Mercado brasileiro de biodiesel e perspectivas futuras

Respectivamente, economista do Departamento de Gás e Petróleo e Cadeia Produtiva da Área de Insumos Básicos e assessor da Área de Infraestrutura do BNDES.

http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/bndes/bndes_pt/Institucional/Publicacoes/Consulta_Expressa/Setor/Biocombustiveis/201003_07.html

Data: 03/201,BNDES Setorial 31, p. 253-280-O biodiesel foi introduzido na matriz energética brasileira, no ano de 2005, pela Lei 11.097 de 13 de janeiro de 2005, por meio da adição do biodiesel ao diesel mineral consumido no país.

O governo federal entendeu ser estratégico para o Brasil promover um combustível renovável que  pudesse fomentar o desenvolvimento regional, reduzir as desigualdades sociais, gerar emprego e renda no campo e reduzir a necessidade de divisas para importação de diesel.
Entre os anos de 2005 e 2007, a mistura de 2% (B2) no diesel comercializado foi autorizada de forma não compulsória (período voluntário).
O período de obrigatoriedade começou em janeiro de 2008 com a mistura a 2% (B2), tendo de passar a 5% até 2013. No segundo semestre de 2008, o governo elevou a mistura para 3% (B3), e no segundo semestre de 2009 para 4% (B4). Embora inicialmente a mistura a 5% (B5) estivesse prevista para vigorar somente em 2013, durante o ano de 2009 esse prazo foi revisto, antecipando a meta de B5 a partir de janeiro de 2010……..

…..Principais matérias-primas empregadas na produção de biodiesel no Brasil
O biodiesel pode ser produzido a partir de diversos tipos de óleos vegetais (soja, canola, girassol, mamona, pinhão-manso, algodão, dendê, etc.) ou de gordura animal. Por exemplo, em setembro de 2009, no Brasil, o óleo de soja representava cerca de 75% da matéria-prima utilizada para produzir biodiesel, seguido por 16% de gordura bovina e 6% de algodão, conforme pode ser observado no gráfico a seguir……….

…….Não restam dúvidas de que os produtores da cadeia produtiva da soja exerceram papel fundamental para o êxito do programa, visto que, quando do lançamento do programa de biodiesel, o setor da soja era o que se encontrava mais bem preparado para atender ao mercado de biodiesel.
O setor já produzia em escala, estava consolidado, apresentava alta performance e era competitivo no mercado internacional.
Apesar dessas vantagens, a soja não deve permanecer dominante como a principal matéria-prima de produção do biodiesel, por causa da baixa produtividade de óleo por área plantada.2 A Tabela 1 apresenta produtividades de diversas oleaginosas. Conforme pode ser visto, várias culturas conseguem produzir mais óleo vegetal por hectare plantado do que a soja…….

….Atualmente, existem iniciativas para desenvolver e utilizar o pinhão-manso na produção de biodiesel que, em princípio, apresentaria produtividade maior que as demais culturas vegetais, exceto a do dendê. As vantagens de empregá-lo são:

  • i) não é utilizado como alimento;
  • ii) baixo custo de implantação e manutenção agrícola;
  • iii) intensivo em mão de obra não qualificada (colheita manual);
  • iv) possibilidade de cultivo no semiárido;
    v) cultura perene (produção durante todo o ano);
  • e vi) elevada produtividade (em torno de 1,5 ton a 2 ton de óleo/ha)……..

…….Apesar das qualidades do pinhão-manso, pouco se sabe sobre sua cultura, as resistências a doenças e pragas e as áreas mais adequadas para plantio, além do fato de que há um período inicial de dois a três anos de baixa produtividade. Isso significa que há elevada necessidade de capital de giro no início da atividade agrícola.
Para o longo prazo, há pesquisas com o objetivo de desenvolver bio- diesel a partir de algas, que supostamente devem apresentar produtividade superior à de qualquer cultura vegetal tradicional. Hoje, a pesquisa sobre o biodiesel de algas é considerada a nova fronteira do setor.

A expectativa em relação a esse biodiesel é enorme, pois as algas

  • (i) absorvem o CO2;
    (ii) crescem de forma rápida e exponencial;
  • (iii) são ricas em lipídios (óleo);
  • (iv) podem ser cultivadas em piscinas ou lagoas abertas ou em fotobiorreatores;
  • (v) podem apresentar grandes produtividades por hectare
  • por necessitar relativamente de pouco espaço físico (terra), o que não ocorre com as culturas vegetais tradicionais;
  • e (vi) não são utilizadas como alimento de uma forma geral.

De qualquer modo, o Brasil, ao longo do tempo, deveria perseguir uma fonte (cultura vegetal tradicional ou algas) mais eficiente do que a soja, preferencialmente que não seja utilizada como alimento, evitando-se ou minimizando qualquer possibilidade de a produção de biodiesel afetar, de alguma forma, os preços dos óleos vegetais (ou grãos) utilizados como alimento. Dado o tamanho do mercado de combustíveis, qualquer percentual de mistura de biodiesel impactaria o mercado de óleos vegetais e toda a sua cadeia produtiva.4

Ao se utilizar um óleo vegetal alimentar para produzir biodiesel, aumenta-se a demanda desse óleo e, consequentemente,há uma pressão de alta de seu preço, uma vez que a quantidade ofertada nem sempre aumenta no mesmo ritmo da demanda.

Visto de outra forma, o emprego desse óleo para produzir combustível diminuiria sua oferta no mercado de alimentos, podendo, portanto, ocorrer um aumento do preço do óleo vegetal alimentar, caso não haja, simultaneamente, aumento suficiente de sua oferta para atender à demanda do mercado de alimentos e de combustível….

