Congadas de Minas: a fé que dança

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Diversidade Cultural

Congadas de Minas – A Fé que Dança

por Mafalda Pequenino

A festa da de Nossa Senhora do Rosário dos homens Pretos é a lendária Festa do Reinado de Chico Rei, homem que na África era o soberano da sua tribo quando foi capturado por negreiros juntamente com sua família e quase todo seu povo. Na travessia para o Brasil morreram sua mulher e quase todos os filhos, restando apenas um. Ao chegar em Ouro Preto, Francisco trabalhou nas minas e conseguiu realizar a economia necessária para comprar a sua libertação e a do filho. Adquiriu a mina de Encardideira e aos poucos comprou a libertação dos compatriotas.

Os escravos libertos tinha Chico como rei. A corte estava formada. Esse grupo associou-se a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos em 1715, uma confraria de culto católico, criada para abrigar a religiosidade do povo negro que na época da escravidão era impedido de frequentar as mesmas igrejas dos senhores. Construíram em 1723 a Igreja do Alto da Santa Cruz em alvenaria de pedra e cantaria do Itacolomia: um dos maiores monumentos do barroco mineiro.

A celebração é realizada com tambores, pontos cantados, muita dança e música. Esta celebração é  conhecida como “Congado”, mas também pode ser denominada “Congada” ou “Congo”. Manifestação cultural e religiosa de influência africana, o Congado traz tradições tribais de Angola e do Congo mesclada à influências ibéricas. Esse legado de experiências históricas é preservado em diversas regiões do Brasil com algumas diferenças devido à cultura de cada região.

O Congado tem no estado de Minas a maior concentração. Passado três séculos, o legado de Chico Rei se tornou referência para todo o Brasil. Transmitida oralmente, a tradição é passada de uma geração para outra.

A Congada é um bailado dramático que representa a coroação do rei do Congo e da Rainha Niziga, acompanhado de um cortejo compassado, cavalgadas, encenações e levantamento de mastros. Os temas dos enredos tratam basicamente da vida de São Benedito, o encontro de Nossa Senhora do Rosário submergida nas águas, Santa Efigênia e a representação da luta de Carlos Magno contra as invasões mouras.

A tradição oral remete três naturezas de Congado praticados por “Chico Rei” e seu grupo: o Candombe, realizado pelos mais velhos que falavam em bantu, relembrando a África, os ancestrais e passado; o Moçambique com seu canto de lamento, os gungás e pantagomes marcando o ritmo dos grilhões que acorrentava o povo africano; e o Congado, que na batida forte do tambor marcava a força, a vitalidade e busca da liberdade. As manifestações femininas eram feitas através da dança das taieiras. Os cantos das mulheres lamentavam as prisões e a dor do povo escravo, mas oferecia o alento e a esperança.

As festas em louvor a Nossa Senhora do Rosário começavam às vésperas do Natal, com a novena. Durante os nove dias que antecediam a festa, os congados faziam a procissão dos mastros e bandeiras, dançavam, cantavam e rezavam. Festa de muita alegria, devoção e fé.

No dia 01 de janeiro, ao alvorecer, os sinos anunciavam a festa de Nossa Senhora do Rosário e Santa Efigênia. As festividades prosseguiam até o dia 06 Janeiro, a ele se juntava a Folia de Reis e os Reis Magos eram incorporados ao cortejo real.

Atualmente, a data da festa varia de região para região, muitas a realizam no mês de agosto. Em Ouro Preto a festa da Nossa Senhora do Rosário e Santa Efigênia é realizada de 02 a 09 de Janeiro, segundo o calendário da cidade.

Essa grande Herança Africana, transmitida oralmente pelos mais velhos, os detentores das tradições, preservando aspectos básicos do viver antepassado, de significados e expressão por meio da dança, música e rituais religiosos de caráter sincrético, louvando os santos católicos e os Deuses Africanos – O Congado segue rumo a tornar-se parte do patrimônio Imaterial da Humanidade. Decisão histórica que contribui para valorização e proteção dessa importante manifestação cultural da alma afrobrasileira, a essência de nossa cultura popular.

