“Nos desumanizamos quando discriminamos”

É preciso aumentar o diálogo para enfrentar avanço da ultradireita

Jornal GGN – A dificuldade de desconstruir valores preconceituosos na sociedade também é encontrada entre grupos oprimidos, esta é a avaliação do deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) e da secretária de políticas de direitos humanos do Distrito Federal, Marise Nogueira, convidados do programa Brasilianas.org.

O caso do antropólogo Luiz Mott, que afirmou que o líder negro Zumbi dos Palmares era gay, é emblemático nesse sentido. Quando publicou suas conclusões, em meados dos anos 1990, o estudioso foi fortemente rechaçado por parte da comunidade negra, que partiu do princípio de que seria um demérito ter um herói gay.

Jean Wyllys diz que essa reação é compreensível tendo em vista as dificuldades que cada grupo enfrenta para ser reconhecido como detentor de direitos.

“Cada segmento ou cada grupo difamado tem diferentes posições de sujeito [impostas pela sociedade] que podem ampliar ou reduzir nossa miséria. Uma pessoa gay tem uma miséria que vem dessa posição de sujeito, de ser homossexual numa sociedade homofóbica. Mas se ela conjuga isso com segunda e terceira posições, que é ser gay, pobre e negro, ela amplia consideravelmente a miséria”, explicou.

Por isso, o deputado defende hoje que movimentos sociais devem trabalhar juntos para desconstruir preconceitos internos. “É necessário, sobretudo nesse momento que estamos vivendo, do avanço das ultradireitas, não só no Brasil como no mundo, que os movimentos sociais se comuniquem para pensar nessas múltiplas posições de sujeito”, alertou.

A doutora Marise Nogueira complementou lembrando que o machismo, ligado diretamente “à visão do homem de que o corpo da mulher deve ser visto como coisa, como posse”, é identificado tanto entre homens negros como entre homens brancos. “A violência de gênero não tem classe social”, pontuou, destacando que a inferiorização de alguns seres humanos por outros é fruto de padrões criados pela sociedade que precisam ser enfrentados e desconstruídos.

“Todos nós nos desumanizamos quando discriminamos, porque sabemos hoje que o feminicídio [assassinato de mulheres] é um crime contra a sociedade, porque a família que vive uma situação de violência está toda doente e essa violência praticada [no núcleo familiar] irá para toda a sociedade. Quem foi abusado, muito mais chance tem de ser abusador no futuro”, avaliou.

Por que discutir direitos humanos?

Para a maior parte das pessoas que vive em sociedade é natural ter o direito de estudar, de ser atendido em um hospital, de concorrer a uma vaga de emprego em pé de igualdade com os demais. Mas, infelizmente, essa ainda não é a realidade de milhões de pessoas mundo afora, e não porque em suas cidades ou estados não tenham escolas, vagas de emprego ou hospitais, mas por serem diferentes, seja pelo tom da pele, por andarem de cadeiras de rodas, por gostarem de pessoas do mesmo sexo ou por apenas terem o dom de dar a luz.

Mulheres, por exemplo, recebem 77% do salário dos homens, mesmo os dois exercendo a mesma função e com o mesmo grau de instrução escolar, segundo o último levantamento da Organização Internacional do Trabalho. Já no Brasil, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), revelou que mulheres ganham 2/3 do salário masculino.

O Brasil, ainda, é um dos países mais violentos do mundo para a Anistia Internacional, matando mais do que em regiões de guerra – são cerca de 56 mil vítimas de homicídios por ano no país. Moradores da periferia, sobretudo jovens negros, mulheres, homossexuais e travestis são as principais vítimas, pois o mesmo documento aponta que todos os dias 82 jovens morrem no Brasil por assassinato ou acidente de carro, sendo 77% negros. Já, segundo o coletivo Transrevolução, a expectativa de vida de uma travesti e transexual no Brasil gira em torno de 30 anos, enquanto a expectativa de vida de um brasileiro médio é de 74,6 anos. Em relação às mulheres, dados levantados pelo Ipea, de 2013, apontam que a cada uma hora e meia uma mulher morre vítima de violência masculina no país.

Tendo em vista esse cenário, a primeira pergunta que surge é de que forma a sociedade civil organizada e os poderes legislativos e executivos podem atuar para reverter essa imagem. A resposta, para os debatedores Marise Nogueira e Jean Wyllys, não é simples e complica ainda mais quando o agente indutor ou motivador da violência são membros do próprio jogo político, representantes da população.

Acompanhe à seguir o debate completo do programa Brasilianas.org, coordenado pelo jornalista Luis Nassif:

https://www.youtube.com/watch?v=UXfMuonRK1s width:700

Redação

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