Trump e o fantasma da globalização, por Daniel Bellut

Entre os temores decorrentes do resultado da eleição presidencial nos EUA está a oposição do candidato vencedor à globalização e ao livre-comércio. A era Trump trará de volta o provincianismo econômico?

Donald Trump durante campanha eleitoral

Enviado por Vânia

do Deutsche Welle – DW

Trump e o fantasma da globalização

por Daniel Bellut

Um dos motivos por que Donald Trump venceu a disputa pela Casa Branca foi ter conquistado para si a classe média frustrada – o assim chamado angry white man (homem branco zangado).

Muitos de seus discursos foram marcados por uma acirrada retórica antiglobalização. Ele colocou em questão a cooperação econômica com outros países; disse que pretende renegociar acordos de livre-comércio como o Nafta e impedir que o TTIP, com a União Europeia (UE), sequer se realize. E não só: ele também pretende trazer de volta para os Estados Unidos os postos de trabalho transferidos para a China.

Palavras de ordem desse gênero encontram ressonância, sobretudo, entre a classe média branca. Enquanto os ricos ficavam cada vez mais ricos, também graças às interconexões mundiais, a globalização não trouxe maior prosperidade à classe média.

Para os operários do Rust Belt (cinturão da ferrugem), uma antes próspera região industrial do nordeste americano, é cada vez mais difícil garantir a subsistência. Isso, apesar de manterem vários empregos – mas que são mal pagos. Trump responsabiliza a globalização e o livre-comércio por tais desníveis sociais.

Antiglobalização, um instrumento do populismo contemporâneo

Os estereótipos de inimigos contam entre os instrumentos principais no repertório de um populista. Eles promovem identidade e coesão, desviando a atenção do próprio fracasso. Judeus, muçulmanos, bolcheviques, sionistas, americanos, social-democratas: sempre houve estereótipos hostis de que os populistas se servissem.

Hoje há outro inimigo em curso: a globalização. É cada vez mais comum reduzir-se a uma vaga ameaça esse fenômeno multifacetado. O neoprotecionismo de um Trump não abre um precedente. Os opositores da globalização já estão por toda parte, promulgando medidas protecionistas.

O Brexit (decisão pela saída do Reino Unido da UE) não foi apenas antieuropeu, mas também um rechaço à globalização, incluindo a imigração em massa. Também a Frente Nacional (FN), popular na França, defende um rigoroso protecionismo econômico. Menos populista, porém tão mais decidido, é o movimento na Alemanha contra acordos de livre-comércio como o TTIP ou o Ceta, com o Canadá.

O ex-diretor do Instituto de Economia Mundial (IfW, na sigla em alemão) Rolf Langhammer atribui esse desdobramento ao declínio das taxas de crescimento global nos últimos anos, que acirrou os conflitos de distribuição. Os populistas atribuíram esses problemas à globalização, embora, segundo o especialista, a fonte do mal seja, antes, o progresso tecnológico.

Ascensão e declínio de um mito

Será, então, que o início da presidência de Trump marca o começo do fim para a globalização econômica? O início de uma espiral descendente, gradativamente precipitando a economia mundial em direção ao provincianismo econômico?

É o que faz aponta o índice de globalização do grupo de logística Deutsche Post DHL, segundo o qual tanto os investimentos estrangeiros quanto os fluxos de transações e de capital vêm caindo constantemente desde o princípio da crise econômica, em 2007.

Gustav Horn, diretor do Instituto de Macroeconomia e Pesquisa de Conjuntura (IMK), responsabiliza sobretudo a China por essa conjuntura. Há muito, a economia mundial não roda macia, e medidas protecionistas à la Trump poderão emperrar ainda mais seu motor.

Alguns anos atrás, essa súbita “calmaria da globalização” seria considerada impossível. Há décadas era consenso que a dinâmica global resolvia os problemas do mundo, beneficiando os pobres e multiplicando a prosperidade.

Especialmente desde a abertura da China e a queda da Cortina de Ferro, o comércio internacional e os fluxos de capital vinham aumentando de forma constante. A integração vitoriosa do mercado interno da UE e a consolidação de uma classe média de alto poder aquisitivo na Índia, Rússia e China vieram confirmar a credibilidade de uma “globalização benéfica”.