Mafalda Pequenino é atriz e articulista no Jornal GGN

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

4 Comentários

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  1. Infelizmente o Congado vem

    Infelizmente o Congado vem perdendo público e continuadores para as igrejas evangélicas. Não é incomum no interior grupos encerrarem suas atividades em função da conversão de suas lideranças. Some-se a isso, há o desinteresse dos mais jovens. 

    1. Sabe tudo!

      Perdi um abusado amigo congadeiro que, arrependido das presepadas pregressas, se tornou o Imão Taruira – não pode falar! – como é contado em comentário ao post.

  2. A Conversão do Congadeiro Taruira

    Risca a Faca

    O meu velho amigo Josemir, festeiro e ‘gente boa prá mais de metro’, comandava a Festa de Nossa Senhora do Rosário em uma bucólica e super aconchegante cidadezinha da região do Parque Estadual do Rio Doce.

    Celebração dos 67 anos do Parque Estadual do Rio Doce, 2011.

    O desassombrado Josemir, cabra do c* riscado, com o fardamento característico, durante o desfiles dos vários grupos de marujos e congados, metia o seu alongado facão no piso de pedra das ruas, lançando fagulhas ao espaço circundante, na cidade onde se concentram os seus ascendentes e outros aparentados que ainda resistem e permanecem residindo não muito distantes da metrópole.

    Mas aquela cidadezinha, inserida na macrorregião do Parque Estadual do Rio Doce, perdeu um dos seus maiores agitadores culturais.

    Parque Estadual do Rio Doce

    Vista área de uma das mais de 40 lagoas do notável sistema lacustre do PERD.

    A conversão ao credo evangélico sequestrou o amado Taruíra – o insolente que pronunciar este apelido, na sua frente, pode encomendar o caixão – não entra mais na igrejas de orientação católica, patrocinadora do evento, onde são reunidos os vários grupos para a comunhão na tradicional missa, que é realizada para abençoar os participantes e os espectadores do encontro festivo anual.

       Muriquis do PER

    São, no entanto, os atrevidos macacos pregos que circulam, livremente, e promovem a diversão dos visitantes quando recebem bananas maduras ou outro tipo de alimentação que não é recomendada pela Guarda Florestal.

    Para concluir, declaro que sou grato pelo legado que o meu parça deixou e continua muito bem prestigiado pelo sabido povo daquela região.

    Precavidamente, fujo prá bem longe, dando um “salve abençoado Taruíra!”, antes que ele descubra o esconderijo deste incorrigível delator.

    Reconsiderando: agora ele só anda armado com a Bíblia e não faz mal nem a mim nem a ninguém, graças à Deus!

    Celebração religiosa no templo católico onde é realizada a Festa de Nossa Senhora do Rosário, 2011.

    [video:http://youtu.be/vxulwwOJCh8%5D

    A Raizes do Batuqe Rural

    Em outra cidade, na região das montanhas, existe, também, outra festa singular onde um sanfoneiro, sem dedos em uma das mãos, arrebenta e comanda o som dos congadeiros.

    Muito próximo dalí, existe um povoado conhecido como o Achado dos Pretos que era formado por uma comunidade  quilombola.

    Grupo de pesquisadores da raizes do batuque nas comunidades rurais, 2011.

    Recentemente, as terras foram adquiridas por pessoas abastadas e nada mais restou daquele núcleo que era motivo de estudos acadêmicos e documentários que investigavam, entre outros temas, a antropologia e as raízes do batuque nas comunidades rurais.

    [video:http://youtu.be/X2H04GuloAM%5D

    Só Alegria!

    Em outra área rural, a terceira, também na região montanhosa, há mais uma Festa do Rosário.

    A reunião de congadeiros, bem concorrida, faz parte do calendário de eventos ligado aos esportes de aventura que é frequentado por motociclistas, jipeiros, praticantes do voo livre, escaladas, rapel e ciclismo, etc., em um harmonioso cenário coberto por floresta nativa, permeada com plantações de eucaliptos, adornados por belas cachoeiras que favorecem o clima ameno e, extremamente, agradável do local.

    [video:http://youtu.be/2n3ywmuZ-VU%5D

     

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