Andre Motta Araujo
Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo
[email protected]

Pierre Laval, o oportunismo na política, por André Araújo

Pierre Laval, o oportunismo na política, por André Araújo

Pierre Laval foi um dos personagens emblemáticos do Século XX como representante do oportunismo politico no seu estado mais puro em meio ao cenário dramático da Segunda Guerra. Seu papel foi único e diverso do Marechal Petain, seu companheiro em desonra.

Laval fez longa carreira na política da Terceira República francesa, começando em 1905 com a filiação ao tradicional Partido Socialista (Secion Française de l´International Ouvvriere-SFIO).

Mostrou que não tinha convicções de nenhuma espécie ao se transformar no principal agente do Terceiro Reich durante a ocupação alemã da França, provocada pela derrota inesperada de junho de 1940, uma rendição com pouca luta que se tornou símbolo da covardia do estamento politico e militar francês frente ao agressor alemão. A França não usou nem um terço de seus blindados e não fez voar grande parte de sua enorme força aérea. Depois do armistício, os oficiais alemães ao fazerem o inventário do material bélico francês e encontraram centenas de aviões e tanques que nunca foram usados escondidos em galpões no campo. Os alemães avaliaram que os franceses tinham mais blindados e mais aviões de combate do que eles tinham, ficaram espantados com o tamanho do poder militar à disposição da França, citado por W.Shirer em “A Terceira República em 3 volumes que descreve o inventário do material bélico francês nunca usado, o que espantou os alemães depois da rendição.

Laval começou na vida como advogado, se tornou conhecido como defensor de sindicatos e de esquerdistas, ai fez seu capital politico. Eleito deputado socialista em 1914, tornou-se senador em 1927, ganhando fama e poder para ser Ministro de Obras Públicas, da Justiça e do Trabalho. Em 1931 tornou-se Primeiro Ministro no gabinete Doumergue, em 1934 foi Ministro das Relações Exteriores e em 1935 novamente Primeiro Ministro, perdendo o cargo com a eleição de Leon Blum e seu Front Populaire, um grupo da esquerda mais radical que não confiava em Laval. O Front Populaire era uma coligação de partidos de esquerda que representava o forte movimento operário e implantou a semana de 40 horas.

A RENDIÇÃO PARA A ALEMANHA

O ataque alemão à França em 1940 encontrou pouca resistência por causa da traição e da indiferença da elite política francesa à uma dominação alemã, vista como defesa contra o avanço da esquerda, a eleição do Front Populaire provocou um calafrio nas 200 famílias de França, no Comité des Forges e  no “haurte monde” do dinheiro.

A elite financeira francesa, representada por Paul Baoudain, presidente da Banque de l `Índochine, que se tornou o guru econômico do novo regime colaboracionista de Vichy, preferia os nazistas como blindagem contra a esquerda, o trauma da vitória da Frente Popular em 1936 estava muito vivo,  a direita achava que os alemães iriam salvar a França do domínio da esquerda, Laval rapidamente embarcou nessa onda e se ofereceu a serviço dos nazistas.

LAVAL E O GOVERNO DE VICHY

Pierre Laval, um politico já de longa carreira e hábil manipulador do poder, foi o mentor do idoso Marechal Henri Petain, herói da 1ª Guerra, que tornou-se Chefe de Estado do Governo de Vichy, um governo da metade sul da França, teoricamente independente mas debaixo do controle alemão. A metade norte, com sede em Paris ficava sob ocupação militar direta da Alemanha, situação que se alterou após a invasão aliada à  África do Norte em 1942, até então o Governo de Vichy tinha  soberania sobre a Argélia, Marrocos e Tunísia, com a invasão anglo-americana da África do Norte a ficção do governo de Vichy desaparece, os alemães ocupam o sul da França mas a farsa de um governo francês continua com Petain e Laval agora sem disfarces sob as botas alemãs. Esse governo fantasmagórico sobreviveu mesmo após o Dia D e a invasão dos Aliados em solo francês, Petain e Laval continaram a se apresentar como governo francês mesmo estando agora sediados no castelo de Sigmaringen, na Alemanha.

A ficção tinha tons de realidade, havia um Embaixador dos EUA em Vichy até as vésperas da invasão da Normandia (era o Almirante Leahy, amigo pessoal de Roosevelt) .

Após a rendição vexaminosa, Laval dissolveu a Assembleia Nacional e aboliu a Terceira Republica em 10 de julho de 1940, tornando-se Primeiro Ministro do Governo de Vichy até dezembro de 1940 quando Petain o demitiu porque ele lidava com os alemães diretamente sem informar Petain. Por pressão alemã Laval retornou ao posto de Primeiro Ministro em dezembro de 1942 e para retribuir o apoio alemão à sua volta ao poder celebrou um acordo para enviar trabalhadores franceses para trabalhar na Alemanha nas industrias de guerra, cerca de 2 milhões foram recrutados pelos alemães.

Para combater os movimentos de resistência que estavam aumentando Laval fortaleceu sua policia politica, a Milice,  que tornou-se mais temida do que a Gestapo em certas regiões, Laval de 1944 em diante passou a ter outros inimigos, colaboracionistas franceses mais pro-alemães do que ele, como Marcel Deat e Phelippe Henriot, eram os ultra colaboracionistas.

Seu papel na Historia foi abjeto, virou capataz dos alemães contra seus próprios compatriotas. Para quem começou no socialismo e na defesa dos esquerdistas como advogado, foi um final indigno que teve seu desfecho no paredão de fuzilamento da prisão de Fresnes, por crime de alta traição em outubro de 1945, após julgamento em tribunal especial.

PORQUE LAVAL SE TORNOU INSTRUMENTO DOS NAZISTAS

Há dois tipos de políticos na Historia: o politico das convicções que mantem uma certa linha de pensamento e ação e pode circunstancialmente fazer acordos com outras forças, por um expediente tático, não significando uma mudança de rumos na trajetória politica. Exemplo clássico é Churchill, o maior anticomunista de seu tempo, fez acordo com Stalin em 1941 contra um inimigo comum, reuniu-se com Stalin quatro vezes entre brindes e conferencias, mas ai não havia traição porque ninguém estava enganando ninguém, era um acordo temporário por conveniência dos dois. Stalin tinha plena certeza que após a derrota do inimigo comum Churchill voltaria a ser seu adversário, não havia enganos, era um pacto de situação.

Já o politico oportunista muda completamente de rumo para se aliar a forças novas que julga vencedoras, largando pelo caminho antigos aliados e amigos. Troca de lado sem olhar para trás, abandonando na estrada quem lhe ajudou a subir na vida, não tem gratidão, perdão ou remorso, é uma maquina de deslealdade em funcionamento compulsivo, trai por gosto.

Laval virou as costas a seus compatriotas para servir ao estrangeiro, tirano de seu próprio povo na pior das circunstancias, sem qualquer tipo de escrúpulo, apenas seu interesse pessoal.

Ficará para sempre como exemplo do politico oportunista da pior espécie.

Ainda ao fim do Terceiro Reich tentou fugir para a Espanha, mas não lhe deram asilo.

Seu chefe nominal, o Marechal Petain teve um papel igualmente perverso, mas com outro vetor, não entendia de politica, foi manobrado por Laval, tinha créditos na Primeira Guerra que foram considerados na comutação da pena de morte em prisão perpetua por De Gaulle.

Ao repararmos na vida politica brasileira, encontraremos almas penadas que lembram a trajetória ignominiosa de Laval, a cena politica e seus variados personagens, pouco mudaram no seu palco dramático da Historia desde Júlio Cesar e Nicoló Maquiavel até nossos dias.

Andre Motta Araujo

Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo

21 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Este texto parece ter sido

    Este texto parece ter sido escrito pro laRval Ciro Gomes, não ?  .,.ou será que pro “verme”(segundo amigo) do Fachin ?

    Ciro pede perdão ao DEMO (que capitaneado por “PAUDERNEI 200 mangos” só tá esperando o coroné ex PATRICIA pra lhe beijar os pés)

    Ciro disse que como professor de direito (qua qua qua) acha que eleição sem LULA não é golpe ..que LAVA JATO é a fina flor da legalidade e que dá a ela mó apoio ..que lula não é preso político e que sua sentença só cabe a justiça

    Ciro disse que iria enquadrar o mercado, e agora desdiz a ele mercado dizendo não precisar mais teme-lo

    Abaixo um artigo bom MAS que se esqueceu dum outro personagem do Justiciamento brasileiro, de Rosa Weber

     ..ela que tb foi presidente do TRF4 e que contou com o arguto Sergio Moro pra condenar Dirceu sem provas (pq a literatura permitia  ..assim disse o júiz, ups, ela, Rosinha, no caso mensalão)

    https://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-conexao-do-parana-de-moro-a-fachin-um-time-coeso-na-guerra-contra-lula-por-joaquim-de-carvalho/

  2. sayers e kahn

    sugestão de leitura: ‘a grande conspiração’ de sayers e kahn.

    esse laval foi um verme. mas não era o único naquele cenário: chamberlain não lhe ficava nada a dever.

    interessante também é o filme “sessão especial de justiça”

    1. “”Seção Especial de Justiça””

      “”Seção Especial de Justiça”” filme extraodinario de Costa Gravas mostra a que limites chega o rastejamento na politica,

      magistrados franceses querendo agradar aos alemães iam ALEM do que os alemães pretendiam, a ponto de um oficial alemão,

      em francês perfeito   (muitos oficiais alemães de elite eram fluentes em francês) ficou chocado com a subserviencia desses juizes, ao dizer ” mas a justiça francesa permite lei retroativa? na Alemanha isso não é possivel””, nem os alemães achavam noram criar uma lei para valer para trás, os franceses de Vichy fizeram isso para punir o pessoal da resistencia.

  3. O artigo me faz lembrar

    O artigo me faz lembrar Fernando Henrique Cardoso, particularmente quando se relaciona o comportamento dele com aquela famosa foto que tirou com Bill Clynton  e terceiros. FHC está com a felicidade exuberante mostrada nos olhos, encantado com a compania. Seus livros, seus amigos,seus trabalhos, e, por que não (?); sua pátria,  foram jogados no lixo com todo o desdém que se possa imaginar!!! No fundo é algo que deve ou deveria deixar a qualquer um muito triste,mesmo abandonando o moralismo piegas,  porque simboliza o quanto um ser humano pode se degradar e por tão pouco!!! Pior é saber que é infinito o número de candidatos!! 

  4. bom post.

    Não sei porquê, enquanto lia o artigo me passou pela mente alguns personagens do nosso tempo em nosso país.

    Acho que muitos leitores terão a mesma impressão.

  5. Petain passou raspando, no
    Petain passou raspando, no fundo merecia o paredão. Personagem heroico da 1a guerra e figura abjeta da 2a.
    A historia do mundo está lotada desses personagens carrapatos. No Brasil o seu representante mais notório se chama Roberto Freire(me dá um carguinho), exemplo perfeito de homem sem virtudes, mistura em altas doses de oportunismo, hipocrisia e cinismo.

    1. Petain teve a pena de morte

      Petain teve a pena de morte comutada para prisão perpetua por De Gaulle. Petain era padrinho de batismo do filho mais velho de De Gaulle, que teve o mesmo prenome de Petain, Henri Phelippe, em homenagem ao padrinho. Petain foi tambem quem

      na decada de 30 levantou a carreira de De Gaulle no Exercito frances, De Gaulle sentiu constrangimento em sancionar a pena de morte para o padrinho de filho, lamentou muito o fato de Petain ter retornado da Suiça, para onde fugiu com a queda do Terceiro Reich, paa ser julgado na França. De Gaulle disse ” Que miseria esse homem na velhice, poderia ter me poupado

       o dever de julga-lo”. Peain tinha recebido asilo politico na Suiça e De Gaulle ficou horrorizado com sua volta a França, criando-lhe um enorme problema pessoal e politico, nem é preciso dizer as criticas que recebeu ao comutar a pena de morte.

      Petain ficou preso até morrer em uma casa dentro de uma fortaleza numa ilha na costa atlantica francesa, ao lado da marechala, , morreu com 91 anos de morte natural.

       

      1. Será que Petain não voltou

        Será que Petain não voltou pra França pra constranger De Gaulle, pois sabia que DeGaulle não lhe condenaria à pena de morte em nome da gratidão que De Gaulle lhe devia? Se Petain fez esse lance com esse objetivo maquiavélico, revela-se mais fdp ainda rs 

  6. Aliás Laval não merecia a
    Aliás Laval não merecia a honra do fuzilamento. Seu destino deveria ter sido a guilhotina, na melhor tradição francesa.

  7. FHC é mais traidor que Laval,

    FHC é mais traidor que Laval, sem falar em várias figuras do judiciário. E Ciro é um sério candidato ( a Laval).

  8. Quem não sabe o que tem, não

    Quem não sabe o que tem, não sabe o que perde. Esse pensamento serve aos brasileiros que, desconhecendo as riquezas do pré-sal aceitam calados sua entrega para ser explorado por empresas estrangeiras em detrimento de uma nacional mais competente, nesse caso específico da exploração de petróleo em águas profundas.

    Essa mesma ideia, em termos de riquezas tangíveis, também poderia ser usada para as imateriais.

    Quem não conhece e valoriza a história do seu povo e, por conseguinte, não se vê um construtor dela, é incapaz de perceber o que está fazendo, ou melhor, o que está destruindo.

    Essas pessoas navegam pelo poder imaginando-o um fenômeno natural, não uma construção histórico-social.

    As organizações populares e nacionalistas são poderosas, então estou a serviço delas. Essas forças foram golpeadas, então estou a serviço dos novos poderosos. Para essas pessoas, o poder, independentemente de quem ou o que é feito dele, representa o bem. Por isso, servem-lhe com total lealdade e vigor. Esse é o pensamento dos medíocres e ignorantes. 

    – Medíocres porque incapazes de realizar suas vontades – de serem verdadeiramente poderosos. A única vontade do medíocre é servir aos poderosos do momento – aqueles que tomam para si, numa determinada conjuntura as rédeas de história.

    – Ignorantes, porque incapazes de perceber os limites históricos de suas ações. Veem a frágil crista da onda e imaginam serem elas as correntes profundas e poderosas que determinam a direção do mar.

    Os poderosos sabem que o poder de um indivíduo não pode se contrapor a história de desenvolvimento do povo ao qual ele pertence. É nessa direção que seu poder deve atuar, do contrário sucumbirá. Mas os medíocres e ignorantes servem a outros interesses se imaginando poderosos.

    Enfim, creio que não há mistérios (dinheiro, chantagens, etc.), por trás da ação dessas tristes figuras traidoras do seu povo, além de mediocridade e ignorância.

  9. Reencarnação

    André,

    O último parágrafo de sua postagem quse me rouba o conteúdo deste comentário.

    Será que o Sr. Ministro Fachin não seria a reencarnação do Sr. Laval?

    Sua história antes de política é muitíssimo parecida…

    1. Figuras como Laval são muito

      Figuras como Laval são muito comuns na historia de todos os paises em seus momentos mais dramaticos.

      São mais comuns do que os homens de convicções mas amedida que diminui a presença da elite intelectual e cresce a presença de pessoas vulgares na politica essas figuras tem maior presença.

  10. Nomes
    Pequena correção onomástica:

    Se escreve Philippe Pétain, e não “Phelippe”.

    Idem para Philippe Henriot.

    Obrigado pelo artigo. Abraços.

    1. Agradeço, são erros de

      Agradeço, são erros de digitação, cometo esses e muitos outros, escrevo de uma vez só e de memoria, é

      bom que me corrijam.

  11. Os grandes traidores da patria

    Na semana que passou participei de uma conferência com um professor da Universidade Estadual de Feira de Santana que lançou um livro sobre a historia de Canudos e o livro de Euclides da Cunha. Seu livro tem como nome “O pêndulo de Euclides” e decortica o livro de Euclides da Cunha e o que foi de fato Canudos. Pois bem, ao debatermos sobre Canudos e a historia do Brasil, falamos sobre esses lapsos que o brasileiro tem de sua propria historia, sobre aquilo que é divulgado pela imprensa e a historia oficial contada nas escolas quase sempre de forma superficial. Os reais herois do Brasil tornam-se parias da Historia e essas lacunas por vezes graves na formação do brasileiro são fatores de desunião em torno da construção de uma Nação de identidade forte. 

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador