Ronaldo Bicalho
Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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O setor elétrico e as indefinições da política de gás natural no Brasil

Enviado por Ronaldo Bicalho

Do Blog Infopetro

Por Marcelo Colomer

A mais recente crise do setor elétrico brasileiro vem chamando a atenção para a importância da termoeletricidade como fonte complementar de geração, principalmente da geração térmica a gás natural. Sendo assim, entusiasmados com a “revolução do shale gas norte-americana” e com o potencial de produção nacional (tanto das áreas do cluster do pré-sal quanto das formações convencionais e não convencionais em terra), muitos analistas vêm exaltando a importância do gás natural no futuro da matriz elétrica nacional.

É fato que as mudanças ocorridas no perfil de demanda e oferta de eletricidade exigem um novo modelo para o setor onde a termoeletricidade irá desempenhar um papel cada vez mais importante na geração de base. Contudo, qual o tipo de térmica que melhor se adequa ao novo perfil do setor elétrico brasileiro ainda não é uma questão respondida.

Nos EUA, a recente conversão do parque térmico para gás natural dependeu da disponibilidade de gás abundante e competitivo (preço do Henry Hub em junho de 2014 foi de US$4/MMbtu). No Japão, por outro lado, os elevados preços de importação de GNL (US$16/MMbtu) não só acarretaram em um aumento do déficit comercial de 65% entre 2012 e 2013 (de US$70 para US$112 bilhões) como também aumentaram o custo da geração elétrica em 56% no mesmo período.

Nesse contexto, em junho de 2014, três dos maiores lobbies japoneses (Federação de Negócio Japonesa -Keidanren, a Câmara de Comércio e Indústria e a Associação Japonesa de Executivos – Keizai Doyukai) submeteram uma proposta ao Ministério da Indústria para antecipação da reativação dos reatores nucleares no Japão (World Nuclear Association, 2014). Na China, apesar de todas a pressões ambientais, a falta de um suprimento seguro e barato de gás natural vem forçando o governo a manter seus projetos de expansão do parque térmico a carvão.

Os exemplos acima evidenciam que a inserção da geração termoelétrica a gás natural na base do sistema exige fontes de oferta seguras e competitivas. O caso japonês demonstra que os contratos de GNL de longo prazo com elevadas cláusulas de take-or-pay não são suficientes para garantir a competitividade do gás natural na geração elétrica de base. No caso brasileiro, a competitividade do gás no setor elétrico mostra-se ainda mais sensível aos preços do energético em função do maior número de alternativas de geração e das regras de compra de capacidade definidas nos leilões de energia. Nesse contexto, a revisão do perfil de despachos das térmicas a gás natural exige um aumento do esforço exploratório e da capacidade de produção nacional o que mostra-se inconsistente com as constantes mudanças de direção da política setorial.

O desenvolvimento da indústria de gás natural no Brasil é um evento relativamente recente embora suficientemente longo para percebemos a falta de linearidade das políticas públicas direcionadas ao setor. Durante toda a década de 90, o consumo de gás natural nunca representou mais do que 4% da oferta interna de energia. Contudo, a partir de 1999, com o início das operações do gasoduto Bolívia-Brasil, o consumo de gás natural no Brasil cresceu a uma taxa média de 15% ao ano acompanhado pelo crescimento tanto das importações quanto da produção nacional de forma que, em 2014, o gás natural já representava cerca de 12% da matriz energética brasileira (MME, 2014).

Figura 1- Evolução da Participação do Gás Natural na Oferta Interna de Energia

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Fonte: Elaboração própria a partir de dados do MME, 2014

O rápido crescimento da indústria de gás natural vivido nos últimos 15 anos esconde, contudo, a falta de um planejamento de longo prazo para o setor. É incontestável que as políticas públicas e a atuação da Petrobras desempenharam papel de destaque no desenvolvimento recente da indústria de gás brasileira. Entretanto, quando se analisa a condução das ações governamentais, percebe-se nitidamente que os interesses da indústria de gás natural encontram-se constantemente subordinados às diferentes necessidades do setor elétrico brasileiro.

