Os destruidores do futuro

Coluna Econômica – 25/04/2007

Neste momento discute-se quais os setores que sobreviverão nesse país tresloucado. O câmbio continua descer ladeira abaixo. As vozes dissonantes são poucas. De um lado, há os beneficiários do modelo, os rentistas nadando de braçada em juros desproporcionais; o grande capital nacional entrando como se fosse capital estrangeiro, ganhando nos juros e na apreciação do real. Os recalcitrantes desistiram ou por falta de eco, ou por falta de vontade, ou por promessa de barganhas setoriais.

No mercado, já se aceita a apreciação cambial como uma realidade definitiva. E discute-se agora quem sairá vivo, quem morrerá.

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A conta é simples, conforme noticiou outro dia a revista “Veja”, em uma capa absurdamente desinformada. A Estrela conseguiu sobreviver porque se aliou aos chineses e tornou-se importadora. Nem se pense nos empregos perdidos, nos fornecedores afetados. É como se a soma dos que sobreviverem compensará o restante, independentemente das condições da sobrevivência.

Quem sobreviverá? Setores onde o Brasil possui vantagens naturais, como na biomassa, papel e celulose, mineração e siderurgia. Nos demais, sobreviverá quem conseguir ampliar consideravelmente o conteúdo importado em seus produtos. Significa que parte de seus fornecedores desaparecerá.

Sem condições de concorrer com os importados em produtos de maior valor agregado, os sobreviventes reverterão à condição de “maquiadores”. Haverá perda de emprego de mão-de-obra mais qualificada.

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Haverá oportunidades no setor da biomassa. E fala-se disso como se fosse algo mais natural do mundo os desabrigados da indústria, empresários, executivos e trabalhadores, se reciclarem e mudarem de profissão.

Mais: no novo setor há pouquíssimo espaço para inovação, que é ponto central de desenvolvimento, melhoria de salários, crescimento de empresas. Há uma pesquisa feita nos centros tecnológicos, grandes usinas e uma multidão de pequenos empreendedores plantando ou, no máximo, esmagando parte da produção e entregando o óleo.

Nos demais setores, haverá cada vez mais dificuldades em conquistar a produtividade necessária para enfrentar a apreciação do câmbio. A indústria de software, que estava conseguindo entrar no mercado americano, começa a dar sinais de falta de fôlego. A indústria automobilística começa a se preparar para importar carros da China, justamente para competir com os importados avulsos da China.

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Na entrevista com Fernando Henrique Cardoso, que encerra meu livro “Os Cabeças de Planilha”, o ex-presidente admite os erros absurdos do câmbio e diz que as “explicações” técnicas para a apreciação -a de que induziria a ganhos de produtividade na economia, como afirmava Gustavo Franco—não passavam de “teorias para racionalizar posições”.

Agora, volta-se ao mesmo desatino. Não vai durar para sempre essa loucura. Mas já começou a segunda rodada de destruição estéril de setores econômicos.

O futuro de milhões de pessoas está sendo decidido, neste momento, nas salas do Banco Central e do Palácio de Planalto. Mas, assim como FHC, Lula, no auge da sua popularidade, está ajudando a destruir um pouco mais a estrada para o futuro.

Para incluir na lista Coluna Econômica

Luis Nassif

29 Comentários

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  1. Nassif.
    Concordo em genero
    Nassif.
    Concordo em genero numero e grau com seu comentario.
    Ainda mais que meus filhos estao em fase de conclusao do ensino superior e terao mantido o atual quadro dificuldade em se colocarem em setores de ponta do mercado de trabalho. A gente esta vendo que estes setores estao cada vez menores e com extrema dificuldade de concorrencia.
    Não há criatividade e gestao que permita concorrer nestes niveis de cambio e de juros com o resto do mundo.
    Exemplo de gestao é a Toyota ultrapassar a GM.
    Agora no Brasil o que se ve é empresas de marcas conhecidas , com bom nivel de venda no mercado, terem que migrar para outros países, formando ali outras plantas industriais para vender para o Brasil. Instinto de sobrevivencia. Triste.
    Quando o cambio se acertar seremos empresarialmente menores nos segmentos de ponta. Com certeza.
    Mesmo setores competitivos pagam este quase imposto de importação devido ao cambio no chao.
    O duro é que historiadores, engenheiros, economistas e sociologos ao analisarem este periodo dirao que erramos muito e acabarao achando e nominando quem errou. Não mais adiantará.
    O que espanta é que as centrais sindicais que se mobilizam e mobilizam seus associados na busca de evitar a perda de seus ganhos, sejam incapazes de se manifestar veementemente a favor dos empresarios nacionais e do proprio país sendo claramente contrarias a este estado de coisas.
    Preferem se manter no poder. Sendo subservientes.

