O planejamento financeiro e o novo brasileiro

Coluna Econômica

Algum cientista social ainda irá defender alguma tese sobre o perfil do brasileiro, a partir das seções de finanças pessoais dos jornais e de livros de orientação financeira para pessoas físicas.

Praticamente inaugurei essa atividade no início dos anos 80, com a criação da seção Seu Dinheiro, no Jornal da Tarde.

A inflação já explodira em fins dos anos 70 e o grande esforço consistia em informar o leitor sobre as armadilhas do sistema financeiro, com as taxas de juros, e sobre formas de driblar a explosão dos preços.

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HaviHavia golpes de toda ordem. Todas as aplicações de renda fixa pagavam correção monetária mais uma determinada taxa de juros. A CM era determinada pela variação mensal das ORTNs (Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional). Alguns bancos ofereciam CDBs de 190 dias, com taxas de juros bem acima das de mercado. Só não informavam que, como a variação da ORTN era mensal, no 10 dias adicionais aos seis meses não havia correção. Com inflação a 10% ao mês, o que se perdia ali era muito mais do que as taxas de juros a maior.

Outro jogo complicado era a ilusão de muitos poupadores de que podiam sacar indefinidamente a correção monetária das aplicações, sem que houvesse perda do principal.

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Para enfrentar esse jogo, precisei me especializar em matemática financeira, recorrendo às calculadoras HP-12C e aos primeiros computadores pessoais.

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Em fins dos anos 80, multiplicaram-se as jogadas em cima de correntes da felicidade, venda de ouro, boi gordo, diamantes, obras de arte e toda sorte de manipulações. O pesado jogo especulativo no mercado de ações criava a mística de que qualquer analista financeira conhecia a “dica” capaz de enriquecer os mortais comuns.

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Após a estabilização, ocorreram algumas bolhas especulativas, mas as altas taxas de juros direcionavam as aplicações para renda fixa.

No período, os ganhos extraordinários do mercado financeiro criaram nos jovens recém-formados a ideia de vencer a qualquer custo. Pregava-se um individualismo atroz, a busca do sucesso, a competição desenfreada.

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Crise internacional, novos valores globais e amadurecimento do país mudaram esse perfil.

As duas últimas pesquisas sobre o perfil do brasileiro – uma da UNCTAD, outra do Instituto República – mostram que acabou a ideia do enriquecimento fácil, da vitória a todo custo, da tacada para vencer na vida.

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Nos últimos anos, não apenas por aqui, mas internacionalmente, o tema da felicidade pessoal passou a se sobrepor ao da vitória na vida. Por tal, entenda-se, considerar a estabilidade fator fundamental para a paz de espírito.

Em outros tempos, dois fatores eram os principais responsáveis pela instabilidade financeira das famílias: despesas com saúde e preocupações com a velhice.

Esses dois itens passaram a ser cobertos por planos de saúde e planos de previdência privada. A partir daí, o planejamento financeiro passou a ser um item da busca do equilíbrio pessoal e das famílias. Não o objetivo simples do enriquecimento ou do sucesso a qualquer custo. 

Luis Nassif

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