Crescimento globalizado

No momento, essa quase euforia perante a globalização retrocedeu temporariamente. O comércio global estanca, a maior economia do mundo terá como presidente um adversário da globalização; por todo o mundo, populistas bradam contra a globalização e o livre-comércio. Será que essa dinâmica que vem crescendo desde a época da industrialização receberá agora o golpe de misericórdia?

É inegável que a globalização também trouxe efeitos positivos. Langhammer lembra que tanto as nações industriais como as emergentes se beneficiaram: centenas de milhões conseguiram escapar à pobreza nos países emergentes e em desenvolvimento, graças à abertura dos mercados nacionais.

Horn lembra que a China, o México e o Brasil, em particular, acusaram crescimento meteórico através do comércio mundial. Por outro lado, ele reconhece que a prosperidade proveniente à globalização deveria ser mais bem distribuída.

Também na Europa o livre-comércio teve efeito positivo. O mercado comum europeu promoveu prosperidade nos países do Sul e do Leste do continente. Da Espanha à Romênia, o padrão de vida melhorou em tempo recorde após a adesão à União Europeia – e, consequentemente, ao mercado comum.

Mais do que isso, o livre-comércio para além das fronteiras nacionais na Europa foi um catalisador da paz e da compreensão entre os povos. As interligações econômicas tornam quase impossível uma guerra. A globalização uniu seres humanos das mais diferentes culturas. Assim, quem se posiciona contra ela incentiva as iniciativas solitárias nacionalistas.

Protecionismo não é a solução

Trump gostaria de isolar os EUA e restringir o comércio em nível mundial. No entanto, o plano de colocar os acordos de livre-comércio sob sindicância nada traria à classe média americana frustrada.

Para Horn, a política econômica de Trump prejudicaria a real-economia e os mercados financeiros, a longo prazo. Mais importante, porém: ela não serve em absoluto à classe média. A redução do imposto sobre fortunas agravará ainda mais a desigualdade e reforçará a distribuição de capital de baixo para cima.

Tanto o diretor do IMK quanto Langhammer estão convencidos de que uma política econômica que prejudique os acordos de livre-comércio não resolverá os problemas da classe média americana.

O ex-diretor do IfW chama a atenção para o aspecto do avanço tecnológico: os EUA possuem, de fato, numerosas universidades de ponta, mas seu sistema de ensino é basicamente desigual. Num país caracterizado pela alta tecnologia e não pela indústria, a mão de obra bem treinada teria uma situação mais fácil. Além disso, deixou-se de realizar uma reforma estrutural em polos industriais como o Rust Belt.

A globalização proporcionou crescimento econômico, prosperidade e entendimento entre os povos. Devido ao alarmismo dos populistas e dos idealistas político-sociais, contudo, ela passou a ser associada antes a riscos do que a chances.

Em muitos casos, a insuficiente distribuição de capital, tanto nos países emergentes quanto nos industrializados, tem causas mais complexas, como reforma estrutural, corrupção, uma economia mundial vacilante – a lista é praticamente infinita.

Fazer retroceder a roda da globalização não é apenas pouco pragmático, mas fomenta, no fim das contas, o isolamento econômico e social – um desdobramento que definitivamente não é sinônimo de mais prosperidade.

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Redação

14 Comentários

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  1. Sabem o pior? Trump está

    Sabem o pior? Trump está certo. A famosa globalização como acabou se tornando (estou falando da versão real, não a versão editada para publicação na mídia) em uma ferramenta para tornar os garotos de Wall Street cada vez mais ricos aonde a conta é paga por todo o resto.

    P.S: Eu queria Sanders para presidente, mas Hillary Clinton seria bem pior.

    1. Somebody, reescrevendo com outras palavras, …

      Somebody, reescrevendo com outras palavras, o que dizes é que a globalização é o objetivo final do imperialismo, continuar a acumulação capitalista a nível planetário, retirando os empasses do Estado Nacional na acumulação final.

      Quem melhor reproduz o resultado final da globalização são vários filmes de ficção em que 99,9% está na miséria para que o restante 0,01% acumule a riqueza do mundo.

      A globalização leva a concentração de riqueza a níveis jamais imaginados pelo homem comum.