……No Brasil, atualmente, um dos principais determinantes do preço do biodiesel é o preço do óleo de soja, uma vez que este representava 75% da matéria-prima na produção de biodiesel nacional em setembro de 2009. Outro fator que determina o preço é o grau de competitividade que está relacionado diretamente com o número de produtores e da capacidade de utilização ou ociosidade das plantas. Nos leilões da ANP, a agência só determina o preço máximo, e os preços médios leiloados são determinados em função do grau de competição entre os produtores…….

…Perspectivas de mercado
Atualmente, a oferta potencial de biodiesel é muito superior à demanda, provocando, assim, um excesso de capacidade ociosa no setor.

  • Como será o comportamento da demanda de biodiesel no futuro?
  • Como e quando essa capacidade ociosa poderá desaparecer?
  • Por que não aumentar a mistura no diesel mineral até se esgotar essa capacidade ociosa?

Para responder ou discutir essas questões, iremos apresentar três possibilidades de cenários futuros para a demanda nacional de biodiesel.
No primeiro cenário não haveria alteração na mistura de biodiesel a partir de 2010 conforme determina a lei. A mistura de biodiesel no diesel mineral seria de 5% (B5) a partir de janeiro de 2010. Na Figura 7, podem ser observadas a capacidade instalada informada pela ANP para a produção de biodiesel, a capacidade instalada com autorização da ANP para comercialização,14 e a capacidade instalada com autorização para comercialização com um fator de utilização de 95%.
Supõe-se que a capacidade instalada será mantida ao longo do tempo e que nenhuma planta será desativada…..

…..A demanda de biodiesel brasileira é estimada com base na projeção de demanda de diesel do país, que é função do nível de atividade e crescimento do Produto Interno Bruto – PIB e de outros fatores. Estima-se que, em média, ao longo do tempo, a demanda de diesel, bem como a de biodiesel, aumente cerca de 3,6% ao ano a partir de 2011…….

..Com base nessas hipóteses, observa-se que, num horizonte até 2018, a demanda esperada brasileira de biodiesel sempre será inferior do que à atual capacidade instalada/operação ou de comercialização16 de biodiesel. Caso não haja choque positivo de demanda17 ao longo do tempo, várias plantas de biodiesel no país deverão ficar paradas ou ociosas, uma vez que não deverá existir demanda suficiente para todas as plantas. No futuro, essa ociosidade poderá proporcionar um incentivo para consolidação dos produtores do setor.
A expectativa para o setor nesse cenário é de que haja concorrência entre os produtores de biodiesel, pelo fato de existir capacidade instalada superior à demanda e pela dinâmica de comercialização por meio de leilões…….

……O grau de concorrência no setor é função da ação das empresas integradas, se elas vão ou não exercer sua opção de produzir biodiesel com frequência.
Caso isso ocorra, as margens deverão ser reduzidas; caso contrário, as margens poderão se situar no patamar dos últimos leilões.18

Num segundo cenário, o governo alteraria a lei e aumentaria o percentual de mistura de biodiesel no diesel mineral para B6 em 2011 e B7 a partir de 2012. A demanda de biodiesel nesse cenário cresceria a 3,6% ao ano a partir de 2013 como pode ser observado na Figura 8……
…..Nesse cenário, a capacidade ociosa seria menor do que a do cenário anterior, e a demanda de biodiesel estaria próxima da capacidade instalada no final do horizonte analisado. Por volta do ano de 2016, haveria necessidade de novos investimentos em novas plantas de biodiesel para atender à demanda a partir dessa data. Novamente, o fator de utilização
das plantas poderia ser maior, caso houvesse possibilidade de exportação do biodiesel nacional para a UE, por exemplo.
No terceiro cenário analisado, o governo teria que alterar a lei para aumentar a mistura de biodiesel no diesel mineral para B6 em 2011, B7 em 2012, e B8 em 2013. A partir de 2014, novamente, a demanda cresceria a 3,6% ao ano.
Nessa alternativa, o excesso de capacidade estaria praticamente eliminado entre os anos 2014 e 2015. Nesse contexto, por volta de 2013 e 2014, haveria a necessidade de investimento em novas plantas de biodiesel para atender à demanda futura. Como nos outros cenários, nesse também não foram consideradas possibilidades de exportação do biodiesel nacional
pelas razões já mencionadas. Caso haja essa possibilidade antes de 2014, o excesso de capacidade poderia deixar de existir antes dessa data……

……O grande desafio para o setor de biodiesel brasileiro é o de se desasso ciar da cadeia produtiva da soja. O setor, no curto e médio prazo, deveria buscar uma matéria-prima que não fosse utilizada como alimento (para não contaminar o preço deste), com custo menor e produtividade maior do que a soja. A médio e longo prazos, a nova fronteira seria a produção de biodiesel a partir de algas marinhas, que não competem com alimentos de forma geral e têm expectativa de alta produtividade muito superior doque a da soja. Com base em uma matéria-prima com menor custo e maior produtividade, o custo de produção do biodiesel poderia ser mais baixo do que o do diesel mineral, possibilitando, assim, o biodiesel deslocar ou até mesmo substituir o diesel mineral no futuro.

Para que o biodiesel exerça um papel importante na matriz energética e não seja apenas um complemento marginal ao diesel mineral, são ne cessárias inovações para que alguns paradigmas sejam quebrados, a fim de reduzir o seu custo de produção, empregando-se matéria-prima de alta produtividade que não seja alimento. Somente assim o biodiesel se des-
vincularia da tradicional e consolidada indústria do petróleo tornando-se de fato uma alternativa ao petróleo. Se continuar sendo apenas um complemento marginal ao diesel mineral, no dia em que o petróleo se exaurir ou for substituído, o biodiesel poderá ter o mesmo destino………

Redação

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