  2. Calma pessoal, não estaremos
    Calma pessoal, não estaremos vivos para ver isso tudo, pois o já combalido sistema ecologico irá se encarregar de dizimar a vida em no mãximo 50 anos…

  3. Nassif você é um dos
    Nassif você é um dos economistas e comentaistas mais lúcidos que existem na grande mídia. Também sou economista e quando vi aquela reportagem de capa da Veja elogiando a taxa de câmbio valorizada, eu quase desmaiei!
    Pensei comigo mesma:”Será que terei que jogar fora meus diplomas de graduação e mestrado em Economia?” Estudei o caso da Argentina, no meu mestrado e temo que em breve o Brasil vá pelo mesmo caminho…
    A elite brasileira me surpreende cada vez mais, como pode ser tão anti-nacionalista! E meus colegas economistas? Parece que assistem a esta destruição de forma anestesiada…
    A maior lição da China e da Índia é a existência de um Estado que protege os interesses nacionais e isto inclui também uma taxa de câmbio desvalorizada.
    Só espero que o Brasil não acorde tarde demais… precisamos acordar o gigante deitado em berço esplêndido!
    Parabenizo-o novamente pela sua coragem, inteligência e lucidez

  4. Marco, não adianta fotografar
    Marco, não adianta fotografar o momento. Desenvolvimento não se dá com sopros de crescimento, como tivemos em algumas outras etapas desse período. Se dá com investimento continuado em P&D, com pequenas empresas que, com oportunidade, viram médias e grandes. E isso só se consegue com rentabilidade do setor produtivo. O mercado defende o lucro, mas só o dele. Usa como argumento para esse câmbio maluco que “não se pode proteger ineficientes”. Conte quantas vezes nos iludimos com crescimentos pontuais desde o Plano Real.

  5. Estaria mesmo pessimista após
    Estaria mesmo pessimista após ler este blog se não houvesse, como já disseram aqui, muito cristão-novo pedindo uma maior queda de juros.

    O Delfim Neto em sua coluna de hoje também diz ver sinais de mudança dos ventos. Vejam só:

    – quando a realidade assume tal evidência que impõe uma “mudança de rumo”, (o BC dá) aviso prévio para prevenir qualquer estresse das “tesourarias”, principalmente as dos “hedges funds”.

    – a mídia perde tempo tentando saber quem são os “falcões” (4 votos) e quem são os “pombos” (3 votos) (do COPOM). É tudo fingimento, como na “Commedia dell’Arte”…

  6. Mas, Nassif, esses homens de
    Mas, Nassif, esses homens de ternos escuros não fazem parte daquele grupo de especialistas que o presidente cumprimentava, de mesa em mesa, nos programas eleitorais ?

    Não são eles que orientarão o país em direção ao futuro, agora que temos o PAC ?

    Onde está a inteligência nacional ?
    Será que não é permitido ao PT ter pessoas – nem exijo que sejam brilhantes – mas pelo menos com inteligência “normal” ?

    Será que a personalidade do lula é tão impactante para eles que os inibe, a ponto de se submeterem aos rasgos de ignorância do presidente ?

    Penso que estamos vivendo a época dos apagões:

    Apagão aéreo
    Apagão moral
    Apagão intelectual

    O que será desse nosso país ?

    Agradeço ´pelo post, muito enxuto e esclarecedor.

    Mas fico muito triste!

    Será que para ser presidente é preciso mesmo ser uma pessoa preparada humanamente e intelectualmente e respaldada por um partido que acredite nos valores do homem, da democracia e da civilização ?

    Domande, domande, domande ?

  7. Estamos a tempo………..
    Estamos a tempo……….. Tem que controlar fluxo de capitais, e baixar os juros……….

    Temos que parar de ajujstar tarifas e salarios pela inflação passada, não se pode renunciar a ter industria de transformação. Temos 180 milhôes de pessoas. Brasil não é o Chile.

