Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
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De volta à Redação, duro como uma rocha, por Rui Daher

As telas me exaurem. Após horas, analisando balanços de empresas a que assessoro, transformei prejuízo em lucro.

Claude Verlinde

De volta à Redação, duro como uma rocha, por Rui Daher

Hoje em dia, pouco manuscrevemos. Teclamos. Mesmo a assinatura não lembra a mesma de anos atrás. Vez ou outra, tento. A Montblanc, presente de patrões em épocas de executivo, emula e me faz chique. Mais tarde, mal reconheço o que escrevi. Assim começou este texto que agora teclo, em caligrafia limpa e perfeita, mas não orgânica, se me entendem.

As telas me exaurem. Após horas, analisando balanços de empresas a que assessoro, transformei prejuízo em lucro. Errei: “Cansaço da vida, cansaço de mim, velhice chegando e eu chegando ao fim” (Antônio Maria).

Ligam-me da Redação.

– Venha rápido! Trata-se do Pestana.

Reconheço a voz do segurança e poeta Everaldo. Desliga, mas não antes que eu possa ouvir um choro ao fundo.

Pestana é o mais equilibrado entre nós na Redação. Vezes moleque, vezes, rara surpresa, porra louca.

Sigo. Everaldo está na porta para me receber. Sabe das ameaças bolsonaristas que recebo.

– Chefe, fique tranquilo, ele está mal, chora muito, mas ainda mantém a máscara e, a cada dez minutos, banha-se de álcool em gel.

– Certeza não ter usado nosso estoque de salineiras?

– Sim.

– Querido Pestana, o que aconteceu. Algo grave? Estou aqui para ajudá-lo.

O choro, agora, com a minha presença, fica convulsivo.

– Abra-se. Despeje suas mágoas. “Amigo é pra essas coisas”, saudoso Aldir.

– Foi com a esposa dele, diz Everaldo, um cavalheiro semântico.

– Algum problema com sua mulher, Pestana?

– Fiz uma bobagem, chefe. Sabe o que são quase nove meses, um parto, em isolamento, atendendo aos comandos da mulher e da internet?

– Claro que sei. Estou assim. Pior se fosse de um homem.

– Porra, chefe. Chamei você e não o transviado colega Nestor.

– Trans posso concordar, veado acredito que não.

– A gente tenta se divertir nas telas. Procurar novidades. Aventuras virtuais, curiosidades bestas.

– Evito.

– Pois é, eu não. Foi meu erro. Há alguns dias, fui procurá-la para fazer amor. Um fugidio e inesperado momento de elevação depois de anos. Não me pergunte o porquê. Acontece. Tempos de namoro e lua de mel.

– Imagino.

Pestana volta a chorar.

– Mas o que houve?

– Tenho recebido diversos e-mails sugerindo que eu aumente o tamanho do pênis, ganhe virilidade, enlouqueça na cama mulheres, gel mágico.

– É comum a todos nós, que se imaginam machos.

– Um deles me deixou muito curioso e intrigado: “fique como uma rocha na cama”. Não entendi bem. Por precaução, não abri, mas deixei lá em meu computador. Talvez um dia a curiosidade vencesse o medo.

– Hummmm … Péssimo.

– Pois é. Ela leu. E quando a procurei para o amor berrou: “o que você acha que eu faria com uma rocha em minha cama?”

– Desabei. Como reação ao vergonhoso flagra, dei-lhe um tabefe.

– Vixe! Em mulheres não se bate nem com uma flor.

– Pediu divórcio, denunciou na delegacia das Mulheres. O que faço agora?

– Sugira que ela volte a ser fria como um iceberg. Pode ser que combinem.

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

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