Pesadelos de um segundo turno muito conturbado

“Caminho pelas ruas do que parece ser uma cidade do interior até chegar a uma praça. Quero encontrar um amigo de infância que não vejo a décadas. Ele é dono de uma loja de ferramentas, mas a loja está fechada. Na frente dela alguém me diz que ele está vendendo ferramentas na feira livre. Vou até o local.

Meu amigo está atendendo um outro cliente, então fico observando as ferramentas. Aproveitarei a oportunidade para levar algumas delas. Pego algo parecido com um alicate e aperto, da ponta do objeto saem duas chaves de fenda rodando em sentidos opostos. Não consigo imaginar qual a utilidade daquilo.

Observo outra ferramenta e ela já está em minhas mãos. O objeto parece ser uma broca, mas é feita de madeira com saliências de metal parecidas com aquelas que existem numa lima de madeira. A ponta do objeto é muito fina. Ele fica mais largo e semicilíndrico de um lado e termina num cilindro com dentinhos metálicos afiados com o suporte de encaixe para furadeira.

Enquanto manuseio aquela ferramenta tentando imaginar para o que serve, meu amigo continua atendendo o outro cliente. Mais alto que meu amigo, o cliente não encontrou o que desejava e ficou irritado. O vendedor sorri e diz:

– A ferramenta que você quer eu não tenho aqui, mas posso levar depois na sua casa. Você sabe que sou petista, mas posso perfeitamente atender bem um cliente que não vota no PT.

Sem dizer uma palavra, o cliente agarra meu amigo e começa a agredir ele. Outra pessoa entra na briga e começa a trocar socos e pontapés com o cliente agressivo. Em algum momento, o agressor vai ao chão desacordado. Tento movimentá-lo com o pé para saber se ele está vivo, mas algo estranho acontece. O agressor afunda no piso de chão batido.

Alguns segundos depois, ele ressurge na loja maior do que era. Mas antes que possa agredir alguém ele misteriosamente ascende ao céu esperneando. Olho para cima e vejo que o agressor foi apanhado por um imenso gigante que devora sua cabeça como numa pintura que eu vi em algum lugar.

Meu amigo desaparece. O gigante também. Consulto o celular. Recebi uma mensagem do GGN. Alguém publicou um texto dizendo que não devo mais publicar artigos naquele site. Fico furioso. Começo a escrever uma resposta e me sento num banco na avenida próxima à Faculdade de Direito de Osasco. Há vários bancos ocupados no local. Um carro para na avenida. Dele sai alguém que pede para as pessoas levantarem dos bancos. Carrancudo, ele pragueja:

-Vocês não podem sentar aí. Esses bancos não foram feitos para vocês.

Todos se levantam, mas continuo sentado escrevendo a resposta. Ele fica ao meu lado observando o que estou fazendo. Quando termino, levanto e vou em direção a entrada da Faculdade para atravessar a rua e subir em direção ao Diretório Acadêmico para chegar à Igreja Matriz de Santo Antônio e descer para o Largo de Osasco. Meu acompanhante desagradável e indesejado diz o seguinte:

– Não adianta ficar enviando mensagens do PT, elas não serão capazes de mudar a realidade. Nós já ganhamos a eleição.

Envio a mensagem, mas ela se desmancha como se fosse um pedaço de bolo gelado que foi aquecido. A mensagem sai do celular e vai direto para uma lata de lixo fixada no muro da Faculdade. Desanimado, enfio o celular no bolso.

Meu acompanhante desaparece, decido ir a festa de aniversário de outro amigo de ginásio. Penso em ligar para perguntar se devo levar algo. Me convenço a levar uma garrafa de bebida, depois decido não levar nada. Mais alguns passos e estou convencido de que não irei a festa alguma, pois ele deve ser eleitor do Bozo e não ficará satisfeito ao receber em caso um eleitor do outro. Merda de eleição.

Sigo em frente em direção ao Largo de Osasco. O tempo fica nublado e começa a chuviscar. Estou com um guarda-sol numa das mãos, mas não consigo abri-lo porque tenho um punhado de palitos de dente na outra mão. Chego ao terminal de ônibus da Vila Yara. A praça de alimentação está lotada. Uma moça nariguda, que come batatas fritas com as mãos, olha para os meus palitos de dente. Coloco-os no bolso da calça, atravesso a praça de alimentação e sigo para a passarela que sai da Estação de Trem de Osasco. Caminhei numa direção e cheguei no destino oposto.

A passarela é imensa. Se estende da Estação de Trem até o rio Tietê, atravessa-o e segue até o infinito. Ela parece ser feita de vidro resistente. Fechada dos lados e em cima, a passarela parece muito segura. É possível ver o chão e isso provoca náuseas. Caminho durante algum tempo e noto que ela não é mais fechada na lateral. Está chuviscando a cobertura da passarela desapareceu. Maldito guarda-sol, não sei onde foi que o perdi. O piso da passarela não é mais transparente. Num dos lados dela a proteção é baixa e insegura, no outro a mureta já despencou no abismo.

O piso da passarela é instável. Ele se movimenta à medida que caminho em direção ao rio. Desesperado sento chão, pego meu celular e começo a filmar. Alguém tem que reclamar do que está ocorrendo e fornecer a prova do estado lastimável daquela obra.

Na tela do celular vejo a passarela ondulando freneticamente e jogando as pessoas para fora dela. Mas a imagem não corresponde à realidade. O movimento da passarela é suave e uma pessoa que foi gravada sendo jogada no abismo passa tranquilamente por mim. Desperto.”

Agressão politicamente motivada, distanciamento emocional das pessoas queridas, conflitos pessoais por causa da disputa eleitoral, sensação de impotência diante do imponderável, insegurança crescente, incapacidade da tecnologia de fornecer certezas e uma imagem coerente e estável da realidade… Os temas destes pesadelos são bastante evidentes. Todos eles estão de alguma maneira relacionados com o contexto em que fomos obrigados a viver. E do qual poderemos sair aprofundando ou não o pesadelo no dia da eleição.

 

PS: No detalhe a representação gráfica de uma cidade feita pela Deutsche Welle para um documentário.

 

Fábio de Oliveira Ribeiro

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