  2. O empobrecimento da classe média não é efeito da globalização

    Mesmo que repatrie as indústrias americanas que migraram para a China, o Trump não vai deter o processo de empobrecimento da classe média. As empresas repatriadas vão reduzir suas taxas de lucro, já que terão que pagar salários mais elevados para os trabalhadores americanos e essa elevação dos salários fará os capitalistas substituirem homens por máquinas no processo de produção. O desemprego vai aumentar ainda mais.

    A pauperização da classe média é uma tendência inexorável da sociedade capitalista. Marx e Engels constataram essa tendência no Manifesto Comunista:

    “A história de toda a sociedade até aqua é a história de lutas de classes.

    [Homem] livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, burgueses de corporação e oficial, em suma, opressores e oprimidos, estiveram em constante oposição uns aos outros, travaram uma luta ininterrupta, ora oculta, ora aberta, uma luta que de cada vez acabou por uma reconfiguração revolucionária de toda a sociedade ou pelo declínio comum das classes em luta.

    Nas anteriores épocas da história encontramos quase por toda a parte uma articulação completa da sociedade em diversos estados [ou ordens sociais], uma múltipla gradação das posições sociais. Na Roma antiga temos patrícios, cavaleiros, plebeus, escravos; na Idade Média: senhores feudais, vassalos, burgueses de corporação, oficiais, servos, e ainda por cima, quase em cada uma destas classes, de novo gradações particulares.

    A moderna sociedade burguesa, saída do declínio da sociedade feudal, não aboliu as oposições de classes. Apenas pôs novas classes, novas condições de opressão, novas configurações de luta, no lugar das antigas.

    A nossa época, a época da burguesia, distingue-se, contudo, por ter simplificado as oposições de classes. A sociedade toda cinde-se, cada vez mais, em dois grandes campos inimigos, em duas grandes classes que directamente se enfrentam: burguesia e proletariado”. – Marx e Engels

    Em regra, a classe média não sobe para a classe alta, ao contrário, muitos elementos da classe alta descem para a classe média em decorrência concorrência entre os capitalistas. A regra é a proletarização da classe média pelos motivos abaixo relacionados:

    “Os pequenos estados médios [classe média] até aqui, os pequenos industriais, comerciantes e rentiers, os artesãos e camponeses, todas estas classes caem no proletariado, em parte porque o seu pequeno capital não chega para o empreendimento da grande indústria e sucumbe à concorrência dos capitalistas maiores, em parte porque a sua habilidade é desvalorizada por novos modos de produção. Assim, o proletariado recruta-se de todas as classes da população”. Marx e Engels

    “Os estados médios [Classe Média] – o pequeno industrial, o pequeno comerciante, o artesão, o camponês -, todos eles combatem a burguesia para assegurar, face ao declínio, a sua existência como classes médias. Não são, pois, revolucionárias, mas conservadoras. Mais ainda, são reacionárias, procuram fazer andar para trás a roda da história. Se são revolucionários, são-no apenas à luz da sua iminente passagem para o proletariado, e assim não defendem os seus interesses presentes, mas os futuros, e assim abandonam a sua posição própria para se colocarem na do proletariado”. Marx e Engels

    Como visto, a médio prazo, a desglobalização vai piorar os problemas da classe média, em vez de solucioná-los. E isso se conseguirem, junto com Trump, fazer girar para trás a roda da história.

    1. Calma Rui, este teu raciocínio está meio mecanicista.

      Primeira coisa, esqueces que situações de pleno emprego dão mais força a organização da classe operária. Estás fazendo teu raciocínio por um só lado, a luta de classes subtende que lutam duas classes e se dá mais poder a classe operária esta adquire mais condições de lutar e inclusive de pensar.

      Não podes esquecer que Bernie Sandres falou em socialismo com todas as suas letras e o apoio foi imenso e não houve aquele bloqueio ideológico que caracterizou a política norte-americana do Século XX.

      Também não podes esquecer que a revolução foi prevista para países economicamente e tecnologicamente evoluídos não para a Rússia, China ou Cuba.

      O Rust Belt é composto por operários, que chamamos classe média pois o nível de vida é mais elevado que o operariado internacional, porém não são pequenos proprietários, pequenos industriais ou pequenos comerciantes, não faça a confusão que a direita procurou fazer durante todo o século XX, chamando esta classe como pequenos capitalistas.

      Um operário possuir uma boa casa, um automóvel ou mesmo um pequeno negócio que sofre a concorrência das grandes redes de varejo, não fará com que ele no século XXI pense que um dia ele será o Wallmart, esta ilusão foi para o ralo, Trump ainda consegue levantá-la um pouco, porém por mais incrível que possa parecer, Bernie Sanders falando em socialismo democrático era o único que tirava os votos de Trump.

      Movimentos como o Occupy Wall Street estão vivos, e mais vivos que se pensa, e eles dão o contraponto ao antigo conceito da saída individual do self made man.

      Estas trabalhando por um lado somente no processo histórico, estas fazendo mostrando somente a visão das classes dominadoras e não dos dominados, estás supondo que Trump possa ser exitoso a longo prazo, e isto que é inviável, e não a mobilização das classes operárias norte-americanas.

      A saída nacionalista poderá ser exitosa por algum tempo, porém não é a saída como na própria teoria que falas, diz.

      O que chamo atenção e é novo na intensidade que ocorreu, a palavra socialismo calou forte no norte-americanos mais jovens, e se esta entrar para o vocabulário daqueles que estavam a margem da sociedade moderna, os eleitores do Rust Belt, terá uma força verdadeiramente revolucionária.

      Insisto, a teoria marxista não foi feita para a Rússia, China ou Cuba, mas sim para a Alemanha, França e Estados Unidos.

       

      1. Rdmaestri, acabo de tomar chá de camomila

        Se a classe média do Cinturão da Ferrugem der indícios de satisfação com o sistema capitalista e com a ordem burguesa, eles serão desempregados com maior aceleração.

        Em sandálias que pururucam, fronteiras que se abrem, Rui Daher escreveu o diálogo do Abilio Diniz e da Mirima Leitão:

        “- Miriam, falta produtividade ao trabalho no Brasil.

        – Você fala no geral, no índice de produtividade do trabalho.

        – Também, mas não só. O lado comportamental também conta. Além do que precisa-se de muitos, multidões, sempre mais do que os necessários para realizar alguma tarefa.

        – Verdade. Principalmente no serviço público.

        – Apesar de todos esses artigos modernosos publicados na Harvard Business Review (esta pronunciada em tom mais alto), nas minhas empresas faço a boa e velha conta do faturamento por número de empregados. CAEM AS VENDAS, CORTO GENTE. Dá sempre certo, você não acha? Quanto mais valor se transfere do trabalho para o capital, melhor vai o país.

        – Claro, é assim em todo o mundo, menos aqui. Tecnologia é mais eficaz, barata, não precisa ir ao hospital e nem faz greve. POUPAR MÃO DE OBRA É TENDÊNCIA MUNDIAL. A iniciativa privada precisa lucrar para pagar impostos. Quem paga o serviço da dívida pública?

        – No funcionalismo só acho justo remunerar bem o Judiciário.

        – Matou! É quem nos dá segurança jurídica para produzir, investir, garantir a livre expressão e o regime democrático.

        – Protege os investimentos contra os movimentos sociais, sempre ansiosos, apressados, querendo antecipar a divisão do bolo. Não entendem a necessidade de poupança. Só pensam em consumir. Será que ninguém leu Milton Friedman?

        – Pior, virou moda dar voz a uma menininha da New School for Social Research (NYC), que escreve na Folha.

        – Bobagem, Miriam. A Folha só faz isso para parecer neutra. Mas, vem cá, é verdade que eles te torturaram? Gostaria muito que voltassem.

        Ouço uma estrondosa gargalhada.

        – Relaxa, portuga. O time que chegou agora é muito melhor. Em vez de vigiar as fronteiras prefere abrí-las..”

        https://jornalggn.com.br/blog/rui-daher/sandalias-que-pururucam-fronteiras-que-se-abrem-por-rui-daher

        A repatriação das indústrias por Trump aumentará os custos de produção, a elevação dos custos de produção implicará na redução das vendas e a redução das vendas redundará na despedida de trabalhadores.

        De acordo com o Programa de Gotha,

        “A libertação do trabalho tem que ser obra da classe operária, em face da qual todas as outras classes são uma só massa reacionária.”

        Criticando tal Programa, Marx asseverou:

        A primeira estrofe é tirada das palavras introdutórias dos Estatutos Internacionais, mas «melhorada». Diz-se lá: «A libertação da classe operária tem que ser obra dos próprios operários»; aqui, pelo contrário, «a classe operária» tem que libertar – o quê? «O trabalho.» Compreenda quem puder.

        Em compensação, a antístrofe é, pelo contrário, uma citação de Lassalle, da mais pura água: «em face da qual (da classe operária) todas as outras classes formam uma só massa reaccionária».

        No Manifesto Comunista diz-se:

        «De todas as classes que hoje em dia defrontam a burguesia, só o proletariado é uma classe realmente revolucionária. As restantes classes desmoronam-se e soçobram com a grande indústria; o proletariado é dela o produto mais próprio.»

        A burguesia é aqui apreendida como classe revolucionária – como portadora da grande indústria – face aos feudais e estados médios que querem manter todas as posições sociais que são obra de modos de produção antiquados. Não formam, portanto, juntamente com a burguesia, uma só massa reaccionária.

        Por outro lado, o proletariado é revolucionário face à burguesia, porque, crescido ele próprio do solo da grande indústria, se esforça por despojar a produção do carácter capitalista que a burguesia procura perpetuar. Mas o Manifesto acrescenta: que os «estados médios (se tornam) revolucionários… em vista da sua passagem iminente para o proletariado»

        Deste ponto de vista, é, portanto, de novo um contra-senso que elas «juntamente com a burguesia» e, sobretudo, com os feudais, face à classe operária, «formem uma só massa reaccionária».

        Recordou-se, aquando das últimas eleições, aos artesãos, aos pequenos industriais, etc, e aos camponeses: face a nós, formais com burgueses e feudais uma só massa reaccionária?

        Lassalle sabia de cor o Manifesto Comunista, tal como os seus crentes [sabem] os sagrados escritos da autoria dele. Se, portanto, ele o falsificou tão grosseiramente, isso só aconteceu para embelezar a sua aliança com os adversários absolutistas e feudais contra a burguesia.” – Marx

        Eu não chamo a classe média de pequenos capitalistas, seus membros é que se acham pequenos capitalistas. Se eles não reagiram na iminência da sua derrocada, como vão reagir agora, que vão conseguir emprego e renda, caso não sejam substituídos por máquinas?

        “Se os tubarões fossem homens, naturalmente fariam guerras entre si, para conquistar gaiolas e peixinhos estrangeiros. Nessas guerras eles fariam lutar os seus peixinhos, e lhes ensinariam que há uma enorme diferença entre eles e os peixinhos dos outros tubarões. Os peixinhos, proclamariam, são notoriamente mudos, mas silenciam em línguas diferentes, e por isso não se podem entender entre si. Cada peixinho que matasse alguns outros na guerra, os inimigos que silenciam em outra língua, seria condecorado com uma pequena medalha de sargaço e receberia uma comenda de herói.” Brecht

        Ensinaram aos bagres da classe operária estadunidense que há uma enorme diferença entre eles e os bagres dos outros países. Não é à toa que Trump, que disse que faria um muro entre EUA e México (mandando a fatura para os Mexicanos) foi vitorioso no Cinturão da Ferrugem. E eles se consideram superiores aos Mexicanos.

        Expero que você, Rdmaestri, esteja certo e que eu esteja não errado, pois eu não erro, em me equivoco.

        Valeu, Companheiro

      2. Acho q Marx considerava o operário qualificado como classe média

        Eu acho que Marx considerava o trabalhador qualificado como classe média. Digo isso com base nos trechos abaixo transcritos:

        “Os pequenos estados médios até aqui, os pequenos industriais, comerciantes e rentiers, os artesãos e camponeses, todas estas classes caem no proletariado, em parte porque o seu pequeno capital não chega para o empreendimento da grande indústria e sucumbe à concorrência dos capitalistas maiores, em parte porque a sua habilidade é desvalorizada por novos modos de produção. Assim, o proletariado recruta-se de todas as classes da população”. – Marx e Engels

        Um Caixa Executivo de um banco, por exemplo, tem sua habilidade desvalorizada por um Caixa Eletrônico. Assim, os trabalhadores qualificados também compõem a classe média, juntamente com os pequenos industriais, os comerciantes e rentiers, artesãos e camponeses.

