A história contada é apenas uma versão da realidade

Enviado por Adir Tavares

do Informação Incorrecta

Smart

A História contada é apenas uma versão da realidade: existem outras versões, provavelmente bem mais próximas da realidade.

Um bom exemplo chega da ex-União Soviética, hoje conhecida como Rússia. E é um exemplo interessante porque demonstra também como exista um fio vermelho que liga o passado ao presente e este último ao futuro.

Não é novidade o facto da História não ser um conjunto de “saltos” mas algo bem mais homogéneo e linear; pode ser novidade descobrir a natureza do tal “fio vermelho”, quem o gere e quanto distante isso fique das nossas convicções.

Smart: Magnitogorsk

Se observamos as cidades de Gary (Indiana, Estados Unidos) e aquela de Magnitogorsk (Rússia) podemos notar muitas similitudes: cidades marcadas por um quadrilátero constituído pelas grandes vias de comunicação, um rio que divide o habitado da empresa siderúrgica, até a disposição dos implantes desportivos e do terminal ferroviário é a mesma. Não é um acaso: quem construiu Gary em 1906 desenhou Magnitogorks também em 1928.

Na altura, como parte da preparação do Plano Quinquenal, uma delegação soviética chegou em Cleveland (Ohio, EUA) para discutir com a agência de consultoria Arthur G. McKee o desenvolvimento da cidade russa, até então representada por poucas casas em volta dum antigo complexo militar.  Nascia assim a primeira smart city russa, que nas primeiras fases até atraiu trabalhadores americanos, sobretudo engenheiros.

Desde 1937 Magnitogosrk tornou-se uma cidade fechada (com limitações acerca dos movimentos de cidadãos estrangeiros) mas nem por isso esta estranha colaboração Oeste-Leste acabou.

Magnitogorsk

Em 1986, o professor Antony C. Sutton do Hoover Institute publicou The Best Enemy Money Can Buy, que conta da presença da Ford Motor Company na cidade de Nizhni-Novgorod (também conhecida como Gorki). Também aqui os Estados Unidos colaboraram de forma activa não apenas na produção de veículos civis  como também militares.

O acordo tinha sido assinado em 1929: o governo soviético se empenhava na aquisição de 13 milhões de Dólares em meios de transportes e peças sobressalentes, enquanto a Ford fornecia assistência técnica pelo menos até o ano 1938. De facto, todos os modelos da GAZ (Gorki Avtomobilnyi Zavod) foram construídos segundo os ditames da fábrica de Gorki.

Carros e camiões da Ford-Gorki não só encheram as ruas dos Países do Pacto de Varsóvia, mas também os campos de batalha; modelos produzidos a partir de 1930 têm sido frequentemente modificados para uso militar, como camiões blindados e plataformas móveis de mísseis. O que criou bastante confusão entre os soldados norte-americanos no Vietnam e na Coreia, surpreendidos em ver os camiões blindados comunistas demasiado semelhantes aos deles. Alguns modelos nascidos da colaboração ainda são utilizados pelas forças do Leste (obviamente foram actualizados com o passar das décadas).

Tudo isso não deve surpreender, pois existem dois planos distintos: o primeiro é aquele vendido ao povo e é o mesmo que podemos encontrar nos media; o segundo é aquele dos bastidores, ignorado pelos mesmos órgãos de comunicação. O primeiro plano conta a história de Países empenhados numa feroz guerra ideológica, o segundo relata as aventuras do Deus Dinheiro e das suas leis do mercado, que são bem mais fortes de qualquer ideologia, até o ponto de poder ser utilizadas para enfraquecer o eventual inimigo a partir do interior (história bem antiga esta) ou até para criar inimigos, quando isso for conveniente (ver os financiamentos americanos de Hitler).

Resumindo: duas histórias, uma para manter o povo calmo e bem encaminhado, outro para alcançar determinados objectivos.
 

Smart city, smart car

Tudo isso acabou com a era de Estaline? Nem pensar. O Verdadeiro Poder (porque é disso que estamos a falar) não conhece ideologias e tem muita paciência. Sabe que o trabalho pode ser demorado, mas compensa. E nem é preciso mudar de esquema.

Lembra o Leitor das cidades-fantasma da China? Imensos prédios vazios, construídos sem que haja um único morador, por vezes no meio do deserto. Estas cidades são as smart city de hoje, exactamente como foi Magnitogorsk na altura. E quem encontramos atrás das smart city (deveria escrever-se cities) chinesas?

