Jovens negras assumem cabelo crespo com atitude, por Fania Rodrigues

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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“Somos agredidas quando nos negam o direito de usar nosso cabelo, nossas tranças e nossos turbantes”, diz Karina Vieira

Do Brasil de Fato

O orgulho está na pele, no cabelo e na história dos seus antepassados. Assumir-se negra já é em si uma postura política. Portanto, falar da beleza da mulher negra inclui abordar o significado de reafirmar essa negritude. 

A ideia de ter cabelo alisado nunca seduziu a produtora audiovisual Jessyca Lires, de 21 anos. Ela explica que o simples fato dela assumir quem ela é de verdade já causa reação na sociedade. “Nosso corpo é um espaço de resistência. Em qualquer lugar que a gente chega causa um impacto. Manter nossos cabelos assim é um posicionamento político, é uma forma de resistir”, afirma Jessyca.

O racismo ainda está longe de acabar, mas as integrantes do coletivo Meninas Black Power não se deixam intimidar. Elas decidiram escancarar toda a beleza e a exuberância dos seus cabelos crespos.

“Nossa imagem incomoda algumas pessoas, mas isso acontece porque nós, mulheres negras, estamos ocupando espaços que antes a gente não ocupava. E esse incômodo é transmitido em forma de racismo”, diz a estudante de comunicação Karina Vieira, de 31 anos.

Entretanto, o preconceito nem sempre é tão escancarado. De acordo com Karina, muitas vezes ele vem disfarçado de brincadeiras e piadas. “Mas racismo não tem graça”, destaca a universitária.

Violência

As mulheres negras são as maiores vítimas de violência no Brasil. Segundo os dados do Mapa da Violência 2015, o feminicídio de negras cresceu 54% em 10 anos, entre 2003 e 2013, enquanto o número de mulheres brancas mortas caiu 10% no mesmo período.

Suzane Santos trabalha com publicidade afirmativa em comunidade do Rio e articuladora cultural. Quem vê a bela jovem, de 22 anos, não imagina que ela pode ser agredida por conta de sua aparência física. Mas foi. 

“Uma vez estava atravessando uma passarela, em Ramos, dois homens passaram por mim e um dele me chamou de ‘gostosa’. Olhei feio e um deles disse que eu tinha que agradecer porque estava recebendo um elogio. Minha estética não agrada, só meu corpo que interessa”, afirma Suzane.

Desigualdade

As mulheres negras continuam recebendo as menores remunerações no mercado de trabalho. Para as Meninas Black Power, essa questão não está separada de sua estética. “Estamos na base da pirâmide social pelo racismo. Isso também é uma forma de violência. Somos agredidas quando nos negam o direito de usar nosso cabelo, nossas tranças e nossos turbantes”, diz Karina Vieira.

Pérola negra

“A gente nasce preta, mulata, parda, marrom, roxinha dentre outras, mas tornar-se negra é uma conquista”, diz a militante do movimento negro Lélia Gonzalez. Tomar consciência é só o começo, mas é um começo importante. Por isso, o cabelo das mulheres negras não é só uma questão de moda ou estilo. É uma afirmação de toda história dos antepassados, das rebeldias, da resistência cultural e identidade. 

Deste modo, as bandeiras levantadas pelo fim da violência contra a mulher, do racismo e das desigualdades de salário estão atreladas à luta pelo direito de usar o cabelo afro e pela estética que reafirma a identidade negra.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

11 Comentários

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  1. uma pergunta, em nome do
    uma pergunta, em nome do politicamente correto as pessoas tem de passar considerar tudo bonito? Afinal uma mulher pode ser admirável e não ser bonita e o contrário também, vide a mulher do Cunha que é uma mulher bonita, mas representa algo detestável e fútil, então tentar reduzir e misturar ética, afirmação cultural, raça etc como determinante em aspecto físico é forçar demais a barra, resumindo então, EU acho as três retratadas MUITO pouco atraentes e se alguém pensa diferente ótimo, pode ser assim?

    1. “considerar tudo bonito? ”
      O

      “considerar tudo bonito? “

      O bonito ou feio são avaliações subjetivas.

      O fato de você considerar as meninas puco atraente, não quer dizer nada. Ainda bem por isso.

      Você já tem um padrão pré estabelecido para beleza, que foi imposto pela sociedade ao qual você está inserido. 

      A novidade será, quando você aceitar o que está fora do status quo.

      Se não entendeu desenho para você.

        1. “Eu aceito, respeito e

          “Eu aceito, respeito e continuo tendo minha opinião, posso?”:

          Nao pode nao, anonimo filho da puta.  Assinando seu nome real voce pode nos dizer qual das 3 retratadas eh feia ou vai continuar no anonimato pra fuder um assunto como esses?

          Da proxima vez, tente LER ANTES DE COMENTAR, aqui nao eh casa da sua sogra.  Voce nao chegou nem PERTO do assunto do post.

  2. Acredito que a sociedade

    Acredito que a sociedade brasileira ainda vai levar pelo menos uma geração, para aceitação, respeito e aprender a conviver com o diferente, principalmente com os negros.

    Esse processo é lento.

    Ultimamente temos visto manifestações contra pessoas negras nas redes sociais. Pode ser um paradoxo, mas isso é bom.

    Estão sendo criticadas porque estão tendo visibilidade, fora dos padrões pré estabelecidos para os negros.

    Como, empregadas porteiro segurança…

    Esse protagonismos e afirmação de pessoas da raça negra, assustam alguns brancos, e negros submissos ídem.

    A mudança de postura e afirmação dos negros é inexorável, vai acontecer.

    Portanto brancos racistas, lamento por vocês, mas nós, 51% da população brasileira, vamos ocupar o nosso espaço.

    Hoje ocupamos a base da pirâmide social, estamos indo rumo ao cento e ao topo, para participarmos da tomada de decisão do nosso país.

    Aconselho a vocês sairem da nossa  frente, senão vamos passar por cima .

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