        Em Miséria da Filosofia, Marx escreveu:

        “Na Inglaterra, as greves têm dado regularmente lugar à invenção e ao emprego de algumas máquinas novas. As máquinas eram, pode-se dizer, a arma que os capitalistas empregavam para abater o trabalho especializado em revolta”.

        O que você acha, Maestri?

        1. A “classe média” e Marx

          Acho que em princípio, Marx não trabalhava com o conceito de “classe média”, a não ser como uma aproximação, uma forma de fazer o leitor entender melhor o que ele quer dizer. Para ele, havia a burguesia e havia o proletariado; todos os demais estratos sociais eram “de transição”. É o que ele está dizendo aqui:

          Os estratos inferiores da classe média – os pequenos comerciantes, lojistas e rentistas, artesãos e camponeses – todas essas pessoas afundam gradualmente no proletariado, em parte porque o seu diminuto capital não é suficente para a escala na qual a indústria moderna funciona, e é submergida pela competição com os grandes capitalistas, em parte porque suas habilidades especializadas se tornam inúteis diante dos novos métodos de produção. Assim o proletariado é recrutado de todas as classes da população.

          Ou seja, a dita “classe média”, ou pelo menos os seus estratos inferiores, está afundando no proletariado, é uma camada de pessoas em processo de proletarização, não um estrato estável. Assim, o “trabalhador qualificado” já é alguém que não é mais pequeno comerciante, rentista, artesão ou camponês, mas um proletário, ainda que sua origem possa estar nos estratos mencionados, e ainda que possa reter um padrão de vida um pouco mais elevado do que a massa de trabalhadores braçais.

           

          1. Classe Média e Pequena Burguesia

            No Manifesto Comunista, Marx e Engels disseram:

            “A nossa época, a época da burguesia, distingue-se, contudo, por ter simplificado as oposições de classes. A sociedade toda CINDE-SE, CADA VEZ MAIS, em dois grandes campos inimigos, em duas grandes classes que directamente se enfrentam: burguesia e proletariado.”

            Na Crítica do Programa de Gotha, Marx assim se expressa:

            “No Manifesto Comunista diz-se:

            «De todas as classes que hoje em dia defrontam a burguesia, só o proletariado é uma classe realmente revolucionária. As restantes classes desmoronam-se e soçobram com a grande indústria; o proletariado é dela o produto mais próprio.»

            A burguesia é aqui apreendida como classe revolucionária – como portadora da grande indústria – face aos feudais e estados médios [Mittelstände] que querem manter todas as posições sociais que são obra de modos de produção antiquados. Não formam, portanto, juntamente com a burguesia, uma só massa reaccionária.

            Por outro lado, o proletariado é revolucionário face à burguesia, porque, crescido ele próprio do solo da grande indústria, se esforça por despojar a produção do carácter capitalista que a burguesia procura perpetuar. Mas o Manifesto acrescenta: que os «estados médios [Mittelstände]… (se tornam) revolucionários… em vista da sua passagem iminente para o proletariado».

            Deste ponto de vista, é, portanto, de novo um contra-senso que elas «juntamente com a burguesia» e, sobretudo, com os feudais, face à classe operária, «formem uma só massa reaccionária».

            Recordou-se, a quando das últimas eleições, aos artesãos, aos pequenos industriais, etc, e aos camponeses: face a nós, formais com burgueses e feudais uma só massa reaccionária?

            Lassalle sabia de cor o Manifesto Comunista, tal como os seus crentes [sabem] os sagrados escritos da autoria dele. Se, portanto, ele o falsificou tão grosseiramente, isso só aconteceu para embelezar a sua aliança com os adversários absolutistas e feudais contra a burguesia.”

            Na Mensagem da Direção Central à Liga dos Comunistas, Engels e Marx asseveram:

            “O partido democrático pequeno-burguês é muito poderoso na Alemanha. Abrange não somente a grande maioria dos habitantes burgueses das cidades, os pequenos negociantes industriais e os mestres artesãos: conta entre os seus seguidores os camponeses e o proletariado rural enquanto este último não tiver encontrado um suporte no proletariado autónomo das cidades.
            É esta a relação do partido operário revolucionário com a democracia pequeno-burguesa: está com ela contra a fracção cuja queda ele tem em vista: opõe-se-lhe em tudo o que ela pretende para se consolidar a si mesma.