Eis a página das colaborações (partnership) do sito internet de Tianjin: não a velha Tianjin, que existe desde pelo menos a Idade Média, mas a nova, que está a ampliar-se com uma velocidade impressionante.

Tratamos apenas dos nomes mais conhecidos:

  • GM é a General Motors, que dispensa apresentações.
  • Mitsui Fudosan Residencial é uma empresa imobiliária, nomeadamente a maior do Japão.
  • Panasonic, Philips, Samsung e Siemens são outras multinacionais bem conhecidas.

Cereja no topo do bolo: a bênção das Nações Unidas, que em 2010 preparou a conferência sobre as alterações climatéricas nesta cidade, considerada um “modelo de desenvolvimento”.

Uma smart city que não é única: Kazan é o exemplo russo (com Toshiba, Ford, Mitsubishi…). E dado que a História costuma repetir-se, eis que a Ford assinou com a Universidade de S. Petersburgo um acordo de cooperação que tem como objectivo a construção de carros auto-conduzidos, ligados via satélite. E a China? Tranquilos: a Ford está presente também aí, com as smart cars (é tudo smart: cidades, carros…), um investimento de 1.8 biliões de Dólares.

Atrás do smart: a Trilateral

Mas quem fica atrás desta “vaga” de colaborações entre multinacionais e BRICS?

Voltemos atrás, até a smart city de Kazan.
Além dos já citados investidores, podemos encontrar um nome interessante: Allianz.

A multinacional alemã de seguros é na verdade uma criatura da americana Pimco (assets de 1.52 triliões de Dólares em Junho deste ano), mas o que é curioso aqui é observar os seus recentes funcionários:

  • Oliver Bäte, o actual chefe executivo, é membro da Comissão Trilateral.
  • Wolfgang Ischinger, actualmente embaixador e antigo chefe de Comunicação e pesquisa da empresa, faz parte da Comissão Trilateral.
  • Enrico Tomaso Cuccchiani (Conselho de Administração) também milita na Comissão.
  • Henning Schulte-Noelle (ex chefe executivo, agora membro do Conselho de Supervisão), Alfonso Cortina (membro do Conselho International e também Chefe vice-Chefe da Rothschild Europe), Katinka Barvsch (directora dos Relacionamentos Político e também parte do grupo Rockefeller) são todos membros da Comissão Trilateral.

Será que a Comissão Trilateral desenvolve um qualquer papel neste mundo smart que abraça os BRICS? Vamos até outra smart citySkolkovo, que está a surgir a poucos quilómetros da capital Moscovo, uma espécie de Silicon Valley russa. O elenco dos investidores-colaboradores é significativo: Boeing, Cisco, Airbus, Dow Chemical, Ericsson, General Electric, Honeywell, IBM, Intel, Microsoft, Samsung, Siemens…

E mais uma vez, olhamos para a lista da Comissão Trilateral: há concordâncias? Há.
Da Comissão Trilateral fazem parte:

  • Shephard W. Hill, presidente da Boeing.
  • Andrew Liveris, chefe da Dow Chemical.
  • Clara Gaymard, chefe da General Electric France.
  • Richard Thoman, ex-vice presidente da IBM.
  • Lee Jay Y., vice-presidente da Samsung.
  • Joe Kaeser, chefe supremo da Siemens.
  • Peter Loscher, chefe executivo da Siemens.

O que significa tudo isso?

Significa que, como lembrado no começo do artigo, há duas realidades: uma visível e uma menos visível. A menos visível constitui a desilusão de quem prefere ficar parado no esquema das antigas ideologias, esquecendo que o mundo de hoje vive numa outra dimensão: a dimensão do Verdadeiro Poder que não conhece fronteiras ou ideias políticas, cujas armas de eleição são a propaganda e o dinheiro. Rússia, China e qualquer outro membro das Nações Unidas abraçaram o “livre mercado” e, ao fazer isso, entregaram-se à mesma lógica de poder que infelizmente regula a maioria do planeta.

Para nós sobrou a primeira dimensão, a mais simples, feita de bons dum lado e maus do outro. Uma visão elementar que todos conseguem entender e partilhar, não sendo preciso muito esforço para isso.

