Armando Coelho Neto
Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.
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Lula e o sonho. O Rio e a Globo (Pó, milícia, seitas satânicas), por Armando Coelho Neto

Mas o Rio de Janeiro que Lula quer resgatar se depara com o Rio das chacinas (da Candelária à recordista Jacarezinho, com 40 mortos).

Lula e o sonho. O Rio e a Globo (Pó, milícia, seitas satânicas)

por Armando Coelho Neto*

“Precisamos recuperar o simbolismo das coisas boas do RJ”, disse Lula, ainda quando candidato, em agosto de 2022. Quando já presidente, em outubro de 2023, a propósito de uma nova onda de violência, afirmou: “Vamos ajudar o Rio de Janeiro a combater o crime organizado”. No início do ano, ao visitar o território quilombola de Marambaia/RJ, insistiu no tema, ao falar do resgate da história e direitos.

Pelo apreço que tem àquele Estado, Lula trata de temas complexos sem se desprender da tal mística carioca, que vai além das belezas naturais, da irreverência e bom humor, da indisciplina, dos carros apressados no trânsito ou estacionado sobre as calçadas. Tem um pouco de Maracanã com Fla-Flu, os dionisíacos e apoteóticos desfiles de escola, contemplando dessa forma da piada à ginga.

Mas o Rio de Janeiro que Lula quer resgatar se depara com o Rio das chacinas (da Candelária à recordista Jacarezinho, com 40 mortos). Estado onde ao menos seis governadores foram presos nos últimos anos. Entre os crimes, corrupção, abuso de poder político e econômico com benefícios financeiros, favorecimento pessoal e de terceiros, condenações a mais de 400 anos. O Rio é muito mais que um fevereiro!

A mística carioca advém do Império, da capital Federal, da TV Globo – a bisavó das fake news, que a serviço das elites e da ditadura de 64, condenou direitos trabalhistas em editorial e envolveu-se em fraude eleitoral. Pelo lado diversionista, a Globo tentou impor e até inventar sotaques, enfiar goela abaixo o feijão preto como fator de união nacional. Tudo, claro, com muita eficiência técnica de Hans Donner.

A Vênus Platinada romantizou a malandragem no pior sentido e flertou com os Reis de Ramos (obrigado Chico e Francis Hime), Castor de Andrade, banalizou a violência e a “esperteza”, quando a malandragem carioca sempre foi algo mais profundo e até belo, mas se perdeu. Aberta a trilha, bem-vindos às milícias, ao Evangelistão do Pó, onde brotou e se expandiu o nazifascismo genocida do Bozo…

Quando Lula falou várias vezes que o Brasil precisa reaver o Rio de Janeiro, por certo não se inspirou no amargo dessas palavras, mas é possível que ele realmente acredite nisso. E se crê, deveria fazê-lo, pois é certo que ninguém mais o fará. Afinal deve ter em mente algo que vai além do caos urbano e social. Se a deterioração do Rio propiciou o nascimento do inelegível, trata-se de anomalia sobretudo política.

O carioca conheceu muitas iniciativas. Leonel Brizola, mesmo sabotado pela Globo, até tentou, mas pararam, e ou sobraram concretos e ideias inconclusas. Se Lula vai além da fala, a tarefa que se impõe é um movimento decisivo sem retorno. Quem sabe arriscar-se a promover a reconquista urbana do Rio de Janeiro, obviamente pensando na questão econômica do segundo maior PIB do país.

Não fosse sonhar muito, apostar numa mobilização capaz de absorver uma massa de pessoas envolvidas num processo altamente positivo, inclusive com reflexos do ponto de vista político. Se possível, calçado na racionalidade e no coletivismo, o que poderia favorecer o campo popular, contaminado por milícias, tráfico, políticos corruptos, estranhas seitas evangélicas (algumas com pé no satanismo).

O caos e a violência, já se sabe a quem favorece, e não há sinais de que se pretenda tocar nesse tema, mas sim vender operações policiais espetaculosas. Lula sabe disso. É, mas a esquerda não tem proposta para a violência, a segurança. E a direita tem? Não é ela que manda no Rio e até hoje não disse a que veio nesse campo? Talvez o caos e a violência sejam métodos de vencer eleições e garantir poder.

Sim, Lula pode querer restaurar o Rio, o que seria um grande laboratório, ainda que árdua, complexa e colossal tarefa, com desafios na engenharia civil, desenvolvimento de novas tecnologias. Quem sabe, ações simultâneas em vários pontos, com a criação de habitações transitórias para acolhimento de pessoas enquanto algumas intervenções pudessem ser realizadas. Haja fevereiro!

Um grande plano de recuperação do Rio de Janeiro é uma tarefa desafiadora que envolveria muitas pastas federais. Em uma linha transversal, significaria muito do ponto de vista social, econômico e político. Lula deveria cobrar um plano de ação e cometer imediatamente essa grandiosa tarefa aos Ministérios da Defesa, Cidades, Justiça, Educação, Cultura… E assim, contemplar tantas outras místicas.

Reabilitar o Rio e sua mística implicaria mobilizar comunidades, pois envolveria perfurações em rocha e outras intervenções perigosas que teriam que ser contratadas com empresas especializadas. Ao mesmo tempo, seria uma revolução a exigir mutirões populares para o desenvolvimento de edificações em alvenaria básica. Nesse ponto, pouca ou nenhuma falta faria a mística das favelas.

Não sonha, Lula. Age! Ao retomar os símbolos do Rio de Janeiro, certamente muitos deles de tão caricatos e nocivos, falta alguma fariam – como elitismo hipócrita Zona Sul. Sem contar, claro, com a pecha de covil de milícias, traficantes, Evangeslistão do Pó que servem hoje de sustentáculos para o bolsonazifascismo.

Restituir o Rio de Janeiro ao mundo, não apenas como espetáculo, mas como uma metrópole moderna, igualitária, pacificada não pelo medo ou pela intolerância, mas pela genuína alegria de um povo cuja cultura é uma síntese do País. Nada poderia ser mais simbólico do Brasil transformado que queremos.

* Com COLABORAÇÃO

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

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Armando Coelho Neto

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.

6 Comentários

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  1. Armando diante da grandiosidade do problema a ser encarado por Lula, penso que muito pouco fará sozinho, apesar da genialidade que possui.
    Inúmeros embaraços assolam o Brazil ( com z). Confesso que não saberia dizer por onde começar, mas ouso afirmar que é intrínseco no homem a moralidade perdida. Resgatar é tarefa hercúlea e demorada. Lula em nós ad eternum!

  2. Presidente Lula, reforçando o pedido de Armando Rodrigues Coelho Neto, o Rio de Janeiro agoniza e pede socorro a mais de meio século. Portanto Presidente Lula, eu resuplico o pedido:

    E se crê, deveria fazê-lo, pois é certo que ninguém mais o fará.

    E se crê, deveria fazê-lo, pois é certo que ninguém mais o fará.

    E se crê, deveria fazê-lo, pois é certo que ninguém mais o fará.

    E se crê, deveria fazê-lo, pois é certo que ninguém mais o fará….

  3. Pois é, Armando, pois é…

    Então avisa ao Lula e aos russos.

    Paes já mandou dizer que se Lula e o PT querem a vaga de vice na chapa dele, sonhando em herdar a prefeitura, “de migué”, em 2026, que vão catar favas.

    O país foi paulistizado, meu caro, e o Lula não deixou por menos, paulistizou ainda mais o PT, e matou qualquer chance de vida política inteligente no PT, na esquerda fluminense (ou carioca), e sobrou só essa coisa mequetrefe de costumes chamada PSOL, que hoje anda de mãos dadas com o pragmatismo (uia, se a única coisa que o PSOL tinha como bandeira era a chamada “retidão”, que resta a eles agora?).

    Não há tal resgate sem sociedade viva, orgânica, militante por essa demanda…sem isso, é só esse artificialismo tosco: feijão preto, Flamengo e sotaque malhação com símbolos de coesão nacional.

    Sobrou espaço, e agora está aí:

    De um lado a Globo, de outro as narcomilícias do Senhor, e nós no meio.

    Brizola já decifrou Lula faz tempo:

    Filhote da ditadura, aleluia Golbery.

    Se Lula entendesse o seu carisma, e desse a ela um objetivo histórico correto, ah, meu zeus, estaríamos bem melhores, podes crer, Armando.

  4. Que maravilha seria se o #Lula conseguisse, mas penso que será difícil e/ou impossível pensando como o lugar do BOLSONARISMO RAIZ, pois essa família deve ser comprometida com os MILICIANOS…

  5. 2) Realmente, resgatar o simbolismo do Rio. Há nestes 8 milhões de quilômetros quadrados muito lugar a ser resgatado mas sem o simbolismo (charm?) do Rio;
    2) Não bastou o que se gastou com olimpíadas? Sem falar na Copa.
    3) Só apresentar o que se gastou no Rio e comparar (pode ser per capita) com qualquer capital. Por exemplo.

    1. É exatamente isso que eu penso. O Rio de Janeiro é um poço sem fundo, ou melhor, uma draga insaciável de drenar recursos financeiros. Todos os anos se despeja bilhṍes de reais no Rio de Janeiro à custa de outros Estados com o objetivo de se manter essa “mística” carioca inventada pela Globo, dinheiro esse que ninguém sabe para onde vai e a situação só piora. E ainda tem esses deslubrandos que falam em resgatar o simbolismo. O que os cariocas tem de fazer é pagar as suas contas. Isso sim. E foda-se o simbolismo. E os outros Estados, como ficam? Eles também precisam resolver seus problemas de habitação, saneamento básico, saúde e segurança pública. Mas somente o Rio de Janeiro é que tem direito ao “sonho” sabe-se lá qual a razão.

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