            Os pequeno-burgueses democratas, muito longe de pretenderem revolver toda a sociedade em benefício dos proletários revolucionários, aspiram a uma alteração das condições sociais que lhes torne tão suportável e cómoda quanto possível a sociedade existente. Por isso reclamam, antes de tudo, a diminuição das despesas públicas mediante a limitação da burocracia e a transferência dos principais impostos para os grandes proprietários fundiários e grandes burgueses. Reclamam, além disso, a abolição da pressão do grande capital sobre o pequeno, por meio de instituições públicas de crédito e de leis contra a usura que lhes tornassem possível, a eles e aos camponeses, obter em condições favoráveis adiantamentos do Estado em vez de os obterem dos capitalistas; e ainda o estabelecimento das relações de propriedade burguesas no campo, pela completa eliminação do feudalismo. Para realizarem tudo isto, necessitam de uma Constituição democrática, seja ela [monárquica] constitucional ou republicana, que lhes dê a maioria, a eles e aos seus aliados, os camponeses, e de uma organização comunal democrática que ponha nas suas mãos o controlo directo da propriedade comunal e uma série de funções actualmente exercidas pelos burocratas.”

            Acho que Marx e Engels se referiam aos os pequenos comerciantes, lojistas e rentistas, artesãos e camponeses, eles estavam se referindo acima de tudo à pequena burguesia, e quando se referiam à classe média, estavam se referindo principalmente aos trabalhadores qualificados.

  3. A globalização é indefensável sob qualquer aspecto

    O remédio populista que a ultradireita propõe está errado, mas os povos tem toda razão em repudiar a globalização. Da forma como foi realizada ela é indenfensável.

    Esta reportagem expressa  a falta de sensibiliade que os grupos beneficiados pela globalização tem em relação ao sofrimento social que ela causou. Entre estes grupos “sem noção” estão inclusos os cosmopolitas e politicamente corretos da “esquerda soft”, defensores do suposto aumento da tolerância que a globalização trouxe: ou são cegos ou cínicos.

    Basta uma simples verificação dos fatos para ver que a globalização não trouxe paz nem entendimento entre os povos. Pelo contrário, ela acirrou a competição entre os estados e aumentou as tensões mundiais.

    A melhoria de vida em países como Brasil, México, Espanha, Greçia e Portugal, exportadores de matéria primas, foi resultado de duas bolhas econômicas comerciais: a da Alemanha com demais países da UE e a da China com os EUA, sustentadas por crédito ao consumo e às indústrias que nunca serão pagos.

    Aglobalização se deu apenas do ponto de vista do mercado: finanças e comércio livres e indústrias deslocalizadas. Resultou em oligopólios, desigualdade social e exclusão do “menos aptos”.

     

    1. Não defendo a globalização, só constato a sua irreversibilidade

      Eu não defendo a globalização, eu apenas constato a sua irreversibilidade:

      “A necessidade de um escoamento sempre mais extenso para os seus produtos persegue a burguesia por todo o globo terrestre. Tem de se implantar em toda a parte, instalar-se em toda a parte, estabelecer contactos em toda a parte.

      A burguesia, pela sua exploração do mercado mundial, configurou de um modo cosmopolita a produção e o consumo de todos os países. Para grande pesar dos reacionários, tirou à indústria o solo nacional onde firmava os pés. As antiquíssimas indústrias nacionais foram aniquiladas, e são ainda diariamente aniquiladas. São desalojadas por novas indústrias cuja introdução se torna uma questão vital para todas as nações civilizadas, por indústrias que já não laboram matérias-primas nativas, mas matérias-primas oriundas das zonas mais afastadas, e cujos fabricos são consumidos não só no próprio país como simultaneamente em todas as partes do mundo. Para o lugar das velhas necessidades, satisfeitas por artigos do país, entram [necessidades] novas que exigem para a sua satisfação os produtos dos países e dos climas mais longínquos. Para o lugar da velha auto-suficiência e do velho isolamento locais e nacionais, entram um intercâmbio universal, uma dependência das nações umas das outras. E tal como na produção material, assim também na produção espiritual. Os artigos espirituais das nações singulares tornam-se bem comum. A unilateralidade e estreiteza nacionais tornam-se cada vez mais impossíveis, e das muitas literaturas nacionais e locais forma-se uma literatura mundial.

