Marisa Letícia e o uso do precedente Dona Inês de Castro no TRF-4, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Marisa Letícia e o uso do precedente Dona Inês de Castro no TRF-4

por Fábio de Oliveira Ribeiro

A morte acarreta a extinção da punibilidade. É isso que consta do Código Penal:

Art. 107 – Extingue-se a punibilidade: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)

I – pela morte do agente;

II – pela anistia, graça ou indulto;

III – pela retroatividade de lei que não mais considera o fato como criminoso;

IV – pela prescrição, decadência ou perempção;

V – pela renúncia do direito de queixa ou pelo perdão aceito, nos crimes de ação privada;

VI – pela retratação do agente, nos casos em que a lei a admite;

VII – (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)

VIII – (Revogado pela Lei nº 11.106, de 2005)

IX – pelo perdão judicial, nos casos previstos em lei.

Algo semelhante também consta do Código de Processo Penal:

Art. 62. No caso de morte do acusado, o juiz somente à vista da certidão de óbito, e depois de ouvido o Ministério Público, declarará extinta a punibilidade.

Todavia, o art. 397 do CPP prescreve que:

Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art. 396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).

I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

II – a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

III – que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

IV – extinta a punibilidade do agente. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

II – a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

III – que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

IV – extinta a punibilidade do agente. (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).

Após a morte da esposa de Lula, o advogado do casal exigiu o cumprimento destes dispositivos legais no caso do Triplex, enfatizando que ela deveria ser sumariamente absolvida. O pedido foi rejeitado por Sérgio Moro. O juiz da Lava Jato preferiu apenas e tão somente declarar extinta a punibilidade da ré Marisa Letícia. Ao julgar o recurso interposto pelo advogado, o TRF-4 manteve a decisão do Juiz da Lava Jato como se o inciso IV, do art. 397, do CPP não estivesse em vigor.

A Lei de Organização da Magistratura obriga os juízes a cumprir e fazer cumprir com serenidade e exatidão os preceitos legais (art. 35, I, Lei Complementar nº 35/79). Não foi isto o que ocorreu no caso comentado. Tanto Sérgio Moro quanto os amigos dele no TRF-4 se recusaram a dar cumprimento ao que consta do inciso IV, do art. 397, do CPP. Se a falecida esposa de Lula deveria ser absolvida sumariamente após a sua morte (conteúdo expresso da Lei) este direito não poderia ser revogado por uma decisão judicial.

Em virtude da evidente ilegalidade cometida pelo TRF-4 o advogado pode e deve recorrer ao STJ. A Constituição Federal admite esta hipótese:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:

III – julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:

a) contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência;

b) julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face de lei federal;

b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

A consequencia prática desta discussão parece irrelevante. Qual a importância da absolvição sumária da esposa de Lula se a extinção da punibilidade também resultou no fim do processo criminal?

O problema é que a extinção da punibilidade não equivale à absolvição sumária da acusada. Enquanto a segunda liberta a memória da acusada de qualquer reprovação pública, a primeira preserva a idéia de que ela era ou poderia ser culpada e safou-se de ser condenada e cumprir pena porque morreu. Assim, a extinção da punibilidade equivale a uma pena imposta sobre a memória da acusada. Como há previsão expressa obrigando o Judiciário a absolver sumariamente dona Marisa, com toda justiça a família de Lula tem todo direito de considerar intolerável a decisão do TRF-4.

Em meados do século XIV, Dona Inês de Castro foi desenterrada para casar com D. Pedro I. Segundo a tradição o rei de Portugal fez os membros de sua corte beijar a mão do cadáver (Inês de Castro havia sido morta porque era amasia do então príncipe herdeiro do trono português). Violando expressamente o que consta do inciso IV, do art. 397, do CPP, os desembargadores do TRF-4 se recusam a absolver sumariamente a falecida esposa de Lula. O que eles pretendem fazer: desenterrá-la para poder condenar o cadáver a prisão ou impor à família de Lula um sofrimento desnecessário?

Se estivéssemos no século XIV e Lula fosse Rei ele poderia mandar desenterrar Dona Letícia para fazer os desembargadores do TRF-4 beijar a mão dela durante a proclamação do Acórdão do STJ declarando-a absolvida sumariamente. Isto os convenceria de que eles agiram mal ao desrespeitar a Lei?

Fábio de Oliveira Ribeiro

7 Comentários

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  1. A ordem no judiciário e na

    A ordem no judiciário e na mídia é: jamais declarar inocente qualquer pessoa que teve, tem o terá contato com o Lula. Porque estes já nasceram culpados pelo simples fatos de terem nascidos. Agora se não declaram a dona Marisa inocente nem morta, imagina o Lula vivo?

  2.    Nesse caso específico (e

       Nesse caso específico (e talvez somente nesse caso específico), tem razão o “juiz”. O artigo 397 fala de absolvição sumária, que deve ser decidida logo após a defesa prévia e antes da instrução (produção de provas) do processo. Caso seja detectada a extinção da punibilidade NESTE momento processual, deve ser declarada a absolvição.

        No caso de Marisa Letícia, a defesa prévia já havia sido ofertada, não encontrando o “juiz” nenhuma razão para, naquele momento, declarar a absolvição sumária. Quando do falecimento da ex-primeira dama, o processo já estava em fase de instrução, não havendo mais que se falar em absolvição sumária. Correta, portanto, a simples extinção da punibilidade, prejudicada a análise de mérito da causa. E é exatamente pela impossibilidade de análise de mérito que não há como se dizer que a acusada era culpada ou, como quer a defesa, inocente. É claro que a defesa faz o seu papel, até mesmo político, ao exigir a absolvição, mas tal medida, ao menos à luz do processo penal, não é possível, já que se falar em absolvição importaria em análise de mérito, que não existe em caso de extinção da punibilidade.

  3.    Nesse caso específico (e

       Nesse caso específico (e talvez somente nesse caso específico), tem razão o “juiz”. O artigo 397 fala de absolvição sumária, que deve ser decidida logo após a defesa prévia e antes da instrução (produção de provas) do processo. Caso seja detectada a extinção da punibilidade NESTE momento processual, deve ser declarada a absolvição.

        No caso de Marisa Letícia, a defesa prévia já havia sido ofertada, não encontrando o “juiz” nenhuma razão para, naquele momento, declarar a absolvição sumária. Quando do falecimento da ex-primeira dama, o processo já estava em fase de instrução, não havendo mais que se falar em absolvição sumária. Correta, portanto, a simples extinção da punibilidade, prejudicada a análise de mérito da causa. E é exatamente pela impossibilidade de análise de mérito que não há como se dizer que a acusada era culpada ou, como quer a defesa, inocente. É claro que a defesa faz o seu papel, até mesmo político, ao exigir a absolvição, mas tal medida, ao menos à luz do processo penal, não é possível, já que se falar em absolvição importaria em análise de mérito, que não existe em caso de extinção da punibilidade.

  4. Mas essa historia do

    Mas essa historia do desenterro de Inês de Castro eu achava que era figurativo. Imagine D. Pedro I de Portugal casando-se com o cadaver decomposto… Sera que vem dai o famoso “mas agora Inês é morta” 🙂

    Enfim, mas triste e tragica a historia de Marisa Leticia. Lula e seus advogados estão certos em lutarem para que seu nome fique limpo das acusações levianas, maldosas e vingativas dos operadores da Lava Jato.

  5. Juizes do trf-4

    Mulher judia, que esteve presa em campo de concentração nazista a sua filha:

    “Nunca esqueça, nunca perdoe”

    trf-4 essa é para vocês, canalhas:

    “não vamos nos esquecer de nada, não vamos nos acomodar com nada”

  6. Dá para entender

    Não há como o acusador perdoar quem ele sabia ser inocente. Não dá. Neste caso só o acusador poderá, algum dia, conseguir o perdão.

    Esta é a armadilha na qual eles cairam. Desde o “não tenho provas mas a literatura me permite condenar” o desastre só rumará ao desastre.

    Depois do golpe, o caos.

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