  8. Caro Nassif, Zélic,

    Há um
    Caro Nassif, Zélic,

    Há um adágio assim, mais ou menos:

    Os inteligentes aprendem com a experiência dos outros; os medianos com a própria; os burros, estes não aprendem nunca!

    Ou, como diria o Barão de Itararé, “Agua mole em pedra dura, tanto bate e… nada fura.”

    Estamos tutti fregatti, amigos.

    Abraço

  9. No centro desta questão está
    No centro desta questão está a Distribuição de Renda.

    Creio que na medida que a Distribuição de Renda

  10. Nassif, gostaria de
    Nassif, gostaria de compreender uma noticia que li hoje: As reservas do Brasil somam US$ 118,5 bilhões, dinheiro que é aplicado, em grande parte, em títulos públicos emitidos por países desenvolvidos, principalmente pelos EUA.
    Não somos nós que pagamos juros mais altos? Acho qeu eu deveria estudar economia…
    Com relação aos destruidores do futuro, é só um resumo do que você vem “cantando” há meses.
    Um Abraço

  11. Luiz Nassif infelismente tem
    Luiz Nassif infelismente tem uma visão catastrofica da politica economica, tudo bem que o país tem dificuldades com a valorização do real, mas ao contrario do governo FHC onde as importações superaram as importações e surgiu desemprego em massa, estamos batendo recordes nas exportações (o saldo esta em torno de U$ 40 bilhões) e o emprego com carteira assinada bate recordes ou seja as previsões catastroficas não tão se realizando, alem disso o governo vem intervendo no mercado para valorizar o Dolar, portanto estamos no caminho certo.

  12. Escrevo para todos deste
    Escrevo para todos deste blog, a capa da Veja provou o quão elitista é essa revista, voltada para uma minoria, é relamente ridículo.
    Gostaria de fazer uma pergunta ao prof. Nassif sobre questão do aumento de emprego que alguém postou aqui, esse aumento no emprego foi gerado pelo inicio das safras de cana, milho e etc?
    Mais, mexo com com. exterior e todos falam como está devagar, de motoristas de caminhão à bancos, trabalho com álcool ou etanol, enfim, q virou ufanismo nacional (até o Nassif comprou a idéia), e posso afirmar que com o dólar do jeito que está logo mais os campos mais fertéis não ajudarão, pois o custo vai ser muito maior do que em alguns países.

  13. amigo nassif

    sou um micro
    amigo nassif

    sou um micro empresario da area de surfwear , com 25 anos de estrada no setor , dediqeui minha vida a esse setor , hj estou a ver navios , por causa de politicas equivocadas desses ultimos gov , estou sendo incluido nesses milhões de empresarios que ficarão desempregados , isso é uma barbarie o que esse tal de lula esta fazendo com o setor produtivo do pais , tenho vergonha de falar pros gringos que tenho um presidente chamado lula , vc é brilhante com seus artigos parabens!! sempre acerta em cheio , quem sabe um dia um iluminado candidato eleito o convide pra resgatar a moral produtiva desse pais totalmente equivocado!!tenho saudades do seu prog na cultura , quando vc agregava alguma historia da musica popular brasileira , um grande abraço!!!

  14. Ok, o problema parace que
    Ok, o problema parace que muita gente já sabe qual é: juros altos e cambio valorizado.
    Quais seriam as soluções mais factíveis neste cenário para interromper o desmonte do parque industrial brasileiro e, quem sabe, favorecer o tal crescimento que todos esperamos.

  15. Nassif só para informar o
    Nassif só para informar o prof. Delfim Netto está promovendona FEA- USP uma série de debates sobre o Brasil no século XXI, e hoje o tema foi exatamente comercio internacional. Apenas o Delfim bateu firme na questão cambial, os outros palestrantes não, até porque fica aquela história de dados de série histórica e gráfico para tudo que é lado, que explica tudo e não resolve nada. Preciso comprar e ler o teu livro. Um doutorando da Unicamp questionou a questão das cadeias produtivas e do emprego, quase apanhou de um palestrante do Rio, esqueço o seu nome, mas era bem arrogante, que mostrou que estamos exportando aviões e celulares. Ótimo só esqueceu de dizer que é via draw back. Pequeno detalhe.

  16. Sognifica que é país de baixo
    Sognifica que é país de baixo risco para o investidor. O Brasil não faz parte porque tem crescimento medíocre.

  17. Caro Mouro

    O que Tu achas
    Caro Mouro

    O que Tu achas de dar explicações, como convidado é claro, na CPI do REAL que segundo PHA em seu Blog o PSOL ( aquele partido da nossa querida hoje professorinha ) esta querendo propor .
    Imagina Tu cara a cara com aqueles lesa Patria do plano real…com certeza não perderia de jeito nenhum…rsrsrs..

  18. O Eduardo Burlamaqui resumiu
    O Eduardo Burlamaqui resumiu muito bem o pensamento “cabeça sem planilha” do atual modelo econômico, inclusive com os erros de português cometidos, ao meu ver, propositadamente, como forma de ironia. A triste realidade é que temos 50% da população que vive no limite da subsistência e não temos mais nenhum partido de esquerda genuinamente interessado em mudar essa situação.

  19. Francico Alves,

    é simples,
    Francico Alves,

    é simples, pagamos +-9% nos juros internos e aplicamos em títulos do tesouro americano a 4,5%, já viu falar no câmbio português? Sds.

  20. Creio que juros da Selic de
    Creio que juros da Selic de 6%nominais ao ano conseguirá ajustar e cambio a capacitar as empresas a investir para pelo menos sobreviver no Mercado Interno Brasileiro.

    O Brasil já esta em condições de praticar juros para Selic de 6% nominais ao ano. Medidas de proteção ao setores mais prejudicados pelo cambio devem ajudar as empresa a chegar até esse momento.

    Vamos aguardar a próxima reunião do COPOM em junho para avaliar se as recentes alterações na direção do Banco Central também significam um ajuste na Política Monetária para permitir praticar juros da Selic bem menore que o atual patamar, pois já não se justificam juros de 12% nominais ao ano.

    O Brasil já realizou os ajustes nas contas externas, na dívida pública interna e afastou o risco de um governo que renegocie a dívida pública interna e externa, para completar o ciclo de ajuste só falta os juros da dívida pública e está redução dos juros é que permiitirá a reforma tributária e fiscal e não o contrário, pois pagando juros tão elevaods não é possível reduzir a carga tributária.

  21. Certa vez o FHC
    Certa vez o FHC disse:
    ´Esqueçam o que eu escrevi´

    Tacada de gênio – ele matou o passado e destruiu o futuro.

    E você Nassif, está nos devendo uma matéria sobre o Mangabeira Unger – ele também é adépto do ´esqueçam o que eu escrevi´.

    O Lula no futuro vai dizer: ´Esqueçam que eu existi´.

    Oh my God!

  22. Até bem pouco tempo atrás eu
    Até bem pouco tempo atrás eu acreditava no discurso “que racionalizava posições” do Gustavo Franco dos benefícios para o aumento da produtividade do câmbio sobrevalorizado, confesso que hoje concordo com os malefícios do câmbio valorizado, vale porém algumas observações:
    1 – Quando se dá isenções de impostos para exportadores, estimulando artificialmente as vendas externas, se tira competitividade da indústria interna que não exporta;
    2 – Caso houvesse redução homogênea de impostos, como por exemplo INSS sobre folha de pagamento, haveria ganhos distribuídos em todo o conjunto da economia, não somente direcionado ao setor exportador;
    3 – Quanto maior o volume de exportações subsidiadas, maior será o prejuízo dos setores que se dedicam exclusivamente ao mercado interno, pois terá a concorrência dos importados, o câmbio desfavorável, a maior taxa de juros do planeta e não terá nenhum benefício tributário, pois o setor exportador consome todos os benefícios tributários que deveriam estar distribuídos para o conjunto da sociedade.
    A solução para o impasse do câmbio e da competitividade da economia brasileira só será definitiva quando:
    a – houver uma queda substancial da taxa de juros, para os níveis internacionais;
    b – houver uma redução homogênea dos impostos, preferencialmente os impostos sobre folha de pagamento;
    c – Acabar com as isenções descabidas de impostos exclusivas dos setores exportadores;

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