      A burguesia, pelo rápido melhoramento de todos os instrumentos de produção, pelas comunicações infinitamente facilitadas, arrasta todas as nações, mesmo as mais bárbaras, para a civilização. Os preços baratos das suas mercadorias são a artilharia pesada com que deita por terra todas as muralhas da China, com que força à capitulação o mais obstinado ódio dos bárbaros ao estrangeiro. Compele todas as nações a apropriarem o modo de produção da burguesia, se não quiserem arruinar-se; compele-as a introduzirem no seu seio a chamada civilização, i. é, a tornarem-se burguesas. Numa palavra, ela cria para si um mundo à sua própria imagem.” Marx e Engels, Manifesto Comunista

      O muro do Trump não vai resolver o desemprego estrutural dos Estados Unidos. O capitalismo vai derrubar o tal muro tal qual fez com a Muralha da China.

      “Under the freedom of trade (Globalisation) the whole severity of the laws of political economy will be applied to the working classes. Is that to say that we are against Free Trade? No, we are for Free Trade, because by Free Trade all economical laws, with their most astounding contradictions, will act upon a larger scale, upon a greater extent of territory, upon the territory of the whole earth; and because from the uniting of all these contradictions into a single group, where they stand face to face, will result the struggle which will itself eventuate in the emancipation of the proletarians”. – Engels

      1. Mas o autor do artigo defende

        O autor do artigo mistura as duas coisas. Uma é falar que a globalização é irreversível (sob a lógica do capital realmente é). Outra é dizer que traz benefícios aos povos, como mais tolerância e prosperidade econômica, o que é uma bobagem sem tamanho.

        Acho este artigo, ou de um cinismo, ou de uma ignorância sem tamanho. E muita esquerda compra esta ideia de que a globalização e a União Europeia têm aspectos bons, civilizatórios, democratas, de propagação do respeito a direitos humanos etc. Tanto a Globalização, como a UE (um subprocesso seu) fazem parte da expansão do capitalismo e têm unicamente o objetivo de fazer o capital se multiplicar: não tem nada a ver com a união dos povos ou o bem estar das pessoas.

        A resposta de Trump realmente não resolve nada, mas tampouco resolveria uma realpolitk de esquerda de tentar humanizar o capitalismo globalizado com direitos humanos, políticas para a ecologia e as  minorias e outras farsas, como os defensores dos democratas e de Clinton parecem acreditar.

        Não há como humanizar o capitalismo: Obama e os Clinton humanizaram? As mãos deles estão mais sujas de sangue que as dos Bush pai e filho. Conseguiram ser mais beligerantes que os republicanos. E sob seu governo a desigualdade nos EUA aumentou, os problemas ecológicos continuaram, os negros sofreram do mesmo jeito e os árabes do Oriente Médio continuaram a ser mortos por bombas da Otan e aliados.

        Que futuro teria os EUA e o mundo com Clinton? Nem com ela, nem com Trump.

  4. Aí está um artigo que implora

    Aí está um artigo que implora para não ter sido escrito. Nada além de senso-comum, bobagens, frases feitas, auto-complacência, mediocridade, mediocridade, mediocridade.

    O Domingão do Faustão tem mais conteúdo  e análise mais aprofundada do que essa massamorda.

  5. Rui Ribeiro

    Grata pelas excelentes observações feitas em seus comentários. Concordo integralmente.

    Espero que sirva de reflexão para uma parte da esquerda que acha que Trump vai salvar o mundo. Além de se perderem nas análises, ainda acreditam em promessas feitas durante uma campanha eleitorial para presidencia dos EUA. Promessas essas feitas justamente por um multibilionário neofascista que se vendeu como “outsider”. Putz… Um abraço.

    1. Obrigado a você, Vânia, e pode continuar na frente do meu sol

      Mas não fique na frente da minha Lua, porque, sendo lunático, eu quero um lugar à sombra, e não ao sol.

      “Mother Moon she’s calling me back to her silver womb

      Father of creation takes me from my stolen tomb

      Seventh night the unicorn is waiting in the skies

      A symptom of the Universe, a Love that never dies

      Yeah!”

      Brancadeira, Vânia.

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