Em 1999, os interesses do governo brasileiro e do Banco Mundial no desenvolvimento econômico da Bolívia levaram a construção de um gasoduto ligando a região produtora de Santa Cruz de La Sierra, no lado boliviano, aos centros consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil. O objetivo inicial do projeto era aproveitar o reduzido preço do gás boliviano para o desenvolvimento do setor industrial, principalmente da região Sul. Essa estratégia inicial da política de gás natural se reflete na elevada participação do setor industrial no consumo final de gás em 2000 (74% do consumo final energético).

A ociosidade inicial do GASBOL e a importância dos recursos públicos no financiamento do projeto mostram a importância da ação de planejamento do Estado, através da figura da Petrobras, na expansão da oferta de gás natural para o mercado brasileiro. Deve-se reconhecer que o início das operações do gasoduto Bolívia-Brasil trouxe uma nova dimensão para a indústria de gás natural brasileira.

Em 2000, no esforço de reduzir o risco hidráulico do setor elétrico, que viria a suscitar um severo racionamento de energia, foi desenvolvido o Programa Prioritário das Térmicas (PPT). Nesse momento, a orientação da política de gás natural, que até então era voltada para o desenvolvimento do mercado industrial e para a interiorização do consumo de gás natural, desviou-se para o atendimento das necessidades conjunturais do setor elétrico. Dentro do contexto do PPT, a Petrobras se comprometeu a garantir o suprimento de gás natural a preços subsidiados para as térmicas pertencentes ao programa durante 20 anos.

No esforço de expandir a oferta de gás natural para as térmicas da região Sudeste e Nordeste inseridas no PPT, foi desenvolvido em 2003 por iniciativa própria da Petrobras o Projeto Malhas. Diferente do GASBOL, os investimentos associados ao Projeto Malhas concentraram-se na faixa litorânea das regiões Sudeste e Nordeste o que mostra mais uma evidência de reorientação da política de gás natural naquele momento.

A importância do gás natural na geração elétrica manteve sua trajetória ascendente até 2004 quando atingiu 4,2% do total de geração das centrais elétricas de serviços públicos (MME, 2014). A partir de 2005, como resultado das melhores condições hidrológicas e da política de racionamento, a participação do gás natural na geração elétrica começa a se reduzir até atingir 2,6% em 2007 (MME, 2014). Sendo assim, muitos dos projetos térmicos planejados dentro do escopo do Programa Prioritário das Térmicas não saíram da prancheta. Nesse momento, definiu-se que o papel das térmicas a gás natural seria complementar atuando como back-up das centrais hidroelétricas.

Dentro desse contexto de mudanças no setor elétrico, a Petrobras viu-se obrigada a desenvolver o consumo não térmico de gás natural a fim de rentabilizar todos os investimentos feitos a partir do final da década de 90. Assim, já em meados de 2004, com a perspectiva de redução do consumo térmico, foi lançado pela Petrobras o Programa de Massificação do Uso de Gás Natural. O principal objetivo da empresa nesse momento passou a ser a monetização das reservas de gás natural a partir da expansão do consumo industrial, residencial e automotivo. Os próprios gasodutos do Projeto Malhas, cujo o objetivo inicial era de atender as térmicas das regiões Sudeste e Nordeste, passaram a ser utilizados para atender a demanda não térmica das distribuidoras locais de gás natural. (…) O texto continua no Blog Infopetro.

Ronaldo Bicalho

Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

1 Comentário

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  1. Péssimo artigo. Não

    Péssimo artigo. Não acrescenta nada.

    Mudança no perfil da demanda? Só pode ser piada.

     

     

    Gás é combustível fóssil. Quanto menos melhor.. Fim da história.

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