Justiça de Campinas desapropria 10 hectares a quilombolas

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Foto: Arquivo Pessoal

Da Imprensa TRF-3

A Justiça Federal julgou procedente a ação movida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) para decretar a desapropriação de uma área de quase 10 hectares que será destinada ao “Território Comunidade Quilombola Brotas”, incluindo a parte denominada Sítio Brotas, situada no município de Itatiba/SP. A decisão é do juiz federal Renato Câmara Nigro, da 2ª Vara Federal de Campinas/SP.

De acordo com o INCRA, a legalidade da desapropriação está fundamentada no Decreto Federal da Presidência da República, de 20/11/2009, tendo em vista que a referida área foi declarada de interesse social para fins de desapropriação, nos termos da Constituição Federal. Conforme consta no processo, a caracterização da Comunidade de Brotas como remanescente de quilombo ocorreu mediante estudo antropológico que a identificou como tal. 

Um relatório técnico-científico, elaborado pelo Instituto de Terras do Estado de São Paulo – ITESP, apresentou um levantamento histórico da luta travada pelo quilombo para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural. Segundo o relatório, os membros do Quilombo Brotas ocupam o território há mais de 120 anos, sendo que as terras foram compradas por dois escravos libertos em um lugar que existia um quilombo antigo. Assim, o Quilombo Brotas resiste por mais de dois séculos, ao longo dos quais serviu de abrigo para diversas famílias negras e escravos fugidos das fazendas das regiões de Campinas, Atibaia e Jundiaí. 

A lei que aboliu a escravidão (sancionada em 13/5/1888) completou 130 anos. Porém, a comunidade negra ainda enfrenta inúmeros desafios para fazer valer os seus direitos. A luta dos remanescentes das comunidades quilombolas para o reconhecimento do direito à propriedade das terras que ocupam é apenas um dos exemplos.

Ao julgar procedente o pedido de desapropriação, Renato Câmara Nigro afirma ainda ter sido constatada “a pressão exercida pela especulação imobiliária da região, o que fez ser mais ainda necessária esta forma de proteção especial da área onde vive a comunidade”. O relatório do ITESP também registrou que os membros do Quilombo Brotas, ao se identificarem como moradores de um sítio, buscam criar uma estratégia de ocupação do território que os possibilitem defender-se da especulação imobiliária, e, consequentemente, evitar o risco de serem expropriados.

“Há, de fato, um legado, uma herança cultural e material que confere à comunidade uma referência presencial no sentimento de ser e pertencer a um lugar específico, num contexto em que, sobretudo, consistem em grupos que desenvolveram práticas de resistência na manutenção e reprodução de seus modos de vida característicos num determinado lugar, com identidade étnica e territorialidade”, aponta o juiz.

Em relação à indenização a ser paga pela desapropriação, foi feita avaliação do imóvel em R$ 360 mil, incluindo a terra e as benfeitorias realizadas. Os valores depositados pelo INCRA em 5/12/2011 não foram contestados pelas partes e serão corrigidos pelos índices oficiais.

A sentença determinou que o valor depositado e respectivos acréscimos sejam liberados de forma proporcional, em favor dos réus que comprovarem que eram titulares do domínio ou posse da área, mediante alvará, após a publicação do edital e a comprovação da quitação das dívidas fiscais. (JSM)

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

2 Comentários

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  1. Justiça…

    Então enxergamos toda a hipocrisia e interesses ideológicos quando a Justiça se pronuncia sobre os Direitos de Quilombos e Aldeias em áreas urbanas, com alto valor comercial ou em municípios administrados ou de alto interesse de grupos ideológicos dito progressistas. 10 HECTARES? Isto dá mais ou menos 5 ALQUEIRES? Não exigirão os tais Estudos Antropológicos, para saber até aonde esta comunidade se expandiu? Ou conseguiam viver, anos atrás,  do que produziam em míseros 5 alqueires? Isto que era Produção de Alta Eficiência !! Talvez uma semente do AgroNegócio? E os Indigenas, também desta região, que misturados aos Escravos, por toda Serra do Japi? Governo Progressista de Fernando Haddad cedeu uma área de 1 HECTARE a toda Comunidade no Pico do Jaraguá. E também não precisou nem de Estudo Antropologico?!! Indígenas já viviam em Aldeias Padrão Kit-Net. Era muita vanguarda !! E haja canalhice e hipocrisia !!

  2. Xovê se eu entendi

    Uma área de 10 hectares, comprada por escravos livre há 120 anos, localizada em Brotas, a cidade do Daniel e de fazendeiros ricos, é desapropriada pelo INCRA que deposita aos seus legítimos ocupantes o valor de R$360 mil reais?

    E os desapropriados acham que o INCRA vai defende-los da especulação imobiliária, e, consequentemente, evitar o risco de serem expropriados.

    Acho que eu não entendi mesmo.

     

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