de 1960, a violência era baixíssima mesmo em grandes cidades. Haviam poucas favelas ( comparadas ao que há hoje),

    Então tem também o fato de que a própria elite deste país incentivou, a explosão demográfica, para conseguir baratear a mão de obra, mas quando surgiram os efeitos colaterais deste crescimento desordenado, costuma apelar para a violência como forma de resolução dos problemas que o próprio sistema capitalista criou.

    O capitalismo tem muito destas coisas (embora não obrigatoriamente), de usar pessoas, ou uma classe social, e quando não servem mais, descartar ela da maneira mais rápida o possível.

    Este país precisa é de uma política de incentivo ao controle de natalidade, principalmente nas áreas carentes, para desativar a bomba relógio dos conflitos sociais.

    1. Controle de natalidade

      Brasileiro aguerrido,

      Se o artigo sobre controle de natalidade, laqueadura de trompas e vasectomia, na lei de planejamento familiar aprovada em 1997 não tivesse sido vetado pelo pior presidente que este país já conheceu, FHC, hoje não existiria a maior parte dos assaltantes até dezessete anos de idade.

      O peso da influência religiosa e do interesse politiqueiro de quinta categoria, o da pulítica de vaso sanitário praticada desde sempre neste país com andar de cima e sociedade pela metade, foi a combinação determinante para que a miséria desnecessária permanecesse a serviço dos holofotes da grande imprensa, dos mais diversos interesses $$$, religiosos e dos inúmeros grupos de criminosos – sems pivetes acaba a brincadeira, assim não dá. 

      Um abraço

      1. Concordo plenamente com a sua

        Concordo plenamente com a sua opinião, sr. Alfredo

         

        Aliás esta foi uma das causas que me levou a votar em Lula em 2002 e 2006. Até Dona Ruth Cardoso crtiticou duramente o marido dela por esta decisão que ele tomou contra o controle de natalidade.

        E até hoje existem várias restrições no SUS para quem queira fazer a cirurgia de vasectomia ou de laqueadura, exigem que o casal tenha tido no mínimo dois filhos, tenha mais de 25 anos, fora a fila de espera.

        Deviam deixar liberdade plena para o casal decidir quando quer fazer a cirurgia pelo SUS, independentemente de quantos filhos tenha tido ou da idade, desde que fosse maior de 18 anos.

         

  2. D.Marisa Viegas, terá

    D.Marisa Viegas, terá  denunciado com  esse mesmo  entusiasmo o governador Alkmin,no episódio do massacre  de Pinheirinhos ou foi d. Dilma que bancou esse contencioso?

    Era  mais   fácil e eficiente  dar queixa  ao  batman do STF,afinal ,aliados do governo federal e  do PT,tem tratamento 

    especial…

  3. ONG de verdade

    Nassif,

    E se a tal ONG tiver dificuldade para manter contato com o Estado brasileiro, prá omde ela irá, ao Vaticano?

    Se ela recomhece os locais exatos para se debater o assunto, mas não tem capacidade ou prestígio para encontrar os canais de comunicação corretos, que vá fazer hustiça na Ucrânia ou qualquer outro lugar.

    O pai bateu no filho pequeno e sumiu, então vamos indiciar o vizinho, muito bem. Este é  o caminho escolhido por esta ONG folgada, ONG de verdade e preocupada com Belo Monte, comunidades indígenas,criminalização dos movimentos sociais, em resumo, pautas parecidas com a do Greenpeace, outra ONG de verdade.  

    Dona ONG Justça Global, vá bater na porta certa, são duas delas.

    E viva o brasilsil pandeiro

  4. E o registro de imóveis?

    Já foi verificado se o prédio invadido pertence mesmo à OI, ou a alguma dessas operadoras?

    Disseram aqui no blog que o prédio pode ser do acervo mal cuidado da Telebrás, e nesse caso quem teria que se envolver nisso seria o governo federal. 

  5. É uma tremenda deturpação de

    É uma tremenda deturpação de entendimento sobre o que seja agressão aos mais humildes. E um perigoso caminho de “chamar o pápi para lhe dar uma lição”, negando legitimidade e autoridade às instituições da cidade e do país. Coisa destes tempos onde a ignorância agita bandeiras, nem sempre desfraldadas pelo inocente romantismo.

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