A segunda dimensão se calhar é um pouco mais complexa e menos visível mas isso não significa que fique escondida: não é preciso esconder nada, pois ninguém vai espreita-la. O que é uma pena, pois é aí (e não nas ideologias) que podemos encontrar os mecanismos de base que regulam toda a nossa sociedade, sem excepções. É também aí que o Verdadeiro Poder é obrigado a deixar os seus rastos. 

Ipse dixit.

Fontes: Antony C. Sutton – The Best Enemy Money Can Buy (ficheiro Pdf, inglês), no texto.

 

Redação

4 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Ideologia , eu quero uma para viver

    Os caminhos ideológicos que nortearam os tempos que se seguiram após a revolução industrial, não mais frequentam o debate político e convenhamos, nunca foram absolutos. Por uma questão propagandista, símbolos de um lado e de outro não se misturavam, mas agora se misturam. hoje o discurso é de desenvolvimento sustentável. O capital como objeto de união e não de separação. O problema é tratar tudo como guerra. O homem precisa ter um sentido mais humanista e colocar suas possibilidades a serviço de toda a humanidade. Não cabem mais discursos de segregação por falta de interesse em um lugar ( a África por exemplo). A equivalência social que é o remédio contra a tirania que ainda assola certos lugares, é que levará o mundo a paz e a fraternidade.

  2. Interessante

    Texto cheio de curiosidades, quase almanaquístico, mas das duas uma: ou é ingênuo ou é manipulador, no sentido de abraçar e reforçar a tese do “fim da história”, que aliás é o do que ele tenta nos convencer. Não consegue, pois evidentemente o mundo atual é multipolar: basta ver o que está ocorrendo na Síria e na porção meridional do Mar da China, apenas para ficar em dois dados da conjuntura…

    Mais: a cidade de Magnitogogorsk tem uma concepção modernista, no sentido de Le Corbusier, que é o da cidade funcional, com separação entre usos, altas densidades, grandes áreas livres, unidades de vizinhança, separação entre veículos e pdestres, etc – algumas características destas aparecem claramente na fotografia que ilustra o texto. Esta cidade não tem nada a ver com “Smarth cities”… Diga-se também que Le Corbusier era comunista e colaborou intensivamente com o governo soviético nas décadas de 1930 e 1940 – A parte “nova” de Moscou é resultado desta colaboração, assim como outras tantas cidades soviéticas.

  3. Salve o porto de Mariel …

    A aversão a Cuba, que a classe media brasileira ignorante e colonizada faz questão de berrar, é completamente descabida. E depois esses babacas, inclusive os letrados, afirmam que p atraso vem da esquerda … 

  4. Creio, em minha opinião, que

    Creio, em minha opinião, que países como a China e a Rússia com sempre tiveram ideais socialistas ou comunistas, se tornaram muito igualitárias no nível individual…. Quero dizer, se você vê chineses ou russos, você não encontra aquele espírito competitivo e destruidor de um para o outro como se vê em países capitalistas selvagens como EUA ou Brasil. Mais recentemente a China descubriu fraudes na bolsa de valores, as mesmas praticadas por americanos pelo mundo todo e por isso é muito provável a participação americana na fraude… mas o fato é que o governo chinês cortou o mal pela raiz, quando se tem um estado atuante o povo fica mais sossegado e em paz… mas quando, em nome de uma suposta democracia sucateia-se o estado, aí prevalecerá a lei do mais egoista. Os bancos e as grandes multinacionais tomam conta de tudo, comprando políticos para fazerem políticas que destrua o estado e tire o dinheiro de sua população para dar a bancos e multinacionais. Aí está o capitalismo selvagem, em nome de uma suposta democracia pelo mundo eles financiam golpes de estado para que através deste golpe de estado destrua o estado e através do estado tomem atitudes não democráticas empobrecendo suas populações, privatizando seus bens essenciais como energia eletrécia e água, e ainda sucanteando estes bens essenciais para que aumente o valor das contas de água e luz e assim escravizar as populações financeiramente. Também utilizam dos títulos do governo para coagir o povo a ter mais impostos e menores investimentos em educação, saúde e saneamento básico, isso quando estes não são privatizados e tornam o povo refém da inciativa privada, assim como é a saúde nos EUA ou como é a água no Peru. Privatizaram a distribuidora de água no Peru, a distribuidora de água ficou anos fazendo seus mananciais secarem e como diminuiram o nível da água aumentaram as contas do povo para sugá-los assim como aconteceu e acontece em São Paulo.

     

     

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador