Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
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As mariposa, a lâmpida e o desânimo, por Rui Daher – Parte 1

Davos

Tenho evitado tratar de forma séria as política e economia brasileiras depois do golpe que tirou Dilma Rousseff da Presidência. Tentei por algum tempo até o limite de minha paciência. Parei quando percebi o enxame de manifestações nas folhas e telas cotidianas tratando o tema sob diversos ângulos. Mesmo das semanais andanças agrárias pedi licença por um tempo.

A pantomima interna excedeu o patético e, pior, no meu caso, desaguou em episódios passados, inúmeras vezes vivenciados, que me fizeram sabedor da fragilidade das posições distributivas à esquerda diante de uma elite econômica que até parou com as esmolas. Hoje em dia, carrega HP financeira para calcular o quanto irá perder tirando da aplicação o valor do óbolo. Estranho País, este.

Fato é que, furioso, tenho-me valido de galhofa, chacota e deboches. Penso assim melhor estocar fígados Dorianos, Temerosos e Nevados.

Sábado passado, porém, em reunião noturna na precária Redação do BRD/FD*, Nestor e Pestana criticaram a minha caluda diante da “Pátria em risco”. Lembrei-os de que pátria é o refúgio dos canalhas e a cada ano cresce o nosso patriotismo. Faltará espaço.

Mesmo assim, prometi-lhes escrever um editorial, que aqui faço em três partes, para as quais peço paciência.

*Blog-Boteco Rui Daher/O Fígado Diário

Parte 1 – O Planeta no Divã

“As mariposa quando chega o frio/Fica dando vorta em vorta da lâmpida pra si isquentá”

Só mesmo o gênio de Adoniran Barbosa (1910-1982) poderia antecipar o desenrolar do capitalismo e o papel das esquerdas, a partir deste novo século. Pensem nas mariposas representadas pelas economias hegemônicas e na lâmpada como o modelo de capitalismo que assim as aqueceu.

Pois bem, a “lâmpida” apagou. Nela não mais “as mariposa” se esquentarão. À esquerda caberá não acionar o interruptor e reacendê-la.

Comecemos pelo fim, mas depois poderemos voltar, década a década, até Keynes. A notícia mais recente nas folhas e telas cotidianas vem do badalado evento econômico, sempre em Davos, Suíça, óbvio país-símbolo do capital financeiro, espúrio ou não, e dos graciosos relógios cucos. No quentinho dos hotéis, participantes do Fórum se propõem a “colocar o capitalismo no divã”. Sugiro um outro, ao lado, para as esquerdas também necessitadas.

O protagonismo em Davos descansou na felicidade dos primeiros anos do milênio, se assustou entre 2007/2009, se ligou, e agora parte para o revisionismo. Desânimo que se não tratado chegará à depressão.

As esquerdas não sacaram ainda que não somos nós, o siri e o cacete que precisamos de refundação, novos caminhos, autocrítica, mas sim o capitalismo no paroxismo financeiro a que chegou, até com o auxílio luxuoso de um pandeiro verde-amarelo e malandro.

A História não é pródiga em mostrar exemplos de sociedades com longos períodos de menor desigualdade social. A própria divisão internacional do trabalho provocou isso entre os países, em séculos de desenvolvimento.

Daí discutir com muito fervor o Brasil de hoje ser apenas uma distração política, repetitiva, tantas oportunidades perdidas protagonizadas por bufões de um circo mambembe envelhecido sobre estruturas enferrujadas.

O período pós-Segunda Guerra teve duas etapas: a primeira, em parte regulada nas teorias de Keynes, trouxe a hegemonia norte-americana e a recuperação da Europa e do Japão, até desembocar na inflação generalizada da década de 1970; a segunda, da globalização, catalisada pelas reformas de Deng Xiaoping, a partir de 1978, na China, permitiu corrigir o caminho da primeira. Somadas, criaram altas reservas no hemisfério norte que deixou escorrerem franjas aos países emergentes e alguns poucos pobres.

Até que no sétimo dia, Ele descansou, entrou em férias, que poderão ser eternas. O mesmo que dizem Dele. Se foram merecidas não sei, mas que bagunçou o planeta não há dúvida.

As insólitas guerras e incursões promovidas pela aliança EUA, Grã-Bretanha e França, em Iraque, Irã, Líbia, na esteira do 11 de setembro, simulando levar democracia na algibeira, deixaram destruição. Ampliaram-se os tumultos no Oriente Médio, com refugiados desintegrando a estabilidade europeia. A Rússia é Putin na Chechênia; os EUA são Trump na OMC; a China é Xi Jiping, carimbo de economia de mercado e lacre de liberdade até o limite dos ditames do Partido Comunista Chinês.

E para tal imbróglio, o Brasil tem pensadores como Michel Temer, José Serra, Henrique Meirelles. Se não for deboche, haja divã em Davos.

No próximo capítulo, os números para as planilhas do inferno.

 

 

 

 

 

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

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