A discussão do “quinto”

Roberto Wanderley Nogueira*

O ingresso via “quinto constitucional” nos Tribunais do país (art. 94, da Constituição Federal) tem sido assegurado pela Carta no sentido de garantir ao Poder Judiciário uma certa transparência social com que se permeia o sistema judiciário com diversas visões institucionais, no caso, também da advocacia e do Ministério Público (…).

Um vício do sistema faz com que esses representantes, no ato da posse, perpetuem-se como Magistrados, embora não de carreira, e não mais como advogados ou representantes do Ministério Público, segundo suas origens, de cujas funções estariam temporariamente afastados. Gera-se com isso uma inusitada perspectiva psico-funcional: o agente nem é mais advogado ou representante do Ministério Público e, nem como se jamais fora Magistrado, também passa a exercitar de forma não raramente incomum a judicatura.

O grande perigo de aproveitar esse pessoal da forma como ainda presentemente ocorre é justamente o de que venha a exercitar a Magistratura sendo exímios políticos. Nesse caso, o agente, parecendo Juiz, de fato acaba não o sendo para comprometer a saúde institucional do sistema como um todo. Despiciendo referir que para esses acessos muitos lobbies são gerenciados no sentido do amesquinhamento da própria instituição judiciária, valendo tais ações tanto para o ambiente dos Tribunais da eleição como para um concerto muito largo e complexo de politicidade em que o pretendente passa a atuar por si ou por seus prepostos sempre interessados em algum tipo de retorno que possa, quando menos, exprimir prestígio e poder.

Sob uma abordagem sistemática de que se compadece rigorosamente o Direito Positivo, não é para essa gente que se reservam os cargos de Juízes de carreira junto às instâncias superiores (104, inc. I, da CF), pois esses agentes, embora formalmente Juízes porque integrantes de Tribunais, e não obstante os méritos pessoais com que possam eventualmente vergastar suas judicaturas de ocasião, não o são de fato, pois jamais vivenciaram uma carreira judiciária como tal reclamada pela Constituição.

(…) Magistrados de carreira, que fizemos concurso e não devemos nada a ninguém, senão à Deus, à nossa consciência e à lei, tivemos de passar e nos vemos, por isso, desprestigiados com a perpetuação da política de resultados também nessa questão das investiduras originárias às Cortes Superiores deste já notoriamente reconhecido e infelicitado país.

(…) Os Magistrados de carreira não somos políticos, não lidamos com a política, não sabemos transitar com facilidade por ela e em meio aos seus praticantes. O pessoal do “quinto constitucional”, todavia, sabe muito bem como administrá-la, tanto por que aproveitados, e a competição que se estabelece entre uns e outros reflete, pois, uma cruel e desigual disputa.

(…) Sem pretender generalizar, pois toda generalização é odiosa, afirmo que enquanto o Poder Judiciário no Brasil for assim, prenhe de manigâncias e suscetível a todo componente de influenciação política e para além do profissionalismo que os Magistrados deveriam exercitar exclusivamente, não haverá motivos para que dele nos orgulhemos plenamente, seja enquanto Magistrados seja enquanto cidadãos!

Luis Nassif

13 Comentários

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  1. “Magistrados de carreira, que
    “Magistrados de carreira, que fizemos concurso e não devemos nada a ninguém, senão à Deus, à nossa consciência e à lei…”. O meritíssimo não poderia ser mais claro. Vejam que ele não cita a sociedade… Como Deus está muito distante e a lei é interpretada pelos próprios meritíssimos, resta apenas rezar e contar com a consciência deles…O que está faltando é um efetivo controle externo do judiciário, que coloque esse poder subordinado à sociedade civil brasileira, já que o tal CNJ representa apenas mais um espaço do corporativismo. Enquanto, em relação aos poderes legislativo e executivo, somos chamados a cada quatro anos para referendá-los ou substituí-los, o judiciário paira acima da sociedade a que deveria servir…

  2. Aproveito o comentário do
    Aproveito o comentário do Roberto,sobre o poder judiciário,para perguntar ao signatário do blog,a sua opinião sobre a entrevista do juíz Gilson Dipp, na Folha,onde ele entra no mérito da questão ética no Poder Judiciário,e fala coisas,que temo serem anormais neste setor,onde todos os seus componentes se ajudam e encobrem as falhas,mantendo uma aparencia falsa.Seria a dica para uma verdadeira reforma nesta instituição?

  3. O autor do comentário poderia
    O autor do comentário poderia esclarecer como se dá a escolha dos juízes de primeira instância promovidos para os tribunais por merecimento. Quem afere, quem elabora a lista e quem escolhe para a nomeação? Poderia também esclarecer se os envolvidos no atual escândalo são ou não juízes de carreira.

  4. Caro Nassif, esse texto me
    Caro Nassif, esse texto me faz pensar que seria bom analisar as várias conotações possíveis para a palavra Lobby. Clientelismo, fisiologismo, corrupção, seriam opções? Às vezes a palavra lobby parece glamurizar e esconder praticas e pessoas odiosas.

  5. Transparência se consegue com
    Transparência se consegue com um Conselho externo, fiscalizador, constituído por representantes da sociedade civil. Não é necessário que advogados e promotores “entrem” para a Magistratura por meio do “quinto” para se obter transparência. Por esse raciocínio, poder-se-ia defender que a OAB deveria nomear um advogado para ser o Ministro da Justiça, para que o Executivo seja mais transparente. Para o bem do Judiciário, o “quinto” deve ir pros “quintos”.

  6. Para esclarecer o ínclito
    Para esclarecer o ínclito magistrado autor do comentário, devo dizer que dos envolvidos nas operações furacão e themis, os escândalos do mento, cinco são juízes de carreira (Paulo Medina, José Ricardo Regueira, Carreira Alvim, Roberto Luiz Ribeiro Haddad e Maria Cristina Barongero) e dois são oriundos do quinto constitucional (Ernesto Luiz Dória e Nery da Consta Junior). Quer dizer, juiz de carreira ganha de goleada: 5 x 2. Encareço o comentário do autor a respeito, pois os números desmentem a sua tese.

  7. O poder judiciáro brasileiro
    O poder judiciáro brasileiro é o templo mor dos marajás.Salários de tão altos, podem ser classificados com hediondos.
    Com uma justiça tão morosa e eficiente, nada justifica o salário desses marajás emplumados.

  8. Miller, os números não
    Miller, os números não desmentem não. Lembre-se que a proporção de juízes de carreira é 4x maior que de ‘escolhidos’, assim não se pode analisar dessa forma os números.

    Uma versão mais real seria ver que se do total, os provenientes do quinto correspondem a 20%, dos investigados, correspondem a 29% (28,57%)

    é importante ressaltar o primeiro comentário aqui feito, sobre o fato do juiz não reconhecer dever ou prestação de contas à sociedade.

  9. O Dirceu não foi um
    O Dirceu não foi um presidente de Tribunal que permitiu a volta das liminares de combustível? Vou conferir nas minhas colunas, mas acho que sim.

  10. Thiago, longe de mim querer
    Thiago, longe de mim querer transformar essa troca de opiniões num solteiros x casados de fim de semana. Mas devo esclarecer que a minha informação a respeito dos 5 a 2 está furada. Pesquisando com mais vagar, constatei que esqueci de escalar no time dos concursados dois magistrados de carreira, citados pela imprensa como envolvidos nas investigações da operação Themis, ou seja, ambos do TRF de S.Paulo: Alda Ansaldi e Djalma Moreira. O placard agora é 7 a 2. Mas não é só. Se você considerar apenas o Tribunal de São Paulo, dá direitinho: quatro magistrados de carreira e um do quinto. Proporção exata. Por isso, estou com medo de que os defensores da extinção do quinto constitucional, em razão da propalada corrupção dos seus integrantes, passem agora a defender a extinção do próprio judiciário, pela mesma lógica. Uma última observação: finalmente, nesta semana, consegui encontrar num sebo o livro Jornalismo dos anos 90, obra esgotada, que eu muito procurei e estou ávido para ler. No livro, ao que estou informado, Nassif conta a sua luta, solitária, para mostrar que não se podia, mídia e opinião pública, condenar pessoas apressadamente, no famoso caso dos donos da Escola Parque, simplesmente pelas conclusões a que chegaram as autoridades policiais. Como se sabe, foram todos absolvidos, depois de anos de sofrimento e execração pública. Não vamos agora repetir o erro, não é mesmo?

  11. Sugestão ao Miller e demais
    Sugestão ao Miller e demais comentaristas: quando o comentário for dirigido a outro comentarista, mencionar quem é o destinatário para a gente não perder o fio da meada.

  12. Pensei que o “sistema
    Pensei que o “sistema jurídico” fosse uma arte que, com o tempo, buscasse aprimorar um processo o mais perfeito possível para evitar a injustiça, afinal, mandam e desmandam na vida das pessoas. Quando precisei, já no tal “cartório” ví uma lerdeza parecida com aquela do quadro humorístico do carimbaço (será que podem me encarcerar por ter dito que eles são “lerdos”?).
    Será que o dilema dos “quintos” mudaria o esquema teatral com o qual se julgam vidas e destinos? Tua vida pode ser alterada pela injustiça por causa de uma vírgula, uma falta de um número de lei, um oficial de justiça que não intima, pela índole e/ou competência dos cada vez mais mal-ditos advogados, pelos prazos (que só inexistem prá eles, da “justiça”), por um juíz que sequer lê o processo (não têm tempo!!!).
    Porque colocar Deus nisso tudo? Deveriam ser proibidos de realizar aquelas “rezinhas” e até proibidos de utilizarem a termo “justiça” em qualquer coisa que venham deles! Tanto Deus quanto Justiça nada tem a ver com o que se realiza nestes palcos chamados tribunais. Mudem para “Juizado” que é melhor. Existe mais nexo em dizer “fui injustiçado pelo Juizado” do que “fui injustiçado pela Justiça”.

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